TJPI - 0004583-57.2019.8.18.0140
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gabinete do Des. Erivan Jose da Silva Lopes
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Partes
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Polo Passivo
Partes
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Partes
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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21/07/2025 10:28
Expedição de intimação.
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21/07/2025 10:26
Juntada de Certidão
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18/07/2025 10:53
Juntada de Petição de manifestação
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16/07/2025 13:10
Juntada de Petição de petição
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01/07/2025 00:08
Publicado Intimação em 01/07/2025.
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01/07/2025 00:08
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 01/07/2025
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30/06/2025 00:00
Intimação
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0004583-57.2019.8.18.0140 ÓRGÃO: 2ª Câmara Especializada Criminal ORIGEM: 2ª Vara do Tribunal Popular do Júri da Comarca de Teresina -PI RELATORA: Dra.
Valdênia Moura Marques de Sá (Juíza convocada) RECORRENTE: Diego Fernandes Lopes DEFENSOR: Dr.
Adriano Moreti Batista RECORRIDO: Ministério Público do Estado do Piauí EMENTA Ementa: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL.
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO.
HOMICÍDIO QUALIFICADO E ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA ARMADA.
INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA.
PRONÚNCIA.
QUALIFICADORAS.
NULIDADE AFASTADA.
RECURSO DESPROVIDO.
I.
CASO EM EXAME 1.
Recurso em sentido estrito interposto pelo réu contra decisão de pronúncia proferida pelo Juízo da 2ª Vara do Tribunal Popular do Júri de Teresina/PI, que o pronunciou pela prática dos crimes de homicídio qualificado (art. 121, §2º, I e III, do CP) e de integrar organização criminosa majorada pelo uso de arma de fogo (art. 2º, §2º, da Lei 12.850/2013), em concurso material.
A defesa requereu: (i) reconhecimento de nulidade da interceptação telefônica, (ii) despronúncia quanto ao homicídio, (iii) exclusão das qualificadoras e (iv) absolvição sumária quanto à organização criminosa.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.
Há quatro questões em discussão: (i) definir se houve nulidade por quebra da cadeia de custódia das interceptações telefônicas; (ii) estabelecer se estão presentes indícios suficientes de autoria a justificar a pronúncia; (iii) determinar se devem ser excluídas as qualificadoras do motivo torpe e do meio cruel; e (iv) verificar a possibilidade de absolvição sumária quanto ao crime de organização criminosa armada.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 3.
A alegada nulidade por quebra da cadeia de custódia das interceptações telefônicas é afastada diante da inexistência de prejuízo demonstrado, da regular disponibilização do conteúdo às partes e da ausência de requerimento de acesso pela defesa. 4.
A decisão de pronúncia exige apenas prova da materialidade e indícios suficientes de autoria.
O laudo cadavérico comprova a materialidade, e as interceptações telefônicas apontam o recorrente como coordenador de execuções vinculadas a facção criminosa, incluindo a da vítima "Tamborete". 5.
As qualificadoras do motivo torpe e do meio cruel são mantidas por haver elementos indicativos de execução por disputa entre facções e violência exacerbada, com doze disparos, o que autoriza sua apreciação pelo Tribunal do Júri. 6.
A absolvição sumária quanto ao crime de organização criminosa armada é rejeitada, pois há indícios suficientes da participação do recorrente em estrutura hierarquizada com divisão de tarefas, evidenciada por interceptações telefônicas e depoimentos judiciais.
IV.
DISPOSITIVO 7.
Recurso desprovido, em harmonia com o parecer do Ministério Público Superior.
ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, "acordam os componentes do(a) 2ª Câmara Especializada Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, por unanimidade, conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto do(a) Relator(a)." SALA DAS SESSÕES DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ, em Teresina, 13/06/2025 a 24/06/2025 RELATÓRIO Trata-se de recurso em sentido estrito interposto por Diego Fernandes Lopes, irresignado com a decisão proferida pelo Juízo da 2ª Vara do Tribunal Popular do Júri da Comarca de Teresina/PI, que o pronunciou pela prática dos crimes de homicídio qualificado – art. 121, §2º, incisos I e III, do Código Penal – e de integrar organização criminosa majorada pelo uso de arma de fogo, nos termos do art. 2º, §2º, da Lei nº 12.850/2013, em concurso material.
