TJES - 5004570-15.2024.8.08.0030
1ª instância - 2ª Vara Civel - Linhares
Polo Ativo
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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28/05/2025 02:22
Decorrido prazo de ALEXANDRE FUNDAO CARNEIRO em 27/05/2025 23:59.
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21/05/2025 21:46
Juntada de Petição de apelação
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14/05/2025 11:25
Juntada de Petição de Petição (outras)
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26/04/2025 00:08
Publicado Sentença em 25/04/2025.
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26/04/2025 00:08
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 24/04/2025
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24/04/2025 00:00
Intimação
ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Linhares - 2ª Vara Cível e Comercial Rua Alair Garcia Duarte, S/N, Fórum Desembargador Mendes Wanderley, Três Barras, LINHARES - ES - CEP: 29907-110 Telefone:(27) 32640743 PROCESSO Nº 5004570-15.2024.8.08.0030 PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) REQUERENTE: ELESSANDRA PIRES DE OLIVEIRA, VALDECI ALVES PEREIRA REPRESENTANTE: DEFENSORIA PUBLICA DO ESTADO DO ESPIRITO SANTO REQUERIDO: ALEXANDRE FUNDAO CARNEIRO, AFC CONSTRUCAO DE IMOVEIS E LICENCIAMENTO AMBIENTAL - EIRELI Advogado do(a) REQUERIDO: LUIZ GUSTAVO DEL CARRO - ES15987 SENTENÇA 1 - RELATÓRIO Trata-se de ação de cumprimento contratual cumulada com obrigação de fazer, alternativamente com pedido de resolução contratual, restituição de valores e indenização por danos morais, proposta por ELESSANDRA PIRES DE OLIVEIRA e VALDECI ALVES PEREIRA em face de AFC CONSTRUÇÃO DE IMÓVEIS E LICENCIAMENTO AMBIENTAL – EIRELI e ALEXANDRE FUNDÃO CARNEIRO, todos devidamente qualificados nos autos.
Aduzem os autores que celebraram contrato particular de compra e venda com os demandados, adquirindo imóvel rural (chácara) com área de 1.097m² situado em Bananal do Sul, município de Linhares/ES, pelo valor de R$ 60.000,00, acrescido de R$ 65.000,00 destinados à edificação de residência de alvenaria com área total de 71m² (sendo 51m² de área interna e 20m² de varanda), totalizando a importância de R$ 125.000,00, pagos integralmente ao segundo requerido.
Sustentam que o prazo estipulado para conclusão da obra era de 90 dias a contar de 01/11/2021, o qual foi excedido sem justificativa plausível.
Alegam que, após sucessivas prorrogações informais e promessas descumpridas, a casa permanecia inacabada na data do ajuizamento da ação.
Afirmam, ainda, que a parte ré não apenas descumpriu a obrigação pactuada, como também solicitou valores adicionais e deixou os materiais construtivos expostos às intempéries, gerando deterioração, frustração e abalo emocional significativo.
Pleiteiam, em sede principal, o cumprimento da obrigação contratual com a finalização da obra ou, subsidiariamente, a resolução do negócio jurídico com restituição integral dos valores adimplidos, bem como a condenação dos réus ao pagamento de indenização por danos morais no montante de R$ 30.000,00 (ID 40854892).
Deferida a gratuidade da justiça aos autores (ID 40861292) e determinada a citação dos réus, a primeira requerida apresentou contestação (ID 44023246), na qual reconheceu o descumprimento contratual, porém alegou causas excludentes de responsabilidade, notadamente a enfermidade grave acometida ao segundo requerido (Miastenia Gravis Soropositiva Super-Refratária - CID G70.0 e Esclerodermia - CID L94.0), conforme documentação médica acostada aos autos (ID 44023247), além da crise de escassez de mão de obra qualificada no segmento da construção civil.
Arguiu, ainda, a inexistência de responsabilidade civil em virtude de força maior, bem como a ausência de dolo ou culpa e de dano moral indenizável.
