TJCE - 0200494-69.2022.8.06.0064
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) 1ª Camara de Direito Publico
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Partes
Polo Passivo
Partes
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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05/09/2024 12:15
Remetidos os Autos (por julgamento definitivo do recurso) para juízo de origem
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05/09/2024 12:14
Juntada de Certidão
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05/09/2024 12:14
Transitado em Julgado em 04/09/2024
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04/09/2024 00:06
Decorrido prazo de ESTADO DO CEARA em 03/09/2024 23:59.
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23/08/2024 00:34
Decorrido prazo de FUNDACAO GETULIO VARGAS em 02/08/2024 23:59.
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23/08/2024 00:34
Decorrido prazo de AGENOR LUCAS DO NASCIMENTO OLIVEIRA em 02/08/2024 23:59.
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23/08/2024 00:30
Decorrido prazo de FUNDACAO GETULIO VARGAS em 02/08/2024 23:59.
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23/08/2024 00:30
Decorrido prazo de AGENOR LUCAS DO NASCIMENTO OLIVEIRA em 02/08/2024 23:59.
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12/07/2024 00:00
Publicado Intimação em 12/07/2024. Documento: 12696740
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11/07/2024 00:00
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 11/07/2024 Documento: 12696740
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11/07/2024 00:00
Intimação
ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 1ª Câmara de Direito Público Nº PROCESSO: 0200494-69.2022.8.06.0064 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL APELANTE: AGENOR LUCAS DO NASCIMENTO OLIVEIRA e outros (2) APELADO: ESTADO DO CEARA e outros (2) EMENTA: ACÓRDÃO: Continuando o julgamento, o Exmo.
Sr.
Des.
José Tarcílio Souza da Silva proferiu voto-vista no sentido de acompanhar o voto do e.
Relator.
Desta feita, o Colegiado, por unanimidade, acordou em conhecer do recurso para negar-lhe provimento, nos termos do(a) eminente Relator(a). RELATÓRIO: VOTO: ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GABINETE DO DESEMBARGADOR INÁCIO DE ALENCAR CORTEZ NETO PROCESSO Nº 0200494-69.2022.8.06.0064 APELANTE/APELADO: AGENOR LUCAS DO NASCIMENTO OLIVEIRA APELANTE/APELADO: ESTADO DO CEARA e outros RELATOR: INÁCIO DE ALENCAR CORTEZ NETO EMENTA: RECURSOS DE APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO.
CONCURSO PÚBLICO. PMCE. COTA RACIAL.
EXAME DE HETEROIDENTIFICAÇAO.
CANDIDATO AUTODECLARADO NEGRO.
REPROVAÇÃO.
INDEFERIMENTO DE RECURSO ADMINISTRATIVO.
AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA.
VIOLAÇÃO AO ART. 93, IX, CF/88.
PRECEDENTES DESTA CORTE.
TEMA 1.009 DO STF. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE NOVO EXAME.
MAJORAÇÃO DE HONORÁRIOS (§11, ART. 85, CPC).
RECURSOS DE APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDOS E IMPROVIDOS. 1.
Trata-se de Apelações interpostas por Agenor Lucas do Nascimento Oliveira e pelo Estado do Ceará contra sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Caucaia, que julgou parcialmente procedente a Ação de Obrigação de Fazer c/ anulação de ato administrativo ajuizada por Agenor Lucas do Nascimento Oliveira contra o Estado do Ceará e a Fundação Getúlio Vargas (FGV). 2.
O cerne da controvérsia recursal consiste em examinar se há ilegalidade na conduta da comissão organizadora do concurso público para provimento de cargo de soldado da Polícia Militar do Estado do Ceará, conforme Edital n° 01, de 27 de julho de 2021, que eliminou candidato inscrito nas vagas reservadas a negros/pardos, por, supostamente, não apresentar as características que lhe conferiam a condição de candidato pardo ou negro. 3.
Conforme se extrai dos referidos dispositivos do edital e da norma estadual em alusão, o candidato tem a prerrogativa de se autodeclarar negro ou pardo, para enquadramento nas vagas destinadas à cota racial, estando sujeito a posterior verificação por comissão avaliadora, mediante análise presencial do fenótipo. 4.
O art. 93, IX, da CF/88 dispõe que todas as decisões proferidas em processo judicial ou administrativo devem ser motivadas, sendo obrigatória a tarefa de exteriorização das razões de seu decidir, com a demonstração concreta do raciocínio fático e jurídico que desenvolveu para chegar às conclusões contidas na decisão.
Assim, é imperativo declarar que um ato administrativo apenas se reputa devidamente motivado quando se observa exposto formalmente o motivo, mediante enunciados que permitam realmente identificar o motivo fático e o motivo legal que autorizou ou exigiu a sua emissão, de onde se infere que a fundamentação do ato administrativo deve ser explícita. 5.
Decerto que a análise do fenótipo do candidato pela comissão especial avaliadora do concurso público constitui mérito do ato administrativo, fato que impõe a sindicabilidade por parte do Judiciário tão somente quanto à legalidade, sendo-lhe vedado interferir na comparação e na valoração feita pelo avaliador, sob pena de ofensa ao princípio da separação dos poderes, constitucionalmente consagrado. 6.
Compulsando os autos, cristalino que estamos diante de um ato administrativo carente de fundamentação adequada e que apenas repete respostas idênticas e rasas a fim de invalidar autodeclaração do candidato, observa-se nítido vilipêndio ao princípio da motivação dos atos administrativos, porquanto o candidato ter obtido resposta genérica do recurso administrativo por ele interposto. 7.
No entanto, tendo em mira o que decidiu o STF acerca do assunto em pauta, ao julgar o RE 632.853 (Tema 485), não compete ao Poder Judiciário substituir-se à banca examinadora e avaliar as respostas dadas pelos candidatos e notas a elas atribuídas, salvo situações excepcionais, bem como no RE 1.133.146 (Tema 1.009), decidiu-se que candidatos reprovados na fase de avaliação psicotécnica, em casos de ausência de fundamentação, deveriam ser submetidos a novo exame. 8.