A defesa apresentou as razões do recurso, requerendo: a) o reconhecimento da nulidade da interceptação telefônica; b) a despronúncia quanto ao homicídio; c) o afastamento das qualificadoras do motivo torpe e meio cruel; e d) a absolvição sumária quanto ao crime de organização criminosa majorada.
O Ministério Público de primeiro grau apresentou contrarrazões opinando pelo conhecimento, mas desprovimento do recurso.
A Procuradoria de Justiça apresentou manifestação nos autos, opinando pelo desprovimento do recurso, sustentando que a decisão de pronúncia encontra respaldo em elementos indiciários consistentes e que o conteúdo das interceptações telefônicas foi disponibilizado à Defesa, inexistindo, portanto, vício na cadeia de custódia da prova.
VOTO I – JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE O recurso em sentido estrito interposto pela Defensoria Pública do Estado do Piauí em favor de Diego Fernandes Lopes preenche os requisitos legais de tempestividade, legitimidade e regularidade formal.
Preenchidos os pressupostos objetivos e subjetivos, o recurso deve ser conhecido.
II – PRELIMINAR A Defesa, ao apresentar suas razões recursais, sustentou a existência de nulidade processual em razão da suposta quebra da cadeia de custódia, argumentando que o Auto Circunstanciado de interceptação telefônica consubstanciaria vício insanável, por não haver a disponibilização integral dos áudios captados, tampouco documentação da cronologia de sua coleta e tratamento.
Sustentou, ainda, que apenas transcrições selecionadas teriam sido juntadas aos autos pela autoridade policial, o que teria implicado na supressão de conteúdo e, por conseguinte, na violação dos princípios do contraditório e da ampla defesa.
Com efeito, o art. 158-A do Código de Processo Penal, incluído pela Lei nº 13.964/2019, estabelece que cadeia de custódia é o “conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais ou em vítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu reconhecimento até o descarte.” Trata-se, portanto, de instituto voltado à proteção da autenticidade e integridade dos vestígios probatórios.
Contudo, a alegação de quebra da cadeia de custódia não se presume.
Exige a comprovação inequívoca de adulteração, manipulação ou ocultação da prova, e não a simples constatação de que apenas parte do conteúdo captado foi efetivamente transcrito ou acessado no curso da investigação. É bem verdade que o ideal técnico seria o registro, a catalogação e a anexação aos autos de toda a integralidade dos áudios captados.
Mas não se trata de condição de validade da prova, desde que preservada a possibilidade de acesso ao conteúdo por ambas as partes e assegurado o exercício da ampla defesa.
Nesse ponto, a sentença recorrida destacou, de modo claro e fundamentado, que não houve negativa de acesso à integralidade dos dados obtidos com a interceptação telefônica.
Consta nos autos informação de que o CD contendo os áudios e a respectiva senha de acesso foi regularmente encaminhado à Secretaria da Unidade Judiciária, à disposição das partes, respeitado o regime legal de sigilo que rege as interceptações telefônicas.
A Defesa, no entanto, em momento algum do curso processual, requereu acesso ao referido conteúdo, tampouco peticionou nos autos alegando qualquer obstáculo ao exercício desse direito. É oportuno ressaltar que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem sido consistente ao negar provimento a insurgências análogas, firmando o entendimento de que a quebra da cadeia de custódia não configura nulidade processual automática, mas afeta tão somente a eficácia da prova, dependendo de demonstração concreta de que houve prejuízo ou adulteração de conteúdo: “A quebra da cadeia de custódia não configura nulidade processual, mas afeta a eficácia da prova, devendo ser comprovada a adulteração para invalidá-la.” (STJ, AgRg no HC n. 924.130/SE, rel.
Min.
Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJEN 26/2/2025) No caso em tela, não há qualquer indício de que as transcrições tenham sido manipuladas ou adulteradas.
Tampouco foi trazido aos autos qualquer elemento que infirme a fidedignidade do conteúdo utilizado pela autoridade policial.
A ausência de juntada imediata de arquivos em meio digital não configura, por si, vício capaz de comprometer a validade da prova, em especial porque os relatórios circunstanciados foram elaborados por policiais civis, enquanto documentos descritivos válidos e idôneos à luz da legislação processual penal.
