TJRN - 0800941-59.2022.8.20.5159
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Cornelio Alves
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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29/08/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0800941-59.2022.8.20.5159 Polo ativo ALDENISA CAMARA DE LIMA Advogado(s): HUGLISON DE PAIVA NUNES Polo passivo BANCO BRADESCO S/A Advogado(s): LARISSA SENTO SE ROSSI EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. 1) APELAÇÃO CÍVEL INTERPOSTA PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
PREJUDICIAL DE PRESCRIÇÃO SUSCITADA.
REJEIÇÃO.
AÇÃO AJUIZADA DENTRO DO PRAZO ASSINALADO NO ART. 27, DO CDC.
TERMO INICIAL CONTADO DO ÚLTIMO DESCONTO.
PRECEDENTE DO STJ.
PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA.
REJEITADA.
MÉRITO: DESCONTO TARIFÁRIO INDEVIDO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR À HIPÓTESE VERTENTE.
AUSÊNCIA DE CONTRATAÇÃO.
VEDAÇÃO IMPOSTA PELO BACEN QUANTO A COBRANÇA DE SERVIÇOS ESSENCIAIS.
DISPONIBILIZAÇÃO DE SERVIÇOS ONEROSOS NÃO AVENÇADOS.
TARIFA BANCÁRIA "CESTA B.
EXPRESS04” COBRADA INDEVIDAMENTE.
APLICAÇÃO DO ART. 39, § ÚNICO DO CDC.
MÁ-FÉ.
REPETIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO.
PRECEDENTES.
ASTREINTES ARBITRADAS DE MANEIRA PROPORCIONAL.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO 2) APELO INTERPOSTO PELA AUTORA.
FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.
DANO EXTRAPATRIMONIAL.
DEVER DE INDENIZAR QUE SE IMPÕE.
PRECEDENTES DESTA CÂMARA CÍVEL.
REFORMA DO DECISUM.
CONHECIMENTO E PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO.
ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas.
Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, em conhecer dos apelos, e prover, em parte, apenas o recurso interposto pela parte autora, negando provimento a irresignação da instituição financeira, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.
RELATÓRIO Trata-se de apelações cíveis interpostas, respectivamente, por Aldenisa Camara de Lima e pelo Banco Bradesco S.A. em face de sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Umarizal/RN que, nos autos deste processo, julgou procedentes, em parte, os pedidos autorais, nos seguintes termos (Id. 20513915): “[…] ANTE O EXPOSTO, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos contidos na petição inicial, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC, para: a) REJEITAR as prejudiciais de mérito e as preliminares arguidas na contestação; b) DETERMINAR que a instituição financeira promovida realize a restituição (em dobro) dos valores indevidamente descontados a título da tarifa bancária denominada “CESTA B.
EXPRESSO 1”, desde a abertura da conta (mas respeitado o prazo prescricional de 05 anos - art. 27 do Código de Defesa do Consumidor), sendo que tal quantia deverá ser apurada na fase de cumprimento de sentença, com a incidência de correção monetária (pelo INPC), desde o evento danoso (data do respectivo pagamento – Súmula 43 do STJ), e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês incidentes desde o evento danoso (desde o pagamento indevido - Súmula 54 do STJ); c) CONDENAR a instituição financeira promovida ao pagamento das despesas processuais (art. 84 do CPC) e dos honorários advocatícios, estes que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor do proveito econômico obtido (nos termos do parágrafo segundo do art. 85 do CPC), já que entendo que a parte autora decaiu de parte mínima do pedido, devendo a ré responder inteiramente pelas custas e pelos honorários (parágrafo único do art. 86 do CPC); d) CONCEDER o pedido de antecipação de tutela, para que a ré, no prazo de 20 (vinte) dias, cesse os descontos a título de “CESTA B.
EXPRESSO 1”, sob pena de incorrer em multa diária de R$ 200,00 (duzentos reais) em caso de descumprimento (art. 357 do CPC), limitando-se a R$ 2.000.00 (dois mil reais). [...]” Irresignada com o resultado, a autora dele recorreu, insurgindo-se em face do capítulo sentencial relativo à compensação extrapatrimonial, sob alegação de que com a anulação do contrato impugnado e, em consequência, com a impropriedade dos descontos tarifários, evidencia-se o dever de compensação pecuniária pelos danos extrapatrimoniais sofridos com subtração patrimonial ilícita (Id. 20513918).
