TJRJ - 0807873-46.2025.8.19.0031
1ª instância - Marica 2 Vara Civel
Polo Ativo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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22/09/2025 15:03
Juntada de Petição de petição
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03/09/2025 10:57
Juntada de Petição de petição
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14/08/2025 22:52
Juntada de Petição de petição
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14/08/2025 00:49
Publicado Intimação em 14/08/2025.
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14/08/2025 00:49
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 13/08/2025
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13/08/2025 00:00
Intimação
Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Comarca de Maricá 2ª Vara Cível da Comarca de Maricá Rua Jovino Duarte de Oliveira, S/N, Centro, MARICÁ - RJ - CEP: 24901-130 DECISÃO Processo: 0807873-46.2025.8.19.0031 Classe: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) AUTOR: GABRIEL CRUZ DOS SANTOS RÉU: MERCADO PAGO, MERCADOLIVRE COM ATIVIDADES DE INTERNET LTDA DIREITO DO CONSUMIDOR – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO – BLOQUEIO DE CONTA EM PLATAFORMA DE MARKETPLACE – REJEIÇÃO DE PRELIMINARES – INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA – PROCESSO SANEADO I.
CASO EM EXAME 1.Trata-se de ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais e materiais, ajuizada por microempresário individual contra operadoras de marketplace e de serviços de pagamento online, visando ao desbloqueio de conta comercial e liberação de valores retidos, bem como reparação por lucros cessantes e abalo moral. 2.O autor relata suspensão indevida e imotivada de sua conta, vinculada a suposta fraude praticada por terceiros, seguida de bloqueio definitivo por alegadas “vendas suspeitas”, que nega.
Afirma retenção de R$ 1.759,00 e descumprimento reiterado de tutela antecipada. 3.As rés, em contestação conjunta, suscitaram preliminares de ilegitimidade passiva de uma das empresas e de incompetência territorial, além de defenderem a regularidade do bloqueio com fundamento nos Termos e Condições da plataforma.
Alegaram comportamento irregular do autor e necessidade de retenção temporária de valores como garantia.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em: (i) verificar a legitimidade da suspensão e posterior inabilitação da conta; (ii) apurar o efetivo cumprimento da tutela antecipada; (iii) examinar a ocorrência e extensão de danos materiais e morais; (iv) definir a incidência do Código de Defesa do Consumidor à relação jurídica; e (v) estabelecer a distribuição e inversão do ônus da prova.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 1.Preliminar de ilegitimidade passiva– Rejeitada.
Aplicação das teorias da asserção e da aparência, reconhecendo-se a legitimidade de ambas as rés, integrantes do mesmo grupo econômico e responsáveis solidárias pela prestação do serviço, nos termos do CDC. 2.Preliminar de incompetência territorial– Rejeitada.
Reconhecimento da relação de consumo, aplicação da teoria finalista mitigada e nulidade da cláusula de eleição de foro por abusividade, assegurando-se a competência do foro do domicílio do autor (art. 101, I, do CDC). 3.Questões processuais– Não existindo questões processuais pendentes de solução (art. 357, I do CPC), o processo se encontra apto para a colheita de provas. 4.Questões de fato controvertidas– Legitimidade do bloqueio da conta; cumprimento integral da tutela antecipada; extensão dos lucros cessantes; ocorrência e dimensão do dano moral. 5.Distribuição do ônus da prova– Regra geral do art. 373 do CPC, com inversão ope judicis em favor do consumidor (art. 6º, VIII, do CDC), impondo às rés a prova de fatos concretos e objetivos que legitimaram o bloqueio, do efetivo restabelecimento da conta e da inexistência dos danos alegados. 6.Questões de direito controvertidas– Aplicabilidade do CDC; interpretação do contrato de adesão segundo a boa-fé objetiva e função social; exame da conduta das rés à luz do exercício regular de direito versus abuso; responsabilidade civil objetiva e critérios indenizatórios; efeitos jurídicos do eventual descumprimento de decisão judicial. 7.Provas deferidas– Encerrada a instrução probatória por desinteresse das partes, facultando-se às rés a apresentação de documentos e requerimento de outras provas para cumprimento do seu ônus probatório.
