TJRJ - 0087849-68.2024.8.19.0000
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) 6ª C Mara Criminal
Polo Ativo
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Polo Passivo
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
-
30/01/2025 16:59
Definitivo
-
30/01/2025 16:57
Expedição de documento
-
26/11/2024 17:17
Confirmada
-
26/11/2024 00:05
Publicação
-
25/11/2024 00:00
Edital
HABEAS CORPUS PROCESSO N° 0087849-68.2024.8.19.0000 IMPETRANTES: ADVOGADO AFONSO DESTRI E ADVOGADA CAROLINA FIGUEIREDO PACIENTE: WALTER VIEIRA CORRÉU: CLEBER DE OLIVEIRA SANTOS CORRÉU: MATHEUS SALES TEIXEIRA BANDOLI VIEIRA CORRÉU: IVANILSON FERNANDES DOS SANTOS CORRÉ: MARCIA NUNES VIEIRA CORRÉ: JACQUELINE IRIS BARCELLAR DE ASSIS AUTORIDADE COATORA: JUIZO DE DIREITO DA 2ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE NOVA IGUACU RELATOR: DES.
MARCELO CASTRO ANÁTOCLES DA SILVA FERREIRA HABEAS CORPUS.
PRISÃO TEMPORÁRIA EM RAZÃO DA SUPOSTA PRÁTICA DOS CRIMES PREVISTOS NOS ARTIGOS 268, 298 E 299 DO CÓDIGO PENAL E ARTIGO 7º, VII, DA LEI Nº 8137/90.
SUPERVENIÊNCIA DE DECISÃO QUE CONVERTEU A PRISÃO TEMPORÁRIA EM PRISÃO PREVENTIVA E ACRESCENTOU NOVOS FUNDAMENTOS AO DECRETO PRISIONAL PRIMITIVO.
NOVO TÍTULO.
PERDA SUPERVENIENTE DO INTERESSE DE AGIR.
HABEAS CORPUS PREJUDICADO.
DECISÃO Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de WALTER VIEIRA, apontando como autoridade coatora o JUIZO DE DIREITO DA 2ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE NOVA IGUACU.
Relatam os impetrantes que "a denominada Operação Verum foi deflagrada no dia 14.out.24 para apurar a autoria pela alegada prática dos crimes definidos nos artigos 268, 298 e 299 do Código Penal, além do artigo 7º, inciso VII, da Lei 8137/90. (...) Quando da deflagração da operação, no dia 14.out.24, o ora paciente e outros três coinvestigados tiveram a prisão temporária decretada pelo prazo de 5 dias.
Walter Vieira (sócio do laboratório, ora paciente) e Ivanilson Fernandes dos Santos (funcionário do laboratório) foram presos na própria segunda-feira (14.out); Jacqueline Iris Bacellar de Assis e Cleber de Oliveira Santos, ambos funcionários do laboratório, se apresentaram ao longo da semana.
Também foi presa, no dia 20.out.24, outra funcionária da empresa, Adriana Vargas.
A prisão temporária foi decretada no plantão noturno pela Juíza Flavia Fernandes de Melo na noite do dia 13.out.24.
Naquela ocasião Sua Excelência entendeu, a partir de representação da autoridade policial, que os requisitos da custódia cautelar estavam presentes (...) Não é essa, no entanto, a decisão objeto deste habeas corpus.
Apesar de a decisão acima transcrita não trazer nenhum fundamento concreto que justifique a necessidade da medida mais gravosa, o ora paciente contra ela não se insurgiu imediatamente, aguardando que suas contribuições com a investigação fossem bastantes para a não renovação da prisão temporária.
Ocorre que, no dia 17.out.24, véspera do esgotamento do prazo de 5 dias da prisão temporária, sobreveio nova representação da autoridade policial pela prorrogação da prisão por mais 5 dias, o que foi deferido pela autoridade coatora. É essa a decisão atacada pelo presente writ." Sustentam que a decisão que prorrogou a prisão temporária do paciente "limita-se, em relação ao paciente, a reiterar os termos do decreto prisional do Juízo de Plantão.
Nenhum elemento novo foi trazido para justificar a prorrogação da prisão.
Em resumo, renovou-se a prisão temporária do paciente, genericamente, (1) por conveniência da investigação, (2) para assegurar a aplicação da Lei penal e (3) em razão da gravidade do fato.
Vê-se claramente, com a máxima vênia, que a decisão que prorrogou a prisão temporária, em relação ao paciente, não está lastreada em fatos concretos a ele atribuíveis, mas tão somente na suposta existência de "elementos robustos que reforcem a necessidade da manutenção da prisão temporária dos representados", bem como a excepcionalidade da medida e a urgência na prisão que, nas palavras da eminente Juíza, decorrem da "gravidade do caso".
Além disso, a referida decisão é contraditória na sua essência.
Estivesse a investigação instruída com elementos robustos que reforçassem a necessidade da prisão, por certo não seria necessário - ao tempo da prorrogação da prisão temporária - a concessão de mais prazo para a conclusão do inquérito.
No mais, a decisão aponta a "identificação de erros graves que resultaram na contaminação com o vírus HIV em receptores de transplantes de órgãos".
Não houve qualquer ato doloso praticado.
Os erros porventura cometidos não foram intencionais, evidentemente.
Não se pode falar em falsificação de resultado ou de laudo.
Isso não ocorreu.
A hipótese é de falha humana e que lamentavelmente ensejou a divulgação de resultados errados de HIV.
Sob esse aspecto, a questão é: Walter deve ficar encarcerado por conta de erros não intencionais? A resposta é negativa." Aduzem que "a decisão que prorrogou a temporária nem sequer ventilou a possibilidade de substituição da prisão por medidas cautelares diversas.
Quanto a esse aspecto aduziu a magistrada que a liberdade do paciente "coloca em risco a própria investigação, porquanto necessária para assegurar a oitiva das vítimas, da instrução criminal e para assegurar a aplicação da lei penal".
Presume Sua Excelência, sem base em qualquer fato concreto, que a liberdade do paciente, por si só, "coloca em risco a própria investigação".
A prevalecer tão raciocínio, toda investigação deveria ser acompanhada de decreto de prisão temporária dos investigados, com a máxima vênia.
Também segundo a decisão atacada, "resta necessária a identificação da dinâmica do delito, além da localização de outras vítimas e dos demais autores da empreitada criminosa".
Igualmente aqui, Sua Excelência vincula genericamente o êxito da investigação ao encarceramento do paciente, sem qualquer fato concreto a demonstrar a necessidade da medida excepcional.
A decisão é de tal sorte genérica que não trouxe qualquer análise da possibilidade de aplicação de outras medidas alternativas ao cárcere que igualmente salvaguardariam a produção da prova, que é uma das razões da prisão, como por exemplo a proibição de contato de Walter com testemunhas ou outros envolvidos.
Os fundamentos de conveniência da investigação e da garantia da aplicação da lei penal não passam de meras ilações.