Atento aos recentes entendimentos desta Corte, assim como dos tribunais de sobreposição, observo que a sentença foi proferida em conformidade com os excertos anotados, motivo pelo qual deve ser mantida em sua inteireza, com a declaração de nulidade do procedimento de exame de heteroidentificação do autor e a determinação de realização de novo exame da parte autora, com a estrita obediência ao devido processo legal administrativo. 9.
Recursos de Apelação conhecidos e improvidos. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer e negar provimento aos recursos de apelação, nos termos do voto do relator. Desembargador INACIO DE ALENCAR CORTEZ NETO Relator RELATÓRIO Trata-se de Apelações interpostas por Agenor Lucas do Nascimento Oliveira e pelo Estado do Ceará contra sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Caucaia, que julgou parcialmente procedente a Ação de Obrigação de Fazer c/ anulação de ato administrativo ajuizada por Agenor Lucas do Nascimento Oliveira contra o Estado do Ceará e a Fundação Getúlio Vargas (FGV).
O autor relata que participou de concurso p8úblico para provimento de vagas de soldado da Polícia Militar do Estado do Ceará, conforme Edital n° 01, de 27 de julho de 2021, concorrendo para as vagas destinadas aos candidatos que se declaram negros, de modo que obteve aprovação na 439ª colocação nas referidas vagas.
Em razão disso, o candidato foi submetido a exame de heteroidentificação, que indeferiu o seu seguimento na lista de cotistas, razão pela qual interpôs recurso administrativo, argumentando a ausência de fundamentação do seu indeferimento, porém, a decisão administrativa foi mantida, mais uma vez, sem motivação.
Assim, pugnou o promovente pela declaração de ilegalidade do ato que não o considerou como cotista, com a inclusão de seu nome na lista dos candidatos negros, assegurando-lhe o seu prosseguimento regular no concurso, com a inscrição do TAF (teste de aptidão física), apresentação de exames médicos, teste psicológico e apresentação para investigação social, bem como sua inscrição no curso de formação e demais etapas do concurso, caso seja aprovado no curso de formação e outras etapas.
Finda a instrução, o juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Caucaia proferiu sentença (id. 8230827), a qual deu provimento parcial ao pedido autoral, declarando a nulidade da decisão administrativa que desclassificou o apelante do certame por ausência de fundamentação e violação ao contraditório.
Além disso, o juízo de primeiro grau determinou que o Estado do Ceará e Fundação Getúlio Vargas permitissem a participação do ora recorrente nas demais fases do certamente até a sua conclusão, com reserva de vaga, e que, no prazo de 15 dias, profiram nova decisão estabelecendo os critérios utilizados para a heteroidentificação, com devida motivação específica, de forma objetiva, identificando quais os aspectos fenotípicos considerados.
Inconformado, o autor interpôs recurso de apelação (id. 8230837) por meio do qual insurge-se a parte da sentença que determinou a realização de novo exame de heteroidentificação, acreditando que a nulidade do anterior exame convola a veracidade da autodeclaração.
Também inconformado, o Estado do Ceará interpôs apelação (id. 8230842) por meio do qual refere-se ser indevida a ingerência do Poder Judiciário na análise dos critérios adotados pela banca para eliminação do autor da lista de cotistas, sustentando a observância ao princípio da separação dos poderes e da isonomia entre os candidatos.
Contrarrazões de apelo apresentada pelo Estado do Ceará (id. 8230850) e pela parte autora (id. 8230854). É o relatório.
VOTO Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos Recursos de Apelação e da remessa necessária.
O cerne da controvérsia recursal consiste em examinar se há ilegalidade na conduta da comissão organizadora do concurso público para provimento de cargo de soldado da Polícia Militar do Estado do Ceará, conforme Edital n° 01, de 27 de julho de 2021, que eliminou candidato inscrito nas vagas reservadas a negros/pardos, por, supostamente, não apresentar as características que lhe conferiam a condição de candidato pardo ou negro.
Inicialmente, saliento que a intervenção do Judiciário na avaliação das provas e etapas de um concurso público somente tem cabimento em hipóteses excepcionais, quando se observa erro grosseiro ou flagrante ilegalidade, conforme entendimento pacificado pelo STF, por meio do julgamento do RE nº 632.853, submetido ao rito de Repercussão geral, vejamos: Recurso extraordinário com repercussão geral. 2.
Concurso público.
Correção de prova.
Não compete ao Poder Judiciário, no controle de legalidade, substituir banca examinadora para avaliar respostas dadas pelos candidatos e notas a elas atribuídas.
Precedentes. 3.
Excepcionalmente, é permitido ao Judiciário juízo de compatibilidade do conteúdo das questões do concurso com o previsto no edital do certame.
Precedentes. 4.
Recurso extraordinário provido. (STF - RE 632853, Relator(a): Min.
GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em23/04/2015,ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-125 DIVULG26-06-2015 PUBLIC 29-06-2015). Assim, excepcionalmente, a intervenção jurisdicional nas questões dispostas em concurso público limita-se às hipóteses de flagrante ilegalidade do certame ou por ausência de observância às regras editalícias, não cabendo ao Poder Judiciário interferir nos critérios de avaliação utilizados pela banca examinadora ou adentrar no mérito de correção da prova.
No entanto, é incontestável que, existindo vícios de legalidade em atos administrativos, tais atos deverão ser invalidados e, se for o caso, novamente realizados sem tais equívocos, podendo a nulidade ser decretada, como de resto ocorre com atos administrativos, pelo Judiciário ou pela própria Administração Pública, neste caso consubstanciado no seu poder de autotutela.
Diante disso, de acordo com o caso apresentado, a despeito das razões elencadas pelos réus, entende-se pelo enquadramento na hipótese das exceções destacadas, sendo cabível a intervenção judicial, porquanto resta claramente constatada a ausência de motivação do ato que desclassificou a parte apelante na fase de heteroidentificação.