IV.
DISPOSITIVO PROCESSO SANEADO– Rejeitadas as preliminares, fixados os pontos controvertidos, invertido o ônus da prova em favor do autor e facultada às rés a apresentação de provas nos termos da decisão.
Dispositivos relevantes citados:arts. 5º, XXXV, da CF; 6º, VIII; 7º, parágrafo único; 25, § 1º; 51, XV; 54; 101, I, do CDC; 187 e 188, I, do CC; 357, I a IV, e 373 do CPC.
Vistos etc.
BREVE RELATO Trata-se de Ação de Obrigação de Fazer cumulada com Indenização por Danos Morais e Materiais, com pedido de tutela de urgência, ajuizada por GABRIEL CRUZ DOS SANTOS em face de MERCADO PAGO INSTITUIÇÃO DE PAGAMENTO LTDA e MERCADOLIVRE.COM ATIVIDADES DE INTERNET LTDA.
Narra o autor, em síntese, que, na qualidade de empresário individual (CNPJ nº 60.***.***/0001-73), criou em 17/04/2025 sua primeira conta profissional nas plataformas das rés, com o objetivo de realizar vendas de seus produtos.
Alega que, de forma surpreendente e imotivada, sua conta foi suspensa sob a justificativa de vinculação a uma outra conta que desconhece, supostamente criada de forma fraudulenta por terceiros com seus dados.
Afirma que, após registrar reclamação no portal Consumidor.gov.br (Protocolo nº 2025.04/*00.***.*84-23), a conta foi momentaneamente desbloqueada, mas, em 20/04/2025, foi novamente suspensa, desta vez de forma permanente, sob a alegação de "vendas suspeitas", o que nega veementemente.
Sustenta que a conduta das rés é abusiva, arbitrária e impede o exercício de sua atividade empresarial, além de ter resultado na retenção indevida de valores provenientes de duas vendas, uma no valor de R$ 960,00 (realizada em 17/04/2025) e outra de R$ 799,00 (realizada em 19/04/2025), totalizando R$ 1.759,00.
A causa de pedir remota assenta-se na falha na prestação do serviço e na violação da boa-fé objetiva, enquanto a causa de pedir próxima reside nos danos materiais (lucros cessantes e retenção de valores) e morais decorrentes do bloqueio.
Requereu, em sede de tutela de urgência, o imediato desbloqueio de suas contas nas plataformas Mercado Livre e Mercado Pago, bem como a liberação dos valores retidos.
Ao final, pugnou pela confirmação da tutela, a condenação das rés ao pagamento de indenização por danos morais e materiais, a inversão do ônus da prova e a concessão do benefício da gratuidade de justiça.
Atribuiu à causa o valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais).
A petição inicial (ID 189517141), cujo conteúdo foi extraído das peças subsequentes, veio instruída com documentos pessoais, comprovante de residência, procuração, declarações de hipossuficiência e isenção de IRPF, extratos bancários, comprovante de inscrição no CNPJ e cópia da reclamação administrativa.
Através da decisão de ID 190299409, cujo teor se extrai dos Embargos de Declaração de ID 192270436, este Juízo deferiu o benefício da gratuidade de justiça e a tutela de urgência para determinar que as rés, no prazo de 48 horas, procedessem ao desbloqueio das contas do autor e à liberação dos valores retidos (R$ 1.759,00), sob pena de multa diária de R$ 1.000,00, limitada a R$ 30.000,00.
As rés foram devidamente citadas e intimadas da decisão liminar (IDs 190347422 e 190347423).
Em petição de ID 191059704, as rés requereram dilação de prazo para cumprimento da medida.
Opondo Embargos de Declaração (ID 192270436), as rés alegaram omissão na decisão liminar, ao argumento de que não haveria prova do saldo exato de R$ 1.759,00 na conta do autor, requerendo que a liberação se limitasse ao valor efetivamente existente.
Regularmente citadas, as rés apresentaram contestação conjunta (ID 196529869).
Em sede preliminar, arguiram a ilegitimidade passiva da ré MERCADOLIVRE.COM ATIVIDADES DE INTERNET LTDA, ao argumento de que os fatos se relacionam exclusivamente com os serviços financeiros prestados pela ré MERCADO PAGO INSTITUIÇÃO DE PAGAMENTO LTDA.
Suscitaram, ainda, a incompetência territorial deste Juízo, defendendo a validade da cláusula de eleição de foro que estabelece a Comarca de São Paulo-SP como competente.