A decisão não trouxe nenhum fato concreto que pudesse remeter a situação de Walter Vieira a qualquer dessas hipóteses.
Nesse sentido, também não se considerou que diversas buscas e apreensões já foram feitas nos laboratórios e nas residências dos investigados.
Os documentos que se pretendia buscar já foram apreendidos.
Dezenas de depoimentos já foram prestados.
Sigilos foram quebrados.
Foi realizada toda a sorte de diligências para a coleta de provas." Acrescentam que "o contrato com a Fundação Estadual de Saúde está suspenso, a sede do laboratório foi interditada e seus demais postos foram fechados, pelo que não há qualquer possibilidade de reiteração da conduta, o que nem mesmo a decisão aqui combatida ventilou.
As investigações já avançaram a um nível em que não há mais a necessidade da manutenção da prisão do ora paciente, cuja permanência no cárcere é basicamente uma antecipação de pena, quando não uma resposta à sociedade em um caso midiático como esse.
As demais provas a serem colhidas, como pericial e documental, não podem afetar a liberdade do ora paciente.
Nada mais justifica a manutenção da prisão, de resto jamais fundamentada. (...) No mais, e atendo-se os impetrantes aos termos genéricos do decreto prisional, a aplicação da lei penal pode ser garantida com o acautelamento do passaporte do paciente na secretaria da Vara.
A conveniência da investigação, com todas as vênias, não sofreu qualquer risco em nenhum momento.
Ao contrário, o ora paciente - que poderia se reservar ao direito de permanecer em silêncio - optou por responder ao que foi perguntado pela autoridade policial e trazer a sua versão dos fatos objeto de investigação. É nítido que em relação ao paciente não está presente o periculum libertatis, pressuposto para a decretação de prisão.
A decisão ora combatida, com todas as vênias, não trouxe um único elemento sequer para demonstrar o risco à conveniência da investigação ou à aplicação da lei penal.
Preferiu prorrogar a prisão com base na gravidade do suposto delito.
A própria fundamentação da prisão não faz menção a sequer um ato ou circunstância que se possa opor ao paciente, que de resto possui mais de 60 anos de idade e residência fixa, além de estar colaborando com as investigações." Ressaltam que "os ora impetrantes não adentrarão em matéria de prova nesta estreita via do habeas corpus, mas é fundamental, desde logo, demonstrar o que efetivamente consta dos autos, em oposição ao que diuturnamente tem noticiado a mídia.
Antes de mais nada, vem noticiando a imprensa, fundamentalmente com base no depoimento do coinvestigado Ivanilson Fernandes e entrevistas concedidas pelas autoridades policiais envolvidas no caso, que teria havido, a partir de janeiro de 2024, uma determinação, por parte da direção do laboratório, de redução da periodicidade (diário para semanal) de controle de qualidade de sorologia, o que comprometeria os próprios resultados de exames de HIV.
Essa versão dos fatos é claramente fantasiosa e a própria existência de dois únicos casos isolados de resultados inconsistentes no período é prova irrefutável disso.
Tivesse havido de fato determinação para redução da periodicidade no controle de qualidade de sorologia (utilizando-se menos reagentes para exames de HIV para "maximização de lucros", conforme falado na imprensa), pode-se presumir que o número de resultados inconsistentes de exames de HIV teria sido infinitamente superior aos dois únicos casos isolados detectados." Em seguida, junta na inicial cópia dos laudos de exame dos dois doadores de órgãos, para demonstrar que o paciente não foi o responsável pela liberação do laudo, acrescentando, ao final "que suas rubricas constantes das páginas do laudo final (com o resultado de vários exames, uns feitos por ele, outros, como o HIV, por Cléber) decorrem tão somente do fato de mera programação do sistema de informática, que utiliza a rubrica ou assinatura daquele profissional responsável pela conferência e liberação do último resultado de exame feito em relação ao paciente, o que ocorreu no caso em tela, em que o exame "Chagas Total" foi "conferido e liberado por Dr.
Walter Vieira - CRM 5262625-2" no dia "23/01/2024 as 18:07" (veja-se que todos os demais exames foram conferidos e liberados em horário anterior)", com relação ao primeiro laudo e "Essa é a prova definitiva de que, no dia 25/05/2024 (Data), exatamente às 11:01 (Hora), às 12:58 (Hora) e às 13:13 (Hora), respectivamente, Ivanilson Fernandes (Usuário) promoveu o Cadastro a Inserção e Jacqueline Barcellar 2 executou a Conferência Geral do exame de HIV de Andrea Silva, identificado pelo lote 0000704432, cujo Resultado foi NRHIV (não reagente a HIV)!", com relação ao segundo laudo.
Por isso, requerem, "a concessão da ordem de habeas corpus, para que, confirmada a liminar, seja determinada a revogação da prisão ilegal imposta a Walter Vieira." A liminar foi indeferida. (item 0025) Os impetrantes requereram a extinção do presente writ, em razão da perda do objeto, uma vez que foi decretada a prisão preventiva do paciente nos autos da ação penal originária. (item 0039) É O RELATÓRIO.
DECIDO.
Entendo que não há mais interesse de agir.
No caso em tela, o paciente teve a prisão temporária decretada em 13/10/2024, sob os seguintes fundamentos: "A Autoridade Policial representou pela decretação da prisão temporária de WALTER VIEIRA, JACQUELINE IRIS BARCELLAR DE ASSIS, CLEBER DE OLIVEIRA SANTOS e IVANILDO FERNANDES DOS SANTOS, porque estes foram indiciados pela prática de crime de nos artigos 268, 288, 298 e 299, todos do Código Penal e artigo 7º, inciso VII, da Lei 8137/90.
O Ministério Público manifestou-se favoravelmente à decretação da prisão temporária, conforme índex 39, nos seguintes termos: "Trata-se de Representação pela prisão temporária de Walter Vieira, Jaqueline Iris Bacellar de Assis, Cleber de Oliveira dos Santos e Ivanildo Fernandes dos Santos, sendo o primeiro sócio proprietários e os demais funcionários da pessoa jurídica PSC LAB Patologia Clínica Dr.
Saleme, laboratório responsável pela emissão de resultados de exames de sorologia de HIV com "falsos-negativos", que induziram a equipe de médicos transplantadores de órgãos e, fato que gerou a contaminação de 06 (seis) pacientes transplantados com o vírus HIV.
Aduz a Autoridade Policial que a custódia cautelar dos indiciados é medida imprescindível a viabilizar o bom andamento das investigações, que não se encontram ainda encerradas.
Tratando-se de Inquérito Policial não finalizado, pendendo, conforme esclarecido pela Autoridade Policial, em sua Representação, a realização de diligências imprescindíveis à formulação da opinio delicti por parte do órgão com atribuição, a modalidade da custódia é, de fato, a prisão temporária, sendo imperiosa sua decretação.
