TJRN - 0805003-10.2022.8.20.5300
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gilson Barbosa
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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28/11/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE CÂMARA CRIMINAL Processo: APELAÇÃO CRIMINAL - 0805003-10.2022.8.20.5300 Polo ativo MPRN - 50ª Promotoria Natal e outros Advogado(s): GUILLERMO MEDEIROS HOMET MIR Polo passivo PAULO ROBERTO DA SILVA e outros Advogado(s): GUILLERMO MEDEIROS HOMET MIR Apelação Criminal n. 0805003-10.2022.8.20.5300 Apte./Apelado: Ministério Público Apelado: Paulo Roberto da Silva Advogado: Dr.
Guillermo Medeiros Homet Mir – OAB/RN 5.495 Apte./Apelado: José Antônio da Silva Advogado: Dr.
Guillermo Medeiros Homet Mir – OAB/RN 5.495 Relator: Juiz Convocado Ricardo Tinoco Revisor: Desembargador Saraiva Sobrinho EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL.
SENTENÇA CONDENATÓRIA EM RELAÇÃO AO RÉU JOSÉ ANTÔNIO DA SILVA E ABSOLUTÓRIA QUANTO AO CORRÉU PAULO ROBERTO DA SILVA.
APELAÇÕES MINISTERIAL E DEFENSIVA.
CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS MAJORADO (ART. 33, CAPUT, C/C ART. 40, IV, TODOS DA LEI N. 11.343/2006).
I - RECURSO MINISTERIAL.
PLEITO DE CONDENAÇÃO DO RÉU PAULO ROBERTO DA SILVA.
IMPOSSIBILIDADE.
FRAGILIDADE DAS PROVAS.
RELATOS TESTEMUNHAIS INSUFICIENTES PARA ATESTAR A PRÁTICA DO DELITO.
AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CIÊNCIA INEQUÍVOCA QUANTO À PRESENÇA DE ARMA E DROGAS NO VEÍCULO.
INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO.
MANUTENÇÃO DA SENTENÇA NESSE PONTO.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
II - RECURSO DEFENSIVO.
PLEITO DE REDIMENSIONAMENTO DA PENA IMPOSTA AO RÉU JOSÉ ANTÔNIO DA SILVA.
POSSIBILIDADE PARCIAL.
ADOÇÃO DE FUNDAMENTO INIDÔNEO PARA DESABONAR O VETOR DA CULPABILIDADE.
ENTENDIMENTO DOS TRIBUNAIS SUPERIORES.
ALTERAÇÃO, EX OFFICIO, DO PATAMAR APLICADO PARA A ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA.
MODIFICAÇÃO DO QUANTUM APLICADO PARA A CAUSA DE AUMENTO PREVISTA NO ART. 40, IV, DA LEI N. 11.343/2006.
POSSIBILIDADE.
AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO NA SENTENÇA RECORRIDA.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
ACÓRDÃO Acordam os Desembargadores que integram a Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça, por unanimidade, em consonância parcial com o parecer da 2ª Procuradoria de Justiça, conhecer e negar provimento ao apelo ministerial, mantendo incólume a sentença absolutória em relação ao corréu Paulo Roberto da Silva; e conhecer e dar provimento parcial ao apelo do réu José Antônio da Silva, para afastar o desvalor atribuído ao vetor da culpabilidade, na primeira fase da dosimetria, modificar, ex officio, a fração correspondente a atenuante da confissão e fazer incidir o patamar de 1/6 (um sexto) para a causa de aumento do art. 40, VI, da Lei n. 11.343/2006, redimensionando a pena concreta e definitiva para 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, em regime inicial fechado, nos moldes do voto do Relator, que deste passa a fazer parte integrante.
RELATÓRIO Trata-se de Apelações Criminais interpostas pelo Ministério Público e pela defesa de José Antônio da Silva contra sentença prolatada pelo Juízo de Direito da 1ª Vara da Comarca de Parnamirim/RN, ID. 20595729, que, nos autos da Ação Penal n. 0805003-10.2022.8.20.5300, absolveu a apelado Paulo Roberto da Silva do crime de tráfico de drogas majorado (art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 c/c art. 40, IV, da mesma Lei) e condenou o apelante José Antônio da Silva pelo referido crime, à pena concreta e definitiva de 06 (seis) anos, 11 (onze) meses e 10(dez) dias de reclusão e 625 (seiscentos e vinte e cinco) dias-multa, em regime inicial fechado.
