TJPE - 0039307-55.2022.8.17.2001
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gab. Des. Humberto Costa Vasconcelos Junior
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Partes
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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28/07/2025 11:22
Recebidos os autos
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28/07/2025 11:22
Conclusos para admissibilidade recursal
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28/07/2025 11:22
Distribuído por sorteio
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02/04/2025 00:00
Intimação
Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Seção B da 32ª Vara Cível da Capital Avenida Desembargador Guerra Barreto - Fórum do Recife, S/N, Ilha Joana Bezerra, RECIFE - PE - CEP: 50080-900 - F:(81) 31810503 Processo nº 0039307-55.2022.8.17.2001 AUTOR(A): ELI CARLA LEITE, MARIA JOSE LEITE RÉU: BAIRRO UNIVERSITARIO DE GLORIA DO GOITA SPE LTDA, VIGA MESTRE CONSTRUCAO E DESENVOLVIMENTO URBANO LTDA, ANDERSON FRANKLIN DE MELO, IGOR SERGIO BARRETO DE SOUZA SENTENÇA COM FORÇA DE MANDADO Vistos, etc.
Trata-se de AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL E DEVOLUÇÃO DE QUANTIA PAGA C/C DANOS MATERIAIS E MORAIS, TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA E DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS, proposta por ELI CARLA LEITE, posteriormente integrada por MARIA JOSÉ LEITE por decisão de ID 164800393, em face de BAIRRO UNIVERSITARIO DE GLORIA DO GOITA SPE LTDA, VIGA MESTRE CONSTRUÇÃO E DESENVOLVIMENTO URBANO LTDA, ANDERSON FRANKLIN DE MELO e IGOR SERGIO BARRETO DE SOUZA, todos devidamente qualificados, alegando, em síntese, que: As autoras formalizaram em 11/12/2015 contrato de promessa de compra e venda com os réus para aquisição do Lote 18, situado na Quadra 7 do empreendimento imobiliário denominado LOTEAMENTO BAIRRO UNIVERSITÁRIO, com uma área de 240,00 m², pelo valor total de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais).
Nos termos do contrato, caberia às autoras pagar um sinal de R$ 1.000,00 (um mil reais) e mais R$ 59.000,00 (cinquenta e nove mil reais) em 100 (cem) prestações mensais e sucessivas de R$ 590,00 (quinhentos e noventa reais), com início em 10/01/2016.
Por outro lado, caberia aos réus entregar o empreendimento pronto e acabado em 10/06/2017, conforme cláusula 5.5 do instrumento contratual.
Alegam que os réus não entregaram o empreendimento no prazo ajustado, nem têm previsão de entregá-lo, pois as obras estão paradas, configurando descumprimento contratual.
As autoras afirmam ter adquirido o imóvel com base na propaganda e obrigação contratual de que o empreendimento seria entregue com ruas pavimentadas, área de lazer (campo society, praça de convivência, academia de ginástica, pista de cooper e parquinho para as crianças), energia e água encanada, o que não foi concluído.
Além disso, alegam que começaram a receber cobranças de IPTU do imóvel, tendo inclusive efetuado pagamento referente ao ano de 2020, no valor de R$ 126,67 (cento e vinte e seis reais e sessenta e sete centavos), sem nunca terem se imitido na posse do lote.
Sem interesse na aquisição da unidade imobiliária devido ao descumprimento do prazo de entrega, as autoras solicitaram rescisão contratual via WhatsApp e e-mail em 11/10/2021, sem obter resposta, continuando a receber cobranças das mensalidades e do IPTU.
Em face do exposto, requerem o integral acolhimento da pretensão inicial para: a) CONCEDER o benefício da justiça gratuita; b) CONCEDER tutela de urgência para compelir os réus a se absterem de efetuar qualquer tipo de cobrança relacionada às parcelas do imóvel ou ao contrato, bem como de efetuar restrições ao nome das autoras junto aos órgãos de proteção ao crédito; c) DECLARAR rescindido o contrato de promessa de compra e venda; d) DETERMINAR a devolução integral do valor pago, R$ 48.191,44 (quarenta e oito mil, cento e noventa e um reais e quarenta e quatro centavos); e) CONDENAR os réus ao pagamento de multa contratual por equiparação, referente a juros de 1% a.m. e multa compensatória de 2%, ou alternativamente, lucros cessantes de 0,5% ao mês sobre o valor atualizado do imóvel; f) DECLARAR nula a cláusula 7.3 do contrato, que impõe às autoras o pagamento de IPTU antes da entrega do lote, com consequente ressarcimento do valor pago; g) CONDENAR os réus ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais).