Os documentos acostados aos autos fornecem o fumus boni juris necessário, na medida em que não há dúvidas quanto à autoria do fato, ou seja, os responsáveis pela confecção dos laudos com informação falsa.
Sem embargo, a investigação não se encontra encerrada, sendo ainda necessária a realização de diligências para o estabelecimento de todas as circunstâncias dos crimes.
Neste sentido, a manutenção do status libertatis dos indiciados tem o potencial de inviabilizar a colheita da prova, sendo certo que, em liberdade, poderão agir para destruir provas, influenciar o ânimo das testemunhas, ou mesmo empreender fuga, comprometendo a produção das provas que dependam da sua presença." É o relatório.
Passo a decidir.
Pela leitura do Inquérito Policial, há fundadas razões para decretação da prisão temporária dos indiciados, eis que teriam praticado crimes de infração de medida sanitária preventiva, infringindo determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa, em associação criminosa, bem como teriam falsificado documento de análise clínica, induzindo consumidor ou usuário a erro, conforme artigos 268, 288, 298 e 299 do Código Penal e art. 7.º , VII, da Lei 8137/90.
Com efeito, de acordo com os fatos relatados no inquérito policial instaurado sob o n.º 920-00335/2024, a partir da Portaria de fls. 05, 6 (seis) pacientes teriam sido transplantados com o vírus HIV, em razão de resultados de exames com "falsos-negativos" para sorologia de HIV apresentados pelo laboratório de análise clínicas PCS LAB SALEME, CNPJ 30818280/0001-00 (fls. 31/33 e 49) contratado pela Fundação Saúde do Estado do Rio de Janeiro e vinculado à Secretaria de Estado de Saúde.
Tal laboratório teria induzido a erro a Equipe de Médicos Transplantadores que viabilizaram a transferência dos órgãos com a consequente contaminação dos pacientes transplantados com vírus da AIDS.
Apurou-se, ainda, que dois resultados com "falsos-negativos" para sorologia de HIV foram assinados por Walter Vieira e Jacqueline Iris Barcellar de Assis, respectivamente, sócio administrador e funcionária do laboratório, sendo os exames juntados às fls. 50/52 do Inquérito Policial n.º 920-00335/2024 e às fls. 23/29 destes autos.
Apurou-se ainda que a formação da indiciada Jacqueline é desconhecida, havendo referências de que dados inseridos no cadastro do Conselho Regional de Biomedicina seriam inidôneos.
Os indiciados Cleber e Ivanildo, também funcionários do referido laboratório, estariam atuando no protocolo dos exames. É certo que há fortes indícios quanto à autoria e materialidade do delito, tendo em vista as investigações realizadas, notadamente o registro de ocorrência de fls. 12/18 e as investigações realizadas no Inquérito Policial instaurado sob o n.º 920-00335/2024-01 por determinação do Departamento Geral de Polícia Especializada, da Secretaria de Estado da Polícia Civil, diante de notícia veiculada no programa da rádio Bandeirantes que trouxe à tona a contaminação de 6 (seis) pacientes transplantados, com o vírus HIV.
Vislumbro também a presença de outro pressuposto legal para a decretação da prisão temporária previsto no art. 1.º, I, da Lei 7960/89, que é a imprescindibilidade da custódia do indiciado para assegurar a conclusão das investigações em sede policial - periculum in mora.
Em razão do exposto, DECRETO A PRISÃO TEMPORÁRIA de WALTER VIEIRA, JACQUELINE IRIS BARCELLAR DE ASSIS, CLEBER DE OLIVEIRA SANTOS e IVANILDO FERNANDES DOS SANTOS pelo prazo de 5 dias, na forma do artigo1º, I e III, " "l" (associação criminosa) da Lei 7960/89 e artigo 2º, §4º da Lei 8072/90.
Expeça(m)-se mandado(s) de prisão com prazo de validade até 13/10/2036.
Efetuada a prisão, a autoridade policial deverá informar ao(s) preso(s) de seus direitos constitucionais previstos no artigo 5º da Constituição Federal, certificando-se nos autos acerca do cumprimento da medida.
Decorrido o prazo de 5 (cinco) dias sem que tenha havido a sua prorrogação, o preso deverá ser posto imediatamente em liberdade, se por outra razão não estiver preso.
Ciência ao Ministério Público.
Comunique-se imediatamente a autoridade policial.
Façam-se as anotações de praxe e comunique-se esta decisão ao d.
Juízo a quem coube a distribuição dos autos do inquérito." Foi deferida a prorrogação da prisão temporária pelo prazo de 05 (cinco) dias, por decisão proferida em 17/10/2024, mediante a seguinte fundamentação: "Trata-se de representação por prisão temporária formulado pela Autoridade Policial da Delegacia do Consumidor - DECON, nos autos do procedimento investigatório nº 920-00335/2024, no qual se imputa aos indiciados WALTER VIEIRA, JACQUELINE IRIS BARCELLAR DE ASSIS, CLEBER DE OLIVEIRA SANTOS e IVANILDO FERNANDES DOS SANTOS a prática, em tese, dos crimes previstos no artigo 268, 288, 298 e 299, todos do Código Penal e artigo 7º, VII, da Lei nº 8.137/1990.
Instado a se manifestar, o Ministério Público opinou favoravelmente a decretação da prisão cautelar por reputar presentes os requisitos legais (index. 39).
Em decisão proferida em 13/10/2024, o juízo do Plantão Judiciário Noturno decretou a prisão temporária dos representados pelo prazo de 05 (cinco) dias (index. 42).
O feito foi redistribuído a este juízo em 14/10/2024 (index. 64).
A Defesa Técnica da investigada JACQUELINE apresentou pedido de liberdade provisória com ou sem aplicação de multa e/ou substituição da prisão cautelar por prisão domiciliar (index. 87).
Por sua vez, o Ministério Público com atribuição pugnou pelo indeferimento do pedido defensivo, pela manutenção da prisão temporária decretada até o término do prazo (index.114) e apresentou representação pela prorrogação da prisão cautelar por mais 05 (cinco) dias (index. 118). É o breve relatório.
Decido.
O Estado Democrático de Direito, alicerçado no respeito às garantias fundamentais, determina que se imponha, como regra, a liberdade dos indivíduos, ainda que indiciados em inquéritos policiais ou processos criminais.
A restrição de liberdade, em caráter cautelar, portanto, deve ser interpretada como uma exceção aos direitos individuais constitucionalmente assegurados, destinando-se somente às hipóteses em que se demonstre sua estrita essencialidade.
Nessa toada, a prisão temporária traduz-se em medida acauteladora de restrição de liberdade, por tempo determinado, destinada a possibilitar investigações de crimes previstos na Lei nº 7.960/89.
Trata-se de providência necessária, desde que executada dentro da legalidade no intuito de se apurar condutas altamente reprováveis, que afetam a estrutura social e a tranquilidade da comunidade, inserindo-se a presente situação neste contexto.