No mérito, sustentaram a legitimidade da inabilitação da conta do autor, afirmando tratar-se de exercício regular de direito, em conformidade com os Termos e Condições da plataforma.
Alegaram que a suspensão definitiva, ocorrida em 15/05/2025, decorreu da detecção de comportamento irregular, caracterizado por um baixo índice de aprovação e diversos pagamentos rejeitados, o que representaria risco à segurança do ecossistema.
Defenderam a legalidade do bloqueio temporário de valores como medida de garantia para ressarcir eventuais prejuízos a terceiros.
Impugnaram a obrigação de fazer, a existência de danos morais e materiais, e o pedido de inversão do ônus da prova.
Requereram o acolhimento das preliminares ou, no mérito, a total improcedência dos pedidos.
Juntaram atos constitutivos e procurações.
No curso do processo, instaurou-se intensa controvérsia sobre o cumprimento da tutela de urgência.
As rés, em petições de IDs 196391156 e 199288410, informaram o integral cumprimento da liminar, juntando telas sistêmicas que indicariam a reativação da conta e a disponibilização de saldo no valor de R$ 1.837,35.
O autor, por sua vez, em sucessivas manifestações (IDs 197917968, 200906743, 208387649 e 212799659), alegou o descumprimento reiterado e dissimulado da ordem judicial.
Sustentou que, apesar de a conta aparentar estar "ativa", as rés passaram a bloquear e recusar sistematicamente todas as suas tentativas de venda e, posteriormente, até mesmo de compra, tornando a reativação inócua e continuando a lhe causar prejuízos, que, segundo planilha juntada, já alcançariam o montante de R$ 34.523,00.
Requereu a majoração da multa, a conversão da obrigação em perdas e danos e a aplicação de multa por ato atentatório à dignidade da justiça.
A decisão de ID 203129548 rejeitou os Embargos de Declaração opostos pelas rés e, diante da controvérsia sobre o cumprimento da liminar, determinou que as rés comprovassem, de forma detalhada e técnica, o fiel cumprimento da medida, sob pena de majoração da multa.
Em despacho de ID 210739008, este Juízo instou as partes a especificarem as provas que pretendiam produzir.
O autor (ID 212807115) e as rés (ID 213190248) manifestaram desinteresse na produção de novas provas, pugnando pelo julgamento antecipado da lide. É o breve relatório.
Decido.
DAS PRELIMINARES As rés suscitaram preliminares de ilegitimidade passiva e incompetência territorial, as quais passo a analisar. 1.
Da Ilegitimidade Passiva da Ré MERCADOLIVRE.COM ATIVIDADES DE INTERNET LTDA A ré MERCADOLIVRE.COM ATIVIDADES DE INTERNET LTDA argumenta ser parte ilegítima para figurar no polo passivo, sob o fundamento de que a controvérsia diz respeito exclusivamente aos serviços de pagamento prestados pela corré MERCADO PAGO INSTITUIÇÃO DE PAGAMENTO LTDA.
A preliminar não merece acolhida.
A análise da questão deve ser pautada pela Teoria da Asserção, segundo a qual as condições da ação, dentre elas a legitimidade das partes, são aferidas em abstrato, com base nas alegações contidas na petição inicial.
O autor imputa a ambas as empresas a responsabilidade pelos danos sofridos, descrevendo uma atuação conjunta e integrada que, sob a ótica do usuário, se apresenta como um serviço único e indissociável.
Ademais, no âmbito das relações de consumo, aplica-se a Teoria da Aparência, que visa a proteger a confiança do consumidor que, de boa-fé, contrata com quem se apresenta como o efetivo fornecedor do serviço.
As rés, embora possuam personalidades jurídicas distintas, integram o mesmo grupo econômico e operam sob a mesma marca guarda-chuva, apresentando-se ao mercado como um ecossistema unificado.
O usuário cria uma conta que lhe dá acesso tanto à plataforma de marketplace(Mercado Livre) quanto à de pagamentos (Mercado Pago), sendo a interdependência entre os serviços evidente e essencial ao modelo de negócio.
A suspensão em uma plataforma, como narrado, repercute diretamente na outra, reforçando a percepção de unidade.
Nesse sentido, a jurisprudência pátria tem reconhecido a responsabilidade solidária de empresas do mesmo grupo econômico que, perante o consumidor, atuam de forma coligada.
A separação formal das pessoas jurídicas não pode servir de escudo para eximir de responsabilidade aquela que, por sua atuação e imagem, gerou no consumidor a legítima expectativa de que também era responsável pela integralidade do serviço.