Nas razões recursais, ID. 20595745, o Ministério Público pugnou pela condenação de Paulo Roberto da Silva na forma descrita na denúncia, sob o argumento de que o acervo probatório foi suficiente para comprovar a autoria delitiva do réu.
Pleiteou, ainda, o perdimento do veículo Ford Fiesta, de cor branca, placa QGL-1987, em favor da União.
Contrarrazoando o recurso, ID. 20595758, a defesa refutou a tese acusatória, pugnando pela manutenção da sentença em relação a Paulo Roberto da Silva.
Requereu, ainda, o desprovimento do pedido de perda do veículo apreendido em poder de José Antônio da Silva, uma vez que o automóvel era utilizado para o trabalho como motorista de Uber, e que o crime de tráfico foi apenas um ato isolado na vida do apelado.
Por sua vez, ID. 20595755, o réu José Antônio da Silva pugnou nas razões recursais, em síntese, pelo: (i) redimensionamento da pena-base, para afastar o desvalor atribuído aos vetores da culpabilidade e circunstâncias do crime; (ii) redução do patamar aplicado para a causa de aumento do art. 40, IV, da Lei n. 11.343/2006; (iii) adoção de regime inicial semiaberto.
Instada a se pronunciar, ID. 21056349, a 2ª Procuradoria de Justiça opinou pelo conhecimento e provimento da apelação ministerial, para condenar Paulo Roberto da Silva pelo crime de tráfico majorado e determinar a perda do veículo pertencente ao corréu José Antônio da Silva em favor da União.
Quanto ao pleito defensivo, opinou pelo provimento parcial, apenas para redimensionar a fração de aumento do art. 40, IV, da Lei n. 11.343/2006, adotando-se o patamar mínimo previsto em Lei. É o relatório.
VOTO I – APELO MINISTERIAL: Cinge-se a pretensão recursal na reforma da sentença absolutória, para condenar o réu Paulo Roberto da Silva pelo crime de tráfico de drogas majorado, previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 c/c art. 40, IV, da mesma Lei.
Para tanto, o Orgão Ministerial afirmou que as provas produzidas durante a instrução foram suficientes para atribuir a prática do delito.
Sem razão nesse ponto.
Dos autos, verifica-se que a absolvição deve ser mantida, uma vez que a narrativa acusatória, quanto ao réu em questão, não foi confirmada pelo conjunto probatório colhido em juízo.
Se não, veja-se.
Narra a denúncia, ID. 20595650, em síntese, que: Narram os autos do processo em epígrafe, que no dia 22 de outubro de 2022, por volta das 15h30min, na Rua Três Corações, via pública, Nova Parnamirim, Parnamirim/RN, os denunciados transportavam drogas sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar.
Os policiais militares que são testemunhas neste processo realizavam patrulhamento na localidade acima apontada quando se depararam com dois homens no interior do veículo Ford Fiesta, placa QGL-1987, e resolveram abordá-los.
O motorista disse se chamar José Antônio e o passageiro se identificou como Paulo Roberto.
Na ocasião foi realizada uma busca no veículo e encontrado, entre o banco do passageiro e o console central do carro, uma bolsa preta e em seu interior 02 (duas) porções de crack, 01 (um) tablete prensado de cocaína, 01 (um) caderno de anotações possivelmente de tráfico de drogas e 01 (um) revólver calibre .38, marca Rossi, municiado com 05 (cinco) munições de igual calibre.
Próximo a referida bolsa estavam dois aparelhos celulares, sendo um da marca Samsung e outro LG.
Ao serem indagados sobre a propriedade dos ilícitos, ambos negaram.
Conforme laudo de constatação nº 20930/2022 (Num. 90651180- Pág.26), o material apreendido consiste em: 02 (duas) pedras de coloração amarelada, com massa líquida total de 98,89g e 01 (um) tablete de pó de coloração branca, prensado, com massa total bruta de 1.064,78g, cujo resultado de ambos foi positivo para o alcaloide denominado cocaína.
O laudo definitivo será juntado aos autos posteriormente.
Ademais, o auto de exibição e apreensão (Num. 90651180- Págs.13/14), revela as drogas (crack e cocaína); 01 (um) revólver calibre .38, marca Rossi, e 05 (cinco) munições de igual calibre; uma bolsa preta; 01 (um) caderno de anotações; dois celulares, sendo um Samsung e um LG; e o veículo Ford Fiesta, placa QGL-1987, cor branca.
