TJMT - 1004360-49.2023.8.11.0041
1ª instância - Cuiaba - Primeira Vara Especializada da Fazenda Publica
Polo Ativo
Polo Passivo
Partes
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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29/07/2025 19:53
Transitado em Julgado em 08/01/2025
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07/03/2025 02:08
Decorrido prazo de ESTADO DE MATO GROSSO em 06/03/2025 23:59
-
12/02/2025 02:16
Decorrido prazo de Sra. FLÁVIA EMANUELLE DE SOUZA SOARES SECRETÁRIA ADJUNTA DE GESTÃO DE PESSOAS SAGP em 11/02/2025 23:59
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21/01/2025 19:01
Juntada de Petição de manifestação
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21/01/2025 02:39
Publicado Sentença em 21/01/2025.
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10/01/2025 03:15
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 09/01/2025
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08/01/2025 15:35
Expedição de Outros documentos
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08/01/2025 15:35
Expedida/certificada a intimação eletrônica
-
08/01/2025 15:35
Expedição de Outros documentos
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08/01/2025 15:35
Baixa Administrativa
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08/01/2025 15:35
Homologada a Transação
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29/08/2023 13:16
Ato ordinatório praticado
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05/05/2023 18:28
Conclusos para julgamento
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12/03/2023 02:15
Decorrido prazo de MARIA SANDRA OLIVEIRA MAGALHAES DA SILVA em 07/03/2023 23:59.
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10/03/2023 13:33
Decorrido prazo de MARIA SANDRA OLIVEIRA MAGALHAES DA SILVA em 06/03/2023 23:59.
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10/03/2023 08:02
Juntada de comunicação entre instâncias
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06/03/2023 13:22
Juntada de Petição de manifestação
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03/03/2023 14:16
Expedição de Outros documentos
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03/03/2023 05:27
Decorrido prazo de ESTADO DE MATO GROSSO em 02/03/2023 23:59.
-
02/03/2023 18:55
Ato ordinatório praticado
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01/03/2023 12:43
Juntada de Petição de manifestação
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14/02/2023 00:35
Publicado Intimação em 14/02/2023.
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14/02/2023 00:35
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 13/02/2023
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13/02/2023 01:32
Publicado Decisão em 13/02/2023.
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13/02/2023 00:00
Intimação
PJe: 1004360-49.2023.8.11.0041 Vistos, etc...
Cuida-se de Mandado de Segurança impetrado por Maria Sandra Oliveira Magalhães da Silva em desfavor da Secretária Adjunta de Gestão de Pessoas da SEPLAG/MT e do Estado de Mato Grosso, que aduz em síntese ser genitora da menor Monique Esther Magalhães Silva, nascida em 25.02.2019, diagnosticada com Transtorno do Espectro do Autismo – CID 11 6 A02.3, realizando, por conseguinte, diversas terapias. À vista do exposto, pugna pela concessão da segurança para “determinar que o Reclamado conceda à Requerente jornada de trabalho especial com redução da carga horária de 30 (trinta) horas em 50% (cinquenta por cento), sem a necessidade de compensação e sem prejuízo da sua remuneração, a fim de que possa dispensar os devidos e necessários cuidados especiais a sua filha portador de deficiência”.
Documentos acompanham o mandamus.
E o necessário.
O mandamus é remédio constitucional adequado para proteger direito líquido e certo “sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça”, conforme dispõe art. 1º da Lei 12.016/2009 c/c inciso LXIX do art. 5º/CF, de modo que para concessão da medida liminar faz-se necessária a presença de fundamentos relevantes (fumus boni iuris) e a possibilidade do ato impugnado resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida (periculum in mora).
Portanto, o deferimento da liminar em mandado de segurança visa resguardar “possível direito da Impetrante”, para tanto basta a este a apresentação de relevantes fundamentos, assim como a possibilidade da ocorrência de dano pelo não acolhimento da medida, vez que não cabe a dilação probatória, vejamos: “Daí que, quando se cogita de direito líquido e certo, para fins do mandado de segurança, o que se considera não é a norma a aplicar, mas a possibilidade imediata de comprovação dos fatos de que o direito subjetivo se originou.