Ato contínuo, a instituição financeira apresentou apelo, argumentando, em suas razões recursais: a) prejudicialmente, a fulminação da pretensão autoral pela prescrição e a nulidade da sentença por cerceamento de defesa ante ausência de audiência de instrução e julgamento; b) no mérito: b.1) a anuência tácita da autora sobre os descontos referidos; b.2) que a utilização da conta corrente não se enquadra na conta isenta de tarifação; b.3) a inexistência de ilegalidade ou ato ilícito ensejador do dever de indenizar, seja material ou moral, tendo agido em exercício legal de seu direito, tratando-se de tarifas legal e contratualmente previstas, anuídas pela parte autora e; b.4) a desproporção no arbitramento da multa como medida coercitiva ao cumprimento da determinação antecipatória.
Sob esses fundamentos, pugnou pela reforma do decisum para julgar improcedentes os pedidos iniciais ou, subsidiariamente, evidenciada a ausência de má-fé na conduta perpetrada, que a repetição do indébito seja realizada de maneira simples (Id. 20513971).
Contrarrazões apresentadas respectivamente, pela autora e pelo Banco Bradesco aos Ids. 20513976 e 20513978.
Desnecessidade de intervenção do Órgão Ministerial, nos termos do art. 127 da CF/88, dos arts. 176 e 178 do CPC, da Recomendação Conjunta nº 001/2021-PGJ/CGMP, das Recomendações nº 34/2016 e nº 57/2017, do Conselho Nacional do Ministério Público e da Recomendação nº 001/2021-CGMP. É o relatório.
VOTO Antes de adentrar o mérito, passo a analisar a prejudicial e a preliminar suscitadas nas razões recursais da instituição financeira.
I – DA PREJUDICIAL DE PRESCRIÇÃO.
Em suas razões recursais, a instituição financeira alega a ocorrência da prescrição, argumentando que os descontos se iniciaram em 2017 e a ação somente foi distribuída em novembro de 2022, superando o prazo prescricional quinquenal.
Contudo, a jurisprudência sedimentada no Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, “fundando-se o pedido na ausência de contratação de empréstimo com instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo quinquenal previsto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor”, cujo prazo se inicia a partir do último desconto no benefício previdenciário. (AgInt no AREsp n. 1.728.230/MS, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 8/3/2021, DJe de 15/3/2021.) Nesse norte, considerando que ação foi proposta dentro do prazo previsto na legislação consumerista, rejeita-se a prejudicial de mérito lançada pela instituição bancária apelante.
II – PRELIMINAR DE NULIDADE DO DECISUM POR CERCEAMENTO DE DEFESA A preliminar de nulidade da sentença, suscitada pelo Banco Bradesco S.A., não merece prosperar.
Isso porque não há cerceamento de defesa quando o Magistrado, destinatário da prova, reputa suficientes os elementos coligidos para formar seu livre convencimento motivado.
Nesse sentido, a não realização de Audiência de Instrução e Julgamento não configura cerceamento de defesa quando presentes nos autos todos os elementos necessários ao convencimento do juiz, assegurando maior celeridade e economia processuais.
Sabe-se que é o juiz da causa o destinatário das provas, sendo assim, estando ele satisfeito com o conjunto probatório apresentado nos autos, deste que tenha conteúdo suficiente para lastrear seu livre convencimento, devidamente motivado, não há falar-se em cerceamento de defesa.
Ademais, os elementos de prova colacionados aos autos são suficientes para embasar o julgamento do mérito da questão.
O juiz que promove o julgamento antecipado da lide, por considerar que a prova até então produzida é suficiente para a formação do seu convencimento, não comete nenhuma afronta aos princípios do devido processo legal e ampla defesa.
Aliás, o juiz tem o poder/dever de assim agir, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO.
INSURGÊNCIA RECURSAL DA PARTE AUTORA. 1.
Não cabe, em recurso especial, a análise de ofensa a dispositivos constitucionais, cuja competência é reservada à Suprema Corte.
Precedentes. 2.
No sistema de persuasão racional adotado pelo Código de Processo Civil, cabe ao magistrado determinar a conveniência e a necessidade da produção probatória, mormente quando, por outros meios, já esteja persuadido acerca da verdade dos fatos.
Na forma da jurisprudência desta Corte, aferir se as provas são suficientes ou se o recorrido desincumbiu-se de seu ônus probatório demandaria o reexame de todo o contexto fático-probatório dos autos, o que é defeso a esta Corte ante o óbice da Súmula 7 do STJ. 3.
