TJCE - 0201370-39.2024.8.06.0101
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gades - Jose Ricardo Vidal Patrocinio
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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04/09/2025 00:00
Publicado Intimação em 04/09/2025. Documento: 27623231
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03/09/2025 00:00
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 03/09/2025 Documento: 27623231
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03/09/2025 00:00
Intimação
ESTADO DO CEARÁPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇAGABINETE DO DESEMBARGADOR JOSÉ RICARDO VIDAL PATROCÍNIO PROCESSO: 0201370-39.2024.8.06.0101 - APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: CARLOS ANDRÉ DE OLIVEIRA.
APELADOS: FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS MULTSEGMENTOS NPL IPANEMA VI - NÃO PADRONIZADO, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, BANCO VOTORANTIM S/A. Ementa: Direito processual civil e do consumidor.
Recurso de apelação cível.
Ação de repactuação de dívidas.
Lei do superendividamento (lei nº 14.181/2021).
Sentença de indeferimento da inicial.
Inobservância do rito especial.
Obrigatoriedade da fase de conciliação.
Cerceamento de defesa.
Sentença cassada.
Razões recursais prejudicadas.
ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os membros da Primeira Câmara de Direito Privado, à unanimidade de votos, em CASSAR, DE OFÍCIO, a sentença de 1º grau, estando prejudicado o recurso, nos termos do voto do Desembargador Relator.
Fortaleza, data da assinatura digital.
DESEMBARGADOR JOSÉ RICARDO VIDAL PATROCÍNIO Presidente/Relator RELATÓRIO Trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto por CARLOS ANDRÉ DE OLIVEIRA, adversando sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Itapipoca, que, nos autos da Ação de Repactuação de dívidas prevista no artigo 104-a do CDC (introduzido pela Lei nº 14.181/21 - superendividamento), manejada pelo ora recorrente em desfavor da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, do BANCO DO BRASIL S/A, da CREFISA S/A -CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, do BANCO VOTORANTIM S/A e do FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS MULTSEGMENTOS NPL IPANEMA VI - NÃO PADRONIZADO, indeferiu a petição inicial nos termos do art. 330, III, extinguindo a ação sem análise de mérito, nos termos do art. 485, I, ambos do CPC. (id. 20510098).
Em suas razões recursais, suscita o autor/apelante, inicialmente, preliminar de cerceamento de defesa, pois se fazia necessária a realização de perícia técnica.
No mérito, arguiu que "o tratamento dado pelo juízo a quo desrespeitou o devido processo legal, posto que não observou o tratamento especial dado ao consumidor superendividado, conforme artigo 104-B do código de Defesa do Consumidor." Alega que "a lei é clara ao determinar que em caso de insucesso na conciliação com os credores, estes estarão submetidos ao plano judicial compulsório, além da nomeação de administrador e perícia contábil para apurar o saldo devedor do principal ao qual se refere o Parágrafo Único do Art. 54-D do CDC." Sustenta "a não aplicação do Tema 1085, posto que a presente demanda tem como principal argumento e fundamento a Lei. 14.181/2021 tratando especificamente sobre o superendividamento".
Pugna pelo provimento do recurso, cassando-se a sentença objurgada, ou, reformando-a para julgar o feito procedente.
Contrarrazões apresentadas (Id's. 25748816, 25748828 e 25748830). É o relatório.
VOTO Primeiramente ressalte-se que "Considerando a natureza concursal, compete à Justiça estadual ou distrital conhecer do processo de superendividamento previsto nos arts. 104-A e 104-B do Código de Defesa do Consumidor, com a redação da Lei n. 14.181/2021, e julgá-lo, ainda que um ente federal integre o polo passivo, tratando-se de exceção ao art. 109, I, da Constituição Federal" (STJ - CC: 192140 DF 2022/0316357-3, Relator.: JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 10/05/2023, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 16/05/2023).
Aduz o autor na exordial que formula a causa de pedir e os pedidos de sua petição inicial utilizando como fundamento jurídico a Lei do Superendividamento (Lei nº 14.181/21), tendo em vista que se trata de pessoa superendividada, nos termos da própria Lei.
Ressalta que não pretende esquivar-se do pagamento de suas dívidas, estando a utilizar a nova Lei do Superendividamento justamente para criar um plano de pagamento e permanecer adimplente com todos os seus credores.