Pode-se, por conseguinte, dizer que há direito líquido e certo quando o titular dispõe de documentos para provar, de plano, a situação fática que lhe permite invocar o direito objetivo ofendido ou ameaçado.
O que importa não é a maior ou menor complexidade da tese jurídica, mas a prova pré-constituída (documental) do seu suporte fático.
Se a demonstração do direito do impetrante estiver na dependência de investigação probatória, ainda a ser feita em juízo, o caso não será de mandado de segurança.
Terá de ser resolvido pelas vias ordinárias.
O procedimento do mandamus é sumário e não contém fase para coleta de outras provas que não as documentais, imediatamente exibíveis.
Enfim, o que se exige é prova pré-constituída das situações e fatos que embasam o direito invocado pelo impetrante. (THEODORO JR., Humberto.
Lei do Mandado de Segurança comentada: artigo por artigo – [2. ed.]. – Rio de Janeiro: Forense, 2019. p. 62).
Pois bem. À vista dos argumentos expostos pela impetrante, observo a presença do direito líquido e certo que enseja na concessão da segurança.
A impetrante pugna pela redução da carga horária em 50% (cinquenta por cento), sem redução da remuneração, para que possa acompanhar os cuidados com a filha menor diagnosticada com Transtorno do Espectro do Autismo – CID 11 6 A02.3, comórbido com o fato de ser não verbal, e com sérias dificuldades em comunicar-se por gestos, e ainda apresenta Transtornos de Processamento Sensorial, ora com hipo-reatividade, ora com hiper-reatividade, conforme ponderado pela médica especialista em neuropediatria, Gisele Reck Claudino – CRM 4199-MT, ID 109021208.
Há ainda documentação acostada no ID 109021221 relatando que a criança realiza acompanhamento psicológico com Análise Aplicada do Comportamento, subscrito pela neuropsicóloga Regiane Mendes Fernandes – CRP 18/02043.
De acordo com as peculiaridades apresentadas, é dever do Estado zelar pela dignidade e bem-estar das pessoas portadores de deficiência ou necessidades especiais, circunstância que se alia a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, promulgada pelo Decreto n. 6.949/09, e ao Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/15), os quais cotejam proteção e assegura os direitos e liberdades fundamentais.
No que tange à especificidade do feito, há de se ponderar a inexistência de previsão legal no âmbito deste Estado, haja vista a inconstitucionalidade declarada por vício formal da Lei Complementar 607/2018.
Entretanto, tal não obsta o deferimento da concessão da segurança.
Pondero que o âmbito federal, a Lei 8.112/90 dispõe acerca da redução da carga horária do servidor que tenha filho portador de deficiência.
Vejamos: “Art. 98.
Será concedido horário especial ao servidor estudante, quando comprovada a incompatibilidade entre o horário escolar e o da repartição, sem prejuízo do exercício do cargo.
Parágrafo único.
Para efeito do disposto neste artigo, será exigida a compensação de horário na repartição, respeitada a duração semanal do trabalho. § 1o Para efeito do disposto neste artigo, será exigida a compensação de horário no órgão ou entidade que tiver exercício, respeitada a duração semanal do trabalho. (Parágrafo renumerado e alterado pela Lei nº 9.527, de 10.12.97) § 2o Também será concedido horário especial ao servidor portador de deficiência, quando comprovada a necessidade por junta médica oficial, independentemente de compensação de horário. (Incluído pela Lei nº 9.527, de 10.12.97) § 3o As disposições do parágrafo anterior são extensivas ao servidor que tenha cônjuge, filho ou dependente portador de deficiência física, exigindo-se, porém, neste caso, compensação de horário na forma do inciso II do art. 44. (Incluído pela Lei nº 9.527, de 10.12.97) § 3o As disposições constantes do § 2o são extensivas ao servidor que tenha cônjuge, filho ou dependente com deficiência. (Redação dada pela Lei nº 13.370, de 2016)”. (grifei).