De acordo com o Supremo Tribunal Federal (STF), para a decretação de prisão temporária faz-se necessária a observância cumulativa dos presentes requisitos: (1) for imprescindível para as investigações do inquérito policial (artigo 1º, I, II, da Lei nº 7.960/89); (2) houver fundadas razões de autoria ou participação do indiciado (artigo 1º, III, da Lei nº 7.960/89); (3) for justificada em fatos novos ou contemporâneos (art. 312, § 2º, CPP); (4) for adequada à gravidade concreta do crime, às circunstâncias do fato e às condições pessoais do indiciado (art. 282, II, CPP); e (5) não for suficiente a imposição de medidas cautelares diversas (art. 282, § 6º, CPP) - STF, ADI 4109/DF e ADI 3360/DF, Rel.
Min.
Carmen Lúcia, redator para o acórdão Min.
Edson Fachin, julgado em 11/2/2022 (Informativo 1043).
Forçoso observar que para a decretação da prisão temporária, prevalece o posicionamento doutrinário e jurisprudencial que sustenta a necessidade de se cumular o inciso III do artigo 1º da Lei nº 7.960/89 com um dos outros incisos, I e II, alternativamente, para o cabimento da prisão temporária.
No caso em análise, presentes os requisitos elencados nos incisos I e III, alínea "l" do referido dispositivo.
Nesse contexto, a prisão temporária deve apenas ser decretada quando imprescindível para as investigações do inquérito policial, "constatada a partir de elementos concretos, e não meras conjecturas, vedada a sua utilização como prisão para averiguações, em violação ao direito à não autoincriminação, ou quando fundada no mero fato de o representado não ter residência fixa" (STF, ADI 4109/DF e ADI 3360/DF).
Compulsando os autos, verifica-se que os requisitos e pressupostos para a decretação da prisão temporária foram detidamente analisados em decisão proferida e fundamentada pelo juízo do Plantão Judiciário Noturno em 13/10/2024, na forma do artigo 1º, I e III, "l" da Lei nº 7.960/1989 (index. 42), não tendo sido apresentado, no requerimento defensivo, prova ou alegação nova e apta a gerar qualquer direito subjetivo à liberdade em favor da representada JACQUELINE.
Com base em cognição superficial, há elementos robustos que reforcem a necessidade da manutenção da prisão temporária dos representados, considerando a presença de elementos mínimos que comprovem a sua autoria ou participação delitiva nos crimes previstos nos artigos 268, 288, 298 e 299, todos do Código Penal e artigo 7º, VII, da Lei nº 8.137/1990, consubstanciado pelo registro de ocorrência nº 920-00335/2024 (index. 12, 15) e laudos médicos lavrados pela PCS LAB - Laboratório de Análises Clínicas (index. 23-33), que apura suposta conduta dos representados na falsificação de exames médicos com identificação de erros graves que resultaram na contaminação com o vírus HIV em receptores de transplantes de órgãos, em programa realizado pela Secretária de Estado de Saúde do Rio de Janeiro.
De fato, o fumus boni iuris encontra-se demonstrado nas informações coligidas pela Autoridade Policial corroborada pelo Ministério Público, que se revestem de credibilidade e apresentam-se ponderadas e pertinentes, sendo jurídica e legitimamente possível a providência pretendida.
Por sua vez, o periculum libertatis decorre das provas constantes no referido inquérito policial, de modo que a prisão dos investigados se mostra imprescindível para o prosseguimento das investigações, sendo que a sua liberdade coloca em risco a própria investigação, porquanto necessária para assegurar a oitiva das vítimas, da instrução criminal e para assegurar a aplicação da lei penal, somado ao fato de que resta necessária a identificação da dinâmica do delito, além da localização de outras vítimas e dos demais autores da empreitada criminosa.
Com efeito, a excepcionalidade da medida e a urgência da prisão fundam-se na gravidade do caso e na repercussão negativa na vida das vítimas, diante da suposta associação criminosa envolvida na elaboração de laudos médicos falsos que causaram a transmissão do vírus HIV em vários pacientes receptores de órgãos, o que poderia colocar em risco o meio social.
Desse modo, o pedido defensivo de liberdade provisória não encontra respaldo legal ou fático, uma vez que a prisão temporária, ao menos por ora, apresenta-se como absolutamente necessária para garantir o prosseguimento das investigações, notadamente pela gravidade concreta dos crimes investigados e da complexidade do caso em apuração, devendo-se, portanto, aguardar o decurso do prazo da prisão cautelar decretada.
Ademais, em atenção ao pedido defensivo de substituição para prisão domiciliar, verifica-se que não há previsão legal para a conversão de prisão temporária em prisão domiciliar, pois a prisão temporária, consoante aos ditames legais previstas na Lei nº 7.960/1989, é uma prisão cautelar com prazo para cumprimento, findo o qual, deve o representado ser imediatamente colocado em liberdade.
Inclusive, para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) a prisão domiciliar é incompatível com o fim a que se destina a prisão temporária, que é acautelar o inquérito policial (AgRg no HC nº 736.138/PR, Sexta Turma, Relator Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região), julgado em 20/9/2022, DJe de 23/9/2022).
Não obstante, não se descura este Juízo acerca da inteligência do julgado do Supremo Tribunal Federal (STF), nos autos do Habeas Corpus Coletivo nº 143.641, e da possível existência de precedentes pela viabilidade de seu cabimento nos casos da prisão cautelar temporária, que, similar a prisão cautelar preventiva, poderia ser convertida em prisão domiciliar, caso em que se deve ter por base as mesmas regras objetivas para concessão do benefício.
Contudo, ainda que este fosse o caso dos autos, a requerente, tampouco, tem respaldo fático e legal para o seu deferimento.
Com o advento da Lei nº 13.769/2018 foi acrescido ao Código de Processo Penal os artigos 318-A e 318-B, tendo por objetivo resguardar os interesses da criança ou do nascituro, como partes vulneráveis, nos termos da legislação que protege a criança e o adolescente.
No entanto, em análise aos requisitos legais para a conversão da prisão domiciliar, verifica-se que, em nenhuma das hipóteses ali elencadas, a referida representada se enquadra, notadamente quando não há qualquer documento quanto à existência, sob o seu cuidado indispensável e exclusivo, de criança ou pessoa com deficiência, conforme alegado na sua peça defensiva.
A substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar exige prova idônea do preenchimento dos requisitos estabelecidos em lei, nos termos do parágrafo único do artigo 318 do CPP.
Na espécie, a alegação de que a requerente tem duas filhas menores, sendo uma com 10 (dez) anos e a outra com 09 (nove) anos de idade não constitui fundamento válido quando não há qualquer documento comprobatória de tal alegação.