O Edital nº 01/2021, de 27/07/2021, que regeu o referido concurso público, prevê as seguintes hipóteses para o candidato concorrer às vagas destinadas às cotas raciais: 7.3 Os candidatos que, no ato da inscrição, declararem-se negros e que forem aprovados no Exame Intelectual, serão convocados de acordo com o subitem 9.7 para o procedimento de heteroidentificação, ocasião em que será verificada a veracidade das informações prestadas pelos(as) candidatos(as), por meio de análise do fenótipo, e será proferido parecer definitivo a esse respeito. 7.3.1 O procedimento de heteroidentificação será realizado em Fortaleza e Região Metropolitana por uma comissão especial a ser instituída pela FGV para esse fim. 7.3.2 Será enquadrado como negro o candidato que assim for reconhecido pela maioria dos membros presentes da comissão mencionada no subitem 7.3.1. 7.3.3 A convocação para avaliação da condição de candidatos negros será publicada juntamente com o resultado definitivo da Prova Objetiva (Exame Intelectual). 7.3.4 O candidato deverá comparecer ao procedimento de heteroidentificação munido do formulário de autodeclaração, publicado no site da FGV, a fim de ser confrontado com o fenótipo declarado, além de documento de identidade (original e cópia) e cópia da certidão de nascimento.
As cópias serão retidas pela FGV para avaliação da heteroidentificação.
Informações adicionais constarão da convocação para o procedimento de heteroidentificação. 7.4 A não aprovação na análise documental realizada ou o indeferimento da condição de negro, bem como o não comparecimento ao procedimento de heteroidentificação no caso dos candidatos negros, acarretará a sua eliminação do concurso, conforme Art. 2º, §2º da Lei nº 17.432 de 25.03.2021.
A Lei Estadual nº 17.432, de 25.03.2021, que dispõe sobre a reserva de vagas para concursos públicos destinadas a negros, estabeleceu o seguinte, ao que interesse ao caso vertente: Art. 1º Fica instituída, no âmbito do Poder Executivo Estadual, política pública social e afirmativa consistente na reserva para candidatos negros de 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas, considerando regionalização e especialidade, em concursos públicos destinados ao provimento de cargos ou empregos integrantes do quadro de órgãos e entidades públicas estaduais, incluídas as empresas públicas e sociedades de economia mista. §1º A reserva de vagas prevista no caput deste artigo constará expressamente nos editais de concursos públicos estaduais, com a especificação do total de vagas correspondente, sendo obrigatória sempre que o número de vagas ofertadas, para o cargo ou emprego público, for igual ou superior a 5 (cinco). §2º Caso da incidência do percentual de cota sobre o total de vagas ofertadas para o cargo ou emprego resultar número fracionado, o quantitativo de vagas a serem reservadas, nos termos deste artigo, será aumentado para o número inteiro subsequente caso a fração seja superior a 0,5 (cinco décimos), ou diminuído para o inteiro imediatamente anterior, se a fração for inferior a 0,5 (cinco décimos), observado sempre o patamar limite para a reserva de vagas estabelecido no caput deste artigo. §3º Os candidatos negros poderão concorrer, no concurso público, tanto às vagas reservadas quanto às vagas destinadas à ampla concorrência, não sendo computado para efeito de preenchimento das vagas reservadas aquele candidato que obtiver aprovação dentro das vagas ofertadas à ampla concorrência. §4º A desistência de candidato negro aprovado em vaga reservada importará no preenchimento para o candidato negro imediatamente em seguida posicionado. §5º A nomeação dos candidatos aprovados no concurso público estadual observará os critérios de alternância e proporcionalidade, levando em consideração a relação entre o número de vagas total e o número de vagas reservadas a candidatos com deficiência e a candidatos negros.
Art. 2º O acesso à reserva de vagas instituída nesta Lei dar-se-á por meio de manifestação formal do candidato na qual se autodeclare preto ou pardo por ocasião da inscrição no concurso público, observados os quesitos cor e raça utilizados pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. §1º O candidato que se autodeclare na forma do caput deste artigo, para validação de sua participação no certame pelo sistema de cotas, será submetido, previamente à realização das provas, à comissão de heteroidentificação, observada, no que couber, a Portaria Normativa nº 04, de 6 de abril de 2018, oriunda do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão/Secretaria de Gestão de Pessoas, que atestará seu enquadramento nos termos do art. 1.º desta Lei, considerados aspectos fenotípicos. §2º O candidato cuja autodeclaração não for validada na forma do §1.º deste artigo será eliminado do concurso. Conforme se extrai dos referidos dispositivos do edital e da norma estadual em alusão, o candidato tem a prerrogativa de se autodeclarar negro ou pardo, para enquadramento nas vagas destinadas à cota racial, estando sujeito a posterior verificação por comissão avaliadora, mediante análise presencial do fenótipo.
Nesse sentido, verifica-se, também, a impossibilidade de um candidato se inscrever, concomitantemente, às vagas destinadas à ampla concorrência e à cota racial (art. 1º, §3º, da Lei Estadual nº 17.432/2021), como também, uma vez eliminado do certame em virtude da não validação de sua autodeclaração pela comissão de heteroidentificação, ficará impossibilitado de concorrer às vagas destinadas à ampla concorrência, ainda que tenha pontuação suficiente para tanto, à luz do disposto no art. 2º, §2º, de referida norma estadual.
O art. 93, IX, da CF/88 dispõe que todas as decisões proferidas em processo judicial ou administrativo devem ser motivadas, sendo obrigatória a tarefa de exteriorização das razões de seu decidir, com a demonstração concreta do raciocínio fático e jurídico que desenvolveu para chegar às conclusões contidas na decisão.