O pedido de gratuidade de justiça foi deferido no ID 103428931.
Devidamente citados, os réus apresentaram contestação no ID 107298074, onde arguiram preliminarmente: a) ilegitimidade passiva de Anderson Franklin de Melo, Igor Sergio Barreto de Souza e Viga Mestre Construção e Desenvolvimento Urbano LTDA, por não terem firmado o contrato com a autora; b) ilegitimidade ativa da autora, por não ser a única compradora do imóvel, havendo litisconsórcio ativo necessário com a Sra.
Maria José Leite.
No mérito, os réus manifestaram concordância com a rescisão contratual, requerendo julgamento antecipado parcial do mérito quanto a este ponto.
Contudo, argumentam que: a) o valor efetivamente pago pela autora foi de R$ 46.502,35 (quarenta e seis mil quinhentos e dois reais e trinta e cinco centavos); b) o atraso na obra decorreu de força maior, pela demora na execução de serviços por concessionárias públicas (Celpe e Compesa); c) inexiste abusividade na cláusula contratual que prevê prorrogação da entrega em caso de força maior; d) em caso de rescisão contratual, deve haver retenção de 25% do valor pago, segundo entendimento do STJ; e) não há lucros cessantes a serem indenizados, havendo incompatibilidade entre o pedido de rescisão contratual e o pedido de lucros cessantes; f) não há previsão contratual para fixação de multa por atraso; g) inexistem danos morais, pois o mero atraso na entrega de obra não gera dano moral indenizável; h) eventual condenação deve ser atualizada pela tabela ENCOGE, não pelo IGP-M; i) a cláusula 7.3 do contrato, que prevê responsabilidade do comprador pelo pagamento de IPTU, é válida.
A autora apresentou réplica no ID 169317352, refutando todas as preliminares e argumentos dos réus.
Quanto à ilegitimidade passiva, alega que Anderson Franklin de Melo e Igor Sergio Barreto de Souza figuraram como vendedores no contrato, e a Viga Mestre Construção foi a construtora responsável pelo empreendimento.
Sobre a ilegitimidade ativa, informa que a litisconsorte já está habilitada nos autos (ID 142336551).
No mérito, a autora impugna a tabela de pagamentos apresentada pelos réus, confirma o descumprimento do prazo contratual, argumenta que não cabe retenção de valores porque a culpa pela rescisão é exclusiva dos réus, defende a possibilidade de reversão da cláusula penal estipulada unilateralmente e a compatibilidade entre rescisão contratual e lucros cessantes, reitera o pedido de danos morais pela frustração do sonho da casa própria, insiste na utilização do IGP-M previsto contratualmente, e reafirma a nulidade da cláusula que impõe pagamento de IPTU antes da entrega do imóvel.
Por decisão de ID 164800393, foi determinada a retificação do polo ativo para incluir Maria José Leite, e as partes foram intimadas para manifestarem eventual interesse na produção de provas, não havendo requerimentos adicionais.
Vieram-me os autos conclusos. É o que basta relatar.
Decido. 1.
Do julgamento antecipado da lide.
O feito comporta julgamento antecipado, na forma do Art.355, I, do Diploma de Ritos. É que, compulsando os elementos produzidos pelas partes, se infere desnecessária a dilação probatória, porquanto as alegações controvertidas encontram-se elucidadas pela prova documental apresentada.
Eventual produção de prova oral ou pericial não terá o condão de trazer quaisquer esclarecimentos relevantes para seu deslinde.
Encontra-se pacificado na doutrina e na jurisprudência que o julgador, visualizando nos autos elementos suficientes para a apreciação das questões postas pelas partes, pode dispensar a produção de quaisquer outras provas, ainda que já tenha saneado o processo, e julgar antecipadamente a lide, sem que isso configure cerceamento de defesa (Theotônio Negrão.
Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor. 31ª Edição.
São Paulo: Saraiva, p. 397).
Nessa diretiva, Cândido Rangel Dinamarco é preciso ao pontuar: “a razão pela qual se permite a antecipação do julgamento do mérito é invariavelmente a desnecessidade de produzir provas.
Os dois incisos do Art. 330 desmembram essa causa única em várias hipóteses, mediante uma redação cuja leitura deve ser feita com a consciência de que só será lícito privar as partes de provar quando as provas não forem necessárias ao julgamento” (Instituições de Direito Processual Civil, Vol.
III.
São Paulo: Malheiros, p.555).
Na mesma linha de raciocínio, o STF firmou entendimento de que “a necessidade de produção de prova há de ficar evidenciada para que o julgamento antecipado da lide implique em cerceamento de defesa.
A antecipação é legítima se os aspectos decisivos estão suficientemente líquidos para embasar o convencimento do magistrado” (STF - RE 101171, Relator Min.
Francisco Rezek, Segunda Turma, julgado em 05/10/1984, DJ 07-12-1984, p.20990).
Para a Corte, “o propósito de produção de provas não obsta ao julgamento antecipado da lide, se os aspectos decisivos da causa se mostram suficientes para embasar o convencimento do magistrado (STF -RE 96725/RS, Rel.
Min.
Rafael Mayer).
Presentes as condições que ensejam o julgamento antecipado da causa, é dever do juiz, e não mera faculdade, assim proceder. (STJ.
REsp n°2.832-RJ, Rel.
Min.
Sálvio de Figueiredo, QUARTA TURMA).
No mesmo sentido: RSTJ 102/500 e RT 782/302. 2.
Preliminares 2.1 Da ilegitimidade passiva alegada pelos réus Anderson Franklin de Melo, Igor Sergio Barreto de Souza e Viga Mestre Construção e Desenvolvimento Urbano LTDA Os réus Anderson Franklin de Melo, Igor Sergio Barreto de Souza e Viga Mestre Construção e Desenvolvimento Urbano LTDA argumentam que são partes ilegítimas para figurar no polo passivo da demanda, sob o fundamento de que não teriam celebrado diretamente o contrato de promessa de compra e venda com as autoras, afirmando que o negócio jurídico foi firmado apenas entre as autoras e a ré Bairro Universitário de Glória do Goitá SPE LTDA.
A análise dos autos, contudo, revela situação distinta.
Ao examinar o contrato de promessa de compra e venda juntado aos autos (ID 103394934), verifico que os réus Anderson Franklin de Melo e Igor Sergio Barreto de Souza figuram claramente como vendedores no instrumento contratual, tendo inclusive assinado o documento nessa qualidade, conforme apontado pela parte autora em sua réplica.
No que diz respeito à ré Viga Mestre Construção e Desenvolvimento Urbano LTDA, embora não conste expressamente no contrato como vendedora, há elementos que demonstram sua participação efetiva no empreendimento.
Conforme documentos juntados pelas autoras (ID 103394937 e 103394939), essa empresa atuou como construtora responsável pelo empreendimento e realizava tratativas diretas com as adquirentes, participando ativamente da relação negocial.
Importante destacar que nas relações de consumo, como a que se estabelece no caso em análise (aquisição de imóvel em loteamento), aplica-se a teoria da aparência e o princípio da solidariedade entre todos os integrantes da cadeia de fornecimento, nos termos dos artigos 7º, parágrafo único, e 25, §1º, do Código de Defesa do Consumidor: "Art. 7º [...] Parágrafo único.
Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo." "Art. 25 [...] § 1° Havendo mais de um responsável pela causação do dano, todos responderão solidariamente pela reparação prevista nesta e nas seções anteriores." Nesse contexto, todos aqueles que de alguma forma participaram da relação negocial, seja como vendedores diretos, construtores ou incorporadores, devem responder solidariamente perante o consumidor pelos danos causados, inclusive pelo eventual descumprimento contratual.
Ademais, no caso específico dos sócios Anderson Franklin de Melo e Igor Sergio Barreto de Souza, não se trata de desconsideração da personalidade jurídica, como erroneamente argumentado, mas da responsabilidade direta decorrente de sua atuação como vendedores no contrato objeto da lide.