Ao final, requereu a improcedência dos pedidos autorais.
Em réplica (ID 45092831), os autores refutaram as alegações defensivas, sustentando que a obrigação pactuada não possuía natureza personalíssima, sendo perfeitamente exequível por terceiros.
Destacaram que, não obstante a alegada enfermidade, houve reiteradas promessas de entrega do imóvel, todas inadimplidas, o que evidenciaria a má-fé contratual.
Pugnaram pelo prosseguimento do feito com a procedência integral dos pedidos exordiais.
Na decisão de saneamento (ID 51418942), reconheceu-se a revelia do segundo requerido pela ausência de contestação tempestiva, declarando-se o feito saneado e fixando-se os pontos controvertidos: a) responsabilidade civil da parte demandada; b) ciência dos autores acerca do estado de saúde do segundo requerido; c) nexo de causalidade entre o atraso na obrigação e a enfermidade diagnosticada ou escassez de mão de obra; d) configuração do dano moral e sua quantificação.
Na mesma decisão, operou-se a inversão do ônus probatório, com fulcro no art. 14 do CDC, considerando a vulnerabilidade dos autores na relação consumerista.
A ré manifestou interesse na produção de prova testemunhal (ID 52999205), enquanto a Defensoria Pública, em patrocínio dos interesses dos autores, informou a impossibilidade de contato com os assistidos (ID 53504296), o que inviabilizaria a apresentação de rol testemunhal, requerendo a intimação pessoal dos demandantes para comparecimento à sede da instituição.
Eis o relatório.
Passo a decidir. 2 - FUNDAMENTAÇÃO I - DO JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO A controvérsia posta nos autos comporta julgamento antecipado do mérito, nos termos do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, porquanto a matéria debatida é preponderantemente de direito e as questões fáticas encontram-se suficientemente demonstradas pelo acervo probatório documental já produzido, prescindindo-se de dilação probatória adicional.
No caso concreto, a parte autora apresentou documentação robusta e suficiente para instruir os autos, demonstrando de forma clara: (i) a celebração do contrato de compra e venda de imóvel com obrigação de edificação de casa de alvenaria; (ii) o adimplemento integral do valor convencionado; e (iii) o inadimplemento contratual por parte da empresa ré, que não entregou a obra no prazo avençado, nem em período razoável após múltiplas promessas.
Embora o feito tenha tramitado regularmente com vistas à especificação de provas pelas partes (decisão de saneamento – ID 51418942), a parte autora não indicou qualquer meio de prova adicional, tendo a Defensoria Pública, inclusive, peticionado nos autos (ID 53504296) informando que não conseguiu contato com os requerentes para definição de rol testemunhal, o que inviabilizou o prosseguimento da fase instrutória por sua iniciativa.
De seu turno, a parte requerida, embora tenha requerido genericamente a produção de provas (ID 44023246 e ID 52999205), não demonstrou objetivamente a utilidade ou necessidade da prova oral, limitando-se a ratificar pedido sem indicação concreta de fatos a serem esclarecidos por testemunhas, o que se mostra insuficiente frente à exigência contida no art. 373, §1º, do CPC.
Assim, INDEFIRO o pedido de prova testemunhal apresentado no ID 52999205.
Ademais, o requerido Alexandre Fundão Carneiro foi declarado revel nos autos (ID 51418942), em razão de ausência de contestação no prazo legal.
Tal revelia, aliada à ausência de contraprova eficaz, reforça a presunção de veracidade dos fatos articulados na inicial, nos termos do art. 344 do CPC.
Ao cabo, o próprio reconhecimento do inadimplemento contratual pela parte ré, associado à documentação colacionada aos autos, forma conjunto probatório robusto e suficiente para a apreciação segura do mérito, não havendo necessidade de instrução probatória complementar, sendo, portanto, cabível e oportuno o julgamento antecipado da lide, sem que tal providência implique cerceamento de defesa ou prejuízo às partes.
II - DO MÉRITO II.1 - Da Aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor Preliminarmente, cumpre assentar a natureza jurídica da relação estabelecida entre as partes.