Ademais, a prova impugnada não foi a única base da decisão de pronúncia, mas também pelo laudo pericial confirmando a materialidade do homicídio (ID 22108949).
Em suma, diante da inexistência de requerimento da Defesa para acesso ao conteúdo completo das interceptações, da ausência de qualquer demonstração de manipulação ou prejuízo, bem como da existência de outras provas nos autos aptas a sustentar o juízo de admissibilidade da acusação, não se configura qualquer nulidade a ser reconhecida.
Rejeita-se, portanto, a preliminar de nulidade por quebra da cadeia de custódia da prova.
III – MÉRITO 3.1 Pedido de despronúncia diante da ausência de indícios suficientes de autoria A Defesa requer a despronúncia de Diego Fernandes Lopes com fundamento no art. 414 do Código de Processo Penal, argumentando que não há nos autos indícios suficientes de autoria a justificarem a submissão do réu ao Tribunal do Júri.
Alega que os depoimentos testemunhais colhidos em juízo não apontam a participação do acusado no delito, não havendo testemunha ocular do fato.
Sustenta, ainda, que a suposta autoria se baseia exclusivamente em interceptações telefônicas obtidas na fase policial, não submetidas ao contraditório, e que os elementos colhidos judicialmente não demonstram de forma idônea qualquer vínculo entre o acusado e a execução da vítima.
Por fim, sustenta que o acusado negou integralmente os fatos, inexistindo qualquer prova firme de seu envolvimento com o homicídio da vítima Francisco Augusto Felipe Rodrigues Neto, vulgo “Tamborete”.
A sentença de pronúncia consiste em juízo de admissibilidade, não exigindo prova incontroversa da autoria delitiva, bastando que o juiz indique as provas da materialidade do crime e os indícios suficientes da autoria, ou seja, de que haja uma probabilidade de ter o acusado praticado o crime.
Dessa forma, cabe ao juiz sentenciante somente indicar os elementos aptos a comprovar a materialidade do fato e os indícios suficientes de autoria, competindo ao Conselho de Sentença do Tribunal do Júri apreciá-las.
Nos termos do art. 413 do Código de Processo Penal, é cabível a pronúncia quando presentes dois requisitos: a comprovação da materialidade do fato e a existência de indícios suficientes de autoria ou de participação.
No presente caso, a materialidade do crime encontra-se amplamente demonstrada pelo laudo de exame cadavérico constante no ID 22108949, o qual atesta que a vítima Francisco Augusto Felipe Rodrigues Neto faleceu em decorrência de múltiplos disparos de arma de fogo, totalizando doze lesões perfuro-contusas por projéteis, compatíveis com execução sumária, revelando modus operandi característico de grupo organizado.
No tocante à autoria, os indícios são robustos e consistentes o suficiente para sustentar o juízo de admissibilidade da acusação, conforme exige o procedimento escalonado do Tribunal do Júri.
Embora as testemunhas ouvidas em juízo não tenham presenciado os fatos, os elementos informativos obtidos no curso da investigação criminal, especialmente as interceptações telefônicas autorizadas judicialmente, revelam com clareza a ligação do acusado com o planejamento e a execução do homicídio em questão.
Em diálogo interceptado e transcrito no documento ID 20865233 – fl. 18, o acusado, identificado como “Rouba Cena”, menciona diretamente a execução da vítima "Tamborete", referindo-se a ela pelo nome e à data da sua morte.
Transcreve-se trecho relevante: “IEMANJÁ (SALVEIRA) X ROUBA CENA (RESTRITA): ROUBA CEVA PERGUNTA SE IEMANJÁ É A SALVEIRA RESPONSÁVEL NO ESTADO PELO “TERMINAL” (MORTES/EXECUÇÕES) • IEMANJÁ DIZ QUE JÁ PEDIU PARA ROUBA CENA ENVIAR O RELATÓRIO PARA ELA, MAS ELE NUNCA MANDA.
ROUBA CENA QUESTIONA SE NUNCA CHECOU PARA IEMANJÁ OS “TERMINAIS, OS 3 ÚLTIMOS QUE NÓS ARREGAÇAMOS”.
