TJCE - 3011594-12.2023.8.06.0001
1ª instância - 7ª Vara da Fazenda Publica da Comarca de Fortaleza
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Polo Ativo
Movimentações
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03/09/2024 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO CEARÁ Comarca de Fortaleza 7ª Vara da Fazenda Pública (SEJUD 1º Grau) Rua Desembargador Floriano Benevides Magalhaes nº 220, Água Fria - CEP 60811-690, Fone: (85) 3492 8878, Fortaleza-CE - E-mail: [email protected] SENTENÇA PROCESSO Nº 3011594-12.2023.8.06.0001 CLASSE OUTROS PROCEDIMENTOS DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA (1294) ASSUNTO [Indenização por Dano Moral] REQUERENTE: KATIANE MARTINS DE SOUZA CEARA SECRETARIA DA FAZENDA Trata-se de Ação de Indenização proposta por KATIANE MARTINS DE SOUZA, em face do ESTADO DO CEARÁ, objetivando, em síntese, a condenação do requerido em danos morais no montante de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), bem como a concessão de pensão em favor da parte autora.
Aduz a parte autora que na data de 16 de setembro de 2022, Carlos Alberto Silva Alves, seu esposo, veio a falecer decorrente de disparo de arma de fogo efetuado por policiais militares em um posto de gasolina na cidade de Aracaú/CE.
Aponta que, conforme o inquérito policial, quando os policias chegaram no local, testemunharam que Carlos Alberto falava que iria morrer enrolando a mangueira de uma das bombas de combustível do posto no pescoço e que a vítima também dizia que morreria mas também levaria alguém consigo.
Por fim, relata que, segundo o inquérito, ele começou a perseguir um terceiro com uma faca em punho com o objetivo de golpeá-la e nesse momento foi impedido pelos policiais, pois o alvejaram com vários tiros de arma de fogo e após isso a vítima foi socorrida pela SAMU até uma UPA próxima, mas veio a falecer.
Narra que a Carlos Alberto era sofredor de sérios problemas psicológicos crônicos, realizando diversos tratamentos e que com sua morte, ela e o seu filho foram deixados desamparados, sobrevivendo com a ajuda de familiares e amigos.
Instrui a inicial com documentos (IDs 56439214 - 56441475).
Decisão de ID 56754485 defere a gratuidade da justiça e deixa de designar audiência de conciliação ou mediação.
O Estado do Ceará apresenta contestação de ID 58065832, aduzindo, em suma, a não configuração da responsabilidade do Estado, posto que a atuação ocorreu no estrito cumprimento do dever legal, sendo o direito exercido regularmente de acordo com os limites legalmente impostos.
Requer também a condenação da parte autora nos ônus sucumbenciais.
Réplica de ID 64588568 requerendo o julgamento procedente de todos os pedidos contidos na exordial.
Despacho em ID 71755419, determina a intimação das partes a dizerem quanto a necessidade de produção de outras provas, advertindo, para tanto, que o silêncio implicará o julgamento antecipado da lide.
A parte autora em Petição de ID 71437384 informa que não possui mais provas a produzir.
Instado a se manifestar, o Ministério Público em ID 80954869 se manifesta pela improcedência da ação em todos os seus termos. É o que importa relatar.
DECIDO.
A presente ação possui como desiderato a condenação do Ente Estatal em danos morais no montante de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), bem como a concessão de pensão em favor da parte autora.
Pois bem.
A Constituição da República de 1988 adotou a teoria do risco administrativo e, consequentemente, a responsabilidade objetiva do Poder Público, que tem o dever de indenizar a vítima, quando demonstrados o nexo de causalidade entre o prejuízo e o fato danoso ocasionado pela omissão do Poder Público.
A responsabilidade civil, consubstanciada no dever de indenizar o dano sofrido por outrem, provem do ato ilícito, caracterizando-se pela violação da ordem jurídica com ofensa ao direito alheio e lesão ao respectivo titular, conforme a regra expressa dos artigos 186 e 927 do Código Civil, in verbis: Art. 186.
Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 927.
Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
O referido instituto, no ordenamento jurídico Brasileiro, comporta duas modalidades: a subjetiva, que exige a presença do dano, da conduta do agente, do elemento subjetivo da conduta, consistente no dolo ou na culpa, e o nexo causal entre a conduta e o dano.
A outra modalidade é a responsabilidade objetiva, para a qual também se exige a presença do dano, da conduta do agente e do nexo causal entre ambos, dispensando, todavia, a verificação de dolo ou culpa.
Essa última modalidade, por penalizar o agente da conduta, independe de sua intenção de lesionar terceiro, ou de sua negligência, imprudência ou imperícia, é excepcional, e somente será possível em casos expressamente previstos em lei.
Assim, enquanto a responsabilidade subjetiva é a regra no Direito Brasileiro, são restritas as hipóteses em que se admite a objetiva, ou seja, independente de averiguação de culpa do causador do dano, em razão de sua gravidade, visto que o próprio fundamento do instituto da responsabilidade civil encontra respaldo na necessidade de reparar o dano, em função da culpa de seu causador.
Contudo, em casos como aquele em que o cidadão é lesionado em razão do Estado, em uma de suas esferas, por meio de conduta de seus agentes, o que se busca é tornar a responsabilidade pelo dano causado a ele solidária, dissolvendo-a por toda a sociedade, visto que os serviços prestados pela Administração Pública são em prol de todos os cidadãos, não sendo justo que uma pessoa lesionada suporte o dano sozinha.
Nesse sentido, aplica-se a norma esculpida no §6º, do art. 37, da CF/88, segundo o qual: § 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Por sua vez, o art. 43 do Código Civil vigente veio regular a responsabilidade objetiva do Estado, já preconizada na Carta Magna, determinando que: Art. 43.