Dessa forma, rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pelos réus Anderson Franklin de Melo, Igor Sergio Barreto de Souza e Viga Mestre Construção e Desenvolvimento Urbano LTDA. 2.2.
Da ilegitimidade ativa da autora Eli Carla Leite Os réus também suscitaram a ilegitimidade ativa da autora Eli Carla Leite, sob o argumento de que existiria litisconsórcio ativo necessário com Maria José Leite, que também figura como compradora no contrato de promessa de compra e venda.
Ocorre que, no curso da presente ação, especificamente por meio da petição de ID 142336551, Maria José Leite manifestou expressamente seu interesse em aderir à ação como litisconsorte ativa, tendo sido devidamente integrada ao polo ativo da demanda por decisão judicial proferida no ID 164800393.
Considerando que a questão foi prontamente sanada com a integração da litisconsorte ao processo, tendo sido inclusive determinada a retificação do polo ativo para incluir Maria José Leite, não subsiste a alegada ilegitimidade ativa, ficando prejudicada esta preliminar. 3.
Mérito 3.1.
Da concordância dos réus com a rescisão contratual De início, observo que os réus manifestaram expressamente concordância com a rescisão do contrato de promessa de compra e venda objeto da lide (ID 107298074), mantendo controvérsia apenas quanto aos efeitos financeiros daí decorrentes.
Considerando que o pedido de rescisão contratual constitui o núcleo central da presente ação e que sobre ele não há controvérsia, reconheço a procedência deste pedido específico. 3.2.
Dos valores efetivamente pagos pelas autoras Quanto ao valor efetivamente pago pelas autoras, há divergência entre as partes.
Enquanto as autoras alegam ter efetuado pagamentos no montante de R$ 48.191,44 (quarenta e oito mil, cento e noventa e um reais e quarenta e quatro centavos), conforme detalhamento e comprovantes juntados no ID 103394935, os réus sustentam que o valor pago foi de R$ 46.502,35 (quarenta e seis mil, quinhentos e dois reais e trinta e cinco centavos), segundo extrato de pagamento por eles apresentado (ID 107299690).
Contudo, ao analisar os referidos comprovantes, verifica-se que a maioria deles encontra-se em condição extremamente precária de legibilidade, dificultando ou mesmo inviabilizando a identificação clara de elementos essenciais, como: valor, data do pagamento, código de barras, destinatário e vínculo com o contrato discutido nos autos.
Trata-se, em sua grande parte, de fotografias de boletos impressos com baixo contraste, amassados ou parcialmente ofuscados, o que compromete a confiabilidade da prova apresentada.
De outro lado, os réus trouxeram aos autos o documento ID 107299690, que consiste em extrato detalhado de pagamento com discriminação das parcelas quitadas, datas, valores e variações de índice, o qual se mostra coerente com os termos do contrato de promessa de compra e venda, tanto em relação ao número de parcelas quanto aos reajustes aplicáveis conforme índice pactuado (IGP-M).
Embora se trate de documento unilateralmente produzido, não se pode desconsiderar sua força probatória quando respaldado por coerência interna e ausência de prova robusta em sentido contrário.
Além disso, a regularidade dos lançamentos constantes na planilha apresentada pelos réus pode ser inferida a partir do próprio contrato, especialmente no que diz respeito à forma de pagamento prevista — 100 parcelas mensais com valores iniciais de R$ 590,00, reajustados ao longo do tempo —, estando os valores listados no extrato compatíveis com essa sistemática contratual.
Dessa forma, diante da ausência de documentos inequívocos e legíveis por parte das autoras para comprovar valor superior, e considerando que o extrato apresentado pelos réus apresenta dados compatíveis com a dinâmica contratual, reconheço como valor efetivamente pago o montante de R$ 46.502,35, conforme informado pelos demandados. 3.3.
Da abusividade da cláusula de prorrogação indeterminada da entrega da obra e do inadimplemento dos réus A cláusula 5.7 do contrato de promessa de compra e venda (ID 103394934) prevê a possibilidade de prorrogação do prazo de entrega do imóvel em caso de ocorrência de caso fortuito ou força maior, sem estabelecer um limite temporal para essa prorrogação.