Assim, é imperativo declarar que um ato administrativo apenas se reputa devidamente motivado quando se observa exposto formalmente o motivo, mediante enunciados que permitam realmente identificar o motivo fático e o motivo legal que autorizou ou exigiu a sua emissão, de onde se infere que a fundamentação do ato administrativo deve ser explícita.
Nesse sentido, pelo princípio da motivação das decisões, constitucionalmente consagrado, art. 93, IX e X, as autoridades judiciais e administrativas têm o dever de explicar suas razões, de fato e de direito, pelas quais o pedido foi considerado procedente ou improcedente, afigurando-se uma garantia contra possíveis excessos do Estado-Juiz, de maneira que, o julgador, seja no âmbito administrativo ou judicial, tem, necessariamente, de explicar o porquê do seu posicionamento, sob pena de nulidade.
De certo que a análise do fenótipo do candidato pela comissão especial avaliadora do concurso público constitui mérito do ato administrativo, fato que impõe a sindicabilidade por parte do Judiciário tão somente quanto à legalidade, sendo-lhe vedado interferir na comparação e na valoração feita pelo avaliador, sob pena de ofensa ao princípio da separação dos poderes, constitucionalmente consagrado.
Compulsando os autos, cristalino que estamos diante de um ato administrativo carente de fundamentação adequada e que apenas repete respostas idênticas e rasas a fim de invalidar autodeclaração do candidato, observa-se nítido vilipêndio ao princípio da motivação dos atos administrativos, porquanto o candidato ter obtido resposta genérica do recurso administrativo por ele interposto.
Confira: "Recurso Indeferido.
Conhecidas as razões do recorrente e analisado o registro de vídeo da etapa de Heteroidentificação, a Banca recursal decidiu pela manutenção do resultado preliminar, com consequente indeferimento do recorrente". (id. 8230793).
Consoante previsto no edital do certame (item 7.3), configura-se necessário que a comissão especial examine aspectos fenotípicos do candidato capazes de ratificarem ou infirmarem a sua condição de pessoa parda constante na autodeclaração, não sendo demonstrados pela referida comissão qual ou quais aspectos foram analisados, qual ou quais características do candidato não se enquadra no fenótipo desejado, enfim não houve, aparentemente, fundamento válido e adequado ao caso concreto na decisão do recurso administrativo.
Com isso, para que sejam observados o contraditório e a ampla defesa, o candidato deve estar ciente das razões da sua exclusão, bem como dos critérios adotados pela Comissão para o indeferimento de seu recurso, sendo insuficiente a simples indicação de que o candidato não detém fenótipo de pessoa negra (preta ou parda), já que genérica e sem os fundamentos necessários, em desacordo coma Teoria dos Motivos Determinantes.
Ademais, sabe-se que os atos praticados pela administração pública, especialmente os que importam em supressão de candidatos da disputa do concurso público, devem, necessariamente, ser fundamentados de forma clara e objetiva, conforme consta no Enunciado 684 do Supremo Tribunal Federal: "É inconstitucional o veto não motivado à participação de candidato a concurso público".
Outrossim, a Lei Federal nº 9.784/1999, a qual regulamenta o Processo Administrativo no âmbito federal, estabelece que o ato administrativo deverá ser motivado, contendo os fatos e fundamentos jurídicos quando decidirem, dentre outros, processos administrativos relacionados a concurso ou seleção pública, vejamos: Art. 50.
Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando: I - neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses; II - imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções; III - decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública; Assim, com fulcro no art. 50, III e V, da Lei Federal nº 9.784/1999, as decisões prolatadas em recurso administrativo, bem como processos que dizem respeito a concurso público, devem ser devidamente fundamentadas.
Do mesmo modo o art. 12, caput, da Portaria Normativa n.04/2018, do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão/Secretaria de Gestão de Pessoas, prevê, expressamente: "Art. 12.
A comissão de heteroidentificação deliberará pela maioria dos seus membros, sob forma de parecer motivado". Conforme exposto, verifica-se, que a decisão do recurso administrativo proferida pela banca examinadora do certame padece de excessiva generalidade, abstração e imprecisão, em verdade constitui um modelo único, utilizado para todo e qualquer recurso com vistas ao reexame de decisão acerca de reprovação na fase de heteroidentificação, malferindo o disposto no art. 93, IX, da Carta Magna, e o art. 50, III e V, da Lei Federal nº 9.784/1999.
No caso dos autos, nada há que nos demova do já apresentado, convindo reafirmar o já assentado no Supremo Tribunal Federal a respeito do tema (grifei): Agravo regimental na suspensão de segurança.
Decisões atacadas nas quais se anularam desclassificações de postulantes a vagas em concurso público reservadas a candidatos negros.
Eliminações ocorridas em desacordo com os parâmetros para tanto fixados pela Suprema Corte.
Lesão à ordem ou à economia públicas não demonstrada. 1.
A Suprema Corte já decidiu que, na análise de atendimento aos requisitos para concorrência a vagas de concursos públicos reservadas a candidatos negros, mostra-se legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação, desde que respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa (ADC nº 41, Tribunal Pleno, Rel.
Min.
Roberto Barroso, DJe de 17/8/17). 2.
Decisões regionais proferidas em conformidade com essas diretrizes jurisprudenciais mostram-se insuscetíveis de futura reapreciação pela via extraordinária. 3. É inviável, destarte, reconhecer-se, nessas hipóteses, risco de lesão à ordem ou à economia públicas que justifique a concessão da pretendida contracautela. 4.
Agravo regimental a que se nega provimento. (STF - SS 5347 AgR, Relator(a): DIAS TOFFOLI (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em29/06/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-207 DIVULG19-08-2020 PUBLIC 20-08-2020) Não é outro o entendimento deste Sodalício a respeito do tema (destaquei): CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO.
AGRAVO INTERNO EM MANDADO DE SEGURANÇA.
CONCURSO PÚBLICO PARA PROVIMENTO DE CARGOS EFETIVOS DO QUADRO DE PESSOAL DO TJCE.
