TJPI - 0806148-49.2022.8.18.0065
1ª instância - 2ª Vara de Pedro Ii
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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31/07/2025 00:00
Intimação
poder judiciário tribunal de justiça do estado do piauí GABINETE DO Desembargador MANOEL DE SOUSA DOURADO PROCESSO Nº: 0806148-49.2022.8.18.0065 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO(S): [Empréstimo consignado] APELANTE: MARIA JOSE UMBELINO APELADO: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A, BANCO BRADESCO S.A.
DECISÃO TERMINATIVA EMENTA: APELAÇÕES CÍVEIS.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
CONTRATO APRESENTADO PELO RÉU.
NULIDADE VERIFICADA.
DESCUMPRIMENTO DOS REQUISITOS DO ART. 595 DO CC/02.
INEXISTÊNCIA DO NEGÓCIO JURÍDICO.
TED NÃO COMPROVADA.
APLICAÇÃO DA SÚMULA 18 DO TJPI.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO DE FORMA SIMPLES ANTERIOR AO DIA 30/03/2021 E EM DOBRO POSTERIOR AO DIA 30/03/2021.
ENTENDIMENTO FIRMADO PELO STJ EM RECURSO REPETITIVO PARADIGMA (EARESP 676.608/RS).
MODULAÇÃO DOS EFEITOS.
DANO MORAL CONFIGURADO.
MAJORAÇÃO DO VALOR ARBITRADO NA ORIGEM.
PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE.
TERMO INICIAL DOS JUROS MORATÓRIOS A PARTIR DO EVENTO DANOSO.
SÚMULA 54 DO STJ.
RECURSOS CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDOS.
I - RELATÓRIO Trata-se de duas apelações cíveis manejadas contra a sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Comarca de Pedro II/PI nos autos da AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO ajuizada por Maria José Umbelino em face de Banco Bradesco S.A. e Banco Bradesco Financiamentos S/A.
A sentença julgou parcialmente procedentes os pedidos para (a) declarar nulo o contrato; (b) determinar o cancelamento dos descontos; (c) condenar o réu à restituição em dobro dos valores indevidamente debitados, com correção monetária e juros de 1 % a.m.; e (d) indeferir a indenização por danos morais.
Condenou-se, ainda, o banco ao pagamento das custas e de honorários advocatícios de 20 % sobre o valor da condenação.
Em suas razões, a autora (apelante) sustenta, em síntese: (i) violação ao art. 186 c/c art. 927 do CC e aos arts. 6º, 14 e 20 do CDC, reivindicando dano moral ante o caráter alimentar do benefício vilipendiado; (ii) aplicação da teoria do valor-desestímulo, aduzindo que o quantum deve refletir a capacidade econômica da instituição financeira; (iii) pedido de majoração dos honorários, se mantida a procedência; (iv) pretensão final: reforma parcial da sentença para condenar os réus ao pagamento de indenização moral em valor adequado.
Es suas razões, o Banco Bradesco S.A. (apelante), pugna pelo reconhecimento da regularidade da contratação, apontando existência de contrato nº 346476434-3, transferido para conta da própria autora; a incidência da boa-fé objetiva e do pacta sunt servanda.
Requer a reforma total da sentença, com improcedência da demanda ou, subsidiariamente, exclusão da restituição em dobro e redução dos honorários.
Em contrarrazões, a parte ré pugna pela manutenção do indeferimento do dano moral, asseverando a ausência de ato ilícito e o risco de enriquecimento sem causa da autora.
Por sua vez, a autora apresenta contrarrazões ao recurso do banco, insistindo na nulidade do contrato por inobservância do art. 595 do CC (falta de assinatura de uma das testemunhas) e ausência de prova do repasse do valor contratado, defendendo a íntegra da sentença e reiterando o pleito indenizatório. É o relatório.
Decido.
II - DA ADMISSIBILIDADE RECURSAL Recursos interpostos tempestivamente.
Preparo do recurso interposto pelo Banco recolhido integralmente.