Atento a este dispositivo legal, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral sobre a matéria: TEMA 1097 - Possibilidade de redução da jornada de trabalho do servidor público que tenha filho ou dependente portador de deficiência, através do julgamento do RE 1237867/SP, dispondo da seguinte forma: Ementa: RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA.
CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA.
TRATADO EQUIVALENTE À EMENDA CONSTITUCIONAL.
PROTEÇÃO INTEGRAL E PRIORITÁRIA À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE.
LEI 12.764/2012.
POLÍTICA NACIONAL DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS DA PESSOA COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA.
PROTEÇÃO E ASSISTÊNCIA DA FAMÍLIA DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA.
REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO SEM ALTERAÇÃO NOS VENCIMENTOS.
SERVIDORA ESTADUAL CUIDADORA DE FILHO AUTISTA.
INEXISTÊNCIA DE LEGISLAÇÃO ESTADUAL.
ANALOGIA AO ART. 98, § 3°, DA LEI 8.112/1990.
LEGITIMIDADE DA APLICAÇÃO DE LEGISLAÇÃO FEDERAL QUANDO A OMISSÃO ESTADUAL OU MUNICIPAL OFENDE DETERMINAÇÃO CONSTITUCIONAL AUTOAPLICÁVEL QUE NÃO ACARRETE AUMENTO DE GASTOS AO ERÁRIO.
PRINCÍPIO DA IGUALDADE SUBSTANCIAL.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE DÁ PROVIMENTO.
FIXAÇÃO DE TESE DE REPERCUSSÃO GERAL.
I – A Carta Política de 1988 fixou a proteção integral e prioritária à criança e ao adolescente, cujas garantias têm sido reiteradamente positivadas em nossa legislação, a exemplo do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8069/1990) e da promulgação da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança (Decreto 99.170/1990).
II – A Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, no § 2° do art. 1° da Lei 12.764/2012, estipulou que eles são considerados pessoas com deficiência, para todos os efeitos legais.
Assim, é incontestável que a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência e a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência aplicam-se também a eles.
III – A Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD) foi assinada pelo Brasil e, por ter sido aprovada de acordo com os ritos previstos no art. 5°, § 3° da Constituição Federal de 1988, suas regras são equivalentes a emendas constitucionais, o que reforça o compromisso internacional assumido pelo País na defesa dos direitos e garantias das pessoas com deficiência.
IV – A CDPD tem como princípio geral o “respeito pelo desenvolvimento das capacidades das crianças com deficiência e pelo direito das crianças com deficiência de preservar sua identidade” (art. 3°, h) e determina que, nas ações relativas àquelas com deficiência, o superior interesse dela receberá consideração primordial (art. 7°, 2).
V – No Preâmbulo (item X), o Tratado é claro ao estabelecer que a família, núcleo natural e fundamental da sociedade, tem o direito de receber não apenas a proteção de todos, mas também a assistência necessária para torná-la capaz de contribuir para o exercício pleno e equitativo dos direitos das pessoas com deficiência.
VI – Os Estados signatários obrigam-se a “adotar todas as medidas legislativas, administrativas e de qualquer outra natureza, necessárias para a realização dos direitos reconhecidos na presente Convenção” (art. 4°, a).
VII – A omissão do Poder Público, portanto, não pode justificar afronta às diretrizes e garantias constitucionais.
Assim, a inexistência de lei estadual específica que preveja a redução da jornada de servidores públicos que tenham filhos com deficiência, sem redução de vencimentos, não serve de escusa para impedir que seja reconhecido a elas e aos seus genitores o direito à dignidade da pessoa humana e o direito à saúde.
VIII – A convivência e acompanhamento familiar para o desenvolvimento e a inclusão das pessoas com deficiência são garantidos pelas normas constitucionais, internacionais e infraconstitucionais, portanto, deve-se aplicar o melhor direito em favor da pessoa com deficiência e de seus cuidadores.
IX – O Superior Tribunal de Justiça já reconheceu que é legítima a aplicação da Lei 8.112/1990 nos casos em que a legislação estatal e municipal for omissa em relação à determinação constitucional autoaplicável que não gere aumento ao erário.
Precedentes.