Portanto, com base na Teoria da Asserção e na Teoria da Aparência, e considerando a responsabilidade solidária prevista no Código de Defesa do Consumidor (arts. 7º, parágrafo único, e 25, § 1º), ambas as rés são partes legítimas para figurar no polo passivo da demanda.
Rejeito, pois, a preliminar de ilegitimidade passiva. 2.
Da Incompetência Territorial As rés arguem a incompetência deste Juízo, com base em cláusula de eleição de foro prevista nos Termos e Condições de Uso, que estabelece a Comarca de São Paulo-SP como competente para dirimir controvérsias.
A preliminar também deve ser rechaçada.
A relação jurídica estabelecida entre as partes, ainda que o autor seja empresário individual, ostenta natureza consumerista.
O autor, embora utilize a plataforma para fins comerciais, enquadra-se no conceito de consumidor por equiparação, à luz da teoria finalista mitigada, adotada pelo Superior Tribunal de Justiça.
Evidencia-se, no caso concreto, a sua vulnerabilidade técnica, informacional e econômica perante as rés, conglomerado de grande porte que detém o monopólio das informações e do poder decisório sobre a relação contratual.
O contrato firmado é de adesão (art. 54 do CDC), cujas cláusulas são preestabelecidas unilateralmente, sem possibilidade de discussão pelo aderente.
Nesse contexto, a cláusula de eleição de foro que dificulta o acesso do consumidor à justiça é considerada nula de pleno direito, por ser abusiva, nos termos do art. 51, XV, do Código de Defesa do Consumidor.
O art. 101, I, do mesmo diploma legal, assegura ao consumidor a faculdade de propor a ação em seu domicílio, norma de ordem pública que visa a facilitar a defesa de seus direitos em juízo.
A imposição de que o autor, microempresário domiciliado em Maricá/RJ, litigue na Comarca de São Paulo/SP representaria um obstáculo desproporcional e injustificado ao seu direito fundamental de acesso à justiça (art. 5º, XXXV, da Constituição Federal).
A tramitação eletrônica do processo, embora mitigue algumas dificuldades, não elimina por completo os ônus decorrentes do ajuizamento da demanda em foro distante, especialmente em caso de eventual necessidade de produção de provas ou comparecimento a atos processuais.
Dessa forma, reconheço a abusividade da cláusula de eleição de foro e, por conseguinte, a competência deste Juízo para processar e julgar o feito, com fundamento no art. 101, I, do CDC.
Rejeito, assim, a preliminar de incompetência territorial.
Superadas as questões processuais pendentes de solução (art. 357, I do CPC), de modo que o processo se encontra apto para a colheita de provas.
Motivo pelo qual, passo a delimitar as questões de fato sobre as quais recairá a atividade probatória, especificando os meios de provas admitidos (art. 357, II do CPC).
DELIMITAÇÃO DAS QUESTÕES DE FATO Confrontando a petição inicial e a contestação, verifico que são fatos incontroversos, porquanto admitidos por ambas as partes ou não impugnados especificamente (art. 374, II e III, do CPC): (a) a existência de relação contratual entre as partes, regida pelos Termos e Condições de Uso das plataformas; (b) a criação da conta pelo autor em 17/04/2025; (c) a suspensão/bloqueio da referida conta pelas rés; e (d) a concessão de tutela de urgência por este Juízo determinando a reativação da conta e a liberação de valores.
Por outro lado, remanescem como questões de fato controvertidase relevantes para o deslinde da causa, sobre as quais deverá recair a atividade probatória: 1.A legitimidade da suspensão inicial e posterior inabilitação definitiva da conta do autor:Cumpre aferir se a conduta do autor configurou, de fato, "comportamento irregular" ou violação aos Termos e Condições, notadamente no que tange ao alegado "baixo índice de aprovação nos pagamentos transacionados", e se a sanção aplicada foi proporcional e precedida do devido processo informativo. 2.O efetivo cumprimento da tutela de urgência deferida:Verificar se, após a ordem judicial, a conta do autor foi restabelecida em sua plena funcionalidade ou se persistem restrições que impeçam ou dificultem a realização de vendas e compras, configurando descumprimento da medida. 3.A existência e a extensão dos danos materiais (lucros cessantes):Apurar se o autor deixou de auferir lucros em razão do bloqueio da conta e da posterior recusa de vendas, bem como o montante do prejuízo efetivamente suportado. 4.A ocorrência de dano moral:Analisar se a situação vivenciada pelo autor (bloqueio de sua ferramenta de trabalho, retenção de valores e o suposto descumprimento de ordem judicial) ultrapassou o mero aborrecimento, atingindo seus direitos da personalidade e causando-lhe abalo psíquico indenizável.
DISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS DA PROVA 9.1.
Regra Geral e sua Aplicação ao Caso Concreto A distribuição do ônus probatório é regra de julgamento que orienta a atividade das partes e do juiz.
O Código de Processo Civil, em seu art. 373, estabelece a regra geral estática, segundo a qual incumbe ao autor a prova do fato constitutivo de seu direito (inciso I) e ao réu a prova da existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor (inciso II).
No caso em tela, sob a ótica da regra geral, caberia ao autor provar o bloqueio indevido, a falha na prestação do serviço e os danos decorrentes. Às rés, por sua vez, competiria demonstrar a legitimidade de sua conduta, ou seja, que o bloqueio se deu por justo motivo (exercício regular de direito), em razão de violação contratual praticada pelo autor. 9.2.
Da Modificação do Ônus Probatório e a Inversão em Favor do Consumidor Conforme já fundamentado na análise das preliminares, a relação jurídica em exame é regida pelo Código de Defesa do Consumidor.
A condição do autor como microempresário individual não descaracteriza sua vulnerabilidade perante o poderio econômico e técnico das rés, provedoras de serviços em massa por meio de contrato de adesão.
Tal cenário atrai a incidência do microssistema protetivo consumerista, incluindo seus institutos processuais.
Nesse sentido é pacífica a jurisprudência: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL.
CONSUMIDOR.
COMPRA DE VEÍCULO AUTOMOTOR COM DEFEITO.
ARTIGOS 489 E 1.022 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
OMISSÃO.
INOCORRÊNCIA.
PESSOA JURÍDICA.
AQUISIÇÃO DO VEÍCULO PARA USO DE UM DOS SÓCIOS.
DESTINATÁRIO FINAL.
APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
ARTIGO 18, § 2º, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
PRAZO CONVENCIAL.
NULIDADE.
FUNDAMENTO NÃO INFIRMADO.
SÚMULAS 283 E 284/STF.
ARTIGO 26 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
PRAZO DECADENCIAL.
TERMO INICIAL.
CONSTATAÇÃO DO VÍCIO.
PRECEDENTES.
NÃO PROVIDO. 1.
Não há falar-se em violação aos arts. 489, II, e 1.022 do CPC se o Tribunal de origem examina o recurso atendo-se aos limites objetivos da matéria devolvida. 2.
A jurisprudência desta Corte Superior, em relação ao conceito de consumidor, adota a teoria finalista mitigada, admitindo-se a aplicação do Código de Defesa do Consumidor a aquisições de produto por pessoa jurídica, quando evidenciada a vulnerabilidade do adquirente, como no caso.
Súmula 83//STJ. 3.
A falta de impugnação a fundamento necessário e suficiente para manter a conclusão do acórdão recorrido atrai a aplicação das Súmulas 283 e 284/STF. 4.
A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de afirmar que o termo inicial do prazo decadencial, no caso de vício oculto, é a data em que o consumidor toma ciência do vício.
Súmula 83/STJ. 5.
O valor a ser restituído ao consumidor deve corresponder à quantia paga, corrigida monetariamente desde o desembolso, conforme prevê o inciso II do § 1° do art. 18 do CDC, não sendo devido abatimento decorrente da utilização do produto.
Súmula 83/STJ. 6.
Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp n. 2.419.630/SP, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 12/8/2024, DJe de 14/8/2024.) RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO REGRESSIVA.
SEGURO.
PESSOA JURÍDICA.
TRANSPORTADORA QUE CONTRATA SEGURO PARA PROTEÇÃO DE SUA FROTA E CONTRA DANOS CAUSADOS A TERCEIROS.
DESTINATÁRIA FINAL DO PRODUTO.
APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
NECESSIDADE DE ANÁLISE CONJUNTA DO CRITÉRIO DA VULNERABILIDADE.
CLÁUSULA LIMITATIVA DE COBERTURA.
CASO CONCRETO.
VALIDADE.
APLICAÇÃO DAS SÚMULAS 5 E 7/STJ.
DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO.
RECURSO NÃO PROVIDO. 1.