A materialidade do crime foi comprovada por meio do Auto de Prisão em Flagrante, contendo Boletim de Ocorrência, ID. 20595211, p. 02-05, Auto de Exibição e Apreensão, ID. 20595211, p. 13-14, bem como pelos relatos das testemunhas Policiais Militares Kelson Soares do Nascimento e Rafael de Carvalho Lima, e interrogatório dos réus, produzidos ainda na fase inquisitorial e ratificados em juízo.
Por outro lado, no que diz respeito à autoria delitiva, as provas produzidas durante a instrução processual não foram suficientes para atestar, com a necessária certeza, a prática do crime de tráfico pelo corréu Paulo Roberto da Silva.
Sobre isso, com o fim de evitar repetições desnecessárias, o que seria contraproducente tendo em vista os princípios da eficiência e celeridade processual, adota-se como próprios os fundamentos utilizados pelo Juízo a quo na sentença recorrida.
In verbis: Já em relação ao corréu Paulo Roberto, com efeito, subsiste dúvida sobre a participação no delito.
Explica-se.
Em sede policial, o acusado José Antônio relatou que Paulo Roberto foi lhe acompanhar na entrega e tinha conhecimento do conteúdo do pacote.
Na audiência de custódia, Paulo Roberto disse que foi preso quando estava indo deixar “um negócio” e que tinha arma e droga no meio.
Com base nesses elementos informativos, ambos os acusados foram denunciados.
Contudo, como destacado pela defesa técnica, a conduta do acusado Paulo Roberto é atípica.
Isso porque não há prova robusta de que ele tinha conhecimento do material transportado, sendo razoável a versão que apresentou em seu interrogatório judicial, de que estaria apenas de carona, o que foi confirmado pelo corréu confesso e indica ausência de domínio sobre a conduta típica de transporte, sendo duvidoso se prestou algum tipo de auxílio efetivo à realização do transporte da droga.
O ônus da prova da traficância é do Ministério Público, conforme já sedimentado nos tribunais superiores (por exemplo, STF. 1ª Turma.
HC 107448/MG, red. p/ o acórdão Min.
Marco Aurélio, 18.6.2013 (Info 711) e STJ. 6ª Turma.
REsp 1.769.822, Rel.
Min.
Rogério Schietti Cruz, julgado em 27/11/2018.).
Portanto, pelo exposto, incide o princípio in dubio pro reo a inviabilizar a condenação de Paulo Roberto da Silva, impondo-se a absolvição, com fundamento no art. 386, VII, do CPP.
Como se vê, não há como concluir, com a necessária certeza, que o réu tinha ciência de que no veículo em que se deslocava como carona existiam drogas e arma de fogo escondidos.
Nesse sentido, os depoimentos dos Policiais Militares responsáveis pela prisão em flagrante, na esfera judicial: Relatos da Testemunha Policial Militar Kelson Soares do Nascimento: “que perceberam o desconforto do motorista e realizaram a abordagem; que, ao descer do veículo, visualizaram o segundo elemento; que dentro do veículo foi encontrada a droga e a arma de fogo; que a arma estava na parte onde ficava o passageiro, embaixo, no espaço entre o banco e o console do carro; que o motorista dizia que estava fazendo corrida, mas, salvo engano, falaram de entrega; que não viu aplicativo ligado, apesar de o motorista se dizer “Uber”; que o outro homem, indicado como sendo o réu Paulo, estava alterado, parecia estar sobre efeito de algo e nervoso; que ao abrir a bolsa já sentiam o cheiro de entorpecente; que ao chegar no veículo perceberam desconforto dos réus; que não se recorda se o carro tinha parte desmontada; que no momento ficou claro que estariam indo entregar a droga para alguém; que não conhecia nenhum dos dois.
Relatos da Testemunha Policial Militar Rafael de Carvalho Lima: “que estavam em uma área próxima ao batalhão e ao avistarem um veículo Fiesta, de cor branca, decidiram abordar, diante da situação suspeita; que o motorista José Antônio já estava fora do veículo e olhou para a polícia ou para alguém que estava próximo; que, na abordagem, perceberam que o corréu Paulo Roberto estava dentro do veículo; que na verificação do veículo, entre o banco do passageiro e console central, encontraram a bolsa com os materiais descritos; que também encontraram dentro do veículo dois celulares; que foi indagado de quem era o material e os dois negaram; que um jogou para o outro; que o console central do veículo estava como se estivesse mexido e outras partes também, como se estivesse montada e desmontadas, com travas soltas, a exemplo da trava do painel; que o material não caberia no recinto, painel, aberto; que no carro já sentiu o cheiro da droga; que a rua não é movimentada e a atitude do motorista levantou a suspeita.