EDITAL Nº 01/2019.
INDEFERIMENTO DA INSCRIÇÃO DO IMPETRANTE NA CONCORRÊNCIA ÀS VAGAS DESTINADAS AOS CANDIDATOS NEGROS E PARDOS.
AUTODECLARAÇÃO SUBMETIDA À ENTREVISTA PREVISTA NO EDITAL.
PROCEDIMENTO DE HETEROIDENTIFICAÇÃO.
ANÁLISE DAS CARACTERÍSTICAS FENOTÍPICAS.
VÍCIO DE MOTIVAÇÃO DO ATO ADMINISTRATIVO IMPUGNADO.
RESPOSTA GENÉRICA E PADRÃO AO RECURSO DO CANDIDATO.
PRECEDENTES DO TJCE.
AGRAVO INTERNO CONHECIDO, TODAVIA, DESPROVIDO. 1.
As decisões da Comissão do Concurso, sempre que concluírem por atribuição identitária diversa daquela autodeclarada, requerem decisão fundamentada, sempre possibilitando a ampla defesa e o contraditório pelo candidato. 2.
In casu, atento aos documentos constituídos nos autos do presente recurso, entendo que, de fato, houve ilegalidade na conduta adotada pela comissão organizadora do certame, uma vez que esta apenas se limitou a informar que o candidato não atende ao quesito cor ou raça, por não apresentar aspectos fenotípicos que as identifiquem como pessoa parda, sem, contudo, fundamentar a respeito das questões científicas que levaram ao seu indeferimento. 3.
Tem-se que, em consonância às normas do edital de abertura, foi publicado, após o resultado das provas objetiva e discursiva em que o candidato impetrante alcançou a nota final de 76,7 (58,0 na prova objetiva (fl. 90) e 18,7 na discursiva (fl. 515) -, o "Edital de Convocação para Entrevista de Averiguação da Autodeclaração de Negro", chamando os candidatos para a entrevista. 4.
Quando do resultado da aludida entrevista, publicado no Diário da Justiça, teve o impetrante "indeferido" seu pedido de inscrição para concorrer às vagas cotistas, todavia, não lhe foi indicada a motivação do indeferimento, de forma objetiva, contra a qual pudesse se contrapor. 5.
Com efeito, do "indeferimento", sem qualquer indicação dos motivos determinantes, o impetrante "recorreu às cegas", pois não sabia em qual (is) ponto (s) foi considerado inapto por não atender às exigências fenotípicas necessárias para possibilitar sua continuidade no certame.
Sem dúvida, foi-lhe cerceada a defesa pois teve que recorrer de uma decisão sem fundamentação exposta. 6.
Passando à fase do recurso, este foi julgado improcedente pela banca recursal, mediante resposta padrão e genérica, amparada unicamente no entendimento pessoal dos componentes da comissão, a fim de determinar o enquadramento ou exclusão dos candidatos na condição de cotistas. 7.
Ressalte-se que, se de umlado, o candidato impetrante trouxe aos autos, para comprovar a condição de pardo, fotografias (fls. 611/621) e atestado elaborado por médica dermatologista, Dra.
Maria Emília Ferreira Cabral - CREMEC 2650, que declarou apresentar o impetrante o fenótipo tipo V na "Escala Fitzpatrick" (fls. 606), bem como o "Termo de Concessão de Bolsa - PROUNI, do Ministério da Educação, em que o impetrante respondeu "parda" à pergunta "Qual a raça/cor do candidato", constando no documento "informações comprovadas" (fls. 607/609), do outro lado, tem-se que o procedimento de verificação da condição autodeclarada para concorrer às vagas da cota racial, utilizado pela Banca Examinadora, não indicou quaisquer elementos objetivos. 8.
Com efeito, as características fenotípicas são as que devem ser avaliadas, não há discussão quanto a isso, no entanto, não foi possível mensurar os critérios objetivos e nem entender a metodologia adotada pelos integrantes da comissão, já que não houve nenhuma formalização das razões que levaram à exclusão do candidato, dificultando assim o direito à ampla defesa e o contraditório. 09.
Embora se presuma a legitimidade da avaliação da comissão (presunção de legitimidade do ato administrativo), há possibilidade de invalidação daquela, quando, por exemplo, a decisão não for fundamentada. 10.
Ademais, por si só a autodeclaração de raça, segundo a própria norma reguladora emseu Art. 5º, § 2º, da Resolução CNJ nº 203/2015, é revestida de presunção de veracidade, de modo que a banca examinadora, à vista dessa previsão normativa, só poderia afastar a referida presunção com a indicação de idôneas razões de fato e de direito, capazes de justificar a exclusão do candidato autodeclarado negro da disputa pelas vagas reservadas. 11.
AGRAVO INTERNO CONHECIDO, CONTUDO, DESPROVIDO.
DECISÃO MANTIDA NA ÍNTEGRA. (Agravo Interno Cível - 0620097-32.2020.8.06.0000, Rel.
Desembargador(a) FRANCISCO MAURO FERREIRA LIBERATO, Órgão Especial, data do julgamento: 07/04/2022, data da publicação: 07/04/2022 AGRAVO INTERNO.
DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE NEGOU TUTELA DE URGÊNCIA EM AGRAVO DE INSTRUMENTO, DADA A INEXISTÊNCIA DO FUMUS BONI IURIS.
CONCURSO PARA SOLDADO DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DO CEARÁ.
CANDIDATO ELIMINADO NA ETAPA DE HETEROIDENTIFICAÇÃO.
RECURSO ADMINISTRATIVO INDEFERIDO, COM FUNDAMENTAÇÃO GENÉRICA E IMPRECISA.
AUSÊNCIA DE MOTIVOS APTOS A ENSEJAR A MODIFICAÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
DECISÃO MANTIDA. 1.
O presente agravo interno vergasta decisão interlocutória que, entendendo ausente o fumus boni iuris, negou pedido de atribuição de efeito suspensivo ao Agravo de Instrumento nº 0620629-35.2022.8.06.0000.