X – Tendo em vista o princípio da igualdade substancial, previsto tanto em nossa Carta Constitucional quanto na Convenção Internacional sobre o Direito das Pessoas com Deficiência, se os servidores públicos federais, pais ou cuidadores legais de pessoas com deficiência têm o direito a horário especial, sem a necessidade de compensação de horário e sem redução de vencimentos, os servidores públicos estaduais e municipais em situações análogas também devem ter a mesma prerrogativa.
XI – Recurso extraordinário a que se dá provimento.
Fixação de tese: “Aos servidores públicos estaduais e municipais é aplicado, para todos os efeitos, o art. 98, § 2° e § 3°, da Lei 8.112/1990”.
Tema 1097 - Possibilidade de redução da jornada de trabalho do servidor público que tenha filho ou dependente portador de deficiência.
Tese Aos servidores públicos estaduais e municipais é aplicado, para todos os efeitos, o art. 98, § 2° e § 3°, da Lei 8.112/1990.”.
No mesmo sentido é a jurisprudência do e.
Tribunal de Justiça deste Estado: AGRAVO DE INSTRUMENTO - MANDADO DE SEGURANÇA – SERVIDORA PÚBLICA MUNICIPAL – REDUÇÃO DE 50 % DA CARGA HORÁRIA - FILHO COM “TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA” E OUTRAS IMPLICAÇÕES DE SAÚDE ADVINDAS DE “TOXOPLASMOSE CONGÊNITA DURANTE A GESTAÇÃO” - AUSÊNCIA DE LEI MUNICIPAL PREVENDO O DIREITO À REDUÇÃO DA CARGA HORÁRIA - INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA E ANALÓGICA - POSSIBILIDADE - NORMAS FEDERAIS E CONSTITUCIONAIS DE PROTEÇÃO À CRIANÇA VULNERÁVEL – MATÉRIA AFETADA PELO TEMA 1097 DO STF - DECISÃO MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. 1.
A atuação do Poder Judiciário visando suprir a lacuna da lei não configura ofensa ao princípio da legalidade ou ao da separação de poderes, senão interpretação sistemática e analógica dos dispositivos legais vigentes, que regem a tutela dos direitos das pessoas vulneráveis, em especial das crianças e adolescentes que necessitam de proteção especial. 2.
A redução de 50 % (cinquenta por cento) da carga horária da jornada de trabalho, sem redução de remuneração, para a genitora acompanhar e cuidar do filho menor, portador de necessidades especiais, há de ser reconhecida quando em consonância com as normas que regem a matéria. 3.
Hipótese afetada pela matéria tratada no Recurso Extraordinário 1.237.867, que teve repercussão geral reconhecida pelo STF sem determinação da suspensão dos feitos relacionados: Possibilidade de redução da jornada de trabalho do servidor público que tenha filho ou dependente portador de deficiência (Tema 1097). (STF – Plenário Virtual; Leading Case RE 1237867, Relator: Min.
Ricardo Lewandowski, julgado 08/08/2020). (N.U 1017428-97.2020.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIA APARECIDA RIBEIRO, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 30/03/2021, Publicado no DJE 13/04/2021) (grifei).
Em atenção ao acima exposto, é ainda de especial relevância ponderar que o direito que se busca é, em verdade, para amparar a criança, que por sua natureza encontra-se em desenvolvimento, sendo de conhecimento público e notório que as pessoas portadoras de espectro autista passam por diversas terapias, as quais devem ser continuadas, para que progridam nas dificuldades próprias dos transtornos, de modo que a interrupção ou paralisação de tais trazem inúmeros prejuízos ao desenvolvimento.
Isto posto, DEFIRO a segurança vindicada para reduzir a carga horária da impetrante em 50%, sem redução da remuneração, nos termos acima exposto, até ulterior deliberação deste juízo.
Notifiquem-se as Autoridade Impetradas, para, no prazo de 10 (dez) dias, prestem as informações de praxe, e, na oportunidade, intimem-nas do teor desta decisão.
Oficie-se a Procuradoria Geral do Estado sobre a presente decisão, enviando-lhe cópia da inicial, para que, querendo, ingresse no feito, consoante previsão do art. 7º, II da Lei nº 12.016/2009.