Para acolher a pretensão recursal acerca do alegado cerceamento de defesa decorrente do julgamento antecipado da lide, seria necessário o revolvimento do acervo fático-probatório dos autos, providência que encontra óbice na Súmula 7 do STJ.
Precedentes. 4.
Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no REsp: 1824242 AC 2019/0192324-9, Relator: Ministro MARCO BUZZI, Data de Julgamento: 29/10/2019, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 12/11/2019) (Grifos acrescidos) Nesse sentido já se manifestou esta Câmara Cível: EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO ORDINÁRIA DE COBRANÇA.
SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTES OS PLEITOS AUTORAIS.
PLANO DE SAÚDE.
PAGAMENTO DE COMISSÃO.
ALEGADO CERCEAMENTO DE DEFESA POR AUSÊNCIA DE DESIGNAÇÃO DE AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E OITIVA DE TESTEMUNHAS.
NÃO OCORRÊNCIA.
PRESENÇA DE ELEMENTOS NECESSÁRIOS AO CONVENCIMENTO DO JUIZ.
INEXISTÊNCIA DE NULIDADE.
MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.
CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO. (APELAÇÃO CÍVEL, 0809486-88.2014.8.20.5001, Des.
Cornélio Alves, Primeira Câmara Cível, ASSINADO em 11/11/2020) A ausência de produção de prova testemunhal não importa em cerceamento de defesa, principalmente se a matéria é unicamente de direito ou, se de direito ou de fato, entender o juiz estar o processo suficientemente instruído, possibilitando a decisão sem que se realizem as provas requeridas, considerando, ainda, que a parte apelante não justificou a necessidade da prova testemunhal.
Nesse sentido, dispõe o Novo CPC: Art. 355.
O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando: I - não houver necessidade de produção de outras provas; Em análise dos fatos alegados na petição inicial e na contestação, bem como, pela documentação apresentada, é perfeitamente possível a prolação de sentença sem a Audiência de Instrução e Julgamento, totalmente prescindível para a justa solução da lide.
III – DO MÉRITO.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, intrínsecos e extrínsecos, conheço dos apelos e, dada a correlação entre os cernes recursais, passo a analisá-los de maneira concomitante.
Pois bem, cinge-se a discussão em aferir a (i)legalidade dos descontos tarifários realizados em conta de titularidade da parte autora, cuja contratação é por ela negada, e suas repercussões jurídicas, bem assim, se a conduta objeto da irresignação ensejaria compensação moral por violação a direitos personalíssimos.
De início, tenho que a relação jurídico-material estabelecida entre as partes litigantes é dotada de caráter de consumo, fazendo subsumir a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, consoante traduz o artigo 3º, § 2º, do referido Código.
Em se tratando de relação consumerista, a responsabilização do fornecedor independe da investigação da sua conduta, elemento anímico dos agentes, bastando para sua configuração apenas a existência de danos relacionados a defeitos pela falha na prestação dos serviços, nos moldes do art. 14, § 1º, da Lei nº 8.078/90 – Código de Defesa do Consumidor: Art. 14.
O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. § 1º O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I – o modo de seu fornecimento; II – o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam; III – a época em que foi fornecido.
Dispõe ainda, o §3° do art. 14 do CDC, que o fornecedor somente é isento de indenizar eventuais danos causados em caso de excludente de ilicitude, demonstrando que não houve defeito na prestação do serviço, ou que o consumidor tenha sido único responsável pelo ocorrido, ou, ainda, que o prejuízo tenha decorrido exclusivamente de ato de terceiro, sem que aquele tenha concorrido para o evento: § 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I – que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.” Logo, caberia à instituição financeira, a quem lhe foi atribuído o ônus quanto à demonstração de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito autoral, dos termos do art. 373, inciso II do CPC, além da inversão do dever probatório inserte no art. 6º, VIII, da Lei nº 8.078/90.
Pois bem, voltando os olhos ao caso, tenho que a Resolução nº 3.919/2010 do BACEN, em seu artigo 1º, exige a previsão contratual ou prévia autorização/solicitação do cliente para que haja a cobrança de qualquer tarifa pela prestação de serviços por parte das instituições financeiras, em harmonia com os preceitos consumeristas, in verbis: Art. 1º A cobrança de remuneração pela prestação de serviços por parte das instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil, conceituada como tarifa para fins desta resolução, deve estar prevista no contrato firmado entre a instituição e o cliente ou ter sido o respectivo serviço previamente autorizado ou solicitado pelo cliente ou pelo usuário.