Referido recurso instrumental fora interposto contra decisão do Juízo da 7ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Fortaleza que, nos autos de Ação Ordinária, deferiu medida liminar, determinando que a ora agravada prossiga nas etapas seguintes do Concurso Público destinado ao provimento de 2.000 (duas mil) vagas para o cargo de Soldado da PMCE, regido pelo Edital nº 01- Soldado PMCE, de 27 de julho de 2021. 2.
Consignou a decisão ora agravada que, realmente, é pacífica a compreensão de que a intervenção do Judiciário na avaliação das provas e etapas de um concurso público somente tem cabimento em hipóteses excepcionais, quando se observa erro grosseiro ou flagrante ilegalidade, sendo tal matéria decidida pelo STF através do julgamento do RE nº 632.853, submetido ao rito de Repercussão Geral.
Destacou-se, ainda, que a situação tratada nos autos parece se amoldar às exceções enunciadas no precedente citado. 3.
Após sua eliminação decorrente do parecer desfavorável da comissão de heteroidentificação, a ora agravada ingressou com recurso administrativo, o qual foi indeferido de forma genérica e aparentemente sem motivação idônea. 4.
Esta Corte Estadual de Justiça tem entendido que esse tipo de resposta dada pela banca do concurso ao recurso administrativo padece de excessiva generalidade e imprecisão, amparada unicamente no entendimento pessoal dos componentes da comissão, a fim de determinar o enquadramento ou exclusão dos candidatos na condição de cotistas, pelo que segue a orientação de que o ato administrativo praticado nesses termos malfere a exigência de motivação prevista na norma do art. 50, inc.
III, da Lei de Processo Administrativo (Lei Federal n.º 9.784/99), aplicável à espécie (Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação os fatos e dos fundamentos jurídicos, quando: (...) decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública). 5.
Nesse contexto, considerou-se ausente o requisito do fumus boni iuris, indispensável à concessão da tutela de urgência recursal perseguida, não havendo razões que justifiquem a modificação da decisão interlocutória ora agravada. 10.
Agravo interno conhecido e desprovido. (Agravo Interno Cível - 0620629-35.2022.8.06.0000, Rel.
Desembargador(a) LUIZ EVALDO GONÇALVES LEITE, 2ª Câmara Direito Público, data do julgamento: 13/04/2022, data da publicação: 13/04/2022) Assim, a comissão avaliadora do certame só poderia afastar a presunção de veracidade da autodeclaração da parte recorrida com a indicação de idôneas razões de fato e de direito, capazes de justificar a exclusão da candidata autodeclarada parda na disputa pelas vagas reservadas, fato que não se observa da resposta ao recurso administrativo interposto pela candidata, quando de sua exclusão no certame.
Portanto, o ato questionado deve ser anulado, porém tendo em mira o que decidiu o STF acerca do assunto em pauta, ao julgar o RE 632.853 (Tema 485), entendeu que não compete ao Poder Judiciário substituir-se à banca examinadora e avaliar as respostas dadas pelos candidatos e notas a elas atribuídas, salvo situações excepcionais, bem como no RE 1.133.146 (Tema 1.009), decidiu-se que candidatos reprovados na fase de avaliação psicotécnica, em casos de ausência de fundamentação, deveriam ser submetidos a novo exame.
Confira: Recurso extraordinário com repercussão geral. 2.
Concurso público.
Correção de prova.
Não compete ao Poder Judiciário, no controle de legalidade, substituir banca examinadora para avaliar respostas dadas pelos candidatos e notas a elas atribuídas.
Precedentes. 3.
Excepcionalmente, é permitido ao Judiciário juízo de compatibilidade do conteúdo das questões do concurso com o previsto no edital do certame.
Precedentes. 4.
Recurso extraordinário provido." (RE 632853, Relator(a): GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 23/04/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO Dje-125 DIVULG 26-06-2015 PUBLIC 29-06-2015 RTJ VOL-00235-01 PP-00249) RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
ADMINISTRATIVO.
CONCURSO PÚBLICO.
EXAME PSICOTÉCNICO COM PREVISÃO NO EDITAL E NA LEI.
AUSÊNCIA DE CRITÉRIOS OBJETIVOS DE AVALIAÇÃO NO EDITAL.
NULIDADE DO EXAME PSICOTÉCNICO.
CONTROVÉRSIA QUANTO À NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE NOVA AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA PARA O PROSSEGUIMENTO NO CERTAME.
PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
CONTROVÉRSIA CONSTITUCIONAL DOTADA DE REPERCUSSÃO GERAL.
REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO. (RE 1133146 RG, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 20/09/2018, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO Dje-204 DIVULG 25-09-2018 PUBLIC 26-09-2018) Este Sodalício vem decidindo neste mesmo sentido, oportunidade em que confere ao candidato o direito de prosseguir no certame, para que não seja prejudicado, porém reconhece o ônus de se submeter novamente à etapa de heteroidentificação na qual lhe seja assegurados os direitos à avaliação fundamentada, à ampla defesa e aos contraditório administrativos.
Veja: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL. OMISSÃO NO ACÓRDÃO EMBARGADO QUANTO À TESE FIRMADA PELA SUPREMA CORTE NO JULGAMENTO DO RE Nº 1.133.146, SUBMETIDO À SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL (TEMA 1.009). EXISTÊNCIA.
ACLARATÓRIOS CONHECIDOS E PROVIDOS, COM EFEITOS INFRINGENTES. 1.
Alega o Estado do Ceará que a decisão embargada foi omissa quanto ao entendimento vinculante do STF, firmado no julgamento do Tema 1.009, ¿que trata do dever de o Poder Judiciário, ao verificar ausência de fundamentação em um ato administrativo, remetê-lo para análise do mérito pela própria Administração Pública, no lugar de substituí-lo pelo comando judicial¿. 2.