Em seguida, abro vistas ao mister do Ministério Público, para, querendo, manifestar-se no presente feito, nos termos do art. 12 da Lei nº 12.016/09.
Após, decorrido o prazo das informações, prestadas ou não, voltam-me os autos conclusos para sentença.
Intimem-se.
Cumpra-se, expedindo-se o necessário.
Flávio Miraglia Fernandes Juiz de Direito -
11/02/2023 01:21
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 10/02/2023
-
10/02/2023 08:02
Ato ordinatório praticado
-
10/02/2023 07:58
Expedição de Outros documentos
-
10/02/2023 07:58
Expedição de Aviso de recebimento (AR)
-
10/02/2023 07:58
Expedição de Outros documentos
-
10/02/2023 00:00
Intimação
PJe: 1004360-49.2023.8.11.0041 Vistos, etc...
Cuida-se de Mandado de Segurança impetrado por Maria Sandra Oliveira Magalhães da Silva em desfavor da Secretária Adjunta de Gestão de Pessoas da SEPLAG/MT e do Estado de Mato Grosso, que aduz em síntese ser genitora da menor Monique Esther Magalhães Silva, nascida em 25.02.2019, diagnosticada com Transtorno do Espectro do Autismo – CID 11 6 A02.3, realizando, por conseguinte, diversas terapias. À vista do exposto, pugna pela concessão da segurança para “determinar que o Reclamado conceda à Requerente jornada de trabalho especial com redução da carga horária de 30 (trinta) horas em 50% (cinquenta por cento), sem a necessidade de compensação e sem prejuízo da sua remuneração, a fim de que possa dispensar os devidos e necessários cuidados especiais a sua filha portador de deficiência”.
Documentos acompanham o mandamus.
E o necessário.
O mandamus é remédio constitucional adequado para proteger direito líquido e certo “sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça”, conforme dispõe art. 1º da Lei 12.016/2009 c/c inciso LXIX do art. 5º/CF, de modo que para concessão da medida liminar faz-se necessária a presença de fundamentos relevantes (fumus boni iuris) e a possibilidade do ato impugnado resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida (periculum in mora).
Portanto, o deferimento da liminar em mandado de segurança visa resguardar “possível direito da Impetrante”, para tanto basta a este a apresentação de relevantes fundamentos, assim como a possibilidade da ocorrência de dano pelo não acolhimento da medida, vez que não cabe a dilação probatória, vejamos: “Daí que, quando se cogita de direito líquido e certo, para fins do mandado de segurança, o que se considera não é a norma a aplicar, mas a possibilidade imediata de comprovação dos fatos de que o direito subjetivo se originou.
Pode-se, por conseguinte, dizer que há direito líquido e certo quando o titular dispõe de documentos para provar, de plano, a situação fática que lhe permite invocar o direito objetivo ofendido ou ameaçado.
O que importa não é a maior ou menor complexidade da tese jurídica, mas a prova pré-constituída (documental) do seu suporte fático.
Se a demonstração do direito do impetrante estiver na dependência de investigação probatória, ainda a ser feita em juízo, o caso não será de mandado de segurança.
Terá de ser resolvido pelas vias ordinárias.
O procedimento do mandamus é sumário e não contém fase para coleta de outras provas que não as documentais, imediatamente exibíveis.
Enfim, o que se exige é prova pré-constituída das situações e fatos que embasam o direito invocado pelo impetrante. (THEODORO JR., Humberto.
Lei do Mandado de Segurança comentada: artigo por artigo – [2. ed.]. – Rio de Janeiro: Forense, 2019. p. 62).
Pois bem. À vista dos argumentos expostos pela impetrante, observo a presença do direito líquido e certo que enseja na concessão da segurança.
