TJPI - 0807017-77.2023.8.18.0032
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gabinete da Desa. Lucicleide Pereira Belo
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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23/04/2025 09:54
Arquivado Definitivamente
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23/04/2025 09:54
Baixa Definitiva
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23/04/2025 09:54
Remetidos os Autos (outros motivos) para a instância de origem
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23/04/2025 09:53
Transitado em Julgado em 16/04/2025
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23/04/2025 09:53
Expedição de Certidão.
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23/04/2025 02:23
Decorrido prazo de BANCO BRADESCO S.A. em 15/04/2025 23:59.
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25/03/2025 10:01
Juntada de manifestação
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25/03/2025 00:11
Publicado Intimação em 25/03/2025.
-
25/03/2025 00:11
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 25/03/2025
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24/03/2025 00:00
Intimação
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ ÓRGÃO JULGADOR : 3ª Câmara Especializada Cível APELAÇÃO CÍVEL (198) No 0807017-77.2023.8.18.0032 APELANTE: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A, BANCO BRADESCO S.A.
Advogado(s) do reclamante: WILSON SALES BELCHIOR APELADO: JOSE PEREIRA DE ANDRADE Advogado(s) do reclamado: ISADORA SANTOS LUZ LEAL NEIVA RELATOR(A): Desembargadora LUCICLEIDE PEREIRA BELO EMENTA Ementa: DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.
CONSUMIDOR ANALFABETO.
AUSÊNCIA DE ASSINATURA A ROGO E TESTEMUNHAS.
NULIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO.
RESTITUIÇÃO EM DOBRO DOS VALORES INDEVIDAMENTE DESCONTADOS.
DANO MORAL CONFIGURADO.
COMPENSAÇÃO DO VALOR EFETIVAMENTE CREDITADO.
PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO.
I.
CASO EM EXAME 1.
Apelação cível interposta por instituição financeira contra sentença que declarou a nulidade de contrato de empréstimo consignado firmado por consumidora analfabeta, determinando a cessação dos descontos em seus proventos, a restituição em dobro dos valores indevidamente cobrados e a indenização por danos morais no valor de R$ 2.000,00.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.
Há duas questões em discussão: (i) definir se a ausência de assinatura a rogo e a falta de subscrição por duas testemunhas invalidam o contrato firmado por pessoa analfabeta; e (ii) estabelecer se a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente e a indenização por danos morais são devidos.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 3.
A relação jurídica entre as partes se submete às normas do Código de Defesa do Consumidor, sendo a instituição financeira fornecedora de serviços, nos termos dos arts. 3º e 14 do CDC, o que impõe sua responsabilidade objetiva. 4.
A inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC, se justifica pela hipossuficiência técnica e econômica da consumidora, cabendo ao banco demonstrar a regularidade da contratação. 5.
A formalização de contrato escrito por pessoa analfabeta exige a assinatura a rogo por terceiro, na presença de duas testemunhas, nos termos do art. 595 do Código Civil, sob pena de nulidade do negócio jurídico. 6.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça estende a exigência formal do art. 595 do CC a todos os contratos escritos firmados por analfabetos, como forma de proteger sua vulnerabilidade informacional. 7.A nulidade do contrato implica a ilegalidade dos descontos efetuados, tornando cabível a repetição do indébito em dobro, conforme o art. 42, parágrafo único, do CDC, e jurisprudência consolidada no STJ (EAREsp nº 676.608/RS). 8.
O dano moral decorre in re ipsa da cobrança indevida sobre benefício previdenciário de caráter alimentar, sendo desnecessária a comprovação de abalo emocional específico. 9.
O valor da indenização por danos morais, fixado em R$ 2.000,00, atende aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando a situação econômica das partes e a gravidade do ilícito. 10.
Deve ser compensado do montante a ser restituído o valor efetivamente creditado na conta da consumidora, a fim de evitar o enriquecimento ilícito.
IV.
DISPOSITIVO E TESE 11.
Recurso parcialmente provido.
Tese de julgamento: 1.
A ausência de assinatura a rogo e a falta de subscrição por duas testemunhas tornam nulo o contrato escrito firmado por pessoa analfabeta, mesmo que haja prova do crédito do valor na conta do consumidor. 2.