Tal disposição contratual caracteriza-se como abusiva, nos termos do art. 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor, por estabelecer obrigações consideradas excessivamente desvantajosas ao consumidor, incompatíveis com a boa-fé e a equidade.
Ao permitir a prorrogação por prazo indeterminado, a cláusula transfere ao consumidor os riscos do negócio que deveriam ser suportados exclusivamente pelo fornecedor, desequilibrando significativamente a relação contratual.
Nesse sentido, destaco precedente: "Ementa: APELAÇÃO.
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
AÇÃO DE CONHECIMENTO.
COMPRA E VENDA DE UNIDADE IMOBILIÁRIA .
ATRASO NA ENTREGA.
EFEITOS DA PANDEMIA DA COVID-19.
PARALISAÇÃO DA OBRA.
NÃO COMPROVADA .
CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR.
NÃO CONFIGURADOS.
RISCO DO EMPREENDIMENTO.
INADIMPLEMENTO .
MULTA CONTRATUAL.
RECURSOS CONHECIDO E DESPROVIDO. (...) Na espécie, incumbia à parte ré comprovar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, na forma do art. 373, II, do CPC, por meio da demonstração de evento imprevisível e inevitável hábil a caracterizar caso fortuito e, por conseguinte, afastar sua responsabilização pela mora na entrega da obra.
No entanto, observa-se do exame dos autos que a requerida não foi capaz de se desincumbir do ônus probatório que lhe cabia. (...) 5.
As Escrituras Públicas acostadas ao feito - referentes ao desabastecimento de piso cerâmico e à redução do número de funcionários da construtora - não são, por si sós, capazes de justificar o atraso na conclusão e entrega da obra.
Ainda que se considerasse estarem comprovadas as alegações da ré, a jurisprudência deste e.
Tribunal de Justiça já se consolidou no sentido de que a escassez de insumos ou de mão de obra não configura justificativa apta a afastar o inadimplemento decorrente do atraso nas obras no ramo da construção civil, sob justificativa de caso fortuito ou força maior, porquanto o prazo estipulado para a construção deve abranger eventuais imprevistos, que constituem riscos inerentes à atividade exercida pela pessoa jurídica. (TJ-DF 0701728-03 .2023.8.07.0020 1787074, Relator.: SANDRA REVES, Data de Julgamento: 16/11/2023, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: 01/12/2023) Para além disso, consoante o julgamento do AgInt no AREsp 1.253.328/AM, relator Ministro Raul Araújo (j. 04/03/2024), o STJ reafirmou que: “É válida a cláusula de tolerância, desde que limitada ao prazo de 180 dias corridos” e que “o atraso na entrega do imóvel, por si só, não enseja danos morais, salvo se presentes circunstâncias excepcionais”.
Quanto à alegação dos réus de que o atraso decorreu de força maior, devido à demora na execução de serviços por concessionárias públicas (Celpe e Compesa), observo que tal argumento não se sustenta.
Isso porque a jurisprudência pacífica reconhece que tais circunstâncias constituem fortuito interno, inerente à atividade empresarial desenvolvida, não afastando a responsabilidade do fornecedor.
Ressalte-se que os réus não trouxeram aos autos nenhuma prova concreta do alegado atraso por parte das concessionárias, limitando-se a alegações genéricas, insuficientes para comprovar a excludente de responsabilidade.
No caso concreto, restou inconteste que o prazo contratual para entrega do empreendimento era 10/06/2017 (cláusula 5.5), e que, passados mais de cinco anos da data prevista, o empreendimento ainda não foi entregue conforme contratado.
As fotografias apresentadas pelos réus (ID 107299687 e ID 107299688) não comprovam conclusão das obras conforme o compromisso assumido, que incluía ruas pavimentadas, área de lazer com campo society, praça de convivência, academia de ginástica, pista de cooper e parquinho para crianças, energia e água encanada.
Portanto, declaro a nulidade da cláusula 5.7 do contrato, que prevê prazo de tolerância indeterminado, e reconheço a mora dos réus no cumprimento de sua obrigação contratual. 3.4.