Ante o exposto, INDEFIRO o pedido defensivo formulado e PRORROGO a prisão temporária dos investigados WALTER VIEIRA, JACQUELINE IRIS BARCELLAR DE ASSIS, CLEBER DE OLIVEIRA SANTOS e IVANILDO FERNANDES DOS SANTOS pelo prazo de 05 (cinco) dias, nos termos do artigo 1º, incisos I e III, alínea "l" da Lei nº 7.960/1989.
REGULARIZE-SE a prorrogação da prisão temporária no Banco Nacional de Medidas Penais e Prisões (BNMP).
Expeçam-se os mandados de prisão, se necessário.
Fixo o prazo de 30 (trinta) dias para o cumprimento do mandado.
Diante da informação prestada pela Secretaria de Administração Penitenciária - SEAP (index. 106, 107), OFICIE-SE, com URGÊNCIA, acerca o teor da presente decisão, instruindo-o com as cópias pertinentes.
Após, encaminhe-se à Autoridade Policial da Delegacia do Consumidor - DECON para cumprimento das diligências.
Antes de expirado o prazo da prisão cautelar, devem os autos serem encaminhados ao Ministério Público, a fim de que o órgão de acusação com atribuição avalie a possibilidade de oferecer denúncia, requerer a prorrogação do prazo ou outra medida judicial cabível.
Dê-se ciência às partes.
Publique-se.
Intimem-se." Em 22/10/2024 foi proferida decisão decretando a prisão preventiva do paciente sob os seguintes fundamentos: "1.
Ação penal pública movida pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro em face de (1) MATHEUS SALES TEIXEIRA BANDOLI VIEIRA, (2) WALTER VIEIRA, (3) ADRIANA VARGAS DOS ANJOS, (4) IVANILSON FERNANDES DOS SANTOS, (5) CLEBER DE OLIVEIRA SANTOS e (6) JACQUELINE IRIS BARCELLAR DE ASSIS, pela prática, em tese, dos delitos previstos no artigo 129, § 2º, inciso II, por seis vezes, artigo 288 e artigo 299, todos do Código Penal (CP), sendo a última denunciada também incursa no crime previsto no artigo 298 do CP. 2.
Representação da autoridade policial pela prisão preventiva dos denunciados (index. 1.111). 3.
Cota da denúncia, opinando pela decreta da prisão preventiva dos denunciados (index. 3/18). 4.
Certidão de juntada de denúncia (index 1.368). 5.
Os autos vieram conclusos. É o breve relatório.
DECIDO.
I- DO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE DA DENÚNCIA (artigos 41 e 395 do Código de Processo Penal) 6.
Do exame dos autos, verifica-se que a denúncia oferecida pelo Ministério Público preenche os pressupostos legais para o seu recebimento, elencados nos artigos 41 e 395, incisos I a III, este a contrário sensu, ambos do Código de Processo Penal (CPP). 7.
A denúncia contém a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação dos acusados, a classificação dos crimes e o rol de testemunhas, além dos elementos dos autos, que fornecem a necessária justa causa para a deflagração da presente ação penal. 8.
Os pressupostos processuais e as condições para o exercício da ação penal estão presentes.
Há justa causa para a deflagração da ação penal, consubstanciada na materialidade delitiva e nos indícios de autoria, que exsurgem do teor do depoimento prestado pelas testemunhas e pelos demais elementos informativos coligidos em sede policial. 9.
Procedida à leitura dos documentos que instruem o inquérito policial, verifico que a materialidade delitiva ficou demonstrada por meio dos registros de ocorrência nº 920-00335/2024 (index. 45, 49, 67, 97, 296, 933, 965, 1.126), nº 920-00338/2024 (index. 145), nº 920-00339/2024 (index. 152), nº 920-00340/2024 (index. 165), nº 920-00341/2024 (index. 180), nº 920-00342/2024 (index. 189), nº 920-00343/2024 (index. 199), nº 920-00344/2024 (index. 201), nº 920-00345/2024 (index. 211), nº 920-00346/2024 (index. 226) e nº 056-07567/2024 (index. 150); do relatório de informações da JUCERJA acerca da pessoa jurídica Patologia Clínica Dr.
Saleme Ltda.
EPP e dos sócios administradores (index. 51, 70); dos laudos e exames médicos (index. 54, 73, 257, 431, 432, 496, 578, 1.134); do auto de apreensão (index. 149, 160, 168, 186, 193, 209, 217); do contrato nº 571/2023 - Fundação Saúde (index. 318); da ordem de serviço nº 1444/2024 da Vigilância Sanitária (index. 335); da licença sanitária de funcionamento (index. 340); do relatório de inspeção sanitária (index. 409); das informações prestadas pela Central Estadual de Transplantes (index. 562), pelo Sistema Nacional de Transplantes (index. 789) e pela Secretaria de Estado de Saúde (index. 855, 886, 1.063), e do resultado dos exames de sorologia (index. 600, 684 e 759). 10.
Por sua vez, os indícios de autoria decorrem do contexto fático construído a partir dos depoimentos prestados por testemunhas (index. 89, 110, 131, 154, 156, 162, 169, 171, 173, 182, 184, 185, 194, 203, 205, 207, 312, 314, 316, 350, 358, 362, 364, 941, 962, 975) e investigados (index. 92, 108, 113, 117, 120, 158, 347, 352, 366, 931), que descrevem a atuação de cada um dos denunciados na prática delitiva imputada. 11.
Tudo isso constitui lastro probatório suficiente para o recebimento da inicial acusatória, que não exige prova cabal das imputações, pois o seu juízo de admissibilidade é de cognição sumária (ut STF, 2ª Turma, AgRg no HC 187.227/TO, DJ 04.09.2020). 12.
Note-se que, nesta fase, 'não há exigência de avaliação exaustiva da prova ou apreciação exauriente dos argumentos das partes, bastando o exame da validade formal da peça e a verificação da presença de indícios suficientes de autoria e de materialidade' (in STF, HC 146.956-AgR, Relatora Min.
ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 24/11/2017). 13.
Pelo exposto, RECEBO A DENÚNCIA oferecida pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro em face de MATHEUS SALES TEIXEIRA BANDOLI VIEIRA, WALTER VIEIRA, ADRIANA VARGAS DOS ANJOS, IVANILSON FERNANDES DOS SANTOS e CLEBER DE OLIVEIRA SANTOS, devidamente qualificados nos autos, pela suposta prática dos delitos previstos no artigo 129 § 2º, II, por seis vezes, no artigo 288 e no artigo 299, todos do Código Penal, e de JACQUELINE IRIS BARCELLAR DE ASSIS, devidamente qualificada nos autos, pela suposta prática dos delitos previstos no artigo 129 § 2º, II, por seis vezes, no artigo 288, no artigo 298 e no artigo 299, todos do CP.
III - DA ANÁLISE DA REPRESENTAÇÃO PELA PRISÃO PREVENTIVA 14.