A nulidade do contrato implica a repetição em dobro dos valores indevidamente descontados, conforme o art. 42, parágrafo único, do CDC. 3.
O desconto indevido em benefício previdenciário caracteriza dano moral in re ipsa, cabendo indenização sem necessidade de comprovação de abalo emocional específico. 4.
O valor efetivamente creditado na conta do consumidor deve ser compensado dos valores a serem restituídos pela instituição financeira, evitando o enriquecimento sem causa.
Dispositivos relevantes citados: Código de Defesa do Consumidor, arts. 3º, 6º, VIII, 14 e 42, parágrafo único; Código Civil, art. 595.
Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula nº 297; STJ, REsp 1907394/MT, Rel.
Min.
Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 04/05/2021; STJ, EAREsp nº 676.608/RS; TJPI, Súmula nº 30.
ACÓRDÃO Acordam os componentes da 3ª Câmara Especializada Cível, do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, por unanimidade, conhecer e dar parcial provimento ao recurso, nos termos do voto do(a) Relator(a).
RELATÓRIO
Vistos.
Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta por BANCO BRADESCO S.A contra sentença proferida nos autos da AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, MATERIAIS E EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS.
Em sentença, o d. juízo de 1º grau julgou procedente a demanda, com resolução de mérito, nos seguintes termos: “Ante o exposto, ACOLHO os pedidos articulados na inicial para, como consectário lógico: a) DECLARAR a inexistência dos negócios jurídicos discutidos nesta ação (Contratos n° 814706971) e, por consectário lógico, determinar que o demandado se abstenha de descontar os respectivos valores a título de pagamento de quaisquer empréstimos ainda ativos nos proventos da autora; b) CONDENAR o banco réu na obrigação de restituir em dobro as parcelas auferidas de modo ilícito, devidamente corrigida pelo INPC a partir de cada evento danoso e com juros mensais de 1% (um por cento) a.m. nos moldes da Súmula n° 54 do STJ, cujo montante deverá ser apurado em eventual liquidação desta sentença dada a impossibilidade de fazê-lo neste momento; e c) CONDENAR o demandado na obrigação de pagar R$ 2.000,00 (dois mil reais) , a título de indenização por danos morais, com incidência de juros de 1% (um por cento) a.m. e de correção monetária pelo INPC, respectivamente, na forma do art. 398 do Código Civil e da Súmula n° 362 do STJ.
Condeno a parte ré nas custas e despesas processuais e honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação”.
Em suas razões recursais, a parte apelante alega que a sentença deve ser reformada, pois a instituição financeira não cometeu qualquer ato ilícito, tendo agido de acordo com a legislação vigente.
Sustenta a validade do contrato firmado entre as partes, bem como a inexistência de responsabilidade objetiva do banco, vez que não houve falha na prestação do serviço.
Alega, ainda, a impossibilidade da repetição do indébito em dobro, ante a ausência de prova de pagamento indevido por erro do consumidor.
Defende a inexistência de dano moral, argumentando que não houve comprovação de abalo emocional relevante.
Por fim, caso mantida a condenação, pugna pela redução do valor fixado a título de danos morais, em razão dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
Em contrarrazões, a parte apelada alega que os descontos indevidos foram realizados sem sua anuência e sem qualquer comprovação da transferência dos valores do empréstimo em seu favor.
Sustenta que a sentença recorrida está em consonância com a jurisprudência aplicável, inclusive com a Súmula 18 do TJPI, que prevê a nulidade do contrato em caso de não comprovação da transferência do valor contratado para a conta bancária do consumidor.
Afirma, ainda, que a inversão do ônus da prova foi corretamente aplicada, dada a sua hipossuficiência técnica e econômica frente à instituição financeira.
Requer a manutenção integral da sentença.
Desnecessária a remessa dos autos ao Ministério Público Superior, por não existir razão de fato e/ou de direito que justifique sua intervenção.
Preenchidos os requisitos legais, recebo o recurso nos efeitos suspensivo e devolutivo.
VOTO I.
REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE Recurso tempestivo e formalmente regular.
Preparo recursal recolhido.