Trata-se, inequivocamente, de relação de consumo, conforme reconhecido na decisão de saneamento (ID 51418942), com fundamento nos arts. 2º e 3º do CDC.
A qualificação dos autores como consumidores decorre de sua condição de destinatários finais do produto (imóvel) e serviço (edificação residencial), nos termos do art. 2º do CDC.
Os réus, por sua vez, enquadram-se no conceito de fornecedores, conforme preconiza o art. 3º do mesmo diploma, porquanto desenvolvem atividade empresarial de construção e comercialização de imóveis.
O reconhecimento da relação consumerista implica a incidência dos princípios e normas protetivas do microssistema consumerista, notadamente a responsabilidade objetiva do fornecedor pelos vícios e defeitos na prestação do serviço (art. 14 do CDC), a inversão do ônus da prova em favor do consumidor (art. 6º, VIII, do CDC), já determinada na decisão de saneamento, e a interpretação mais favorável ao consumidor das cláusulas contratuais (art. 47 do CDC).
II.2 - Do Pedido Principal: Cumprimento da Obrigação Contratual Os autores formularam como pedido principal a condenação dos réus ao cumprimento específico da obrigação contratual, consistente na finalização da obra iniciada e entrega do imóvel edificado conforme as especificações pactuadas.
Contudo, tal pretensão não comporta acolhimento no caso concreto.
A execução específica da obrigação de fazer, embora tecnicamente possível, revela-se juridicamente inviável e economicamente ineficiente na espécie, por múltiplas razões.
Primeiramente, verifica-se que o contrato estabelecia o prazo de 90 (noventa) dias, contados a partir de 01/11/2021, para conclusão e entrega da obra.
Decorridos mais de dois anos desde o termo final inicialmente pactuado, a prestação permanece inadimplida, sem perspectiva concreta de cumprimento em prazo razoável.
A requerida reconhece expressamente o inadimplemento contratual, limitando-se a justificá-lo com base em dificuldades de saúde do sócio e obstáculos operacionais.
Tais circunstâncias, conquanto possam explicar parcialmente o atraso, não constituem excludentes de responsabilidade aptas a elidir o dever de prestar, conforme será pormenorizado adiante.
O inadimplemento prolongado e injustificado, associado à ausência de providências efetivas para retomada e conclusão da obra, configuram hipótese de inadimplemento absoluto, com a consequente perda de utilidade da prestação para o credor.
Nesse contexto, compelir os autores a aguardarem, por tempo indeterminado, nova tentativa de execução contratual por parte da mesma construtora que já demonstrou incapacidade técnica e operacional para cumprimento da obrigação, seria medida ineficiente, ineficaz e desproporcional, em flagrante violação aos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da própria função social do contrato.
Nos termos do art. 248 do Código Civil, "se a prestação do fato tornar-se impossível sem culpa do devedor, resolver-se-á a obrigação; se por culpa dele, responderá por perdas e danos".
Na mesma linha, dispõe o art. 499, § 1º, do Código de Processo Civil que "a obrigação somente será convertida em perdas e danos se por elas optar o autor ou se impossível a tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente".
No caso em tela, ainda que não haja impossibilidade material absoluta de conclusão da obra, verifica-se a perda da confiança recíproca entre as partes e o comprometimento da relação negocial, circunstâncias que tornam a prestação específica inexigível, por violação à boa-fé objetiva e frustração da legítima expectativa dos contratantes.
Portanto, diante do inadimplemento absoluto e da perda de utilidade da prestação específica, impõe-se o acolhimento do pedido subsidiário de resolução contratual, com restituição de valores e indenização por danos morais, rejeitando-se, por conseguinte, o pedido principal de cumprimento da obrigação de fazer.
II.3 - Da Resolução Contratual e Restituição de Valores Verificada a inviabilidade do cumprimento específico da obrigação contratual, impõe-se a resolução do negócio jurídico, com fundamento nos arts. 475 e 389 do Código Civil, e art. 20, II, do CDC.