Preparo do recurso da autora não recolhido, uma vez que a mesma é beneficiária da gratuidade de justiça.
Presentes, ainda, os demais requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, quais sejam: cabimento, legitimidade, interesse para recorrer, inexistência de fato impeditivo ou extintivo e regularidade formal.
Assim sendo, RECEBO os recursos nos efeitos suspensivo e devolutivo, nos termos dos artigos 1.012, caput e 1.013, caput, do Código de Processo Civil.
III - DO MÉRITO RECURSAL De início, destaco que o artigo 932 do Código de Processo Civil versa sobre a competência delegada ao relator para a prática de atos processuais.
Dentre eles, existe a possibilidade de julgamento monocrático do recurso.
Dispõe o artigo 932, IV, do Código de Processo Civil, o seguinte: Art. 932.
Incumbe ao relator: IV - negar provimento a recurso que for contrário a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; Sobre o cerne da questão em apreço, constato que o Tribunal de Justiça do Estado do Piauí possui a súmula nº 18 no sentido de que “a ausência de transferência do valor do contrato para conta bancária de titularidade do mutuário enseja a declaração de nulidade da avença e seus consectários legais e pode ser comprovada pela juntada aos autos de documentos idôneos, voluntariamente pelas partes ou por determinação do magistrado nos termos do artigo 6º do Código de Processo Civil” Diante da existência da súmula nº 18 do Tribunal de Justiça e da previsão do artigo 932, IV, do Código de Processo Civil, é possível o julgamento monocrático por esta relatoria.
Ressalto que a matéria em discussão é regida pelas normas pertinentes ao Código de Defesa do Consumidor, porquanto a instituição financeira caracteriza-se como fornecedora de serviços, nos termos do artigo 3º.
Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
Além disso, há entendimento sumulado no Superior Tribunal de Justiça.
Súmula nº 297: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.
Diante da incidência da norma consumerista à hipótese em apreço, é cabível a aplicação da regra constante do art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor no tocante ao ônus probatório. É que, como cediço, o instituto da inversão do ônus da prova confere ao consumidor a oportunidade de ver direito subjetivo público apreciado, facilitando a sua atuação em juízo.
Nesse sentido: Art. 6º.
São direitos básicos do consumidor: [...] VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências. É importante destacar que o caso versa a respeito de contrato firmado com analfabeto.
Não restam dúvidas de que essas pessoas são capazes para os atos da vida civil.
Entretanto, para a prática de determinados atos, deve-se observar formalidades legais a fim de que aqueles tenham validade.
O artigo 595 do Código Civil preceitua o seguinte: “Art. 595.
No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas”.
Embora inserido na parte do Código Civil que trata especificamente do contrato de prestação de serviço, esta regra é aplicável a todo e qualquer negócio jurídico, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça.
DIREITO CIVIL.
RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C PEDIDOS DE RESTITUIÇÃO DE VALORES E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FIRMADO POR IDOSO INDÍGENA ANALFABETO.
VALIDADE.
REQUISITO DE FORMA.
ASSINATURA DO INSTRUMENTO CONTRATUAL A ROGO POR TERCEIRO, NA PRESENÇA DE DUAS TESTEMUNHAS.
ART. 595 DO CC/02.
PROCURADOR PÚBLICO.
DESNECESSIDADE. […] 7.
Embora o referido dispositivo legal se refira ao contrato de prestação de serviços, deve ser dada à norma nele contida o máximo alcance e amplitude, de modo a abranger todos os contratos escritos firmados com quem não saiba ler ou escrever, a fim de compensar, em algum grau, a hipervulnerabilidade desse grupo social. […] (REsp 1907394/MT, Rel.
Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/05/2021, DJe 10/05/2021).
Nesse contexto, analisando o conjunto probatório dos autos, verifica-se que o Banco acostou aos autos o instrumento contratual (ID 24141363), em que não se observa o cumprimento dos requisitos para a contratação com pessoa analfabeta, pois apesar de o contrato conter assinatura a rogo, constato que a mesma pessoa que assinou a rogo também o fez como testemunha, o que contraria o disposto no art. 595 do Código Civil.