Preenchidos os demais requisitos necessários à admissibilidade recursal, CONHEÇO do apelo.
II.
MÉRITO Trata-se de ação objetivando a declaração de nulidade de contrato de empréstimo, bem como indenização pelos danos morais e materiais sofridos pela parte autora/apelada, sob a alegação de nulidade do contrato, por não atender os requisitos formais previstos na lei.
De início, vale ressaltar que a matéria em discussão é regida pelas normas pertinentes ao Código de Defesa do Consumidor, porquanto a instituição financeira caracteriza-se como fornecedor de serviços, razão pela qual, sua responsabilidade é objetiva, nos termos dos arts. 3º e 14, da supracitada legislação, como veremos a seguir: Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. (…) Art. 14.
O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. §1º.
O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I - o modo de seu fornecimento; II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam; §2º.
Omissis; §3º.
O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
Além disso, esta questão já foi sumulada pelo Superior Tribunal de Justiça, na Súmula nº 297: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”.
Diante da incidência da norma consumerista à hipótese em apreço, é cabível a aplicação da regra constante do art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor no tocante ao ônus probatório. É que, como cediço, o instituto da inversão do ônus da prova confere ao consumidor a oportunidade de ver direito subjetivo público apreciado, facilitando a sua atuação em juízo, de modo que tal ônus incumbe ao prestador do serviço, mormente em face da sua hipossuficiência técnica.
Nesse contexto, analisando o conjunto probatório dos autos, verifica-se que o Banco/Apelante acostou aos autos contrato de empréstimo consignado (Id nº 21451682 - pág. 7-13) em que se observa que a manifestação de vontade da parte apelada foi realizada pela aposição da sua impressão digital acompanhada da assinatura de duas testemunhas, porém, sem a presença de assinatura a rogo.
Assim, resta claro que não houve o cumprimento dos requisitos legais exigidos para a contratação, nos termos do art. 595 do Código Civil.
Nula, portanto, a relação contratual.
Apesar de haver prova de que a instituição financeira tenha creditado o valor do empréstimo em conta de titularidade da parte recorrida, conforme comprovante de transferência do valor contratado para conta de titularidade do apelado, constante no Id nº 21451681-pag. 5, o contrato não pode ser considerado válido.
No entanto, a fim de evitar o enriquecimento ilícito, evidencia-se a necessidade de retorno das partes ao status quo ante, de modo que é correta a determinação de que a instituição financeira deverá restituir à parte requerente todos os descontos promovidos indevidamente no seu benefício, assim como a parte requerida deverá abater do valor da condenação o valor efetivamente pago, conforme comprovante de transferência de valor para conta de titularidade da apelada, juntado aos autos.
Embora inserido na parte do Código Civil que trata especificamente do contrato de prestação de serviço, a regra estabelecida no art. 595, do Código Civil é aplicável a todo e qualquer negócio jurídico, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça.
DIREITO CIVIL.
RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C PEDIDOS DE RESTITUIÇÃO DE VALORES E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FIRMADO POR IDOSO INDÍGENA ANALFABETO.
VALIDADE.
REQUISITO DE FORMA.
ASSINATURA DO INSTRUMENTO CONTRATUAL A ROGO POR TERCEIRO, NA PRESENÇA DE DUAS TESTEMUNHAS.
ART. 595 DO CC/02.
PROCURADOR PÚBLICO.
DESNECESSIDADE. […] 7.
Embora o referido dispositivo legal se refira ao contrato de prestação de serviços, deve ser dada à norma nele contida o máximo alcance e amplitude, de modo a abranger todos os contratos escritos firmados com quem não saiba ler ou escrever, a fim de compensar, em algum grau, a hipervulnerabilidade desse grupo social. […] (REsp 1907394/MT, Rel.
Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/05/2021, DJe 10/05/2021) G.N.
A exigência de cumprimento dos requisitos de validade do negócio jurídico supracitado tem a função de garantir que os idosos analfabetos tenham verdadeiramente conhecimento do que estão contratando, manifestando sua vontade de maneira livre e consciente.
Nesse sentido remansosa jurisprudência da Corte Superior de Justiça: DIREITO CIVIL.
RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C PEDIDOS DE RESTITUIÇÃO DE VALORES E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FIRMADO POR IDOSO INDÍGENA ANALFABETO.