Acolhendo a representação da autoridade policial, o Ministério Público, ao oferecer denúncia, opinou pela decretação de prisão preventiva dos acusados MATHEUS SALES TEIXEIRA BANDOLI VIEIRA, JACQUELINE IRIS BARCELLAR DE ASSIS, WALTER VIEIRA, ADRIANA VARGAS DOS ANJOS, IVANILSON FERNANDES DOS SANTOS e CLEBER DE OLIVEIRA SANTOS. 15.
A custódia cautelar deve ser decretada nos termos do requerido.
Senão vejamos: 16.
Para a decretação da prisão preventiva, como espécie de prisão cautelar, somente pode ser decretada quando estiverem presentes os requisitos legais (art. 313 do CPP) e ocorridos os motivos autorizadores listados no art. 312 do CPP, sendo adequados e suficientes. 17.
Nesse sentido, a decretação da segregação cautelar reclama, segundo a sistemática processual penal, a concorrência do "fumus comissi delicti" e do "periculum libertatis", consubstanciados, o primeiro, em indícios suficientes de autoria e prova da materialidade delitiva e, o segundo, na presença de um dos requisitos previstos nos incisos do art. 312 do CPP, a saber: a garantia da ordem pública, da ordem econômica, a conveniência da instrução criminal e a garantia da futura aplicação da lei penal.
Além disso, a decretação da prisão preventiva será admitida nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos. 18.
In casu, estão presentes o 'fumus comissi delicti' e o 'periculum libertatis'. 19.
O 'fumus comissi delicti' reside na prova da materialidade do delito e nos indícios suficientes de autoria demostrados pelos elementos informativos coligidos na fase inquisitiva que são suficientes para, nesta fase, indicar que os réus teriam, ao menos em tese, se associado entre si e/ou com outros indivíduos ainda não identificados, para o fim específico de cometer crimes; praticado o crime de lesão corporal de natureza gravíssima contra pelo menos em pacientes receptadores de órgãos, que foram contaminados pelo vírus HIV (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida), conforme index. 895, 1.096, bem como inserido, também em tese, declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita em laudo com resultado falso negativo para sorologia anti-HIV.
Além disso, a denunciada JACQUELINE IRIS BARCELLAR DE ASSIS, teria, supostamente, falsificado documento particular, referente ao seu diploma de graduação no curso de Biomedicina. 20.
Por sua vez, o 'periculum libertatis' decorre da necessidade da custódia cautelar para garantia da ordem pública, por conveniência da instrução criminal e para se assegurar a aplicação da lei penal. 21.
Compulsando os autos, depreende-se que, entre os dias 01/12/2023 até 09/2024, no interior do Laboratório de Análises Clínicas - Patologia Clínica Doutor Saleme Ltda ou PCS LAB Salema (CNPJ 30818280/0001-00), com sede nesta comarca, os denunciados estariam cientes de que o controle de qualidade da sorologia para a realização dos exames de anatomia patológica deveria ser realizado diariamente para evitar resultados falsos, contudo, a partir do início do ano de 2024, o controle de qualidade dos exames passou a ser realizado de forma semanal, no intuito de reduzir os custos dos exames, conforme se denota das declarações prestadas pelos investigados em sede policial (index. 92, 108, 113, 117, 120, 158, 347, 352, 366 e 931). 22.
Frise-se que era de possível conhecimento dos acusados, diante das funções exercidas em suas atividades, de que os reagentes ficam degradados por permanecerem muito tempo na máquina analítica utilizada no laboratório, bem como os pacientes receptores de órgãos transplantados recebem imunossupressores para evitar a sua rejeição, de modo que eventual aquisição de qualquer doença em um organismo já fragilizado, principalmente HIV (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida), seria extremamente danoso ao receptores. 23.
Em que pese a postura irregular dos envolvidos e cientes da probabilidade de um paciente ser contaminado, teriam os acusados, em tese, emitido e/ou anuído com a emissão de laudos com falso negativo para sorologia anti-HIV, indiferentes à transmissão de doenças aos pacientes transplantados, o que inclui a transmissão do vírus da Imunodeficiência Humana, o que, via de consequência, lhes causaria enfermidade incurável. 24.
Malgrado as supostas irregularidades praticadas no Laboratório de Análises Clínicas - Patologia Clínica Doutor Saleme Ltda., o Estado do Rio de Janeiro, por meio da Fundação Saúde (FSERJ), contratou a referida sociedade empresária para a realização de exames de análises clínicas e de anatomia patológica em unidades de saúde sob a sua gestão, incluindo a Central Estadual de Transplantes, pelo período de 12 (doze) meses, conforme contrato nº 571/2023 celebrado entre os sócios da mencionada pessoa jurídica (PJ) e o ente público, pelo valor de R$ 9.799.836,03 (index. 318). 25.
Veja-se que o réu WALTER VIEIRA é o sócio administrador do Laboratório de Análises Clínicas - Patologia Clínica Doutor Saleme Ltda., sendo o responsável por conferir, assinar e liberar o laudo com resultado falso referente à análise clínica efetuada na amostra dos doadores de órgãos, autorizando implantação em pacientes, tanto que, em 23/01/2024, foi emitido um laudo pelo acusado com resultado negativo para sorologia anti-HIV e o órgão doado foi transplantado durante cirurgia realizada no Núcleo de Transplante Cardíaco da Rede D´OR.
Inclusive, o referido réu teria, em tese, ordenado a alteração nos protocolos de controle de qualidade nos equipamentos de análises clínicas instalados nas unidades operacionais da PJ, que funcionava no Instituto Estadual de Cardiologia Aluísio de Castro (IECAC), conforme indicado nos autos (index. 51, 54, 70, 92, 113, 347, 793, 874, 897, 905). 26.
O réu MATHEUS SALES é sócio do Laboratório de Análises Clínicas - Patologia Clínica Doutor Saleme Ltda. (index. 51, 70) e indicado pelo Ministério Público como o responsável pela área de Tecnologia da Informação com acesso privilegiado e ilimitado a todo o sistema informatizado utilizado no laboratório, com autonomia para manipular documentos, incluindo possível descarte de documentos a partir da publicização dos fatos pela imprensa, consoante declarações prestadas em sede policial (index. 92). 27.
A acusada JACQUELINE IRIS era empregada do Laboratório de Análises Clínicas - Patologia Clínica Doutor Saleme Ltda., na função de supervisora administrativa e analista responsável pela conferência dos resultados de exames, tendo, supostamente, apresentado documentação falsa que lhe atribuíra a qualificação de biomédica.
Há relatos de a referida acusada, em 25/05/2024, ter emitido um laudo com resultado negativo para sorologia anti-HIV e, posteriormente, a médica de transplante renal da Rede D´OR teria notificado formalmente a CET/RJ, por e-mail, informando que um dos receptores dos rins obteve teste positivo para o Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), conforme indiciado nos autos (index. 53, 92, 108, 348, 352, 896 e 901). 28.