Ainda acerca da temática, a Resolução n. 4.196/2013, também editada pelo Banco Central, dispõe: "Art. 1º As instituições financeiras devem esclarecer ao cliente pessoa natural, por ocasião da contratação de serviços relacionados às suas contas de depósitos, sobre a faculdade de optar, sem a necessidade de adesão ou contratação específica de pacote de serviço, pela utilização de serviços e pagamento de tarifas individualizados, além daqueles serviços gratuitos previstos na regulamentação vigente.
Parágrafo único.
A opção pela utilização de serviços e tarifas individualizados ou por pacotes oferecidos pela instituição deve constar, de forma destacada, do contrato de abertura de conta de depósitos." Logo, como corolário ao princípio da informação, este que norteia as relações de consumo, compete às instituições financeiras esclarecerem sobre a contratação realizada, de forma detalhada e compreensível, destacando-se, em avença, a opção de uso dos serviços pagos e quais serviços serão disponibilizados.
Entretanto, carecem, os autos, de prova quanto à ciência da parte autora na adesão do serviço aqui questionado, ausente o respectivo instrumento contratual, ônus este que competia ao banco, nos termos do art. 6º, inciso VII do Código de Defesa do Consumidor.
Assim, à luz do que preconiza o Banco Central e tendo por fundamento os princípios da transparência e informação, há que se concluir que a cobrança desarrazoada de serviços bancários, com o consequente desconto automático, fere o princípio da boa-fé contratual, além de consistir em vedação legal.
Lado outro, o fato de existir na conta da autora eventual movimentação financeira que exceda os limites disponibilizados como serviços essenciais, por si só, não altera a natureza da conta bancária aberta para recebimento de benefício da Previdência Social, posto que patente o vício de informação.
Colaciono precedente desta Câmara Cível: EMENTA: DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO INDENIZATÓRIA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS.
DESCONTO DE TARIFA BANCÁRIA.
AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA CONTRATAÇÃO.
DESCUMPRIMENTO.
DESCONTOS INDEVIDOS.
UTILIZAÇÃO DE OUTROS SERVIÇOS BANCÁRIOS QUE NÃO ELIDE A OBRIGAÇÃO DE INFORMAR SOBRE A COBRANÇA DAS TARIFAS DELA CORRENTES.
FALHA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO, NOS TERMOS DO ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC.
DANO MORAL CONFIGURADO.
FIXAÇÃO DO VALOR INDENIZATÓRIO EM OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE.
REFORMA DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE.
CONHECIMENTO E PARCIAL PROVIMENTO DO APELO. (APELAÇÃO CÍVEL, 0800391-73.2021.8.20.5135, Des.
Claudio Santos, Primeira Câmara Cível, ASSINADO em 29/11/2021) – Destaque acrescido.
A disponibilização unilateral de serviços tarifados – não contratados – insere-se, pois, no conceito de amostra grátis, nos termos do art. 39, parágrafo único do CDC[1], não podendo o consumidor arcar com os custos daquilo que sequer foi consentido.
Friso ainda que, o Código de Defesa do Consumidor, elencou práticas consideradas abusivas vedadas ao fornecedor, dentre as quais, no art. 39, III, tem-se a prática de “enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço”.
Assim, caracterizado o ilícito danoso, patente o dever de indenizar, cuja responsabilidade independe de elemento subjetivo de culpa ou dolo, nos termos do art. 14 do CDC.
Este é, inclusive, o entendimento desta Câmara Cível, que em outras oportunidades já se debruçou sobre o tema: EMENTA: CIVIL, PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR.
APELAÇÕES CÍVEIS.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS.
SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DO PEDIDO AUTORAL.
COBRANÇA INDEVIDA.
NÃO APRESENTAÇÃO DE CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES.
DESCONTO EM PROVENTOS DE APOSENTADORIA SOB A FORMA DE PACOTE DE SERVIÇOS.
VEDAÇÃO IMPOSTA PELO BACEN.
DEVER DE INFORMAÇÃO.
DESCUMPRIMENTO.
RESTITUIÇÃO EM DOBRO DOS VALORES.
DANO MORAL CONFIGURADO.
QUANTUM INDENIZATÓRIO MAJORADO.
NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE.
REFORMA EM PARTE DO VEREDICTO SINGULAR.
DESPROVIMENTO DO APELO INTENTADO PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA E PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO INTERPOSTO PELA AUTORA. (APELAÇÃO CÍVEL, 0800991-19.2021.8.20.5160, Des.
Cornélio Alves, Primeira Câmara Cível, ASSINADO em 17/06/2022) EMENTA: PROCESSO CIVIL.
AGRAVO DE INSTRUMENTO.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS.
COBRANÇA NÃO AUTORIZADA DE TARIFA BANCÁRIA “PACOTE SERVIÇOS PADRONIZADO PRIORITÁRIOS II”.
DESCONTOS INDEVIDOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
INTELIGÊNCIA DO ART. 1ª, DA RESOLUÇÃO Nº 3.919/2010, DO BACEN.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (AGRAVO DE INSTRUMENTO, 0800540-17.2022.8.20.0000, Des.
Claudio Santos, Primeira Câmara Cível, ASSINADO em 10/06/2022) Reconhecido o dever de indenizar, resta-nos ponderar o quantum indenizatório devido.
Pois bem, não há no ordenamento jurídico pátrio a definição de regras concretas acerca de sua estipulação do dano moral, porém, tanto a doutrina quanto a jurisprudência são unânimes em afirmar que o julgador deve se utilizar da razoabilidade como parâmetro para atender ao duplo aspecto, quais sejam: a compensação e a inibição.
Assim, o montante arbitrado não pode gerar enriquecimento ilícito, mas também não pode ser ínfimo, a ponto de não atender ao seu caráter preventivo e repressor.
Por oportuno, destaque-se que o dano moral não se avalia apenas mediante o cálculo matemático/econômico das repercussões patrimoniais negativas da violação, porém necessita ser estipulado levando-se em consideração a capacidade econômica das partes, função pedagógica da condenação, extensão e gravidade da ofensa, além do que deve figurar em patamar suficiente para desestimular a ocorrência de novos eventos da mesma natureza.
Assim, em atenção aos parâmetros acima delineados, bem assim, em consonância com o quantum arbitrado por esta Câmara em situações semelhantes, tenho por razoável a aplicação de R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de indenização por danos morais, merecendo, o decisum, ser reformado quanto ao referido capítulo: EMENTA: DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO INDENIZATÓRIA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS.
DESCONTO DE “TÍTULO DE CAPITALIZAÇÃO”.
AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA CONTRATAÇÃO DA TARIFA BANCÁRIA.
DESCUMPRIMENTO.
DESCONTOS INDEVIDOS.
CONTA UTILIZADA PARA SAQUE DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
COBRANÇA IRREGULAR.
DANO MORAL CARACTERIZADO.
PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE.
LESÃO PRESUMIDA.
DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO (DANO IN RE IPSA).
DANO MORAL QUE SE DEMONSTRA CABÍVEL.
NECESSIDADE DE FIXAÇÃO DA INDENIZAÇÃO SEGUINDO OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE.
PRECEDENTES DESTA CORTE DE JUSTIÇA.
INVERSÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL.
CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO APELO. (APELAÇÃO CÍVEL, 0801260-58.2021.8.20.5160, Des.
Claudio Santos, Primeira Câmara Cível, ASSINADO em 17/10/2022).
Sobre tal condenação, deverão incidir correção monetária (pelo INPC), a partir do julgamento deste recurso (Súmula 362 do STJ), e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, incidentes desde o evento danoso (desde o primeiro desconto indevido – Súmula 54 do STJ), a serem devidamente apurados na fase de cumprimento de sentença.
Por fim, evidenciado o dano pela falha na prestação, igualmente caracterizado o dever de reparação material.
Quanto a este tópico, convém assinalar que o parágrafo único do art. 42, do Código de Defesa do Consumidor, prevê a possibilidade de o consumidor receber, em dobro, as quantias indevidamente cobradas: “O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável".
Sobreleva ressaltar, ainda, que a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça fixou a tese de que "a repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo" (EREsp n. 1.413.542/RS, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, relator para acórdão Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, julgado em 21/10/2020, DJe de 30/3/2021.).
Assim, na linha do que restou assentado pela Corte Superior, a repetição do indébito em dobro prescinde da comprovação do elemento volitivo (má-fé), bastando, pois, que a conduta seja contrária a boa-fé objetiva.