Com efeito, o parágrafo único, inciso I, do art. 1.022 do CPC/2015, classifica como ¿omissa a decisão que (¿) deixe de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos¿. 3.
Na espécie, o acórdão embargado confirmou a sentença que julgou procedentes os pedidos autorais, para decretar a nulidade do ato administrativo de exclusão da requerente do concurso público para provimento do cargo de Soldado da Polícia Militar do Estado do Ceará, regido pelo Edital nº 01 - SOLDADO PMCE, de 27/07/2021, assegurando-lhe o prosseguimento nas etapas subsequentes do certame, sem, contudo, manifestar-se sobre o referido julgamento vinculante. 4.
De fato, no julgamento do RE nº 1133146, submetido à sistemática da repercussão geral (Tema 1.009), a Corte Suprema reafirmou seu entendimento acerca da necessidade de realização de nova avaliação psicológica para prosseguimento no certame, em caso de declaração de nulidade de exame psicotécnico já ocorrido.
Na oportunidade, restou firmada a seguinte tese: ¿No caso de declaração de nulidade de exame psicotécnico previsto em lei e em edital, é indispensável a realização de nova avaliação, com critérios objetivos, para prosseguimento no certame.¿ 5.
Embora trate de teste psicotécnico, referida tese vem sendo utilizada, por analogia, em demandas como a presente, em que o candidato foi reprovado na etapa da heteroidentificação, sem motivação idônea, gerando a nulidade do ato administrativo. 6.
Nesses casos, não há como o Poder Judiciário substituir-se à banca examinadora, determinando o prosseguimento do candidato no certame, como se aprovado fosse, mesmo porque lhe é vedado imiscuir-se no mérito administrativo.
Deve, efetivamente, anular o ato ilegal, ordenando, todavia, que seja realizada nova etapa de heteroidentificação para aquele candidato, ocasião em que a administração pública poderá reconhecer ou não a sua condição de negro ou pardo, motivando de forma específica sua decisão, de acordo com as características pessoais do candidato, de modo a permitir o exercício do contraditório e da ampla defesa. 7.
Assim, imperiosa a concessão de efeitos infringentes aos presentes aclaratórios, como consequência do enfrentamento da omissão apontada e da aplicação analógica da tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 1.009. 8.
Embargos de declaração conhecidos e providos, com efeitos infringentes. (Embargos de Declaração Cível - 0200352-57.2022.8.06.0293, Rel.
Desembargador(a) LUIZ EVALDO GONÇALVES LEITE, 2ª Câmara Direito Público, data do julgamento: 02/08/2023, data da publicação: 02/08/2023) AGRAVO DE INSTRUMENTO.
CONCURSO PÚBLICO PARA SOLDADO DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DO CEARÁ ¿ PMCE.
ELIMINAÇÃO DE CANDIDATO AUTODECLARADO NEGRO, CUJA AUTODECLARAÇÃO NÃO RESTOU VALIDADA NA ETAPA DE HETEROIDENTIFICAÇÃO RACIAL.
APARENTE AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA DO ATO ADMINISTRATIVO IMPUGNADO.
PROVÁVEL INOBSERVÂNCIA AO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA.
PLAUSIBILIDADE DE REINTEGRAÇÃO AO CERTAME, COMO CANDIDATO ÀS VAGAS RESERVADAS A PESSOAS NEGRAS, DESDE QUE SUA AUTODECLARAÇÃO SEJA CONFIRMADA PELA BANCA EXAMINADORA, EM DECISÃO DOTADA DE FUNDAMENTAÇÃO PERCUCIENTE E EFETIVO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1.
Embora o processo tramite hoje em unidade dos Juizados Especiais Fazendários, não houve perda de objeto deste agravo de instrumento, tendo em vista que a unidade dos Juizados Especiais ainda não reexaminou o pedido de tutela de urgência, quer para indeferi-lo, quer para deferi-lo total ou parcialmente, de modo que, no processo, subsiste a decisão proferida pela 14ª Vara da Fazenda Pública e, por conseguinte, o interesse da parte agravante de reformá-la.
Não se lobriga, ademais, risco de usurpação de competência da unidade dos Juizados Especiais Fazendários, porquanto, mesmo que este Tribunal se pronuncie sobre a decisão da 14ª Vara da Fazenda Pública, não haverá preclusão pro judicato para a Vara dos Juizados Especiais, na medida em que esta continuará no exercício da jurisdição no que tange à reapreciação do pedido de tutela de urgência, na forma do art. 64, § 4º, do CPC: "salvo decisão judicial em sentido contrário, conservar-se-ão os efeitos de decisão proferida pelo juízo incompetente até que outra seja proferida, se for o caso, pelo juízo competente". 2.
Afigura-se plausível o argumento da parte autora, inscrita no concurso público para Soldado da Polícia Militar, regido pelo Edital nº 01/2021, de que a sua desclassificação não ostentou fundamentação hígida e percuciente.
Frise-se que, consoante entendimento exarado pelo Supremo Tribunal Federal ¿ STF no julgamento da ADC 41, a realização da heteoridentificação em concursos públicos deve se orientar pelo primado da "dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa". 3.
Dificilmente pode se afirmar que o contraditório e ampla defesa é respeitado, se o candidato sequer conhece os motivos pelos quais foi eliminado do concurso público, isto é, se não consegue, de fato, impugnar, mesmo na via administrativa, o ato que o excluiu do certame.
Seguindo essa linha de raciocínio, a jurisprudência deste tribunal se firmou no sentido de que a (des)classificação do candidato na etapa de heteroidentificação deve ser firmar em critérios objetivos e mediante análise minudente do fenótipo do certamista. 4.