Sustenta que possui com as instituições financeiras rés as seguintes dívidas: i) Com a credora CEF, quatro dívidas relacionadas a empréstimos consignados: a) Empréstimo consignado em 120 parcelas com saldo devedor total de R$ 15.000,00, e valor da parcela mensal R$ 359,00; b) Empréstimo consignado em 120 parcelas com saldo devedor total de R$ 12.000,00, e valor da parcela mensal R$ 262,01; c) Empréstimo consignado em 120 parcelas com saldo devedor total de R$ 10.000,00, e valor da parcela mensal R$ 78,16; d) Empréstimo consignado em 144 parcelas com saldo devedor total de R$ 17.000,00, e valor da parcela mensal R$ 326,00; ii) Com o credor BANCO DO BRASIL, duas dívidas: a) Empréstimo pessoal em 60 parcelas, com saldo devedor total de R$ 121.429,20, e valor da parcela mensal R$ 2.023,92; b) Empréstimo consignado em 79 parcelas restantes com saldo devedor total de R$ 94.258,40, e valor da parcela mensal R$ 1.597,60; iii) Com a credora CREFISA, a dívida crédito pessoal vencido e não negociado com saldo devedor total de R$ 7.680,56; iv) Com a credora IPANEMA, a dívida crédito pessoal vencido e não negociado com saldo devedor total de R$ 5.129,84; (v) Com o credor BANCO BV, a dívida crédito pessoal vencido e não negociado com saldo devedor total de R$ 5.000,00.
E salienta que, somadas, as dívidas hoje consomem mais de 78,54% dos rendimentos líquidos mensais do consumidor, estando este claramente em situação de superendividamento.
Após a emenda à inicial, foi proferida sentença de indeferimento da inicial, nos seguintes termos: "[…] FUNDAMENTAÇÃO Defiro a gratuidade de justiça requerida.
DA CONSTITUCIONALIDADE DOS DECRETOS QUE DEFINEM O MÍNIMO EXISTENCIAL O superendividamento pressupõe o comprometimento do mínimo existencial, que, por sua vez, foi regulamentado pelo Decreto n. 11.150/22.
Segundo o art. 3º do referido ato normativo, com redação dada pelo Decreto n. 11.567/23, considera-se mínimo existencial a renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a R$ 600,00 (seiscentos reais).
Embora pendam ações questionando a constitucionalidade do dispositivo, não há, por ora, decisão com declaração definitiva a respeito da matéria, motivo pelo qual o parâmetro estabelecido deve ser aplicado aos casos pertinentes, em homenagem ao princípio da presunção de constitucionalidade das normas.
Friso que o referido valor equivale ao benefício social disponibilizado pelo Governo Federal denominado "Bolsa Família", que visa justamente garantir uma renda mínima à toda família brasileira.
Deste modo, entendo que cabe ao Poder Executivo Federal, e não ao Poder Judiciário, definir o denominado mínimo existencial o qual o Estado é capaz de garantir a todos os cidadãos, observando a economia nacional, por tratar-se de concretização de política pública.
Neste contexto, não reconheço a inconstitucionalidade dos referidos decretos.
MÉRITO A presente ação trata da aplicação da Lei nº 14.181/2021, inovação que concede aos devedores chamados "superendividados" a possibilidade de renegociação de seus débitos, inclusive de maneira compulsória.
Nos termos do parágrafo 1º, do art. 54-A do Código de Defesa do Consumidor, inserido pela referida Lei: "entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação".
Já o art. 104-A, caput, da mesma lei, dispõe que: "a requerimento do consumidor superendividado pessoa natural, o juiz poderá instaurar processo de repactuação de dívidas, com vistas à realização de audiência conciliatória, presidida por ele ou por conciliador credenciado no juízo, com a presença de todos os credores de dívidas previstas no art. 54-A deste Código, na qual o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, e as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas." O Decreto Presidencial nº 11.150/2022, ao regulamentar a referida lei, havia fixado valor do mínimo existencial em 25% do salário-mínimo.
Posteriormente, o Decreto Presidencial nº 11.567/2023 estipulou que o mínimo a ser protegido é de R$ 600 (seiscentos reais).