IEMANJÁ PERGUNTA QUAIS FORAM E QUE DIA.
ROUBA CENA DIZ QUE O PRIMEIRO FOI O DA CASA DE CUSTÓDIA, DEPOIS O TAMBORETE, O EVANDRO E DEPOIS O BALOTELI, ROUBA CENA PERGUNTA SE IEMANJÁ TEM O RELATÓRIO SOBRE O EVANDRO, QUE A DISCIPLINAR ESTÁ PEDINDO.
IEMANJÁ PERGUNTA QUEM SÃO OS IRMÃOS DA DISCIPLINAR QUE ESTÃO PEDINDO.
ROUBA CENA DIZ QUE É O IRAQUIANO.
IEMANJÁ DIZ QUE NÃO SABE SE TEM ESSE RELATÓRIO: QUE COMPARTILHOU ISSO NO GRUPO E ERAM PARA TODOS TEREM CIÊNCIA.
ROUBA CENA DIZ QUE NÃO TEM PORQUE O CELULAR DELE É "BOMBA", IEMANJÁ DIZ QUE O CELULAR DELA É O "QUEBRA GALHO DO COMANDO" : QUE TODO MUNDO "APAGA, MAS QUE ELA NÃO PODE APAGAR", IEMANJÁ DIZ QUE VAI VER SE ACHA O RELATÓRIO: QUE PODE NÃO TER MAIS TODOS OS QUE ROUBA CENA PEDIU.
ROUBA CENA DIZ QUE PRECISA DESSES "QUATRO TERMINAL".
IEMANJÁ PERGUNTA SE O TAMBORETE FOI O PRIMEIRO, ROUBA CENA DIZ QUE NÃO: QUE O PRIMEIRO FOI “ANDREI, ANDRAU" (...) QUE JA AVISOU PARA ROUBA CENA QUE ELE PODE "MATAR UM MILHÃO, MAS QUE SE NÃO PASSAR O TERMINAL NÃO FEZ "PORRA, NENHUMA", ROUBA CENA DIZ QUE ENTÃO "SÓ SUBIU A AIMA, SÓ".
IEMANJÁ DIZ QUE COMO SALVEIRA ELA NÃO "VENTILA" (COMPARTILHA) TERMINAL NÃO; QUE VENTILA NOTA DE FALECIMENTO IEMANJÁ DIZ QUE TAMBURETE FOI MORTO EM 20 DE JUNHO IEMANJÁ DIZ QUE O DO EDCLEISSON FOI DIA 18 DE JUNHO.
ROUBA CENA RESUME QUE EDCLEISON FOI MORTO NO DIA 18/06/19, TAMBURETE NO DIA 20/06/19, EVANDRO NO DIA 26/06/19 E BALOTELI NO DIA 14/07/19.
ROUBA CENA DIZ QUE VAI TER QUE PROCURAR O NOME DAS VÍTIMAS.
IEMANJÁ DIZ QUE O NOME DO TAMBURETE É FRANCISCO.
IEMANJÁ DIZ QUE O TAMBURETE ELA TEM O “TERMINAL” (RELATÓRIO DE EXECUÇÃO). ” (ID 20865233) Este conteúdo revela ciência e controle do acusado sobre execuções múltiplas, com referência nominal à vítima destes autos (“Francisco”, vulgo “Tamborete”) e à data precisa do crime (20 de junho de 2019), além da cobrança por parte da interlocutora sobre o envio de relatórios (“terminais”), prática comum em organizações criminosas com divisão de tarefas e hierarquia.
Tal elemento é suficiente, nos termos do art. 413 do CPP, para justificar a pronúncia, especialmente considerando a natureza do juízo de prelibação próprio dessa fase procedimental, que não exige prova plena, mas apenas a constatação de indícios razoáveis e consistentes de autoria, como reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal (HC 127.900/PR, rel.
Min.
Teori Zavascki).
A negativa do acusado em juízo não tem o condão de afastar a autoria, mormente diante da coerência e materialidade dos diálogos interceptados, os quais retratam o domínio do fato e o conhecimento detalhado das execuções.
A tentativa de dissociar o réu das mortes narradas revela-se ineficaz frente à contundência das transcrições, que estabelecem vínculo direto entre o acusado e o planejamento dos crimes.