Da Devolução Integral Ou Parcial Dos Valores Pagos Reconhecida a rescisão contratual por culpa exclusiva dos réus, cabe analisar se os valores pagos pelas autoras devem ser restituídos integralmente ou se é cabível alguma retenção.
A Súmula 543 do Superior Tribunal de Justiça estabelece que: "Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento." No caso em análise, ficou evidenciado que a rescisão contratual se deu por culpa exclusiva dos réus, que não cumpriram o prazo de entrega do empreendimento, configurando inadimplemento contratual.
Não há que se falar, portanto, em problemas financeiros das autoras como causa da rescisão, como alegado pelos réus, uma vez que o pedido de rescisão foi feito em outubro de 2021, mais de quatro anos após o prazo contratual de entrega.
Assim, com base na Súmula 543 do STJ, as autoras têm direito à restituição integral dos valores pagos, sem qualquer retenção em favor dos réus. 3.5.
Da Multa Contratual Por Equiparação E Lucros Cessantes As autoras pleiteiam, alternativamente, a condenação dos réus ao pagamento de multa contratual por equiparação (inversão da cláusula penal prevista apenas para o caso de inadimplemento do comprador) ou lucros cessantes no percentual de 0,5% ao mês sobre o valor atualizado do contrato.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça reconhece que, em caso de atraso na entrega de imóvel, os lucros cessantes são presumidos, independentemente da comprovação de efetivo prejuízo.
Tal entendimento foi sedimentado na Súmula 147 do Tribunal de Justiça de Pernambuco, que dispõe: "Descumprido o prazo para a entrega do imóvel objeto do compromisso de compra e venda, é cabível condenação da vendedora por lucros cessantes, havendo a presunção de prejuízo do adquirente, independentemente da finalidade do negócio." Nesse sentido, o STJ tem reiteradamente decidido: "O Superior Tribunal de Justiça entende que presumíveis os lucros cessantes no caso de atraso na entrega da obra." (AgInt nos EDcl no AREsp: 1552244 PR 2019/0219719-5, Rel.
Min.
Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 01/06/2020) Importante esclarecer que, mesmo nos casos de rescisão contratual, como o presente, permanece o direito à indenização pelos lucros cessantes referentes ao período em que o contrato esteve vigente mas não foi cumprido pelo vendedor.
Isso porque a indenização corresponde à privação injusta do uso do bem durante o período de mora da construtora, sendo devida independentemente da posterior rescisão.
Ao contrário do que alegam os réus, não há incompatibilidade entre o pedido de rescisão contratual e o de lucros cessantes pelo período de atraso anterior à rescisão.
O desfazimento do contrato não impede a incidência de indenização relativa ao período da mora, conforme já decidiu o STJ no REsp 1.740.911/DF.
Sob o enfoque do Código de Defesa do Consumidor, cabe destacar que o art. 25 veda a estipulação contratual de cláusula que impossibilite, exonere ou atenue a obrigação de indenizar.
No mesmo sentido, o art. 51, inciso I, considera nula de pleno direito a cláusula que impossibilite, exonere ou atenue a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos ou serviços.
No caso em análise, verifico que o atraso se estendeu por 52 meses - de 10/06/2017 (data prevista para entrega) até 11/10/2021 (data do pedido de rescisão) - tempo excessivamente longo que privou as autoras do uso e fruição do imóvel adquirido.
Desta forma, acolho o pedido alternativo de lucros cessantes, fixando-os no patamar de 0,5% ao mês sobre o valor contratual atualizado (R$ 60.000,00), para cada mês de mora a partir de 10/06/2017 até 11/10/2021 (52 meses).
Esse valor deverá ser monetariamente corrigido pelos índices da tabela ENCOGE[1] desde o efetivo prejuízo (Súmula 43 do STJ), e acrescido de juros de mora à base de 1% ao mês desde a citação, até o início da produção de efeitos da Lei 14.905/2024, a partir de quando deverá incidir o IPCA como índice de correção monetária e a Taxa Selic (deduzido o índice de atualização monetária – IPCA) para fins de juros moratórios. até o efetivo pagamento, conforme dispõe o artigo 405 do Código Civil. 3.6.
Da nulidade da cláusula 7.3 do contrato e da restituição do IPTU pago A cláusula 7.3 do contrato prevê a responsabilidade das compradoras pelo pagamento do IPTU desde a assinatura do contrato, mesmo sem a entrega do imóvel.