As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo.
Tal previsão é válida para o caso de conduta dos agentes públicos, sejam elas culposas ou não, dolosas ou não.
Assim, compre analisar apenas a configuração do fato administrativo, do dano e do nexo causal entre eles.
Contudo, acionada a Administração Pública a arcar aos danos causados por seus agentes, possível a mesma invocar causas de excludentes de responsabilidade civil, que podem não apenas minorar, mas até mesmo excluir o dever de indenizar.
Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal teve oportunidade de esclarecer que "o princípio da responsabilidade objetiva não se reveste de caráter absoluto, eis que admite o abrandamento e, até mesmo, a exclusão da própria responsabilidade civil do Estado, nas hipóteses excepcionais configuradoras de situações liberatórias - como o caso fortuito e a força maior - ou evidenciadoras de culpa atribuível à própria vítima" (RDA 137/233 - RTJ 55/50 - RTJ 163/1107-118, Rel.
Ministro Celso de Mello).
No caso dos autos, a parte autora narra que seu esposo veio a falecer decorrente de disparos de arma de fogo efetuados por policiais militares depois que ele começou a perseguir um terceiro com uma faca em punho com o objetivo de golpeá-la, apontando que ele sofria de problemas mentais.
Não obstantes aos argumentos trazidos, verifico que a súplica autoral não merece prosperar.
Explico.
A parte autora não apresentou não apresentou novas provas nos autos, ou seja, sua prova restringe-se a uma cópia do inquérito policial (ID 56439223).
A partir de uma análise desse inquérito, verifica-se a ausência de qualquer responsabilidade estatal pelo óbito do esposo da parte.
Conforme o inquérito policial, a testemunha Francisco Isaias da Silva Costa disse que viu Carlos Alberto Silva Alves com a mangueira da bomba em volta do pescoço confrontando os policiais e que os mesmos efetuaram disparos contra ele e em dado momento, Carlos Alberto saiu correndo em direção a ele, armado com uma faca, acreditando que o mesmo faria algo contra qualquer pessoa que alcançasse em decorrência de seu estado mental, afirmando que os policiais agiram para defendê-lo (p. 15 ID 56439223).
Lucas Freitas da Costa, outra testemunha, também observou que Carlos Alberto estava armado e fazendo ameaças , dizendo a todo momento que mataria os policiais e que os policiais, isolando-o, pediram repetidas vezes que ele largasse a sua arma e se entregasse, mas que o mesmo ignorou esses comandos e procedeu a colocar a bomba de combustível no pescoço e que cortaria a bomba e explodiria o posto com todos que estavam ali (p. 13 ID 56439223).
No mesmo inquérito policial, também foi mencionado que Carlos Alberto já havia assassinado uma pessoa, o padrasto de Francisca Daniele Cordeiro Ferreira, enteada dele (p. 23 ID 56439223).
Nesta senda, não restam dúvidas que os policiais militares agiram no estrito cumprimento do dever legal, sendo que agiram em legítima defesa de terceiro.
Nesse sentido: APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS.
NÃO-COMPROVAÇÃO DE QUE A ABORDAGEM POLICIAL FOI EMPREENDIDOCOM EXCESSO CONDUTA TIPIFICADA COMO ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL.
INEXISTÊNCIA DE RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO.NÃO-CONFIGURAÇÃO DO DEVER DE INDENIZAR.
DANO MORAL INEXISTENTE.
SENTENÇA MANTIDA.
RECURSO DESPROVIDO."Não se pode perder de vista que a abordagem policial, por si só, não configura ato capaz de ensejar dano moral, mas estrito cumprimento do dever legal, devendo-se punir apenas o excesso ou abuso de poder.
Em tais casos, o Poder Público somente poderá ser responsabilizado caso evidenciada a prática de ato ilícito por seus prepostos, sob pena de ser obrigado a indenizar quando age no exercício de sua função de prestar segurança pública" (TJ-SC - AC: *01.***.*54-17 Imbituba 2015.075481-7, Relator: João Henrique Blasi, Data de Julgamento: 16/02/2016, Segunda Câmara de Direito Público) Ademais, como bem apontou o Ministério Público em manifestação de ID 80954869, a doença psicológica da vida não basta para caracterizar responsabilidade: "O fato da vítima Carlos Alberto apresentar doença psicológica e ter sido alvejada por agente policial não é bastante para caracterizar a responsabilidade estatal no caso em espécie, pois a ninguém, independente da condição que apresente, é dado provocar pânico e atentar contra a vida de outrem, como fez o falecido.".
Sobre atos ilícitos, diz o art. 188 do Código Civil: Art. 188.
Não constituem atos ilícitos: I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido; II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente.
Parágrafo único.
No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo.
A atuação do SAMU também afasta qualquer tipo de ilicitude, visto que foi adequadamente socorrido.
Com isso, fica clara a ausência de ilicitude na conduta dos policiais, o que afasta qualquer possibilidade de indenização por danos ou pensões.
Diante do exposto e tudo mais que dos autos consta, JULGO IMPROCEDENTE o pedido autoral, o que faço com espeque no art. art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil.
Condeno a parte autora em custas e honorários advocatícios, estes fixados em 10% do valor da causa, o que faço com fulcro no art. 85, §2º e 3°, I, Código de Processo Civil, restando estes suspensos em razão da gratuidade da justiça concedida.
Após o trânsito em julgado desta decisão, arquivem-se os autos, com a baixa devida.
Intime-se. Fortaleza/CE, data da assinatura digital. Juiz de Direito
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
08/03/2023
Ultima Atualização
24/07/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
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