O art. 475 do Código Civil estabelece que "a parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos".
O art. 389 do mesmo diploma, por sua vez, preconiza que "não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado, quando for o caso".
No âmbito das relações de consumo, o art. 20, II, do CDC dispõe que "o fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: [...] II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos".
In casu, o inadimplemento contratual por parte da requerida é incontroverso e configura falha na prestação do serviço, nos termos do art. 14 do CDC, autorizando a resolução do negócio com restituição integral das quantias pagas.
As alegações defensivas não prosperam.
A requerida invoca, como excludentes de responsabilidade, a enfermidade grave do sócio Alexandre (Miastenia Gravis e Esclerodermia) e a escassez de mão de obra qualificada no setor da construção civil.
Quanto à doença do sócio, embora merecedora de compreensão sob o prisma humanitário, tal circunstância não constitui causa excludente de responsabilidade civil contratual.
A obrigação pactuada não possui natureza personalíssima, sendo perfeitamente exequível por intermédio de terceiros contratados.
A atividade empresarial não pode ficar condicionada exclusivamente à capacidade laborativa de um único indivíduo, sobretudo quando se trata de pessoa jurídica devidamente constituída e com objeto social específico.
A alegada escassez de mão de obra qualificada, por sua vez, insere-se no risco ordinário da atividade empresarial, não caracterizando caso fortuito ou força maior.
Conforme pacífica jurisprudência, dificuldades operacionais previsíveis não eximem o fornecedor do dever de cumprimento das obrigações contratuais assumidas perante o consumidor.
Nesse sentido, pertinente a invocação da Súmula nº 145 do TJPE, que preconiza: "Não constitui hipótese de caso fortuito ou de força maior a ocorrência de chuvas em excesso, falta de mão de obra, aquecimento do mercado, embargo do empreendimento ou, ainda, entraves administrativos, como justificativa para atraso na entrega de empreendimentos imobiliários." Destarte, reconhecida a inexistência de excludentes de responsabilidade e configurado o inadimplemento contratual grave e injustificado, impõe-se a resolução do contrato com restituição integral da quantia paga pelos autores.
II.4 - Do Dano Moral II.4.1 - Da Existência do Dano Moral Além da restituição das quantias pagas, os autores pleiteiam indenização por danos morais no montante de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), em decorrência do inadimplemento contratual e das frustrações dele advindas.
A Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso X, garante a inviolabilidade da intimidade, da vida privada e da dignidade da pessoa humana, assegurando o direito à indenização por dano moral decorrente de sua violação.
No mesmo sentido, o Código Civil, em seus arts. 186, 187 e 927, estabelece que aquele que, por ação ou omissão voluntária, causar lesão a direito de outrem, é obrigado a repará-la.
O art. 6º, inciso VI, do Código de Defesa do Consumidor, por sua vez, assegura como direito básico do consumidor "a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos".
O mesmo diploma normativo, em seu art. 14, preconiza que "o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços".
No presente caso, restou incontroverso que os autores contrataram a construção de uma casa com finalidade residencial, a ser entregue no prazo de 90 dias a contar de 01/11/2021, o que jamais ocorreu, apesar do pagamento integral da quantia contratada.
Passados mais de dois anos do vencimento da obrigação, a obra permanece inacabada, sem que tenha sido apresentada justificativa idônea ou qualquer proposta de solução efetiva.
A conduta da parte ré — especialmente a ausência de providências concretas mesmo após múltiplas promessas verbais de entrega, a exposição dos materiais de construção à deterioração e o descaso com a situação dos autores — revela flagrante violação à boa-fé objetiva (art. 422 do CC), à confiança legítima e à função social do contrato (art. 421 do CC).
Trata-se de um caso em que o inadimplemento transcende a esfera patrimonial, atingindo valores existenciais.
A moradia é mais que um bem material: trata-se de um direito social fundamental (CF, art. 6º), um espaço de abrigo, segurança, planejamento familiar e dignidade.