Os relatos dos policiais militares convergiram no sentido de que o veículo onde estavam os corréus foi abordado em razão de atitude suspeita por parte de José Antônio, que estava do lado de fora do automóvel.
Além disso, confirmaram que o material ilícito não estava à vista, mas escondido debaixo do banco do passageiro, e que somente o encontraram depois de realizar uma revista.
Por sua vez, a escusa apresentada pelo apelado em juízo, no sentido de que somente estava pegando uma carona até o CAIC de Parnamirim/RN e não tinha conhecimento de que no veículo existiam drogas e armamento foi corroborada pelo interrogatório judicial do corréu José Antônio da Silva, que confirmou ser o único responsável pelo transporte, e que foi ele quem recebeu o pagamento para fazer o deslocamento.
Tem-se, ainda, as versões apresentadas por Paulo Roberto da Silva na audiência de custódia e do corréu José Antônio perante a autoridade policial, em que confirmaram que ambos tinham ciência prévia a respeito do transporte da droga.
Contudo, conforme ressaltado pelo magistrado de primeiro grau, dada a ausência de uniformidade a esse respeito, não há como atribuir a autoria delitiva ao apelado, sobretudo tendo em conta o princípio in dubio pro reo.
Assim, em observância ao que prevê o art. 386, VII, do Código de Processo Penal, nada obstante os argumentos levantados nas razões recursais, a manutenção da sentença absolutória é medida que se impõe, dada a insuficiência de provas para embasar eventual condenação.
O Ministério Público pleiteou, ainda, a perda do veículo Ford Fiesta, de cor branca, placa QGL-1987, em favor da União, sob o argumento de que teria restado comprovado que o veículo pertencia ao corréu José Antônio da Silva e que estava sendo utilizado para a prática de delitos.
Igualmente sem razão nesse ponto.
A perda de bens, direitos ou valores que sejam produtos ou constituam proveito dos crimes previstos na Lei de Drogas, está prevista no art. 60 e seguintes da Lei n. 11.343/2006.
Veja-se: Art. 60.
O juiz, a requerimento do Ministério Público ou do assistente de acusação, ou mediante representação da autoridade de polícia judiciária, poderá decretar, no curso do inquérito ou da ação penal, a apreensão e outras medidas assecuratórias nos casos em que haja suspeita de que os bens, direitos ou valores sejam produto do crime ou constituam proveito dos crimes previstos nesta Lei, procedendo-se na forma dos arts. 125 e seguintes do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal . (Redação dada pela Lei nº 13.840, de 2019) […] Art. 62.
Comprovado o interesse público na utilização de quaisquer dos bens de que trata o art. 61, os órgãos de polícia judiciária, militar e rodoviária poderão deles fazer uso, sob sua responsabilidade e com o objetivo de sua conservação, mediante autorização judicial, ouvido o Ministério Público e garantida a prévia avaliação dos respectivos bens. (Redação dada pela Lei nº 13.840, de 2019) […] Art. 63.
Ao proferir a sentença, o juiz decidirá sobre: (Redação dada pela Lei nº 13.840, de 2019) I - o perdimento do produto, bem, direito ou valor apreendido ou objeto de medidas assecuratórias; e (Incluído pela Lei nº 13.840, de 2019) […] § 4º Transitada em julgado a sentença condenatória, o juiz do processo, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, remeterá à Senad relação dos bens, direitos e valores declarados perdidos em favor da União, indicando, quanto aos bens, o local em que se encontram e a entidade ou o órgão em cujo poder estejam, para os fins de sua destinação nos termos da legislação vigente.
O Código Penal brasileiro, ao tratar dos efeitos da condenação, também prevê a possibilidade de perda dos instrumentos do crime em favor da União.
Se não, veja-se: Art. 91 - São efeitos da condenação: I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime; II - a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé: a) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito; b) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso.
Dos autos, vê-se que foi protocolado pedido de restituição de bem apreendido protocolado ainda no primeiro grau, no qual Cornélio de Assunção pleiteou a restituição do veículo apreendido sob a posse do corréu José Antônio da Silva, informando que era o titular do financiamento do veículo.