VALIDADE.
REQUISITO DE FORMA.
ASSINATURA DO INSTRUMENTO CONTRATUAL A ROGO POR TERCEIRO, NA PRESENÇA DE DUAS TESTEMUNHAS.
ART. 595 DO CC/02.
PROCURADOR PÚBLICO.
DESNECESSIDADE. 1. […] 2. […] 3.
Os analfabetos, assim como os índios, detêm plena capacidade civil, podendo, por sua própria manifestação de vontade, contrair direitos e obrigações, independentemente da interveniência de terceiro. 4.
Como regra, à luz dos princípios da liberdade das formas e do consensualismo, a exteriorização da vontade dos contratantes pode ocorrer sem forma especial ou solene, salvo quando exigido por lei, consoante o disposto no art. 107 do CC/02. 5.
Por essa razão, em um primeiro aspecto, à míngua de previsão legal expressa, a validade do contrato firmado por pessoa que não saiba ler ou escrever não depende de instrumento público. 6.
Noutra toada, na hipótese de se tratar de contrato escrito firmado pela pessoa analfabeta, é imperiosa a observância da formalidade prevista no art. 595 do CC/02, que prevê a assinatura do instrumento contratual a rogo por terceiro, com a subscrição de duas testemunhas. 7.
Embora o referido dispositivo legal se refira ao contrato de prestação de serviços, deve ser dada à norma nele contida o máximo alcance e amplitude, de modo a abranger todos os contratos escritos firmados com quem não saiba ler ou escrever, a fim de compensar, em algum grau, a hipervulnerabilidade desse grupo social. 8.
Com efeito, a formalização de negócios jurídicos em contratos escritos - em especial, os contratos de consumo - põe as pessoas analfabetas em evidente desequilíbrio, haja vista sua dificuldade de compreender as disposições contratuais expostas em vernáculo.
Daí porque, intervindo no negócio jurídico terceiro de confiança do analfabeto, capaz de lhe certificar acerca do conteúdo do contrato escrito e de assinar em seu nome, tudo isso testificado por duas testemunhas, equaciona-se, ao menos em parte, a sua vulnerabilidade informacional. 9.
O art. 595 do CC/02 se refere a uma formalidade a ser acrescida à celebração de negócio jurídico por escrito por pessoa analfabeta, que não se confunde com o exercício de mandato.
O contratante que não sabe ler ou escrever declara, por si próprio, sua vontade, celebrando assim o negócio, recorrendo ao terceiro apenas para um auxílio pontual quanto aos termos do instrumento escrito. 10.
O terceiro, destarte, não celebra o negócio em representação dos interesses da pessoa analfabeta, como se mandatário fosse.
Por isso, não é necessário que tenha sido anteriormente constituído como procurador. 11.
Se assim o quiser, o analfabeto pode se fazer representar por procurador, necessariamente constituído mediante instrumento público, à luz do disposto no art. 654, caput, do CC/02.
Nessa hipótese, típica do exercício de mandato, não incide o disposto no art. 595 do Código e, portanto, dispensa-se a participação das duas testemunhas. 12.
Recurso especial conhecido e provido. (REsp 1907394/MT, Rel.
Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/05/2021, DJe 10/05/2021).
Com efeito, a digital do analfabeto no contrato escrito somente faz prova da identidade do contratante e da sua reconhecida impossibilidade de assinar.
No entanto, não prova que ele foi informado adequadamente a respeito das cláusulas do contrato.
Recentemente a matéria foi sumulada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, nos seguintes termos: SÚMULA 30/TJPI - A ausência de assinatura a rogo e subscrição por duas testemunhas nos instrumento de contrato de mútuo bancário atribuídos a pessoa analfabeta torna o negócio jurídico nulo, mesmo que seja comprovada a disponibilização do valor em conta de sua titularidade, configurando ato ilícito, gerando o dever de repará-lo, cabendo ao magistrado ou magistrada, no caso concreto, e de forma fundamentada, reconhecer categorias reparatórias devidas e fixar o respectivo quantum, sem prejuízo de eventual compensação.