No presente caso, observando o rendimento mensal do Autor por ele apresentado nos autos (ID 96770874 - fls. 11), e as dívidas que pretende renegociar utilizando-se da legislação de superendividamento, não há se falar em comprometimento de seu mínimo existencial.
Ainda que descontadas as parcelas dos empréstimos pessoais indicados, do rendimento líquido do Autor apresentado (renda obtida após os descontos legais obrigatórios e dos empréstimos consignados em folha de pagamento), o valor restante é superior ao mínimo existência previsto nas normas de regência.
Neste contexto resta claro que, nos termos do decreto regulamentar, o mínimo existencial do Autor não está comprometido.
Sobre o patrimônio mínimo, Ivan e Renata Pompeu entendem que: "Este patrimônio essencial corresponde àquela parcela de bens imprescindíveis ao sustento do indivíduo e dos sujeitos sobre sua 'guarda', vale dizer, sua família.
Trata-se de um patrimônio mínimo indispensável a uma vida digna, em relação ao qual não pode ser desapossado.
Esta tese fundamenta-se no princípio constitucional da dignidade e de uma hermenêutica crítica e construtiva da codificação civil moderna.
A noção de patrimônio mínimo, portanto, diz respeito à posse de bens materiais que garantam a existência da pessoa humana com um mínimo de dignidade" (POMPEU, Ivan Guimarães; POMPEU, Renata Guimaraes.
A teoria do patrimônio mínimo versus o superendividamento: análise jurídico-econômica sobre o acesso a bens e a serviços.
Revista Jurídica da Faculdade Uma de Contagem, v. 2, n. 2. 2015.).
A garantia do mínimo existencial é justamente a garantia de que a pessoa, após pagar suas dívidas, permaneça com o mínimo necessário à sua sobrevivência e de sua família.
E ausente o comprometimento do mínimo existencial, não se trata de caso de superendividamento, e não subsiste, portanto, o interesse na tutela judicial aqui pleiteada.
O interesse processual deve ser analisado sob diferentes aspectos: a necessidade de obtenção da tutela jurisdicional reclamada e a utilidade ou adequação entre o pedido e a proteção jurisdicional que se pretende obter.
O interesse de agir, que é instrumental e secundário, surge da necessidade de obter através do processo a proteção ao interesse substancial.
Entende-se, dessa maneira, que há interesse processual se a parte sofre um prejuízo, não propondo a demanda, e daí resulta que, para evitar esse prejuízo, necessita exatamente da intervenção dos órgãos jurisdicionais.
Nesse sentido: PROCESSUAL CIVIL.
RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO DE USUCAPIÃO.
LOTEAMENTO IRREGULAR.
PRETENSÃO.
REGISTRO INDIVIDUALIZADO DA MATRÍCULA DA PARCELA IDEAL.
CONDIÇÕES DA AÇÃO.
INTERESSE DE AGIR.
AFERIÇÃO.
NECESSIDADE, UTILIDADE E ADEQUAÇÃO.
AUSÊNCIA. 1.
Cinge-se a controvérsia a determinar se a ação de usucapião é o meio jurídico adequado para que os recorrentes obtenham a individualização e o registro de fração ideal de imóvel objeto de condomínio em loteamento irregular. 2.
O interesse de agir é condição da ação, e, assim, corresponde à apreciação de questões prejudiciais de ordem processual relativas à necessidade, utilidade e adequação do provimento jurisdicional, que devem ser averiguadas segundo a teoria da asserção. 3.
O provimento jurisdicional pleiteado pelo autor deve ser, em abstrato, capaz de lhe conferir um benefício que só pode ser alcançado com o exame de uma situação de fato que possa ser corrigida por meio da pretensão de direito material citada na petição inicial.
Em outras palavras, só é útil, necessária e adequada a tutela jurisdicional se o provimento de mérito requerido for apto, em tese, a corrigir a situação de fato mencionada na inicial. 4.
Nem o reconhecimento da prescrição aquisitiva, nem a divisão do imóvel têm, em tese, o condão de modificar a situação de fato mencionada na inicial, referente à impossibilidade de obtenção do registro individualizado de fração ideal de condomínio irregular, pois não há controvérsia sobre a existência e os limites do direito de propriedade, sequer entre os condôminos. 5.