O art. 2º do Código de Defesa do Consumidor abarca expressamente a possibilidade de as pessoas jurídicas figurarem como consumidores, não havendo, portanto, critério pessoal de definição de tal conceito. 2.
A caracterização do consumidor deve partir da premissa de ser a pessoa jurídica destinatária final do produto ou serviço, sem deixar de ser apreciada a questão da vulnerabilidade. 3. É sempre a situação do caso em concreto que será hábil a demonstrar se existe ou não relação de consumo, sendo o emprego final do produto determinante para conferir à pessoa jurídica a qualidade de consumidora, tendo como parâmetro, além da utilização de insumo imprescindível à atividade, também a sua vulnerabilidade. 4.
Se o transportador contrata seguro visando à proteção da carga pertencente a terceiro, em regra, não pode ser considerado consumidor, uma vez que utiliza os serviços securitários como instrumento dentro do processo de prestação de serviços e com a finalidade lucrativa. 5.
O transportador que contrata seguro objetivando a proteção de sua frota veicular ou contra danos causados a terceiros, em regra, enquadra-se no conceito de consumidor, pois é destinatário final do produto. 6.
A moldura fática entregue pelo Tribunal permite concluir que o esclarecimento contido no contrato acerca da abrangência da cobertura securitária satisfaz o comando normativo segundo o qual as cláusulas limitadoras devem ser claras aos olhos dos seus destinatários. 7.
A análise mais aprofundada de cláusulas contratuais, fora dos parâmetros fixados na sentença de piso e pelo Tribunal de origem, encontra óbice nos enunciados das Súmulas 5 e 7/STJ. 8.
A recorrente não cumpriu o disposto no § 2º do art. 255 do RISTJ, pois a demonstração da divergência não se satisfaz com a simples transcrição de ementas, mas com o confronto entre trechos do acórdão recorrido e das decisões apontadas como divergentes, mencionando-se as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados. 9.
Recurso especial não provido. (REsp n. 1.176.019/RS, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 20/10/2015, DJe de 17/11/2015.) O art. 6º, VIII, do CDC, prevê a inversão do ônus da prova como um direito básico do consumidor, a critério do juiz, quando for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências.
Ambos os requisitos se encontram preenchidos no caso concreto.
A verossimilhança das alegações do autor extrai-se da narrativa coesa e dos documentos que instruem a inicial e as petições subsequentes, que demonstram o bloqueio e as dificuldades enfrentadas.
A hipossuficiência, por sua vez, é manifesta em sua vertente técnica.
As rés detêm o monopólio de acesso às informações, aos algoritmos, aos registros sistêmicos (logs) e aos critérios internos que fundamentaram a suspensão da conta e a posterior recusa de transações.
Exigir que o autor produza prova negativa (de que não agiu de forma irregular) ou que demonstre o funcionamento interno dos sistemas de segurança das rés seria impor-lhe um ônus probatório diabólico, ou seja, impossível ou excessivamente difícil de ser cumprido, o que viola o princípio da paridade de armas e o acesso efetivo à justiça.
A inversão do ônus da prova, portanto, não é uma liberalidade judicial, mas um imperativo de isonomia e equidade processual, essencial para reequilibrar a relação jurídica e garantir a efetividade da tutela jurisdicional.
Conforme leciona a doutrina, a inversão ope judicisé uma técnica que visa a facilitar a defesa do consumidor em juízo, transferindo ao fornecedor, que possui melhores condições técnicas e informacionais, o encargo de provar a correção de sua conduta e a inexistência do defeito no serviço. 9.3.
Delimitação da Inversão do Ônus da Prova Diante do exposto, com fundamento no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, DEFIRO a inversão do ônus da provae estabeleço que incumbirá às résprovar, de forma clara, objetiva e documentalmente robusta: a) Quanto à legitimidade da suspensão (Ponto Controvertido 1):A existência de fatos concretos, específicos e objetivos que caracterizaram o "comportamento irregular" do autor.
Não basta a mera alegação genérica de "baixo índice de aprovação" ou a juntada de telas sistêmicas unilaterais.