A acusada ADRIANA VARGAS também é empregada do Laboratório de Análises Clínicas - Patologia Clínica Doutor Saleme Ltda., atuando na unidade operacional IECAC na função de coordenadora e supostamente teria partido dela a ordem para modificar os protocolos de controle de qualidade dos exames, consoante aos relatos em sede policial (index. 113 e 366). 29.
O réu IVANILSON FERNANDES é empregado do Laboratório de Análises Clínicas - Patologia Clínica Doutor Saleme Ltda., sendo técnico de laboratório concursado do Estado do Rio de Janeiro e atuando na unidade operacional IECAC, como responsável pelas análises clínicas que resultara nos laudos falsos, ciente de que o controle de qualidade da sorologia até dezembro/2023 era realizado diariamente, mas, em janeiro/2024, teria sido alterado irregularmente para semanal, para contenção de custos, sendo indicado como o responsável por digitar, de maneira errônea, o resultado de exames no sistema, consoante aos relatos em sede policial (index. 108, 113, 347). 30.
O acusado CLEBER DE OLIVEIRA é empregado do Laboratório de Análises Clínicas - Patologia Clínica Doutor Saleme Ltda e atuava na unidade operacional IECAC, na função de coordenador de Nível Superior de Biologia, sendo o responsável pelas análises clínicas que resultaram nos laudos falsos.
Ele foi indicado como o responsável por não efetuar o procedimento de checagem dos equipamentos em que eram realizados os testes de HIV, consoante aos relatos em sede policial (index. 108, 113). 31.
Sublinho que, ao menos em juízo de cognição sumária, não parece se tratar de erro pontual causada exclusivamente por erro dos empregados do laboratório, haja vista, como pontuado pela presentante ministerial, "Além de uma série de exames com resultados falsos, as filiais da empresa não possuíam sequer alvará e licença sanitária para funcionamento.
O relatório de inspeção da vigilância sanitária anexado nos autos constatou 39 não conformidades, entre elas a presença de sujeira, de insetos mortos e formigas em todas as bancadas do laboratório"; como também, existem "ações indenizatórias propostas contra o LABORATÓRIO DE ANÁLISES CLÍNICAS - PATOLOGIA CLÍNICA DOUTOR SALEME LTDA ou PCS LAB SALEME por erro de diagnóstico". 32.
Desse modo, verifica-se que o 'modus operandi' da conduta perpetrada revela comportamento perigoso e alheio aos princípios de convivência e solidariedade humana, uma vez que os réus estariam, em tese, associados com o fim de incluir informações falsas em laudos médicos que culminaram na transmissão do vírus HIV, enfermidade incurável, em receptores de transplantes de órgãos, em programa realizado pela Secretária de Estado de Saúde do Rio de Janeiro, o que demonstra a necessidade de se preservar a ordem pública pela gravidade concreta dos delitos imputados. 33.
Como também, para acautelar o meio social e conferir a devida credibilidade do Poder Judiciário frente à sociedade, que espera pronta atuação estatal, notadamente quando a conduta dos denunciados, supostamente envolvidos na propagação de enfermidade incurável em receptores de órgãos, fragiliza todo o sistema de transplantes do Brasil, fazendo com que diversos órgãos das esferas federal e estaduais venham a reavaliar procedimentos para proteger o Sistema de Transplantes e o Sistema de Saúde, no intuito de resguardar a segurança dos pacientes da rede de saúde. 34.
Nesse sentido, a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é no sentido de que "constitui fundamentação idônea para determinar a custódia cautelar a gravidade da conduta e a periculosidade do agente extraídas do modus operandi empregado na prática delitiva" [AgRg no HC nº 768.237/SC, Sexta Turma, Relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), julgado em 13/3/2023, DJe de 16/3/2023]. 35.
De fato, o modo como o crime foi cometido, revelando a gravidade em concreto da conduta praticada, constitui elemento capaz de demonstrar o risco social, o que justifica a decretação da prisão preventiva para garantia da ordem pública (STJ - HC nº 597.624/SP, Quinta Turma, Relator JOEL ILAN PACIORNIK, DJe: 31/08/2020). 36.
A segregação cautelar também é necessária para a conveniência da instrução criminal, uma vez que haverá ainda, durante a instrução processual, a inquirição de testemunhas sobre as supostas práticas criminosas, de modo que, em liberdade, os acusados poderiam colocar em risco a produção probatória, por meio de ameaças e destruição de provas relevantes, ressaltando que há indicação nos autos acerca da exclusão de mensagens de aplicativo e descarte de documentação pelos acusados (index. 92). 37.
Para o Superior Tribunal de Justiça, dificultar o acesso da autoridade policial às provas, bem como tentar destruí-las, justifica a prisão preventiva fundamentada na conveniência da instrução penal (STJ - HC nº 597.624/SP, Quinta Turma, Relator JOEL ILAN PACIORNIK, DJe: 31/08/2020). 38.
Além disso, a concessão da liberdade, nesse ato, poderia impedir a aplicação da lei penal, diante da gravidade dos fatos imputados e do montante considerável da pena in abstrato para o tipo penal, os réus poderiam evadir para evitar o seu cumprimento. 39.
Insta salientar que, neste momento inicial, os elementos informativos que instruem o inquérito policial não sugerem a adequação da substituição da restrição de liberdade imposta aos acusados por quaisquer das outras medidas cautelares previstas no artigo 319 do CPP, nos moldes da fundamentação supra, demonstra ser insuficiente tais condições para acautelar a ordem pública, a conveniência da instrução criminal e a aplicação da lei penal. 40.
Para o Superior Tribunal de Justiça, a "substituição da prisão preventiva por medidas cautelares diversas (CPP, art. 319) não é recomendável quando aquela estiver justificada na "periculosidade social do denunciado, dada a probabilidade efetiva de continuidade no cometimento da grave infração denunciada" (RHC 50.924/SP, Rel.
Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 07/10/2014; RHC 48.813/RS, Rel.
Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 09/12/2014)". 41.
Por fim, verifica-se que o requisito previsto no artigo 313, I, do Código de Processo Penal também se encontra preenchido, ao se considerar que os crimes imputados aos acusados (artigos 129 § 2º, II, 298, 299, todos do CP) têm pena máxima que extrapola o limite previsto no dito artigo da lei processual penal. 42.
Por outro lado, no que tange a eventual alegação defensiva de que os réus seriam tecnicamente primários e portadores de bons antecedentes com residência fixa e trabalho lícito, forçoso observar que, para o Supremo Tribunal Federal (STF), "as condições subjetivas favoráveis do Agravante, tais como emprego lícito, residência fixa e família constituída, não obstam a segregação cautelar" (AgRg no HC n. 127.486/SP, Relatora Ministra CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 5/5/2015, DJe 18/5/2015).
Por sua vez, segundo o Superior Tribunal de Justiça (STJ), "a presença de condições pessoais favoráveis não representa óbice, por si só, à decretação da prisão preventiva, quando identificados os requisitos legais da cautela" (HC n. 472.912/RS, Relator Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Quinta Turma, julgado em 5/12/2019, DJe 17/12/2019), conforme se verifica no caso em tela. 43.