A frustração prolongada da expectativa legítima de habitação própria impacta diretamente o equilíbrio emocional e psíquico dos contratantes, sobretudo quando pertencentes à população economicamente vulnerável, como ocorre com os autores, trabalhadores de base rural.
II.4.2 - Da Natureza e Extensão do Dano Moral O dano moral, nesse cenário, é evidente e se caracteriza pela angústia, insegurança, frustração e sofrimento psicológico decorrentes da instabilidade prolongada e da perda da confiança.
Os autores confiaram suas economias à ré, com o intuito de alcançar o projeto de construção de um lar próprio — expectativa reiteradamente frustrada por conduta omissiva, morosa e insensível.
O art. 187 do Código Civil estabelece que "também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes".
No caso em exame, a parte ré, ao prolongar injustificadamente o inadimplemento contratual, solicitando valores adicionais sem contraprestação e permitindo a deterioração dos materiais construtivos, excedeu os limites impostos pela boa-fé objetiva, configurando abuso de direito passível de reparação.
No caso vertente, os efeitos do inadimplemento contratual manifestamente atingiram a dignidade dos autores.
Não se trata de mero aborrecimento cotidiano, mas de privação prolongada de direito fundamental (moradia), comprometimento de significativa parcela do patrimônio dos autores (R$ 125.000,00) e frustração de legítima expectativa de concretização de projeto existencial basilar.
Quanto à extensão do dano, destaca-se que os efeitos da conduta lesiva se estenderam no tempo.
Não se trata de inadimplemento isolado, mas de um quadro continuado de frustração, que se prolonga desde 2021 até a presente data.
A morosidade, a omissão e a postura indiferente da parte ré acentuam a gravidade da lesão.
O sofrimento causado não foi pontual, mas contínuo e progressivo, agravado pelo silêncio e inércia da fornecedora, inclusive após a propositura da ação.
O art. 5º do Código Civil dispõe que "aquele que, de boa-fé, se retardar para exercer seu direito, sofre as consequências de seu retardamento".
Em sentido contrário, deve-se reconhecer que a parte que, de má-fé, retarda o cumprimento de sua obrigação, causando prejuízo à outra, deve suportar as consequências de sua conduta, incluindo o dever de reparação integral dos danos patrimoniais e morais.
II.4.3 - Da Quantificação do Dano Moral A quantificação do dano moral é tarefa complexa que demanda a ponderação de múltiplos fatores.
Nos termos do art. 944 do Código Civil, "a indenização mede-se pela extensão do dano", observado o princípio da reparação integral.
No âmbito das relações de consumo, o art. 6º, VI, do CDC assegura ao consumidor o direito à "efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais", o que implica fixação de indenização proporcional à extensão do dano e apta a cumprir as funções compensatória, punitiva e preventiva da responsabilidade civil.
Para a adequada mensuração do quantum indenizatório, devem ser considerados diversos critérios orientadores, entre os quais: a) A gravidade da conduta e o grau de reprovabilidade do ofensor; b) A repercussão do fato na esfera pessoal da vítima; c) A duração do sofrimento e a ausência de solução voluntária; d) As condições socioeconômicas das partes; e) O caráter pedagógico-punitivo da indenização; f) A proporcionalidade e a razoabilidade.
No caso em análise, constata-se que: a) A conduta da ré revela alto grau de reprovabilidade, caracterizada pelo descaso persistente em relação à obrigação contratual assumida, mesmo após múltiplas promessas de cumprimento; b) A repercussão do fato na esfera pessoal dos autores é significativa, considerando a natureza existencial do contrato (aquisição de moradia), o montante despendido (R$ 125.000,00) e a condição socioeconômica das vítimas (trabalhadores rurais); c) O sofrimento dos autores prolongou-se por mais de dois anos, sem qualquer iniciativa concreta da ré para solucionar a questão, mesmo após a propositura da ação judicial; d) Há evidente disparidade econômica entre as partes, sendo os autores pessoas de baixa renda e a ré empresa do ramo da construção civil; e) A indenização deve desestimular a reiteração da conduta lesiva, cumprindo função pedagógico-punitiva.