Ressalte-se que em se tratando do procedimento do júri, certo é que a decisão de pronúncia dispensa provas robustas e precisas da autoria do fato.
Isso porque não é necessário, nessa fase processual, um juízo de certeza, mas tão-somente um juízo de probabilidade da autoria atribuída ao acusado pelo cometimento do fato, cuja existência restou confirmada pela prova produzida sob contraditório judicial.
Tais indícios se mostram suficientes para o prosseguimento da acusação contra o acusado pela prática do fato descrito na denúncia, o que afasta a possibilidade de acolhimento do pleito de despronúncia por ele pretendido.
Ademais, conforme decidiu o juízo de origem, o material constante nos autos é apto para permitir o exercício da acusação em plenário, cabendo ao Tribunal do Júri a apreciação do mérito da imputação.
A decisão de pronúncia não viola o princípio da presunção de inocência, pois não se confunde com juízo de certeza, mas sim de admissibilidade da acusação.
Diante do exposto, não há que se falar em despronúncia.
Presentes a materialidade do delito e indícios sérios de autoria, o recurso deve ser conhecido, mas desprovido quanto ao pedido de despronúncia. 3.2 Pedido de exclusão das qualificadoras do motivo torpe e do meio cruel A defesa técnica pugnou, de forma subsidiária, pelo afastamento das qualificadoras previstas no art. 121, § 2º, I e III, do Código Penal, respectivamente, motivo torpe e meio cruel.
Sustentou, quanto ao motivo torpe, que não há nos autos demonstração de vínculo subjetivo entre o recorrente e a vítima, nem comprovação de que a execução decorreu de rivalidade entre organizações criminosas.
Alegou que a motivação atribuída à prática delitiva é baseada exclusivamente em suposições, destituídas de prova judicial.
No que diz respeito à qualificadora do meio cruel, argumentou que a multiplicidade de disparos de arma de fogo não comprova, por si só, o emprego de meio cruel, tampouco a intenção do mandante de impor sofrimento à vítima.
Reforçou que, sendo o recorrente apontado como autor intelectual do delito, não haveria como imputar-lhe uma qualificadora com base em circunstância objetiva praticada pelo executor, cujos detalhes não são descritos com clareza.
A análise das qualificadoras, na fase do juízo de pronúncia, não exige certeza, tampouco demonstração plena dos elementos subjetivos ou objetivos que as caracterizam, mas apenas a existência de indícios mínimos que permitam sua apreciação pelo Conselho de Sentença, nos termos do que dispõe o art. 413, § 1º, do Código de Processo Penal.
A pronúncia traz mero juízo de admissibilidade da acusação, servindo como filtro mínimo que autoriza a submissão da causa ao Tribunal do Júri.
Assim, as qualificadoras somente podem ser excluídas quando manifestamente improcedentes ou descabidas, sob pena de se invadir competência exclusiva do Conselho de Sentença, conforme orientação consolidada desta Corte: "A pronúncia traz mero juízo de admissibilidade da acusação, as qualificadoras somente podem ser excluídas quando manifestamente improcedentes ou descabidas, sob pena de invasão à competência do Conselho de Sentença.
Esta Corte possui entendimento firmado no sentido de que não há incompatibilidade entre o reconhecimento do dolo eventual com as qualificadoras do homicídio.
Agravo regimental desprovido." (AgRg no REsp n. 2.001.595/SP, rel.
Min.
Antonio Saldanha Palheiro, 6ª Turma, j. 19/3/2025, DJEN 25/3/2025) No presente caso, há prova da materialidade do crime, atestada pelo laudo de exame cadavérico (ID 22108949), que registrou doze perfurações por projéteis de arma de fogo no corpo da vítima, Francisco Augusto Felipe Rodrigues Neto, demonstrando a violência e intensidade da ação homicida.
No tocante à autoria, há indícios veementes da participação do acusado na condição de autor intelectual.