As rés deverão apresentar relatórios técnicos detalhados, registros de auditoria ou outros documentos idôneos que demonstrem, inequivocamente, as transações consideradas suspeitas e os critérios objetivos utilizados para tal classificação, provando que a medida foi necessária e proporcional. b) Quanto ao cumprimento da tutela de urgência (Ponto Controvertido 2):Que a conta do autor foi restabelecida em sua integralidade, com todas as funcionalidades (venda, compra, transferências) ativas e operantes, sem quaisquer restrições ou limitações discriminatórias.
Deverão, ainda, comprovar tecnicamente por que as transações indicadas pelo autor como "recusadas" após a liminar foram, de fato, rejeitadas por motivos legítimos e ordinários do sistema de segurança (aplicáveis a qualquer usuário em situação idêntica), e não como forma de retaliação ou descumprimento velado da ordem judicial. c) Quanto à inexistência de danos (Pontos Controvertidos 3 e 4):A ausência de nexo de causalidade entre sua conduta e os danos alegados pelo autor, demonstrando que o bloqueio foi legítimo e que não houve falha na prestação do serviço.
DELIMITAÇÃO DAS QUESTÕES DE DIREITO Fixados os pontos fáticos controvertidos e distribuído o ônus probatório, as questões de direito relevantespara o julgamento do mérito (art. 357, IV, do CPC) são as seguintes: 1.A aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor à relação entre as partes, com base na teoria finalista mitigada, e suas consequências jurídicas (responsabilidade objetiva, inversão do ônus da prova, nulidade de cláusulas abusivas). 2.A natureza jurídica do contrato de adesão firmado e a interpretação de suas cláusulas à luz dos princípios da boa-fé objetiva, da função social do contrato e da proteção ao aderente vulnerável. 3.A análise da conduta das rés sob a ótica do exercício regular de um direito (art. 188, I, do Código Civil) em contraposição à configuração de ato ilícito por abuso de direito (art. 187 do Código Civil) ou falha na prestação do serviço (art. 14 do CDC). 4.A configuração da responsabilidade civil objetiva das rés, a existência dos pressupostos para a condenação em danos materiais (lucros cessantes) e danos morais (in re ipsaou comprovado), e os critérios para a fixação do quantumindenizatório, observando os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. 5.As consequências processuais e materiais do eventual descumprimento reiterado de decisão judicial que antecipou os efeitos da tutela.
DAS PROVAS Ambas as partes manifestaram desinteresse na produção de outras provas, requerendo o julgamento antecipado da lide.
Motivo pelo qual declaro encerrada a instrução probatório.
Contudo, considerando a inversão do ônus probatório e a necessidade de esclarecer os pontos controvertidos, faculto aos Réus a oportunidade de requerem a produção de outras provas, para o cumprimento do seu ônus probatório.
EPÍLOGO Pelo exposto, com fundamento no art. 357 do Código de Processo Civil: 1.DECLAROo processo saneado. 2.REJEITOas preliminares de ilegitimidade passiva e incompetência territorial. 3.FIXOcomo pontos fáticos controvertidos aqueles elencados no item "Delimitação das Questões de Fato". 4.DEFIROa inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC, atribuindo às rés o encargo probatório especificado no item 9.3 deste despacho. 5.INTIMEM-SEas partes desta decisão, advertindo-as de que, nos termos do art. 357, § 1º, do CPC, poderão solicitar esclarecimentos ou ajustes no prazo comum de 5 (cinco) dias, findo o qual a decisão se tornará estável.
Concedo ao Réu o prazo de 15 (quinze) dias, a contar da estabilização desta decisão, para apresentar todos os documentos, solicitar outras provas e esclarecimentos técnicos necessários ao cumprimento de seu ônus probatório, conforme detalhado no item 9.3, sob pena de presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor.
Após o decurso do prazo, com ou sem a juntada de novos documentos pela parte ré, dê-se vista ao autor por 15 (quinze) dias e, em seguida, retornem os autos conclusos para análise quanto à necessidade de produção de outras provas ou para prolação de sentença.
Publique-se.
Intimem-se.
Cumpra-se.
MARICÁ, 12 de agosto de 2025.
FABIO RIBEIRO PORTO Juiz Titular - 
                                            