A impetrante pugna pela redução da carga horária em 50% (cinquenta por cento), sem redução da remuneração, para que possa acompanhar os cuidados com a filha menor diagnosticada com Transtorno do Espectro do Autismo – CID 11 6 A02.3, comórbido com o fato de ser não verbal, e com sérias dificuldades em comunicar-se por gestos, e ainda apresenta Transtornos de Processamento Sensorial, ora com hipo-reatividade, ora com hiper-reatividade, conforme ponderado pela médica especialista em neuropediatria, Gisele Reck Claudino – CRM 4199-MT, ID 109021208.
Há ainda documentação acostada no ID 109021221 relatando que a criança realiza acompanhamento psicológico com Análise Aplicada do Comportamento, subscrito pela neuropsicóloga Regiane Mendes Fernandes – CRP 18/02043.
De acordo com as peculiaridades apresentadas, é dever do Estado zelar pela dignidade e bem-estar das pessoas portadores de deficiência ou necessidades especiais, circunstância que se alia a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, promulgada pelo Decreto n. 6.949/09, e ao Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/15), os quais cotejam proteção e assegura os direitos e liberdades fundamentais.
No que tange à especificidade do feito, há de se ponderar a inexistência de previsão legal no âmbito deste Estado, haja vista a inconstitucionalidade declarada por vício formal da Lei Complementar 607/2018.
Entretanto, tal não obsta o deferimento da concessão da segurança.
Pondero que o âmbito federal, a Lei 8.112/90 dispõe acerca da redução da carga horária do servidor que tenha filho portador de deficiência.
Vejamos: “Art. 98.
Será concedido horário especial ao servidor estudante, quando comprovada a incompatibilidade entre o horário escolar e o da repartição, sem prejuízo do exercício do cargo.
Parágrafo único.
Para efeito do disposto neste artigo, será exigida a compensação de horário na repartição, respeitada a duração semanal do trabalho. § 1o Para efeito do disposto neste artigo, será exigida a compensação de horário no órgão ou entidade que tiver exercício, respeitada a duração semanal do trabalho. (Parágrafo renumerado e alterado pela Lei nº 9.527, de 10.12.97) § 2o Também será concedido horário especial ao servidor portador de deficiência, quando comprovada a necessidade por junta médica oficial, independentemente de compensação de horário. (Incluído pela Lei nº 9.527, de 10.12.97) § 3o As disposições do parágrafo anterior são extensivas ao servidor que tenha cônjuge, filho ou dependente portador de deficiência física, exigindo-se, porém, neste caso, compensação de horário na forma do inciso II do art. 44. (Incluído pela Lei nº 9.527, de 10.12.97) § 3o As disposições constantes do § 2o são extensivas ao servidor que tenha cônjuge, filho ou dependente com deficiência. (Redação dada pela Lei nº 13.370, de 2016)”. (grifei).
Atento a este dispositivo legal, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral sobre a matéria: TEMA 1097 - Possibilidade de redução da jornada de trabalho do servidor público que tenha filho ou dependente portador de deficiência, através do julgamento do RE 1237867/SP, dispondo da seguinte forma: Ementa: RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA.
CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA.
TRATADO EQUIVALENTE À EMENDA CONSTITUCIONAL.
PROTEÇÃO INTEGRAL E PRIORITÁRIA À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE.
LEI 12.764/2012.
POLÍTICA NACIONAL DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS DA PESSOA COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA.
PROTEÇÃO E ASSISTÊNCIA DA FAMÍLIA DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA.
REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO SEM ALTERAÇÃO NOS VENCIMENTOS.
SERVIDORA ESTADUAL CUIDADORA DE FILHO AUTISTA.
INEXISTÊNCIA DE LEGISLAÇÃO ESTADUAL.
ANALOGIA AO ART. 98, § 3°, DA LEI 8.112/1990.
LEGITIMIDADE DA APLICAÇÃO DE LEGISLAÇÃO FEDERAL QUANDO A OMISSÃO ESTADUAL OU MUNICIPAL OFENDE DETERMINAÇÃO CONSTITUCIONAL AUTOAPLICÁVEL QUE NÃO ACARRETE AUMENTO DE GASTOS AO ERÁRIO.
PRINCÍPIO DA IGUALDADE SUBSTANCIAL.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE DÁ PROVIMENTO.
FIXAÇÃO DE TESE DE REPERCUSSÃO GERAL.