Com efeito, consta dos autos o conteúdo de interceptações telefônicas regularmente autorizadas e compartilhadas com esta ação penal, destacando-se o documento ID 20865233, fl. 18, que registra: "ROUBA CENA QUESTIONA SE NUNCA CHECOU PARA IEMANJÁ OS ‘TERMINAIS, OS 3 ÚLTIMOS QUE NÓS ARREGAÇAMOS’. [...] ROUBA CENA DIZ QUE O PRIMEIRO FOI O DA CASA DE CUSTÓDIA, DEPOIS O TAMBORETE, O EVANDRO E DEPOIS O BALOTELI [...].
IEMANJÁ DIZ QUE O NOME DO TAMBURETE É FRANCISCO.
IEMANJÁ DIZ QUE O TAMBURETE ELA TEM O ‘TERMINAL’ (RELATÓRIO DE EXECUÇÃO)." (ID 20865233) A conversa demonstra, com riqueza de detalhes, a vinculação do recorrente (vulgo “Rouba Cena”) à cadeia de comando de execuções praticadas por grupo criminoso, referindo-se à morte de “Tamborete”, posteriormente identificado como a vítima Francisco Augusto Felipe Rodrigues Neto.
O trecho evidencia a participação do acusado na organização de execuções, com controle sobre datas, nomes e a exigência de “terminais” (relatórios) para cada morte praticada.
Tais elementos, ainda que não suficientes para formação de juízo condenatório, são idôneos para amparar o reconhecimento das qualificadoras apontadas, permitindo que sejam submetidas à apreciação do Tribunal do Júri, cuja soberania constitucional legitima a análise do motivo e dos meios empregados no crime.
Quanto ao motivo torpe, é possível inferir, dos diálogos transcritos, que a execução da vítima insere-se no contexto de disputa entre facções criminosas, especificamente entre o PCC, supostamente integrado pelo acusado, e o “Bonde dos 40”, facção da qual a vítima faria parte.
A motivação de ordem faccionária, enraizada na lógica de retaliações e domínio territorial, se reveste de repugnância social, sendo reconhecida como torpe.
A qualificadora, portanto, deve ser mantida para deliberação dos jurados.
No que concerne ao meio cruel, a qualificadora também encontra amparo na prova pericial (ID 22108949), a qual demonstrou que a vítima foi atingida por doze disparos de arma de fogo, o que evidencia uma execução brutal, com emprego de violência excessiva, apta a potencializar o sofrimento físico da vítima.
Ainda que não comprovada a ciência do mandante quanto à reiteração dos disparos, é prematuro afastar a análise dessa circunstância pelo Tribunal do Júri, a quem compete avaliar, em profundidade, a dinâmica da execução e a extensão da conduta atribuída ao réu.
O entendimento jurisprudencial é firme no sentido de que “a multiplicidade de disparos, especialmente quando dirigida a região vital do corpo, pode configurar o meio cruel, cabendo ao júri avaliar tal qualificadora, desde que não seja manifestamente improcedente” (STJ, HC 598.263/SP, Rel.
Min.
Laurita Vaz, 6ª Turma, j. 20/10/2020).
Neste contexto, não se verifica qualquer improcedência manifesta das qualificadoras, razão pela qual o afastamento liminar pretendido pela defesa deve ser rejeitado.
Cabe ao Conselho de Sentença, órgão competente para julgar os crimes dolosos contra a vida, decidir se os elementos presentes nos autos configuram ou não as qualificadoras mencionadas.
Assim, mantêm-se as qualificadoras do motivo torpe e do meio cruel na pronúncia, autorizando sua submissão ao Tribunal do Júri. 3.3 Pedido de absolvição sumária pelo crime de organização criminosa majorada pelo uso de arma de fogo A defesa técnica do recorrente requereu a absolvição sumária quanto à imputação do crime previsto no art. 2º, §2º, da Lei nº 12.850/2013, sob o argumento de que não estariam presentes os elementos estruturantes do tipo penal, tais como a divisão de tarefas, a estabilidade e a permanência da associação criminosa, tampouco a demonstração de vantagem ilícita ou do número mínimo de integrantes.
Sustentou, ainda, que não foram descritas as funções específicas exercidas pelo acusado na suposta organização criminosa, não havendo também menção a outros coautores no processo.
Assim, concluiu pela atipicidade da conduta, nos termos do art. 415, I, do Código de Processo Penal.