Tal disposição contratual se mostra abusiva e contrária ao Código de Defesa do Consumidor, pois impõe às compradoras obrigação desproporcional e desarrazoada, uma vez que o IPTU, sendo um tributo vinculado à propriedade e posse do imóvel, só deveria ser exigível após a efetiva entrega das chaves e imissão na posse.
Nesse sentido, destaco precedente do Tribunal de Justiça de Pernambuco: “A obrigação do adquirente com o pagamento do IPTU e do CONDOMÍNIO inicia-se quando lhe é dada a posse do imóvel, mediante a entrega das chaves.
A efetiva posse do imóvel, com a entrega das chaves, define o momento a partir do qual surge para o adquirente a obrigação de efetuar o pagamento das despesas condominiais e do IPTU, sendo a construtora/incorporadora a responsável pelo pagamento dessas despesas antes desse momento.” (TJ-PE - AC: 00043336520178172001, Relator.: ANTENOR CARDOSO SOARES JUNIOR, Data de Julgamento: 21/12/2020, Gabinete da 1ª Vice Presidência Segundo Grau) Assim, declaro a nulidade da cláusula 7.3 do contrato e reconheço o direito das autoras à restituição do valor de R$ 126,67 (cento e vinte e seis reais e sessenta e sete centavos) pago a título de IPTU referente ao ano de 2020, devidamente atualizado. 3.7.
Dos danos morais Por fim, quanto ao pedido de indenização por danos morais, entendo que o mero atraso na entrega do imóvel, por si só, não gera dano moral indenizável, conforme entendimento consolidado no âmbito do E.
STJ: “(...) o simples inadimplemento contratual em razão do atraso na entrega do imóvel não é capaz, por si só, de gerar dano moral indenizável.
Entretanto, sendo considerável o atraso, alcançando longo período de tempo, pode ensejar o reconhecimento de dano extrapatrimonial" (AgInt nos EDcl no AREsp 676.952/RJ, Relator Ministro RAUL ARAÚJO, Quarta Turma, julgado em 27/3/2023, DJe de 3/4/2023).
Contudo, no caso em análise, verifico que as circunstâncias extrapolam o mero inadimplemento contratual.
O atraso substancial de mais de quatro anos sem qualquer perspectiva concreta de conclusão das obras, somado à negativa dos réus em resolver a situação quando solicitado o distrato e à continuidade das cobranças mesmo após o pedido de rescisão, configura situação excepcional que ultrapassa o mero aborrecimento cotidiano.
Nesse sentido: O excessivo atraso na entrega de unidade imobiliária enseja compensação por dano extrapatrimonial. 3.
Agravo interno no recurso especial não provido. (STJ - AgInt nos EDcl no REsp: 1816498 DF 2019/0139897-4, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 28/10/2019, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 30/10/2019) Entendo, portanto, caracterizado o dano moral, sendo adequado o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), montante que se mostra razoável e proporcional às circunstâncias do caso, servindo tanto para compensar o abalo moral sofrido quanto para desestimular a reiteração da conduta pelos réus. 4.