Além disso, não se pode deixar de notar que o veículo tem registro de alienação fiduciária em favor da empresa Aymore Credito Financ e Invest S.A.
Na sentença, o juízo a quo deixou de decidir os pedidos de restituição e perdimento do bem em favor da União, em razão de dúvida razoável a respeito da propriedade.
Assim, nos termos do art. 120, § 4º, do Código de Processo Penal[1], determinou o envio de cópia dos autos ao juízo cível para decidir a esse respeito.
Veja-se: Em relação aos bens e valores apreendidos, importa destacar que o Plenário do STF, no julgamento com repercussão geral do RE 638491/PR, Rel.
Min.
Luiz Fux, DJe 23/08/2017, firmou a tese de que "é possível o confisco de todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência de tráfico de drogas, sem a necessidade de se perquirir a habitualidade, reiteração do uso do bem para tal finalidade, a sua modificação para dificultar a descoberta do local do acondicionamento da droga ou qualquer outro requisito além daqueles expressamente previstos no art. 243, parágrafo único, da Constituição Federal".
Nestes autos, a despeito da existência de pedido de restituição ao ID Num. 92779664, em nome do proprietário do veículo apreendido – Cornélio de Assunção – tem-se que, por ocasião da instrução processual e mesmo das razões finais defensivas, ficou claro que o carro pertencia, considerando o aspecto fático, ao ora condenado José Antônio, tendo Cornélio emprestado apenas os dados para o respectivo financiamento.
A representante do Ministério Público opinou pelo perdimento do bem apreendido.
O que seria, em tese, aplicável ao caso, considerando o art. 243, parágrafo único, da Constituição Federal e o entendimento do STF citado acima.
Todavia, diante da indicação de alienação fiduciária do veículo apreendido (CRLV ao ID Num. 92779671) em favor de Aymore Credito Financ e Invest SA, CNPJ nº 07.***.***/0001-10, constando como proprietário o terceiro Cornélio de Assunção Bezerra Neto, passa a existir dúvida sobre a propriedade do bem, uma vez que, a alienação fiduciária, “o devedor, fiduciante, transmite ao credor, fiduciário, uma propriedade resolúvel, denominada pela própria lei de propriedade fiduciária, cuja característica e a limitação temporal do domínio do devedor” (Dantzger, Afranio Carlos C.
Alienação Fiduciária de Bens Imóveis, 3ª edição.
Disponível em: Minha Biblioteca, Grupo GEN, 2010.).
Assim, em homenagem ao princípio da razoabilidade, para proteger direito de terceiro (seja Cornélio de Assunção Bezerra Neto, que ostenta a posição de devedor fiduciário, seja da instituição financeira, que tem a propriedade resolúvel do bem), deixo de determinar a perda do veículo FORD/FIESTA HA 1.6L SE, placa QGL - 1987, de cor branca, chassi: 9BFZD55P6FB782841, ano/mod: 2014/2015, apreendido nestes autos, em favor da União.
Entendo que é caso de aplicar o procedimento previsto no art. 120, § 4º, do CPP, uma vez que haverá demanda probatória complexa, que não foi sanada após a instrução neste juízo.
Nesse sentido: “O Juízo Criminal não decide o processo incidental de restituição, remetendo as partes para o Juízo Cível, caso a complexidade da questão acerca da propriedade demande ampla dilação probatória” (STJ, REsp 788.301/PA, 5ª T., rela.
Mina.
Laurita Vaz, j. 10-9-2009, DJe de 28-9-2009).
Portanto, ordeno o depósito do referido veículo, ficando as partes remetidas ao juízo cível para definir a propriedade do referido veículo.
Acertada a decisão do magistrado a quo nesse ponto, haja vista que a análise da propriedade do veículo, dada a complexidade dos contratos de alienação fiduciária, será melhor esclarecida pelo juízo cível, a quem compete, sobretudo, a produção de lastro probatório suficiente para eventual restituição.
De mais a mais, não se pode deixar de notar que a discussão relativa à propriedade do bem independe do fato de o corréu José Antônio da Silva, aparentemente, ser o possuidor do veículo, já que esta última representa direito autônomo em relação àquela.