12/08/2025 11:41
Expedição de Outros documentos.
 - 
                                            
12/08/2025 11:41
Decisão de Saneamento e de Organização do Processo
 - 
                                            
05/08/2025 14:22
Conclusos ao Juiz
 - 
                                            
04/08/2025 16:42
Expedição de Certidão.
 - 
                                            
30/07/2025 22:15
Juntada de Petição de petição
 - 
                                            
29/07/2025 20:00
Juntada de Petição de petição
 - 
                                            
29/07/2025 19:24
Juntada de Petição de petição
 - 
                                            
28/07/2025 00:44
Publicado Intimação em 28/07/2025.
 - 
                                            
26/07/2025 01:40
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 25/07/2025
 - 
                                            
24/07/2025 19:35
Expedição de Outros documentos.
 - 
                                            
24/07/2025 19:35
Proferido despacho de mero expediente
 - 
                                            
15/07/2025 15:02
Conclusos ao Juiz
 - 
                                            
13/07/2025 16:28
Juntada de Petição de petição
 - 
                                            
02/07/2025 12:49
Juntada de Petição de petição
 - 
                                            
29/06/2025 02:05
Publicado Intimação em 27/06/2025.
 - 
                                            
29/06/2025 02:05
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 26/06/2025
 - 
                                            
24/06/2025 18:38
Expedição de Outros documentos.
 - 
                                            
24/06/2025 18:38
Embargos de declaração não acolhidos
 - 
                                            
15/06/2025 19:36
Juntada de Petição de petição
 - 
                                            
15/06/2025 19:32
Juntada de Petição de petição
 - 
                                            
09/06/2025 12:59
Juntada de Petição de petição
 - 
                                            
08/06/2025 00:24
Decorrido prazo de MERCADOLIVRE COM ATIVIDADES DE INTERNET LTDA em 06/06/2025 23:59.
 - 
                                            
08/06/2025 00:24
Decorrido prazo de MERCADO PAGO em 06/06/2025 23:59.
 - 
                                            
03/06/2025 19:14
Juntada de Petição de petição
 - 
                                            
03/06/2025 18:22
Juntada de Petição de contra-razões
 - 
                                            
29/05/2025 15:50
Juntada de Petição de contestação
 - 
                                            
29/05/2025 11:48
Juntada de Petição de petição
 - 
                                            
22/05/2025 07:35
Conclusos ao Juiz
 - 
                                            
22/05/2025 07:32
Expedição de Certidão.
 - 
                                            
14/05/2025 13:01
Juntada de Petição de embargos de declaração
 - 
                                            
09/05/2025 10:30
Juntada de Petição de petição
 - 
                                            
08/05/2025 00:29
Publicado Intimação em 08/05/2025.
 - 
                                            
08/05/2025 00:29
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 07/05/2025
 - 
                                            
07/05/2025 08:39
Expedição de Outros documentos.
 - 
                                            
07/05/2025 08:39
Expedição de Outros documentos.
 - 
                                            
06/05/2025 20:18
Expedição de Outros documentos.
 - 
                                            
06/05/2025 20:18
Concedida a Antecipação de tutela
 - 
                                            
05/05/2025 16:28
Conclusos ao Juiz
 - 
                                            
05/05/2025 16:26
Expedição de Certidão.
 - 
                                            
03/05/2025 18:37
Distribuído por sorteio
 
Detalhes
                                            Situação
                                            Ativo                                        
                                            Ajuizamento
                                            03/05/2025                                        
                                            Ultima Atualização
                                            22/09/2025                                        
                                            Valor da Causa
                                            R$ 0,00                                        
Detalhes
Documentos
Decisão • Arquivo
Despacho • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
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