I – A Carta Política de 1988 fixou a proteção integral e prioritária à criança e ao adolescente, cujas garantias têm sido reiteradamente positivadas em nossa legislação, a exemplo do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8069/1990) e da promulgação da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança (Decreto 99.170/1990).
II – A Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, no § 2° do art. 1° da Lei 12.764/2012, estipulou que eles são considerados pessoas com deficiência, para todos os efeitos legais.
Assim, é incontestável que a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência e a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência aplicam-se também a eles.
III – A Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD) foi assinada pelo Brasil e, por ter sido aprovada de acordo com os ritos previstos no art. 5°, § 3° da Constituição Federal de 1988, suas regras são equivalentes a emendas constitucionais, o que reforça o compromisso internacional assumido pelo País na defesa dos direitos e garantias das pessoas com deficiência.
IV – A CDPD tem como princípio geral o “respeito pelo desenvolvimento das capacidades das crianças com deficiência e pelo direito das crianças com deficiência de preservar sua identidade” (art. 3°, h) e determina que, nas ações relativas àquelas com deficiência, o superior interesse dela receberá consideração primordial (art. 7°, 2).
V – No Preâmbulo (item X), o Tratado é claro ao estabelecer que a família, núcleo natural e fundamental da sociedade, tem o direito de receber não apenas a proteção de todos, mas também a assistência necessária para torná-la capaz de contribuir para o exercício pleno e equitativo dos direitos das pessoas com deficiência.
VI – Os Estados signatários obrigam-se a “adotar todas as medidas legislativas, administrativas e de qualquer outra natureza, necessárias para a realização dos direitos reconhecidos na presente Convenção” (art. 4°, a).
VII – A omissão do Poder Público, portanto, não pode justificar afronta às diretrizes e garantias constitucionais.
Assim, a inexistência de lei estadual específica que preveja a redução da jornada de servidores públicos que tenham filhos com deficiência, sem redução de vencimentos, não serve de escusa para impedir que seja reconhecido a elas e aos seus genitores o direito à dignidade da pessoa humana e o direito à saúde.
VIII – A convivência e acompanhamento familiar para o desenvolvimento e a inclusão das pessoas com deficiência são garantidos pelas normas constitucionais, internacionais e infraconstitucionais, portanto, deve-se aplicar o melhor direito em favor da pessoa com deficiência e de seus cuidadores.
IX – O Superior Tribunal de Justiça já reconheceu que é legítima a aplicação da Lei 8.112/1990 nos casos em que a legislação estatal e municipal for omissa em relação à determinação constitucional autoaplicável que não gere aumento ao erário.
Precedentes.
X – Tendo em vista o princípio da igualdade substancial, previsto tanto em nossa Carta Constitucional quanto na Convenção Internacional sobre o Direito das Pessoas com Deficiência, se os servidores públicos federais, pais ou cuidadores legais de pessoas com deficiência têm o direito a horário especial, sem a necessidade de compensação de horário e sem redução de vencimentos, os servidores públicos estaduais e municipais em situações análogas também devem ter a mesma prerrogativa.
XI – Recurso extraordinário a que se dá provimento.
Fixação de tese: “Aos servidores públicos estaduais e municipais é aplicado, para todos os efeitos, o art. 98, § 2° e § 3°, da Lei 8.112/1990”.
Tema 1097 - Possibilidade de redução da jornada de trabalho do servidor público que tenha filho ou dependente portador de deficiência.
Tese Aos servidores públicos estaduais e municipais é aplicado, para todos os efeitos, o art. 98, § 2° e § 3°, da Lei 8.112/1990.”.
No mesmo sentido é a jurisprudência do e.