Dispositivo Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC, para: a) Declarar rescindido o contrato de promessa de compra e venda firmado entre as partes relativo ao Lote 18, da Quadra 7, do empreendimento Loteamento Bairro Universitário, em Glória do Goitá/PE; b) Condenar solidariamente BAIRRO UNIVERSITÁRIO DE GLORIA DO GOITÁ SPE LTDA e VIGA MESTRE CONSTRUÇÃO E DESENVOLVIMENTO URBANO LTDA à devolução às autoras do valor de R$ 46.502,35 (quarenta e seis mil, quinhentos e dois reais e trinta e cinco centavos), devidamente atualizado monetariamente pelo acrescido de correção monetária pela tabela ENCOGE desde o desembolso e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês a partir da citação até o início da produção de efeitos da Lei 14.905/2024, que ocorrerá após 60 (sessenta) dias de sua publicação em 01/07/2024, a partir de quando deverá incidir o IPCA como índice de correção monetária e a Taxa Selic (deduzido o índice de atualização monetária – IPCA) para fins de juros moratórios; c) Condenar solidariamente BAIRRO UNIVERSITÁRIO DE GLORIA DO GOITÁ SPE LTDA e VIGA MESTRE CONSTRUÇÃO E DESENVOLVIMENTO URBANO LTDA, ao pagamento de lucros cessantes, fixados no percentual de 0,5% ao mês sobre o valor do contrato (R$ 60.000,00) devidamente atualizado pelos índices da tabela ENCOGE mês a mês, para cada mês de mora compreendido entre 10/06/2017 (data prevista para entrega do imóvel) até 11/10/2021 (data do pedido de rescisão contratual), acrescido de correção monetária pelo mesmo índice desde o efetivo prejuízo e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês a partir da citação até o início da produção de efeitos da Lei 14.905/2024, que ocorrerá após 60 (sessenta) dias de sua publicação em 01/07/2024, a partir de quando deverá incidir o IPCA como índice de correção monetária e a Taxa Selic (deduzido o índice de atualização monetária – IPCA) para fins de juros moratórios; d) Declarar a nulidade da cláusula 5.7 do contrato, que prevê prorrogação da entrega por prazo indeterminado, reconhecendo a mora dos réus no cumprimento da obrigação de entrega do imóvel; e) Declarar a nulidade da cláusula 7.3 do contrato, que impõe às autoras o pagamento do IPTU antes da entrega do imóvel, e condenar os réus à restituição do valor de R$ 126,67 (cento e vinte e seis reais e sessenta e sete centavos), atualizado pelo IGP-M/FGV desde o desembolso e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês desde a citação; f) Condenar os réus ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais).
Tal montante deverá ser atualizado pelos índices da tabela não expurgada de referência para a Justiça Estadual (ENCOGE) a partir desta decisão (Súmula 362, do STJ) e acrescida de juros de mora de 1% a.m. (um por cento ao mês) a contar da citação até o início da produção de efeitos da Lei 14.905/2024, que ocorrerá após 60 (sessenta) dias de sua publicação em 01/07/2024, a partir de quando deverá incidir o IPCA como índice de correção monetária e a Taxa Selic (deduzido o índice de atualização monetária – IPCA) para fins de juros moratórios; g) Condenar os réus ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, §2º, do CPC.
No caso de oposição de embargos de declaração manifestamente protelatórios (inclusive voltados à mera rediscussão do julgado), aplicar-se-á multa de até 2% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 1.026, §2º, do CPC, e, em caso de reincidência, a multa será elevada em até 10%, nos termos do §3º do mesmo artigo.
Interposta a apelação, tendo em vista a nova sistemática estabelecida pelo CPC, que extinguiu o juízo de admissibilidade a ser exercido pelo Juízo "a quo" (Art. 1.010 do CPC), sem nova conclusão, intime-se a parte contrária para que ofereça resposta no prazo de 15 (quinze) dias.
Havendo recurso adesivo, também deve ser intimada a parte contrária para oferecer contrarrazões.
Após, remetam-se os autos ao egrégio Tribunal.
Publique-se e intimem-se.
Certificado o trânsito, arquivem-se os autos definitivamente.
Via eletronicamente assinada servirá como expediente de comunicação processual.
Recife (PE), 01 de abril de 2025.
Andréa Duarte Gomes Juíza de Direito 3 [1] Antes da vigência da Lei 14.905/2024, devem ser aplicados os índices da tabela ENCOGE, chancelado pelo E.
TJPE como índice que melhor reflete as variações inflacionárias, conforme inciso I do Art. 3º da Instrução de Serviço/TJPE nº 08/2011, que assim dispõe: Art. 3º Para a atualização monetária, caso não seja determinado de outra forma na decisão, deverão ser utilizadas as seguintes tabelas de fatores de atualização monetária, com observância das notas explicativas que as acompanham: I – Débitos em geral: tabela aprovada pelo 11º Encontro do Colégio de Corregedores Gerais de Justiça Estaduais (ENCOGE), adotada pela Corregedoria Geral da Justiça desde 1997 e que pode ser encontrada no site de seu autor, Gilberto Melo, em www.gilbertomelo.com.br/jebr_n.php
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
28/07/2025
Ultima Atualização
02/04/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
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