A absolvição sumária, prevista no art. 415 do Código de Processo Penal, somente é cabível quando evidente a ausência de prova da materialidade, de indícios de autoria ou demonstrada uma causa excludente de ilicitude ou de culpabilidade.
Em se tratando de crime conexo a delito doloso contra a vida, a apreciação de sua admissibilidade segue o mesmo critério estabelecido no art. 413 do CPP, bastando a presença de prova da materialidade e indícios suficientes de autoria para que a causa prossiga ao Tribunal do Júri.
No caso em exame, o recorrente foi pronunciado também pela prática do delito de integrar organização criminosa armada, conforme descrito no art. 2º, §2º, da Lei nº 12.850/2013.
Trata-se de tipo penal que exige, para sua configuração, a existência de uma associação de quatro ou mais pessoas, estruturalmente ordenada, com divisão de tarefas, estabilidade e permanência, com finalidade de obtenção de vantagem de qualquer natureza por meio da prática de infrações penais graves.
A prova da materialidade encontra-se comprovada pelos elementos constantes no Auto Circunstanciado de Interceptação Telefônica e nos relatórios investigativos constantes no documento ID 20865233 (fl. 18), os quais evidenciam a dinâmica interna da suposta organização, os mecanismos de comando, comunicação e execução de ordens, além do papel de liderança exercido pelo recorrente, identificado como “Rouba Cena”, interlocutor direto da também integrante Layrisse Borges Melo da Silva, conhecida como “Iemanjá”.
As conversas revelam a existência de cadeia hierárquica e funcionalidade ordenada, com papéis definidos — o recorrente aparece como interlocutor estratégico da facção, controlando informações sobre execuções e respondendo a demandas da “disciplinar”, que seria uma espécie de órgão interno de controle da organização.
Há, ainda, referência ao grupo criminoso Primeiro Comando da Capital (PCC), à circulação de informações sobre “terminais” (relatórios de execução), e à necessidade de preservar essas informações como parte de uma estrutura criminosa com protocolos próprios.
No tocante à autoria, o interrogatório judicial do acusado e os depoimentos colhidos em juízo reforçam o quadro probatório.
Em juízo, a testemunha Layrisse Borges Melo da Silva declarou: “Relatou ter tomado conhecimento do fato através de conversas com o recorrente em que ambos realizavam um levantamento de crimes que ocorriam na região. [...] Disse que o fato dessa conversa entre ela e o recorrente ter existido não significa que ambos estão envolvidos na morte da vítima.
Por fim, disse não saber se o recorrente foi quem matou a vítima.” (Interrogatório e audiência de instrução – Ata, ID 38587922) Embora tenha procurado se dissociar da imputação, a testemunha confirma as conversas com o acusado sobre execuções e a prática de levantamento de homicídios em comum.
O próprio acusado, ao ser interrogado, negou a acusação, mas admitiu proximidade com traficantes locais, e não forneceu qualquer explicação razoável para os conteúdos das interceptações mencionadas.
Dessa forma, embora a instrução não tenha permitido, por ora, afirmar com certeza a prática do delito, há elementos mínimos que apontam para a integração do recorrente em uma estrutura criminosa, armada e organizada, com divisão de tarefas e estabilidade.
A ausência de denúncia contra outros membros não afasta a tipicidade da conduta, bastando que o contexto probatório revele a existência da associação e o vínculo do acusado com ela.
Logo, não se trata de hipótese de absolvição sumária, devendo o feito prosseguir ao julgamento popular, onde o Conselho de Sentença poderá avaliar livremente, com base nas provas a serem produzidas em plenário, se houve ou não a prática do delito de organização criminosa.
Rejeita-se, portanto, o pedido de absolvição sumária quanto ao crime previsto no art. 2º, §2º, da Lei nº 12.850/2013.
IV- DISPOSITIVO Diante do exposto, em harmonia com o parecer da Procuradoria de Justiça, conheço do recurso, mas nego-lhe provimento, mantendo-se íntegra a decisão de pronúncia proferida pelo Juízo da 2ª Vara do Tribunal Popular do Júri da Comarca de Teresina, que o encaminha a julgamento pelo Tribunal do Júri pela prática dos crimes de Homicídio qualificado, nos termos do art. 121, §2º, incisos I e III, do Código Penal, e Organização criminosa majorada pelo uso de arma de fogo, previsto no art. 2º, caput e §2º, da Lei nº 12.850/2013.