Esse artigo exige que, além da assinatura a rogo, haja duas testemunhas distintas, requisito que não foi observado no presente caso.
Nula, portanto, a relação contratual.
A exigência de cumprimento dos requisitos de validade do negócio jurídico supracitado tem a função de garantir que os idosos analfabetos tenham verdadeiramente conhecimento do que está contratando, manifestando sua vontade de maneira livre e consciente. É neste sentido o entendimento do Superior Tribunal de Justiça.
RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO.
EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FIRMADO COM ANALFABETO. 1.
VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015.
FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE.
ENUNCIADO N. 284/STF. 2. ÔNUS DA PROVA.
QUESTÃO ADSTRITA À PROVA DA DISPONIBILIZAÇÃO FINANCEIRA.
APRECIAÇÃO EXPRESSA PELO TRIBUNAL LOCAL.
REEXAME DE FATOS E PROVAS.
INVIABILIDADE. 3.
VALIDADE DE CONTRATO FIRMADO COM CONSUMIDOR IMPOSSIBILITADO DE LER E ESCREVER.
ASSINATURA A ROGO, NA PRESENÇA DE DUAS TESTEMUNHAS, OU POR PROCURADOR PÚBLICO.
EXPRESSÃO DO LIVRE CONSENTIMENTO.
ACESSO AO CONTEÚDO DAS CLÁUSULAS E CONDIÇÕES CONTRATADAS. 4.
RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO. 1. […] 2. […] 3.
A liberdade de contratar é assegurada ao analfabeto, bem como àquele que se encontre impossibilitado de ler e escrever. 4.
Em regra, a forma de contratação, no direito brasileiro, é livre, não se exigindo a forma escrita para contratos de alienação de bens móveis, salvo quando expressamente exigido por lei. 5.
O contrato de mútuo, do qual o contrato de empréstimo consignado é espécie, se perfaz mediante a efetiva transmissão da propriedade da coisa emprestada. 6.
Ainda que se configure, em regra, contrato de fornecimento de produto, a instrumentação do empréstimo consignado na forma escrita faz prova das condições e obrigações impostas ao consumidor para o adimplemento contratual, em especial porque, nessa modalidade de crédito, a restituição da coisa emprestada se faz mediante o débito de parcelas diretamente do salário ou benefício previdenciário devido ao consumidor contratante pela entidade pagadora, a qual é responsável pelo repasse à instituição credora (art. 3º, III, da Lei n. 10.820/2003). 7.
A adoção da forma escrita, com redação clara, objetiva e adequada, é fundamental para demonstração da efetiva observância, pela instituição financeira, do dever de informação, imprescindíveis à livre escolha e tomada de decisões por parte dos clientes e usuários (art. 1º da Resolução CMN n. 3.694/2009). 8.
Nas hipóteses em que o consumidor está impossibilitado de ler ou escrever, acentua-se a hipossuficiência natural do mercado de consumo, inviabilizando o efetivo acesso e conhecimento às cláusulas e obrigações pactuadas por escrito, de modo que a atuação de terceiro (a rogo ou por procuração pública) passa a ser fundamental para manifestação inequívoca do consentimento. 9.
A incidência do art. 595 do CC/2002, na medida em que materializa o acesso à informação imprescindível ao exercício da liberdade de contratar por aqueles impossibilitados de ler e escrever, deve ter aplicação estendida a todos os contratos em que se adote a forma escrita, ainda que esta não seja exigida por lei. 10.
A aposição de digital não se confunde, tampouco substitui a assinatura a rogo, de modo que sua inclusão em contrato escrito somente faz prova da identidade do contratante e da sua reconhecida impossibilidade de assinar. 11.