O art. 884 do Código Civil veda o enriquecimento sem causa, estabelecendo que "aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários".
Este dispositivo, interpretado a contrario sensu, impõe moderação na fixação da indenização por dano moral, de modo a evitar que a compensação se converta em fonte de enriquecimento injustificado.
Por outro lado, o art. 6º, VI, do CDC, ao assegurar a "efetiva reparação" dos danos, impede que a indenização seja fixada em valor irrisório ou simbólico, incapaz de compensar adequadamente o prejuízo experimentado e de desestimular a reiteração da conduta lesiva.
Dessa forma, impõe-se a reparação integral do dano moral, nos moldes do art. 6º, VI, do CDC, levando-se em conta os critérios acima mencionados para a quantificação.
Considerando tais parâmetros e as peculiaridades do caso concreto, reputo adequada a fixação da indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada autor, totalizando R$ 20.000,00 (vinte mil reais), montante que se revela suficiente para compensar o abalo psicológico experimentado, sem configurar enriquecimento sem causa, além de atender à finalidade pedagógica da reparação.
Nesse sentido: RECURSO ESPECIAL.
DIREITO CIVIL.
COMPRA E VENDA DE IMÓVEL.
PROGRAMA "MINHA CASA, MINHA VIDA" .
LONGO ATRASO NA CONCLUSÃO DA OBRA.
PRORROGAÇÃO DO PRAZO MEDIANTE ACORDO HOMOLOGADO JUDICIALMENTE.
DESCUMPRIMENTO DO ACORDO.
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS .
CABIMENTO NA ESPÉCIE. 1.
Controvérsia acerca das consequências do atraso na entrega de um imóvel financiado pelo programa Minha Casa, Minha Vida - PMCMV, com subvenção econômica estatal. 2 .
Cabimento de indenização por danos morais em virtude do longo atraso na entrega do imóvel (mais de doze meses após o período de tolerância) por se tratar de imóvel adquirido por família de baixa renda no âmbito do "Programa Minha Casa, Minha Vida", com auxílio estatal por meio de subvenção econômica.
Julgado anterior desta TURMA. 3.
Existência de acordo, homologado judicialmente, mediante o qual se prorrogou o prazo de entrega do imóvel para além do período contratual de tolerância. 4.
Descumprimento do acordo pelas demandadas, não tendo sido concluída a obra no novo prazo pactuado. 5.
Circunstância agravante da culpa das demandadas, intensificando o abalo psíquico sofrido pelos adquirentes . 6.
Cabimento da indenização por danos morais na espécie. 7.
Restabelecimento dos comandos da sentença, em que a indenização fora arbitrada em R$ 10.000,00 (dez mil reais), valor que se mostra adequado aos parâmetros de razoabilidade adotados por esta Corte Superior em casos semelhantes. 8.
RECURSO ESPECIAL PROVIDO. (STJ - REsp: 1818391 RN 2019/0159151-5, Relator.: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Julgamento: 10/09/2019, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/09/2019) Tal montante atende ao princípio da reparação integral (art. 944 do CC) e às finalidades da responsabilidade civil, sendo suficiente para compensar o abalo moral experimentado pelos autores, sem configurar enriquecimento sem causa (vedado pelo art. 884 do CC), além de desempenhar adequadamente a função pedagógico-punitiva, desestimulando a reiteração da conduta lesiva pela parte ré.
Quanto aos consectários legais da indenização por danos morais, incidirá correção monetária pelos índices adotados pela Corregedoria Geral de Justiça do Estado do Espírito Santo a partir da data desta sentença, e juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação, por se tratar de responsabilidade contratual, nos termos do art. 405 do Código Civil.