DRA.
VALDÊNIA MOURA MARQUES DE SÁ (Juíza Convocada - 2º Grau) Relatora Teresina, 26/06/2025 -
27/06/2025 12:55
Expedição de Outros documentos.
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27/06/2025 12:55
Expedição de intimação.
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27/06/2025 12:55
Expedição de intimação.
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26/06/2025 10:09
Conhecido o recurso de DIEGO FERNANDES LOPES (RECORRENTE) e não-provido
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24/06/2025 13:33
Deliberado em Sessão - Julgado - Mérito
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24/06/2025 13:29
Juntada de Petição de certidão de julgamento colegiado
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09/06/2025 12:23
Juntada de Petição de manifestação
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09/06/2025 11:04
Juntada de Petição de ciência
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06/06/2025 02:05
Publicado Certidão de Inclusão em Pauta em 06/06/2025.
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06/06/2025 02:05
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 06/06/2025
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05/06/2025 10:37
Expedição de Outros documentos.
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05/06/2025 10:37
Expedição de Outros documentos.
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05/06/2025 10:37
Expedição de Intimação de processo pautado.
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05/06/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PIAUÍ TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ 2ª Câmara Especializada Criminal PROCESSO: 0004583-57.2019.8.18.0140 CLASSE: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426) RECORRENTE: DIEGO FERNANDES LOPES RECORRIDO: PROCURADORIA GERAL DA JUSTICA DO ESTADO DO PIAUI RELATOR(A): Desembargador ERIVAN JOSÉ DA SILVA LOPES DATA E HORÁRIO DE INÍCIO: 13/06/2025 - 14:00 CERTIDÃO DE INCLUSÃO EM PAUTA DE JULGAMENTO De ordem do Presidente do Órgão Colegiado, a Secretaria Judiciária do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí torna público a todos os interessados, que o processo em epígrafe foi incluído em pauta de julgamento para apreciação na Sessão do Plenário Virtual da 2ª Câmara Especializada Criminal de 13/06/2025 a 24/06/2025.
Para mais informações, entre em contato pelos telefones disponíveis na página da unidade no site do Tribunal: https://transparencia.tjpi.jus.br/units/110001959/public.
SECRETARIA JUDICIÁRIA, em Teresina, 4 de junho de 2025. -
04/06/2025 15:01
Expedição de Outros documentos.
-
04/06/2025 13:54
Inclusão do processo para julgamento eletrônico de mérito
-
27/05/2025 20:37
Pedido de inclusão em pauta virtual
-
08/04/2025 08:51
Conclusos para o Relator
-
08/04/2025 07:28
Juntada de Petição de manifestação
-
28/03/2025 14:05
Expedição de notificação.
-
20/02/2025 12:09
Proferido despacho de mero expediente
-
30/01/2025 10:28
Juntada de Petição de manifestação
-
29/01/2025 11:48
Conclusos para o Relator
-
28/01/2025 03:00
Decorrido prazo de PROCURADORIA GERAL DA JUSTICA DO ESTADO DO PIAUI em 27/01/2025 23:59.
-
03/12/2024 11:27
Expedição de notificação.
-
29/11/2024 10:19
Proferido despacho de mero expediente
-
26/11/2024 10:14
Conclusos para o Relator
-
26/11/2024 03:02
Decorrido prazo de PROCURADORIA GERAL DA JUSTICA DO ESTADO DO PIAUI em 25/11/2024 23:59.
-
04/11/2024 09:44
Expedição de notificação.
-
01/11/2024 06:31
Proferido despacho de mero expediente
-
25/10/2024 09:25
Conclusos para Conferência Inicial
-
25/10/2024 09:25
Juntada de Certidão
-
25/10/2024 08:24
Juntada de Certidão
-
23/10/2024 10:55
Recebidos os autos
-
23/10/2024 10:55
Recebido pelo Distribuidor
-
23/10/2024 10:55
Remetidos os Autos (outros motivos) para Distribuição
-
23/10/2024 10:55
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
23/10/2024
Ultima Atualização
30/06/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
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