Reconhecida pelas instâncias ordinárias a existência de assinatura a rogo no caso concreto, a alteração do acórdão recorrido dependeria de reexame de fatos e provas, inadmissível nesta estreita via recursal. 12.
Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido. (REsp 1868099/CE, Rel.
Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/12/2020, DJe 18/12/2020).
Sendo o contrato nulo, em decorrência do vício citado, a cobrança é indevida, sendo imperiosa a repetição do indébito.
Pela análise dos autos, a instituição financeira não se desincumbiu do seu ônus de provar que ocorreu o repasse do crédito contratado em favor da parte demandante, o que atrai a incidência da Súmula n° 18 desta Egrégia Corte de Justiça.
Logo, inexistindo a demonstração do pagamento, forçoso declarar a invalidade do negócio jurídico e, por consequência, a devolução dos valores descontados indevidamente do benefício da autora/apelante.
Diante da natureza consumerista da relação e da responsabilidade do fornecedor, independentemente da existência de culpa, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, entendo ser inviável impor à parte autora a comprovação da transferência de valores relacionados ao contrato, já que é ônus da parte requerida a incumbência da prova quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, conforme artigo 373, II, do Código de Processo Civil.
Dito isto, entendo ser cabível a aplicação do art. 6°, VIII, do CDC, relativo à inversão do ônus da prova.
No mesmo sentido, prescreve o art. 336, do CPC/15, in verbis: “Art. 336.
Incumbe ao réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa, expondo as razões de fato e de direito com que impugna o pedido do autor e especificando as provas que pretende produzir.” Pela análise do conjunto probatório dos autos, verifico a ausência de comprovação da transferência de valores relacionados ao contrato de empréstimo, ocasionando a declaração de invalidade da avença, nos termos da Súmula 18 do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí.
Vejamos. “TJPI/SÚMULA 18 – A ausência de transferência do valor do contrato para conta bancária de titularidade do mutuário enseja a declaração de nulidade da avença e seus consectários legais e pode ser comprovada pela juntada aos autos de documentos idôneos, voluntariamente pelas partes ou por determinação do magistrado nos termos do artigo 6º do Código de Processo Civil.” Destarte, a instituição financeira não se desincumbiu do seu ônus de provar a existência e validade da relação contratual e que ocorreu o repasse do crédito contratado em favor da parte apelada.
Logo, inexistindo contrato e a demonstração do respectivo pagamento, forçoso declarar a inexistência do negócio jurídico e, por consequência, a devolução dos valores descontados indevidamente do benefício previdenciário da parte recorrida.
Em relação à repetição do indébito, por ocasião do julgamento dos embargos de divergência em agravo em recurso especial EAREsp n.676.608/RS, de relatoria do Ministro OG FERNANDES, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça foi reformulado de modo reconhecer o direito à restituição em dobro do indébito por cobrança de valores referentes a serviços não contratados, por ser conduta contrária à boa-fé objetiva; porém, com a modulação dos efeitos do julgado para cobranças realizadas a partir da data da publicação do acórdão, em 30 de março de 2021.
Confira-se o paradigma do STJ: EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
CIVIL.
PROCESSUAL CIVIL.
TELEFONIA FIXA.
COBRANÇA INDEVIDA.
AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO DE TARIFAS. 1) RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO (PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 42 DO CDC).
DESINFLUÊNCIA DA NATUREZA DO ELEMENTO VOLITIVO DO FORNECEDOR QUE REALIZOU A COBRANÇA INDEVIDA.
DOBRA CABÍVEL QUANDO A REFERIDA COBRANÇA CONSUBSTANCIAR CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA. 2) APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL DO CÓDIGO CIVIL (ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL).
APLICAÇÃO ANALÓGICA DA SÚMULA 412/STJ. 3) MODULAÇÃO PARCIAL DOS EFEITOS DA DECISÃO.
CONHECIMENTO E PROVIMENTO INTEGRAL DO RECURSO. (...) Fixação das seguintes teses.
Primeira tese: A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que realizou a cobrança indevida, revelando-se cabível quando a referida cobrança consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva.