Por outro lado, em análise mais acurada da matéria, entende-se que a jurisprudência pacificada desta corte deve ser parcialmente revista (art. 927, §3º, do CPC) à luz da tese jurídica firmada pelo STF, no julgamento do Tema 485 da sistemática de repercussão geral: "não compete ao Poder Judiciário substituir a banca examinadora para reexaminar o conteúdo das questões e os critérios de correção utilizados, salvo ocorrência de ilegalidade ou de inconstitucionalidade", bem como, por analogia, do Tema 1009 de repercussão geral: "No caso de declaração de nulidade de exame psicotécnico previsto em lei e em edital, é indispensável a realização de nova avaliação, com critérios objetivos, para prosseguimento no certame". 5.
De fato, o Poder Judiciário não pode obliterar a atividade da banca examinadora, admitindo o prosseguimento do candidato na concorrência às vagas reservadas, sem que sua autoclassificação seja devidamente avaliada pela Administração.
Assim, impõe-se que a parte autora seja submetida a nova avaliação pela banca examinadora, com fundamentação percuciente e efetivo contraditório e ampla defesa. 6.
No mais, o perigo da demora está presente, diante da possibilidade concreta de a parte autora não concorrer com seus pares, de forma isonômica nas demais etapas do concurso. 7.
Agravo de instrumento conhecido e parcialmente provido. (Agravo de Instrumento - 0622843-96.2022.8.06.0000, Rel.
Desembargador(a) WASHINGTON LUIS BEZERRA DE ARAUJO, 3ª Câmara Direito Público, data do julgamento: 26/06/2023, data da publicação: 27/06/2023) Atento aos recentes entendimentos desta Corte, assim como dos tribunais de sobreposição, observo que a sentença foi proferida em conformidade com os excertos anotados, motivo pelo qual deve ser mantida em sua inteireza, com a declaração de nulidade do procedimento de exame de heteroidentificação do autor e a determinação de realização de novo exame da parte autora, com a estrita obediência ao devido processo legal administrativo.
Isto posto, conheço dos Recursos de Apelação, para lhes negar provimento, mantendo a nulidade do ato administrativo questionado e a determinação de submissão da parte autora a novo exame de heteroidentificação com o direito de obter uma avaliação fundamentada e respectiva obediência ao devido processo legal administrativo.
Outrossim, majoro os honorários advocatícios impostos em desfavor do Estado do Ceará para o montante de R$ 1.200,00 (um mil e duzentos reais), nos termos do §11, do art. 85, do CPC. É como voto. Fortaleza, data e horário informados no sistema. Desembargador INÁCIO DE ALENCAR CORTEZ NETO Relator -
10/07/2024 09:11
Expedição de Outros documentos.
-
10/07/2024 09:10
Expedida/certificada a comunicação eletrôinica Documento: 12696740
-
05/06/2024 10:11
Conhecido o recurso de ESTADO DO CEARA - CNPJ: 07.***.***/0001-79 (APELANTE) e AGENOR LUCAS DO NASCIMENTO OLIVEIRA - CPF: *07.***.*47-93 (APELANTE) e não-provido
-
04/06/2024 14:14
Juntada de Petição de certidão de julgamento
-
03/06/2024 16:08
Deliberado em Sessão - Julgado - Mérito
-
28/05/2024 15:17
Deliberado em Sessão - Pedido de Vista
-
17/05/2024 00:00
Publicado Intimação de Pauta em 17/05/2024. Documento: 12361452
-
16/05/2024 00:00
Intimação
ESTADO DO CEARÁPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA 1ª Câmara de Direito PúblicoINTIMAÇÃO DE PAUTA DE SESSÃO DE JULGAMENTOData da Sessão: 27/05/2024Horário: 14:00:00 Intimamos as partes do processo 0200494-69.2022.8.06.0064 para sessão de julgamento que está agendada para Data/Horário citados acima.
Solicitação para sustentação oral através do e-mail da secretaria até as 18h do dia útil anterior ao dia da sessão. E-mail: [email protected] -
16/05/2024 00:00
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 16/05/2024 Documento: 12361452
-
15/05/2024 15:46
Expedida/certificada a comunicação eletrôinica Documento: 12361452
-
15/05/2024 14:38
Expedição de Outros documentos.
-
15/05/2024 11:10
Inclusão em pauta para julgamento de mérito
-
14/05/2024 12:01
Pedido de inclusão em pauta
-
13/05/2024 14:22
Conclusos para despacho
-
13/05/2024 14:22
Concedida em parte a Antecipação de Tutela
-
12/04/2024 18:50
Conclusos para julgamento
-
03/04/2024 14:21
Conclusos para despacho
-
12/03/2024 10:54
Deliberado em Sessão - Retirado
-
27/02/2024 14:17
Deliberado em Sessão - Retirado
-
31/01/2024 10:35
Juntada de Petição de petição
-
18/12/2023 22:18
Deliberado em Sessão - Retirado
-
07/12/2023 00:00
Publicado Intimação de Pauta em 07/12/2023. Documento: 10207555
-
07/12/2023 00:00
Publicado Intimação de Pauta em 07/12/2023. Documento: 10207555
-
06/12/2023 00:00
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 06/12/2023 Documento: 10207555
-
06/12/2023 00:00
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 06/12/2023 Documento: 10207555
-
05/12/2023 18:41
Expedida/certificada a comunicação eletrôinica Documento: 10206158
-
05/12/2023 18:41
Expedição de Outros documentos.
-
05/12/2023 15:14
Inclusão em pauta para julgamento de mérito
-
04/12/2023 16:37
Pedido de inclusão em pauta
-
30/11/2023 20:02
Conclusos para despacho
-
17/11/2023 09:35
Conclusos para julgamento
-
01/11/2023 08:28
Conclusos para decisão
-
31/10/2023 15:30
Redistribuído por prevenção em razão de modificação da competência
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27/10/2023 16:52
Determinação de redistribuição por prevenção
-
20/10/2023 17:06
Recebidos os autos
-
20/10/2023 17:06
Conclusos para despacho
-
20/10/2023 17:06
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
31/10/2023
Ultima Atualização
05/06/2024
Valor da Causa
R$ 0,00
Detalhes
Documentos
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