Tribunal de Justiça deste Estado: AGRAVO DE INSTRUMENTO - MANDADO DE SEGURANÇA – SERVIDORA PÚBLICA MUNICIPAL – REDUÇÃO DE 50 % DA CARGA HORÁRIA - FILHO COM “TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA” E OUTRAS IMPLICAÇÕES DE SAÚDE ADVINDAS DE “TOXOPLASMOSE CONGÊNITA DURANTE A GESTAÇÃO” - AUSÊNCIA DE LEI MUNICIPAL PREVENDO O DIREITO À REDUÇÃO DA CARGA HORÁRIA - INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA E ANALÓGICA - POSSIBILIDADE - NORMAS FEDERAIS E CONSTITUCIONAIS DE PROTEÇÃO À CRIANÇA VULNERÁVEL – MATÉRIA AFETADA PELO TEMA 1097 DO STF - DECISÃO MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. 1.
A atuação do Poder Judiciário visando suprir a lacuna da lei não configura ofensa ao princípio da legalidade ou ao da separação de poderes, senão interpretação sistemática e analógica dos dispositivos legais vigentes, que regem a tutela dos direitos das pessoas vulneráveis, em especial das crianças e adolescentes que necessitam de proteção especial. 2.
A redução de 50 % (cinquenta por cento) da carga horária da jornada de trabalho, sem redução de remuneração, para a genitora acompanhar e cuidar do filho menor, portador de necessidades especiais, há de ser reconhecida quando em consonância com as normas que regem a matéria. 3.
Hipótese afetada pela matéria tratada no Recurso Extraordinário 1.237.867, que teve repercussão geral reconhecida pelo STF sem determinação da suspensão dos feitos relacionados: Possibilidade de redução da jornada de trabalho do servidor público que tenha filho ou dependente portador de deficiência (Tema 1097). (STF – Plenário Virtual; Leading Case RE 1237867, Relator: Min.
Ricardo Lewandowski, julgado 08/08/2020). (N.U 1017428-97.2020.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIA APARECIDA RIBEIRO, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 30/03/2021, Publicado no DJE 13/04/2021) (grifei).
Em atenção ao acima exposto, é ainda de especial relevância ponderar que o direito que se busca é, em verdade, para amparar a criança, que por sua natureza encontra-se em desenvolvimento, sendo de conhecimento público e notório que as pessoas portadoras de espectro autista passam por diversas terapias, as quais devem ser continuadas, para que progridam nas dificuldades próprias dos transtornos, de modo que a interrupção ou paralisação de tais trazem inúmeros prejuízos ao desenvolvimento.
Isto posto, DEFIRO a segurança vindicada para reduzir a carga horária da impetrante em 50%, sem redução da remuneração, nos termos acima exposto, até ulterior deliberação deste juízo.
Notifiquem-se as Autoridade Impetradas, para, no prazo de 10 (dez) dias, prestem as informações de praxe, e, na oportunidade, intimem-nas do teor desta decisão.
Oficie-se a Procuradoria Geral do Estado sobre a presente decisão, enviando-lhe cópia da inicial, para que, querendo, ingresse no feito, consoante previsão do art. 7º, II da Lei nº 12.016/2009.
Em seguida, abro vistas ao mister do Ministério Público, para, querendo, manifestar-se no presente feito, nos termos do art. 12 da Lei nº 12.016/09.
Após, decorrido o prazo das informações, prestadas ou não, voltam-me os autos conclusos para sentença.
Intimem-se.
Cumpra-se, expedindo-se o necessário.
Flávio Miraglia Fernandes Juiz de Direito -
09/02/2023 14:45
Expedição de Outros documentos
-
09/02/2023 14:45
Expedição de Outros documentos
-
09/02/2023 14:45
Concedida a Medida Liminar
-
03/02/2023 17:13
Conclusos para decisão
-
03/02/2023 17:13
Ato ordinatório praticado
-
03/02/2023 17:12
Juntada de Certidão
-
03/02/2023 17:11
Juntada de Certidão
-
03/02/2023 14:37
Recebido pelo Distribuidor
-
03/02/2023 14:37
Remetidos os Autos por outros motivos da Distribuição ao CENTRAL DE CONTROLE E QUALIDADE DA AUTUAÇÃO
-
03/02/2023 14:37
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
03/02/2023
Ultima Atualização
13/02/2023
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Sentença • Arquivo
Sentença • Arquivo
Outros documentos • Arquivo
Ato Ordinatório • Arquivo
Decisão • Arquivo
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