Segunda tese: A ação de repetição de indébito por cobrança de valores referentes a serviços não contratados promovida por empresa de telefonia deve seguir a norma geral do prazo prescricional decenal, consoante previsto no artigo 205 do Código Civil, a exemplo do que decidido e sumulado no que diz respeito ao lapso prescricional para repetição de tarifas de água e esgoto (Súmula 412/STJ).
Modulação dos efeitos: Modulam-se os efeitos da presente decisão - somente com relação à primeira tese - para que o entendimento aqui fixado quanto à restituição em dobro do indébito seja aplicado apenas a partir da publicação do presente acórdão.
A modulação incide unicamente em relação às cobranças indevidas em contratos de consumo que não envolvam prestação de serviços públicos pelo Estado ou por concessionárias, as quais apenas serão atingidas pelo novo entendimento quando pagas após a data da publicação do acórdão. (EAREsp 676.608/RS, Rel.
Ministro OG FERNANDES, CORTE ESPECIAL, julgado em 21/10/2020, DJe 30/03/2021).
Grifei Portanto, no tocante à restituição dos valores descontados, a sentença recorrida determinou a devolução em dobro, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC.
Contudo, em observação à modulação definida no EAREsp 676.608/RS (STJ), a condenação deve seguir os seguintes critérios: a) Para os valores descontados após 30/03/2021, a repetição do indébito deve ocorrer em dobro, com correção monetária e juros legais; b) Para os valores descontados antes de 30/03/2021, a devolução deve ocorrer de forma simples, com correção monetária e juros legais.
No que tange aos prejuízos imateriais alegados, o desconto indevido pode gerar danos morais, bastando para isso que o consumidor seja submetido a um constrangimento ilegal, como a cobrança de valores atinentes a um contrato nulo.
Deve ficar evidenciado, ainda, que isso repercutiu psicologicamente no bem-estar do consumidor, de forma a não ficar caracterizado o mero aborrecimento.
Isto reconhecido, como é o caso dos autos, em que a empresa ré agiu com desídia ao retirar quantias da conta do acionante, impõe-se o estabelecimento de uma compensação financeira, a título de danos morais, observado a motivação reparadora.
Ademais, na hipótese dos autos, é certo que o dever de indenizar resulta da própria conduta lesiva evidenciada, independente de prova dos abalos psíquicos causados, pois, em casos tais, o dano é “in re ipsa”, isto é, decorre diretamente da ofensa, por comprovação do ilícito, que ficou sobejamente demonstrado nos autos.
O próprio STJ firmou entendimento no sentido de que “a concepção atual da doutrina orienta-se no sentido de que a responsabilização do agente causador do dano moral opera-se por força do simples fato de violação (damnum in re ipsa).
Verificado o evento danoso surge a necessidade de reparação, não havendo que se cogitar da prova do prejuízo, se presentes os pressupostos legais para que haja a responsabilidade civil (nexo de causalidade e culpa)” (STJ – 4ª T. – REL CESAR ASFOR ROCHA – RT 746/183).
Com base nestas balizas, e considerando a proporcionalidade e razoabilidade aplicável ao caso, tenho como suficiente para compensar o prejuízo imaterial suportado pela autora/apelada, o montante de R$ 2.000,00 (dois mil reais), a título de danos morais, observando-se o caráter compensatório e repressivo da medida.
IV - DISPOSITIVO Por todo o exposto, com fundamento no art. 932, IV, “a”, do CPC, CONHEÇO dos recursos, afastando as preliminares suscitadas, para, no mérito, DAR PARCIAL PROVIMENTO a ambos os apelos, reformando a Sentença de 1º grau, no capítulo dos danos materiais e morais, nos seguintes termos: a) determinar que a restituição dos valores descontados indevidamente deve ser de forma simples, até o dia 30/03/2021, e em dobro a partir de então, nos termos do EAREsp 676608/RS.
A correção monetária incidirá desde cada desconto indevido e os juros de mora desde a citação.