Ressalta-se que a prisão cautelar em nada viola o princípio constitucional da presunção de inocência, uma vez que baseada em um juízo de periculosidade e não de culpabilidade (STJ - HC 469.179/SP, 6ª Turma, Rel.
Min.
Laurita Vaz, J. 23/10/2018, DJe 13/11/2018), o que se depreende, inclusive, do Verbete Sumular nº 9 do Superior Tribunal de Justiça. 44.
Diante do exposto, DECRETO a prisão preventiva dos acusados MATHEUS SALES TEIXEIRA BANDOLI VIEIRA, JACQUELINE IRIS BARCELLAR DE ASSIS, WALTER VIEIRA, ADRIANA VARGAS DOS ANJOS, IVANILSON FERNANDES DOS SANTOS e CLEBER DE OLIVEIRA SANTOS, nos termos dos artigos 311 e 312, ambos do Código de Processo Penal. 45.
Expeçam-se os mandados de prisão em desfavor dos réus, com prazo prescricional para cumprimento fixado até 22/10/2044, tendo por base a pena máxima abstrata cominada e o somatório das sanções dos delitos imputados, consoante o disposto no artigo 109, inciso I, do CP. 46.
Promova-se o imediato registro do mandado de prisão junto aos bancos de dados do CNJ, nos exatos termos do artigo 289-A do CPP, em consonância com a Resolução CNJ nº 417 de 20/09/2021. 47.
Regularize-se a informação junto ao Banco Nacional de Medidas Penais e Prisões (BNMP).
IV - DAS DEMAIS DILIGÊNCIAS 48.
DEFIRO as diligências requeridas pelo Ministério Público por ocasião do oferecimento da denúncia, constantes nos autos (index. 03, item 02).
Diligencie-se. 49.
Determino, ainda, que sejam promovidas IMEDIATAMENTE a citação e a intimação dos acusados, para que, em atenção à norma do art. 396 do CPP, com a redação que lhe foi dada pela Lei n.º 11.719/2008, ofereçam suas defesas escritas no prazo de 10 (dez) dias, devendo o Oficial de Justiça indagar se o réu tem advogado e, caso positivo, deverá fornecer o nome e o número do registro da OAB, ou se será assistido pela Defensoria Pública, fazendo constar esta informação no mandado. 50.
Faça-se constar, ainda, do mandado a advertência de que em sua resposta os acusados poderão arguir preliminares e alegar tudo que interesse à sua defesa, incluindo oferecer documentos e justificações, devendo especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação quando necessário (art. 396-A do CPP acrescentado pela Lei n.º 11.719/2008). 51.
Comunique-se ainda que, se a resposta não for apresentada no prazo legal, será nomeado ao acusado defensor público para oferecê-la, conforme prevê o artigo 396-A, §2º, do CPP. 52.
Transcorrido "in albis" o prazo acima assinalado, certifique-se a citação (positiva ou negativa ou aguardando resposta), constituição de advogado (procuração nos autos), bem como oferecimento de resposta pelo(s) réu(s). 53.
Sendo defendido por advogado, findo o prazo para apresentação de resposta sem que esta tenha sido ofertada, não havendo renúncia nos autos, intime-o, em derradeira oportunidade, para apresentação da resposta, no prazo de 48 horas, sob pena de expedição de ofício à OAB/RJ, para as medidas disciplinares pertinentes, e caracterização de abandono da causa, na forma do artigo 265 do CPP. 54.
Informando que pretende ser assistido pela Defensoria Pública, deverá ser imediatamente aberta vista dos autos a tal órgão. 55.
Com a juntada da resposta, voltem conclusos para os fins do artigo 397 e 399, caput do CPP. 56.
Cadastre-se os bens apreendidos nestes autos, se houver e onde couber, conforme determina a RESOLUÇÃO Nº 63/08, do Conselho Nacional de Justiça.] 57.
Juntem-se as petições pendentes no Sistema DCP. 58.
Proceda a exclusão da nacional MARCIA NUNES VIEIRA do polo passivo do Sistema DCP, uma vez que não incluída na inicial acusatória (index. 03), certificando-se 59.
Regularize-se a representação processual dos acusados CLEBER DE OLIVEIRA SANTOS e JACQUELINE IRIS BARCELLAR DE ASSIS, conforme procuração outorgada anexada aos autos (index. 1.186, 1.364).
Anote-se. 60.
Sem prejuízo, dê-se vista ao Ministério Público sobre o pedido defensivo apresentado pela Defesa Técnica dos acusados WALTER e MATHEUS. 61.
Publique-se.
Intimem-se." Isso posto, JULGO PREJUDICADO o presente habeas corpus nos termos do artigo 659 do Código de Processo Penal c/c artigo 133, do Regimento Interno do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
Rio de Janeiro, 22 de novembro de 2024.
MARCELO CASTRO ANÁTOCLES DA SILVA FERREIRA DESEMBARGADOR RELATOR Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Sexta Câmara Criminal CSG -
22/11/2024 14:32
Recurso prejudicado
-
01/11/2024 13:18
Conclusão
-
24/10/2024 00:05
Publicação
-
23/10/2024 13:50
Liminar
-
22/10/2024 15:07
Conclusão
-
22/10/2024 15:00
Distribuição
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
22/10/2024
Ultima Atualização
30/01/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Informações relacionadas
Processo nº 0803403-34.2024.8.19.0054
Rickson Marcio da Silva
123 Viagens e Turismo LTDA em Recuperaca...
Advogado: Mariana Gonzaga Goncalves
1ª instância - TJRJ
Ajuizamento: 22/02/2024 19:46
Processo nº 0070293-53.2024.8.19.0000
Caixa de Previdencia dos Funcs do Banco ...
Francisco Luiz Cirino Barbosa
Advogado: Guilherme Barbosa Vinhas
Tribunal Superior - TJRJ
Ajuizamento: 21/05/2025 08:00
Processo nº 0822390-78.2023.8.19.0208
Jose Carlos Rodrigues Viveiros
Light Servicos de Eletricidade SA
Advogado: Gustavo Antonio Feres Paixao
1ª instância - TJRJ
Ajuizamento: 31/08/2023 10:21
Processo nº 0069774-78.2024.8.19.0000
Caixa de Previdencia dos Funcs do Banco ...
Francisco Luiz Cirino Barbosa
Advogado: Luan Gabryel Tavares da Silva
Tribunal Superior - TJRJ
Ajuizamento: 19/05/2025 18:00
Processo nº 0826111-13.2024.8.19.0205
Roberto Santiago Ribeiro
Euzeni Dias Carvalho
Advogado: Natasha Frast de Barros e Barcelos
1ª instância - TJRJ
Ajuizamento: 06/08/2024 22:37