Sendo o contrato nulo, em decorrência do vício citado, a cobrança é indevida, tornando-se imperiosa a repetição do indébito e a reparação por danos morais.
Acerca da repetição em dobro, o Colendo STJ fixou a seguinte tese, no julgamento do EAREsp nº 676.608/RS: “A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que cobrou valor indevido, revelando-se cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva”.
Contudo, a Corte Especial do STJ decidiu modular os efeitos da tese, restringindo a eficácia temporal dessa decisão, ponderando que, na hipótese de contratos de consumo que não envolvam a prestação de serviços públicos, o entendimento somente poderia ser aplicado aos débitos cobrados após a data da publicação do acórdão paradigma (EAREsp nº 676.608/RS), em 30/03/2021.
Porém, na sessão presencial por videoconferência realizada em 14 de agosto de 2024, no julgamento do Processo nº 0800432-52.2020.8.18.0084, em regime de ampliação de quórum, fui vencida em meu entendimento.
Assim, em razão dos precedentes desta 3ª Câmara Especializada Cível e do princípio da colegialidade, entendo que a repetição deve ocorrer integralmente em dobro.
No que tange aos prejuízos imateriais alegados, o desconto indevido pode gerar danos morais, bastando para isso que o consumidor seja submetido a um constrangimento ilegal, como a cobrança de valores atinentes a um contrato nulo, bem como por tratar-se de dedução efetuada em verba de caráter alimentar.
Ademais, na hipótese dos autos, é certo que o dever de indenizar resulta da própria conduta lesiva evidenciada, independendo de prova dos abalos psíquicos causados, pois, em casos tais, o dano é in re ipsa, isto é, decorre diretamente da ofensa, por comprovação do ilícito, que ficou sobejamente demonstrado nos autos.
O próprio STJ firmou entendimento no sentido de que “a concepção atual da doutrina orienta-se no sentido de que a responsabilização do agente causador do dano moral opera-se por força do simples fato de violação (damnum in re ipsa).
Verificado o evento danoso surge a necessidade de reparação, não havendo que se cogitar da prova do prejuízo, se presentes os pressupostos legais para que haja a responsabilidade civil (nexo de causalidade e culpa)” (RT 746/183, Rel.
Min.
Cesar Asfor Rocha, 4ª Turma).
A respeito da temática, existem diversos julgados dos Tribunais Pátrios (verbi gratia, TJMS: AC nº 0802134-57.2019.8.12.0012, Rel.
Des.
Vilson Bertelli, 2ª Câmara Cível, j. 27/07/2020; e TJCE: APL nº 0000783-69.2017.8.06.0190, Rel.
Des.
Raimundo Nonato Silva Santos, 4ª Câmara de Direito Privado, j. 12/11/2019).
Por estas razões, com esteio na prova dos autos, entendo ser devida a reparação por danos morais, em função das ações lesivas praticadas pela instituição financeira demandada.
Em continuidade, na fixação da indenização por danos morais, o magistrado deve agir com equidade, analisando a extensão do dano, as condições socioeconômicas e culturais dos envolvidos, as condições psicológicas das partes e o grau de culpa do agente, terceiro ou vítima.
Tais critérios podem ser retirados dos artigos 944 e 945, ambos do CC, bem como do entendimento dominante do STJ.
Pacífico também o entendimento a respeito do caráter dúplice (compensatório/pedagógico) da indenização por danos morais, devendo o julgador, quando da sua fixação, se guiar pelas circunstâncias do caso concreto e pelos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, de modo que seu valor não seja excessivo a ponto de gerar enriquecimento ilícito do ofendido, tampouco irrisório para estimular a prática danosa, sob pena de desvirtuamento da natureza do instituto do dano moral.
Vale dizer, deve ser quantia que não seja insignificante, a ponto de não compor o sentimento negativo experimentado pela vítima, e que não seja tão elevada, a ponto de provocar o seu enriquecimento sem causa.
Portanto, para que o arbitramento atenda aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, a orientação de nossos Tribunais exige que seja feito a partir de dois dados relevantes, quais sejam, o nível econômico do ofendido e o porte econômico do ofensor, ambos cotejados com as condições em que se deu a ofensa.