Recurso especial não provido. (STJ - REsp: 1431244 SP 2014/0016785-3, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 06/12/2016, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/12/2016).
No presente caso, conforme já explanado, analisando o que foi alegado na petição inicial, a própria situação de fato (superendividamento) que necessitaria de correção pela pretensão em juízo é inexistente, tornando a presente ação carecedora de interesse processual.
Nesse sentido: APELAÇÃO.
Preliminares em contrarrazões de inobservância à dialeticidade recursal e inépcia da petição inicial.
Rejeição.
Impugnação à gratuidade judiciária.
Acolhimen-to.
Autora que aufere remuneração superior a três salários-mínimos.
Constitucionali-dade da Lei nº 14.181/21, que passou a disciplinar tutela contra o superendividamento, alterando dispositivos do Código de Defesa do Consumidor.
AÇÃO DE LIMITAÇÃO DE DESCONTOS E REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS COM BASE NA LEI DO SU-PERENDIVIDAMENTO.
Consumidora que não comprovou o comprometimento do mínimo existencial, conforme regulamentação pelo Decreto nº 11.150, de 26 de julho de 2022.
Requisitos do artigo 54-A do CDC não preenchidos.
Precedente.
Constituci-onalidade do Decreto nº. 11.150/22.
Pedido de limitação dos valores descontados em 35% sobre rendimentos líquidos da autora.
Inovação recursal.
Prequestionamento.
Aplicação do art. 1.025 do CPC.
SENTENÇA MANTIDA.
APELAÇÃO DESPRO-VIDA (na parte em que conhecida). (TJ-SP - Apelação Cível: 1004643-27.2022.8.26.0191 Ferraz de Vasconcelos, Relator: Fábio Podestá, Data de Julgamento: 05/02/2024, 21ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 07/02/2024).
APELAÇÃO CÍVEL.
CONSUMIDOR.
SUPERENDIVIDAMENTO.
PROCEDIMEN-TO ESPECIAL DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
REQUISITOS.
AUSÊNCIA. 1.
O fenômeno social do "superendividamento" ensejou a edição da Lei n. 14.181/2021, a qual busca aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e dispor sobre a preven-ção e o tratamento do superendividamento. 2.
De acordo com novel legislação, ?enten-de-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa na-tural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação? (art. 54-A do CDC). 3.
O regulamento específico atribui, por sua vez, ao ?mínimo existencial? o valor equivalente a renda mensal de R$ 600,00 (seiscentos reais), conforme art. 3º, ca-put, do Decreto 11.150/22, com redação dada pelo Decreto nº 11.567/2023, cuja nor-ma segue com presunção de constitucionalidade. 4.
Além disso, exclui da aferição da preservação e do comprometimento do mínimo existencial as parcelas oriundas de dí-vidas renegociadas, as decorrentes de operação de crédito consignado e de operações de crédito com antecipação, entre outras (art. 4º, parágrafo único, inc.
I, alí-neas ?f?, ?h? e ?i?, do Decreto 11.150/22). 5.
Não há obrigatoriedade de instauração da segunda fase do procedimento especial de repactuação de dívidas (art. 104-B do CDC), se não preenchidos os pressupostos legais. 6.
Inviável o prosseguimento do procedimento especial da Lei n. 14.181/2021, se não comprovado o superendivida-mento e os requisitos indispensáveis à revisão e integração dos contratos e a repactu-ação das dívidas, em especial, a conduta abusiva dos credores, mesmo porque a pre-venção e o combate ao superendividamento, com vista à preservação do mínimo exis-tencial do mutuário, não devem se dar por meio de uma indevida intervenção judicial na autonomia da vontade. 7.
Negou-se provimento ao recurso. (TJ-DF 07368129320218070001 1719216, Relator: FABRÍCIO FONTOURA BEZERRA, Data de Julgamento: 28/06/2023, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: 20/07/2023).
DISPOSITIVO Neste contexto, em razão da desnecessidade da presente ação, pois não há superendividamento que justifique a aplicação da legislação especial de proteção do consumidor, reconheço a ausência de interesse processual nesta ação, INDEFIRO a petição inicial nos termos do art. 330, III, e EXTINGO a ação sem análise de mérito, nos termos do art. 485, I, ambos do CPC.