Até 29/08/2024, aplica-se a Tabela do TJPI e juros de 1% ao mês.
A partir de 30/08/2024, conforme a Lei nº 14.905/2024, aplica-se a SELIC, que abrange correção e juros.
Se a SELIC for negativa, o índice será considerado nulo; b) condenar a instituição financeira demandada ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais).
A correção monetária incide a partir da data da publicação desta Decisão (Súmula 362/STJ), pelo IPCA; e juros de mora a partir da citação (arts. 405 e 406, do CC).
Aplicam-se juros de 1% ao mês até 29/08/2024 e, a partir de então, a taxa SELIC, nos termos do art. 406, §1º, do Código Civil; Mantidos os demais termos da Sentença, inclusive quanto aos ônus sucumbenciais e montante dos respectivos honorários advocatícios.
Intimem-se as partes.
Transcorrido o prazo recursal sem manifestação, arquivem-se os autos, dando-se baixa na distribuição.
Cumpra-se.
Teresina, data e assinatura registradas no sistema eletrônico.
Desembargador MANOEL DE SOUSA DOURADO Relator -
03/04/2025 20:45
Remetidos os Autos (em grau de recurso) para à Instância Superior
-
03/04/2025 20:44
Expedição de Certidão.
-
03/04/2025 20:44
Expedição de Certidão.
-
20/03/2025 11:23
Juntada de Petição de manifestação
-
10/03/2025 14:07
Juntada de Petição de contrarrazões da apelação
-
28/02/2025 11:43
Expedição de Outros documentos.
-
28/02/2025 11:41
Expedição de Certidão.
-
21/01/2025 15:23
Juntada de Petição de petição
-
18/12/2024 21:34
Juntada de Petição de apelação
-
18/12/2024 15:09
Juntada de Petição de apelação
-
28/11/2024 12:20
Expedição de Outros documentos.
-
28/11/2024 12:20
Julgado procedente em parte do pedido
-
09/09/2024 10:43
Conclusos para despacho
-
09/09/2024 10:43
Expedição de Certidão.
-
09/09/2024 10:40
Expedição de Certidão.
-
13/08/2024 14:24
Expedição de Aviso de recebimento (AR).
-
13/08/2024 14:22
Expedição de Certidão.
-
13/08/2024 14:21
Expedição de Aviso de recebimento (AR).
-
22/07/2024 21:45
Expedição de Aviso de recebimento (AR).
-
22/07/2024 21:45
Expedição de Aviso de recebimento (AR).
-
22/07/2024 21:44
Expedição de Certidão.
-
12/07/2024 12:49
Expedição de Ofício.
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22/03/2024 03:43
Decorrido prazo de BANCO BRADESCO em 21/03/2024 23:59.
-
29/02/2024 11:47
Juntada de Petição de manifestação
-
28/02/2024 09:13
Expedição de Outros documentos.
-
28/02/2024 09:13
Decisão de Saneamento e de Organização do Processo
-
05/10/2023 12:51
Conclusos para julgamento
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05/10/2023 12:51
Expedição de Certidão.
-
05/10/2023 12:51
Expedição de Certidão.
-
11/09/2023 09:26
Expedição de Certidão.
-
24/04/2023 10:09
Juntada de Petição de manifestação
-
13/04/2023 14:52
Juntada de Petição de petição
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31/03/2023 13:58
Juntada de Petição de manifestação
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21/03/2023 15:35
Juntada de Petição de petição
-
21/03/2023 10:19
Expedição de Outros documentos.
-
21/03/2023 10:19
Proferido despacho de mero expediente
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15/02/2023 11:27
Conclusos para despacho
-
15/02/2023 11:27
Expedição de Certidão.
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09/01/2023 15:06
Juntada de Petição de contestação
-
23/11/2022 08:26
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
23/11/2022
Ultima Atualização
28/11/2024
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Sentença • Arquivo
Sentença • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
Despacho • Arquivo
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