Com efeito, considerando-se as condições das partes, o valor da indenização deve ser compatível com a expressão econômica e com o grau de culpa observado no ato, evidenciada, no caso, pela instituição financeira que realizou descontos no benefício previdenciário da parte autora sem qualquer lastro contratual válido.
Nestas condições, apreciadas todas as questões postas, entendo que a quantia de R$2.000,00 (dois mil reais) arbitrada na sentença, atende aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, levando-se em consideração a realidade das partes, a situação econômica e as particularidades do caso.
III.
DISPOSITIVO Por todo o exposto, voto pelo conhecimento do recurso e DOU-LHE PROVIMENTO EM PARTE para determinar a compensação do valor comprovadamente creditado na conta de titularidade da parte apelada (Id nº 21451681-pag. 5), dos valores a serem pagos pelo banco apelante.
Deixo de majorar a verba honorária sucumbencial, conforme estabelecido no TEMA 1059, STJ. É como voto.
Desembargadora LUCICLEIDE PEREIRA BELO Relatora -
21/03/2025 13:54
Expedição de Outros documentos.
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15/03/2025 05:54
Conhecido o recurso de BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A - CNPJ: 07.***.***/0001-50 (APELANTE) e provido em parte
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28/02/2025 19:16
Deliberado em Sessão - Julgado - Mérito
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28/02/2025 16:58
Juntada de Petição de certidão de julgamento colegiado
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17/02/2025 16:16
Juntada de manifestação
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14/02/2025 03:12
Publicado Certidão de Inclusão em Pauta em 14/02/2025.
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14/02/2025 03:12
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 14/02/2025
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13/02/2025 10:20
Expedição de Outros documentos.
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13/02/2025 10:20
Expedição de Outros documentos.
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13/02/2025 10:20
Expedição de Intimação de processo pautado.
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13/02/2025 10:20
Expedição de Certidão de Publicação de Pauta.
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13/02/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PIAUÍ TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ 3ª Câmara Especializada Cível PROCESSO: 0807017-77.2023.8.18.0032 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A, BANCO BRADESCO S.A.
Advogado do(a) APELANTE: WILSON SALES BELCHIOR - PI9016-A APELADO: JOSE PEREIRA DE ANDRADE Advogado do(a) APELADO: ISADORA SANTOS LUZ LEAL NEIVA - PI15149-A RELATOR(A): Desembargadora LUCICLEIDE PEREIRA BELO DATA E HORÁRIO DE INÍCIO: 21/02/2025 - 12:00 CERTIDÃO DE INCLUSÃO EM PAUTA DE JULGAMENTO De ordem do Presidente do Órgão Colegiado, a Secretaria Judiciária do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí torna público a todos os interessados, que o processo em epígrafe foi incluído em pauta de julgamento para apreciação na Sessão do Plenário Virtual - 3ª Câmara Especializada Cível - 21/02/2025 a 28/02/2025 - Desa.
Lucicleide P.
Belo.
Demais informações podem ser obtidas nos telefones ou balcão virtual desta unidade, ambos informados no site do Tribunal https://transparencia.tjpi.jus.br/telefones_uteis/.
SECRETARIA JUDICIÁRIA, em Teresina, 12 de fevereiro de 2025. -
12/02/2025 09:47
Expedição de Outros documentos.
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12/02/2025 09:43
Inclusão do processo para julgamento eletrônico de mérito
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09/02/2025 15:46
Pedido de inclusão em pauta virtual
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11/01/2025 18:21
Juntada de Petição de outras peças
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19/11/2024 17:48
Recebidos os autos
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19/11/2024 17:48
Conclusos para Conferência Inicial
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19/11/2024 17:48
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
19/11/2024
Ultima Atualização
15/03/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Detalhes
Documentos
ACÓRDÃO SEGUNDO GRAU • Arquivo
ACÓRDÃO SEGUNDO GRAU • Arquivo
ATO ORDINATÓRIO • Arquivo
ATO ORDINATÓRIO • Arquivo
SENTENÇA • Arquivo
SENTENÇA • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
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Jonathas de Cerqueira Castro
Equatorial Piaui
Advogado: Marcos Antonio Cardoso de Souza
1ª instância - TJPR
Ajuizamento: 22/03/2023 21:01