Nada obstante, a tese fixada no citado precedente teve seus efeitos modulados, passando a incidir somente nas cobranças realizadas após a data da publicação do acórdão, que se deu em 30/03/2021.
Confira-se: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR.
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA.
HERMENÊUTICA DAS NORMAS DE PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR.
REPETIÇÃO DE INDÉBITO.
DEVOLUÇÃO EM DOBRO.
PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC.
REQUISITO SUBJETIVO.
DOLO/MÁ-FÉ OU CULPA.
IRRELEVÂNCIA.
PREVALÊNCIA DO CRITÉRIO DA BOA-FÉ OBJETIVA.
MODULAÇÃO DE EFEITOS PARCIALMENTE APLICADA.
ART. 927, § 3º, DO CPC/2015.
IDENTIFICAÇÃO DA CONTROVÉRSIA [...] MODULAÇÃO DOS EFEITOS 29.
Impõe-se MODULAR OS EFEITOS da presente decisão para que o entendimento aqui fixado - quanto a indébitos não decorrentes de prestação de serviço público - se aplique somente a cobranças realizadas após a data da publicação do presente acórdão. [...]” (EREsp n. 1.413.542/RS, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, relator para acórdão Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, julgado em 21/10/2020, DJe de 30/3/2021.) Nessa tessitura, forçoso concluir que, para as cobranças indevidas anteriores à publicação do acórdão do Superior Tribunal de Justiça, tal como ocorre na hipótese em apreço, subsiste a necessidade da efetiva violação da boa-fé objetiva.
Casuisticamente, tenho por nítida a presença de má-fé na conduta da instituição financeira, esta evidenciada pela inserção do consumidor em pacote de conta bancária oneroso, mesmo havendo disposição normativa vedando a respectiva inclusão quando o intuito do cliente cinge-se exclusivamente a percepção de seu benefício previdenciário.
Ressalto ainda a inexistência de engano justificável, máxime por não haver sequer prova sobre a celebração do negócio jurídico impugnado.
Assim, feita essas considerações, tem-se que a repetição do indébito deverá ser realizada em dobro, nos termos decido pelo Juízo a quo.
Por fim, no que concerne à multa cominatória, também não merece acolhimento o intento recursal.
O art. 537, do CPC/2015, autoriza a estipulação das astreintes para os casos de descumprimento da obrigação de fazer.
Confira-se: Art. 537.
A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito. § 1º O juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que: I - se tornou insuficiente ou excessiva; II - o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento.
Nesse norte, a aplicação da multa tem expressa previsão legal, sendo aferida segundo o prudente arbítrio do magistrado, que deve ponderar as peculiaridades do caso concreto.
Na espécie, não se vislumbra qualquer excesso quanto ao valor estabelecido pelo Juízo a quo, estando a quantia limitada ao total de R$ 2.000,00 (dois mil reais), R$ 200,00 (duzentos reais) por dia, e o prazo razoável para cumprimento de 20 (vinte) dias, adequada às circunstâncias do caso apresentado nos autos, inexistindo, de conseguinte, razão alguma para a exclusão das astreintes.
Pelo exposto, conheço dos apelos, dando provimento, em parte, apenas ao recurso interposto pela parte autora para, reformando a decisão a quo, condenar a instituição financeira no pagamento de R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de indenização extrapatrimonial, mantendo-se a sentença incólume nos demais termos.
Nego provimento a apelação cível intentada pela instituição financeira.
Em virtude do resultado, majoro os honorários advocatícios arbitrados em primeiro grau para o percentual de 15% (doze por cento), nos termos do art. 85, § 11 do CPC. É como voto.
Natal/RN, data do registro no sistema.
Desembargador Cornélio Alves Relator [1] Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: [...] Parágrafo único.
Os serviços prestados e os produtos remetidos ou entregues ao consumidor, na hipótese prevista no inciso III, equiparam-se às amostras grátis, inexistindo obrigação de pagamento.
Natal/RN, 21 de Agosto de 2023. -
21/07/2023 11:53
Recebidos os autos
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21/07/2023 11:53
Conclusos para despacho
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21/07/2023 11:53
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
21/07/2023
Ultima Atualização
28/08/2023
Valor da Causa
R$ 0,00
Detalhes
Documentos
ACÓRDÃO • Arquivo
ATO ORDINATÓRIO • Arquivo
SENTENÇA • Arquivo
ATO ORDINATÓRIO • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
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