Suspenso o pagamento das custas processuais ante a gratuidade de justiça deferida.
Sem condenação em honorários ante a ausência de citação e contraditório." Pois bem.
A pretensão formulada na presente ação está fundamentada na Lei nº 14.181/2021, em que sustenta o autor não ter condições de continuar arcando com os empréstimos contraídos juntos à instituições financeiras rés.
Como visto, o Juízo a quo houve por bem indeferir a inicial, não tendo havido sequer a citação dos promovidos.
Ressalte-se a incidência do Código de Defesa do Consumidor no caso vertente, eis que figura o autor como destinatário final e os bancos requeridos como fornecedores, ao colocar no mercado de consumo serviço de natureza bancária, sob a forma de empréstimo, nos termos do Art. 3º, § 2º, da Lei nº 8.078/1990: "Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. […]. § 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista".
Com isso, impõe-se sua análise dentro do microssistema protetivo instituído pela Lei nº 8.078/90, em especial quanto à vulnerabilidade material e a hipossuficiência processual dos consumidores.
Pretende o promovente, amparado na Lei do Superendividamento (Lei 14.181/2021), a repactuação de suas dívidas para com os réus, para que lhe seja possível pagá-las sem comprometer seu mínimo existencial, tendo apresentado plano de pagamento e parecer técnico (id's, 25748382 e 25748383).
Nessa senda, dispõem os artigos 104-A e 104-B, caput, do Código de Defesa do Consumidor: Art. 104-A.
A requerimento do consumidor superendividado pessoa natural, o juiz poderá instaurar processo de repactuação de dívidas, com vistas à realização de audiência conciliatória, presidida por ele ou por conciliador credenciado no juízo, com a presença de todos os credores de dívidas previstas no art. 54-A deste Código, na qual o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, e as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas.
Art. 104-B.
Se não houver êxito na conciliação em relação a quaisquer credores, o juiz, a pedido do consumidor, instaurará processo por superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial compulsório e procederá à citação de todos os credores cujos créditos não tenham integrado o acordo porventura celebrado.
Pela leitura do dispositivo legal acima, infere-se que a Lei nº 14.181/2021, conhecida como "Lei do Superendividamento", promoveu modificações no Código de Defesa do Consumidor e estabeleceu um rito específico em que é possibilitada a repactuação de dívidas perante os credores.
Na primeira etapa deve ser observada a fase de conciliação, com a presença de todos os credores das dívidas afetas ao qualificado como superendividado, oportunidade na qual o consumidor deverá apresentar proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, e as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas (art. 104-A do CDC).
Em não se obtendo êxito na conciliação é que se poderá instaurar uma segunda fase, com revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial compulsório (art. 104-B do CDC).
Nesse contexto, recebida a exordial, era de rigor a designação da audiência conciliatória supracitada para apresentação de plano voluntário de pagamento/repactuação das dívidas entre as partes envolvidas, o que não restou observado pelo d.
Juízo de primeiro grau.
Há, desse forma, um sistema bifásico de repactuação de dívidas (fase de conciliação/homologatória e a fase judicial/condenatória).
Com efeito, a inobservância do rito especial constitui flagrante violação ao devido processo legal, uma vez que cerceado o direito do autor de ver sua pretensão analisada nos termos propostos, ou seja, não teve a oportunidade de repactuação das suas dívidas, escopo do próprio rito eleito.
Assim, de rigor a instauração de processo de repactuação no juízo de origem, com uma fase inicial conciliatória preventiva, pois, inicialmente, o que se almeja é a realização consensual da repactuação das dívidas do promovente perante os réus com a apresentação de plano de pagamento, evitando-se, assim, que essa se dê de forma contenciosa e compulsória.
Nesse sentido, destaco os seguintes precedentes jurisprudenciais: AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
PROCEDIMENTO PRÓPRIO ESTABELECIDO PELA LEI Nº 14.181/2021 E PELO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, O QUAL PREVEEM A REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO EM SEDE DA QUAL O DEVEDOR APRESENTARÁ PLANO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
EXTINÇÃO LIMINAR DA AÇÃO SEM A NECESSÁRIA MARCAÇÃO DA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO PREVISTA NA LEGISLAÇÃO EM ESPÉCIE.
NULIDADE.
APELAÇÃO CONHECIDA E PROVIDA. 1.