III - CONCLUSÃO Ante o exposto, conclui-se que: Houve inadimplemento contratual grave e injustificado por parte dos requeridos; O pedido principal de cumprimento específico da obrigação de fazer mostra-se inviável em razão do inadimplemento absoluto e da perda de utilidade da prestação; Impõe-se a resolução do contrato com restituição integral das quantias pagas; Não restaram configuradas causas excludentes de responsabilidade civil; O inadimplemento contratual, nas circunstâncias específicas do caso, ocasionou danos morais indenizáveis; O valor adequado para compensação dos danos morais é de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada autor. 3 - DISPOSITIVO Ante o exposto, com fundamento no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, para: DECLARAR a resolução do contrato firmado entre as partes em razão do inadimplemento contratual; CONDENAR os requeridos, solidariamente, à restituição integral da quantia de R$ 125.000,00 (cento e vinte e cinco mil reais), com correção monetária pelos índices adotados pela Corregedoria Geral de Justiça do Estado do Espírito Santo desde a data do efetivo desembolso e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação; CONDENAR os requeridos, solidariamente, ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de indenização por danos morais para cada um dos autores, totalizando R$ 20.000,00 (vinte mil reais), com correção monetária pelos índices adotados pela Corregedoria Geral de Justiça do Estado do Espírito Santo desde a presente data e juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês desde a citação.
A parte requerida, vencida, arcará com os honorários de sucumbência, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, §§ 2º e 3º do CPC.
Tendo os autores obtido o deferimento da justiça gratuita, a exigibilidade de tais valores ficará suspensa na forma do art. 98, § 3º, do mesmo diploma legal.
No cálculo, devem ser observadas as diretrizes constantes dos índices da Corregedoria Geral de Justiça do Estado do Espírito Santo.
Ficam as partes advertidas, desde logo, que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com postulação meramente infringente lhes sujeitará à imposição da multa prevista pelo art. 1.026, § 2º, do Código de Processo Civil.
Preclusa a via impugnativa, certifique-se o trânsito em julgado e arquive-se os autos.
Publique-se.
Registre-se.
Intime-se.
Cumpra-se.
Linhares/ES, data registrada no sistema.
Emília Coutinho Lourenço Juíza de Direito -
23/04/2025 12:45
Expedição de Intimação Diário.
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22/04/2025 21:21
Julgado procedente em parte do pedido de ELESSANDRA PIRES DE OLIVEIRA - CPF: *97.***.*23-13 (REQUERENTE).
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22/04/2025 21:21
Processo Inspecionado
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28/03/2025 18:17
Conclusos para julgamento
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25/10/2024 20:59
Juntada de Petição de Petição (outras)
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18/10/2024 14:27
Juntada de Petição de Petição (outras)
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01/10/2024 15:46
Expedida/certificada a intimação eletrônica
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27/09/2024 13:39
Decisão de Saneamento e de Organização do Processo
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24/09/2024 17:05
Conclusos para decisão
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16/09/2024 14:16
Expedição de Certidão.
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19/06/2024 12:16
Juntada de Petição de Petição (outras)
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30/05/2024 01:14
Decorrido prazo de ALEXANDRE FUNDAO CARNEIRO em 29/05/2024 23:59.
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29/05/2024 22:32
Juntada de Petição de contestação
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28/05/2024 13:12
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
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06/05/2024 17:19
Juntada de Aviso de Recebimento
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12/04/2024 14:28
Expedição de carta postal - citação.
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12/04/2024 14:28
Expedição de carta postal - citação.
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04/04/2024 19:29
Processo Inspecionado
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04/04/2024 19:29
Proferido despacho de mero expediente
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04/04/2024 17:24
Classe retificada de PETIÇÃO CÍVEL (241) para PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7)
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04/04/2024 17:15
Conclusos para despacho
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04/04/2024 16:47
Expedição de Certidão.
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04/04/2024 16:40
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
04/04/2024
Ultima Atualização
28/05/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Detalhes
Documentos
Petição (outras) • Arquivo
Sentença • Arquivo
Sentença • Arquivo
Decisão • Arquivo
Despacho - Carta • Arquivo
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