A respeito do superendividamento, a Lei nº 14 .181/2021, promoveu alterações no Código de Defesa do Consumidor para aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e dispor sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento, introduzindo, dentre outros, regramento que trouxe ao consumidor a possibilidade de repactuar as dívidas por meio de audiência conciliatória e em procedimento próprio, que é o caso dos autos. 2.
Contudo, o eminente julgador extinguiu a ação liminarmente, sem determinar a realização de audiência de conciliação (e sem determinar a citação dos demandados) em sede da qual o devedor, inclusive, pode apresentar o plano de repactuação não sendo lícito obrigar ao devedor, de logo, apresentar o referido plano de repactuação, até mesmo por ausente previsão legal para tanto.
Pelo contrário, a lei faculta ao devedor a apresentação do plano por ocasião da realização da dita audiência de conciliação . 3.
Creio, então, que mostrou-se açodada a extinção levada a efeito pela sentença, pelo que entendo deva proceder à anulação da sentença para que o processo siga o rito estabelecido na Lei nº 14.181/2021 e no Código de Defesa do Consumidor ( CDC). 4 .
APELAÇÃO CONHECIDA E PROVIDA.
ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos da APELAÇÃO CÍVEL nº 0232767-28.2024.8 .06.0001, em que é apelante RAFAEL GUSTAVO SIMON e apelados BANCO DO BRASIL S/A, ITAÚ UNIBANCO S/A e BANCO C6 S/A acorda a 1ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade de votos, em conhecer e dar provimento ao apelo, nos termos do voto do Relator.
Fortaleza, 26 de novembro de 2024 FRANCISCO MAURO FERREIRA LIBERATO Presidente do Órgão Julgador EMANUEL LEITE ALBUQUERQUE Relator (TJ-CE - Apelação Cível: 02327672820248060001 Fortaleza, Relator.: EMANUEL LEITE ALBUQUERQUE, Data de Julgamento: 27/11/2024, 1ª Câmara Direito Privado, Data de Publicação: 29/11/2024). [Grifei].
Apelação Cível.
Ação de repactuação de dívidas pela Lei do Superendividamento.
Sentença de improcedência.
Pedido formulado com base na Lei 14 .181/2021, que inseriu o art. 104-A do CDC.
Inobservância de procedimento inerente ao rito da sobredita lei.
Ausência de determinação de realização de audiência de conciliação .
Pedido de exibição de documentos que se mostra possível, a fim de viabilizar a apresentação do plano de repactuação.
Anulação da r. sentença que é de rigor, para determinar o retorno dos autos ao primeiro grau, para designação de audiência de conciliação.
Recurso provido, com determinação . (TJ-SP - Apelação Cível: 10048816720238260302 Jaú, Relator.: Hélio Nogueira, Data de Julgamento: 21/10/2024, 22ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 21/10/2024). [Grifei].
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS - SUPERENDIVIDAMENTO - ART. 104-A DO CDC - AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO - INOBSERVÂNCIA NO JUÍZO DE ORIGEM - NULIDADE POR ERROR IN PROCEDENDO.
De acordo com os artigos 104-A a 104-C do Código de Defesa do Consumidor, inseridos pela Lei nº 14.181/2021, a ação de repactuação de dívidas deve observar o trâmite processual legalmente previsto, com destaque à necessidade de realização prévia de audiência conciliatória .
A inobservância do rito procedimental estabelecido pela Lei nº 14.181/2021 (Lei do Superendividamento) enseja a anulação da sentença, por error in procedendo. (TJ-MG - Apelação Cível: 50118188320228130702 1.0000 .22.136996-0/002, Relator.: Des.(a) Mônica Libânio, Data de Julgamento: 03/07/2024, 11ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 03/07/2024). [Grifei].
Ementa: APELAÇÃO CÍVEL.
PROCESSO CIVIL.
CONSUMIDOR.
SUPERENDIVIDAMENTO.
AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
LEI Nº 14.181/2021.
PRELIMINAR.
NULIDADE DA R.
SENTENÇA.
NÃO ADOÇÃO DO RITO DOS ARTIGOS 104-A E SEGUINTES DO CDC.
COMPROVAÇÃO .
PROCEDIMENTO ESPECIAL.
AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO NÃO OPORTUNIZADA.
SENTENÇA CASSADA. 1 .
Com o advento da Lei nº 14.181/2021, o Código de Defesa do Consumidor passou a expressamente dispor sobre ações direcionadas à educação financeira do consumidor.
O art. 4º, inciso X estipula o atendimento ao seguinte princípio consumerista: ?prevenção e tratamento do superendividamento como forma de evitar a exclusão social do consumidor? . 2.
Sob essa ótica, a legislação objetiva a conciliação entre consumidor e instituição financeira e/ou de crédito, a ser realizada no âmbito judicial e extrajudicial. 3.
Os artigos 104-A e seguintes do Código de Defesa do Consumidor estabelecem a possibilidade de ajuizamento de ação de repactuação de dívidas, com o fim de evitar o superendividamento do consumidor, mediante a realização de tentativa de conciliação judicial entre as partes; suspensão provisória da exigibilidade das dívidas e proposição de acordo de pagamento, assim como a adoção dos princípios e diretrizes contidas na legislação consumerista . 4.
Nesse contexto, o procedimento de superendividamento contido na legislação consumerista diz respeito a procedimento especial binário, consubstanciado em etapas de conciliação, revisão e integração dos contratos e plano de pagamento. 5.
No caso dos autos, estando a ação de repactuação de dívidas devidamente instruída e com o objetivo de revisão os contratos firmados e com a finalidade de obter um plano de pagamento com os credores, o prosseguimento do feito é medida que se impõe . 6.
Há que se considerar, ainda, que deve ser oportunizada às partes a realização de audiência de conciliação, nos termos da legislação de regência, a fim de possibilitar a homologação de acordo de plano de pagamento dos débitos do consumidor. 7.
Apelação conhecida e provida .
Sentença cassada. (TJ-DF 0706303-42.2022.8 .07.0003 1781635, Relator.: ANA MARIA FERREIRA DA SILVA, Data de Julgamento: 03/11/2023, 3ª Turma Cível, Data de Publicação: 20/11/2023). [Grifei].
Diante do exposto, CASSO, DE OFÍCIO, a sentença objurgada, a fim de que seja observado o procedimento de repactuação de dívida previsto nos artigos 104- A e 104-B, do Código de Defesa do Consumidor.
Prejudicadas as razões recursais. É o voto.
Fortaleza, data da assinatura digital.
DESEMBARGADOR JOSÉ RICARDO VIDAL PATROCÍNIO Relator -
02/09/2025 14:04
Expedida/certificada a comunicação eletrôinica Documento: 27623231
-
01/09/2025 10:42
Juntada de Petição de certidão de julgamento
-
28/08/2025 13:47
Anulada a(o) sentença/acórdão
-
28/08/2025 13:47
Prejudicado o recurso CARLOS ANDRE DE OLIVEIRA - CPF: *22.***.*85-72 (APELANTE)
-
28/08/2025 09:31
Deliberado em Sessão - Julgado - Mérito
-
18/08/2025 00:00
Publicado Intimação de Pauta em 18/08/2025. Documento: 27012099
-
15/08/2025 04:57
Confirmada a comunicação eletrônica
-
15/08/2025 00:47
Confirmada a comunicação eletrônica
-
15/08/2025 00:00
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 15/08/2025 Documento: 27012099
-
14/08/2025 15:47
Expedida/certificada a comunicação eletrôinica Documento: 27012099
-
14/08/2025 15:31
Inclusão em pauta para julgamento de mérito
-
06/08/2025 21:27
Conclusos para julgamento
-
04/08/2025 08:44
Conclusos para decisão
-
01/08/2025 20:02
Redistribuído por encaminhamento em razão de Determinação judicial
-
01/08/2025 18:23
Juntada de Certidão (outras)
-
25/07/2025 13:03
Recebidos os autos
-
25/07/2025 13:03
Conclusos para despacho
-
25/07/2025 13:03
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
01/08/2025
Ultima Atualização
03/09/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
ACÓRDÃO SEGUNDO GRAU • Arquivo
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Despacho • Arquivo
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Ato Ordinatório • Arquivo
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Documento de Comprovação • Arquivo
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Intimação da Sentença • Arquivo
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Sentença • Arquivo
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Despacho de Mero Expediente • Arquivo
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