Por isso, é certo dizer que a determinação da perda de bem cuja propriedade não pode ser atribuída ao réu, mas sim a terceiro que não concorreu para a prática do delito, representa extensão da responsabilidade penal e clarividente violação ao princípio da intranscedência da pena, conquanto o perdimento de bens em favor da União representa efeito da condenação.
I – APELO DO RÉU JOSÉ ANTÔNIO DA SILVA: Cinge-se a pretensão recursal, em síntese, (i) na reforma da dosimetria para afastar o desvalor atribuído aos vetores da culpabilidade e circunstâncias do crime; (ii) redimensionamento do patamar aplicado para a causa de aumento do art. 40, IV, da Lei n. 11.343/2006; e (iii) adoção de regime inicial semiaberto.
Para tanto, a defesa argumentou a existência de fundamento genérico.
Razão assiste ao apelante, em parte.
Da análise das circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal e art. 42 da Lei n. 11.343/2006, extrai-se que foram desabonados os vetores da culpabilidade, circunstâncias do crime e quantidade e natureza da droga, elevando-se a pena-base do crime de tráfico em 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão e 60 (sessenta) dias-multa, sob a seguinte motivação: Culpabilidade: Vem a ser o maior ou menor índice de reprovabilidade do agente, o grau de censura à ação ou omissão do réu. "Nos crimes dolosos tem por fulcro a vontade.
Analisando os autos, temos que tal circunstância fala, sobremaneira, em desfavor do réu, visto que acentuadamente reprováveis as suas condutas, até porque nada indica uma inferior consciência da ilicitude ou menor exigibilidade de conduta diversa.
Ao contrário, dos autos se revela que o réu agiu, a todo tempo, de maneira deliberada e premeditada, o que revela firme intencionalidade na prática do ilícito e maior exigibilidade de conduta diversa.
Circunstâncias do crime: São aquelas circunstâncias acessórias que não compõem o crime, mas influem sobre a sua gravidade, como o estado de ânimo do réu, que pode demonstrar maior ou menor determinação do criminoso na prática do delito, ou outras condições, como o lugar, a maneira de agir, a ocasião, além da atitude do criminoso durante ou após a conduta criminosa, que tanto pode indicar a insensibilidade ou indiferença quanto o arrependimento.
No caso presente, como já exposto nos tópicos acima, a elevada quantidade de droga transportada, além da apreensão de caderneta de anotações, são indicativos de que não se tratava de contato ocasional com entorpecente.
Acerca do vetor da culpabilidade, objeto de irresignação do apelo, nas palavras de Ricardo Schmitt, seria “o grau de censura da ação ou omissão do acusado que deve ser valorada a partir da existência de um plus de reprovação social da sua conduta”.
No caso em análise, a exasperação feita pelo Magistrado a quo foi inidônea, uma vez que confundiu a culpabilidade como elemento dos crimes, consistente no “querer e entender a possibilidade, nas circunstâncias do momento, agir de outra forma (lícita)” com a culpabilidade como circunstância judicial.
No que diz respeito ao desvalor atribuído às circunstâncias do crime, inviável o acolhimento do pleito, pois, em que pese a expressiva quantidade de droga apreendida não pudesse ser utilizada como fundamento para desabonar o vetor, pois também utilizada para fins do art. 42 da Lei n. 11.343/2006, o fato de ter sido apreendido caderno de anotações com valores muito além da renda declarada pelo apelante, somado à correspondência com alguns dos registros de contato do aparelho celular apreendido, de fato, demanda uma reprovabilidade maior.
Quanto ao vetor da quantidade e natureza da droga, não há razão para modificá-lo, haja vista que a expressiva quantidade de drogas apreendidas justifica a exasperação da pena-base.
Igualmente, não há razão para modificar o quantum de exasperação adotado para cada vetor desabonado, já que o juízo a quo fez incidir proporção aquém da fração de 1/8, adotada pela jurisprudência desta Câmara Criminal.
Viável, ainda, o acolhimento do pedido de diminuição do patamar aplicado para a causa de aumento prevista no art. 40, IV, da Lei n. 11.343/2006, na medida em que o magistrado de primeiro grau não adotou qualquer fundamento para adotar a fração de 1/4 (um quarto).
Por isso, deve ser adotado o patamar mínimo previsto no tipo penal.
Por fim, tratando-se de questão de ordem pública, faz-se necessário reformar, de ofício, a fração adotada para a confissão espontânea, tendo em vista a inidoneidade do fundamento utilizado pelo magistrado de primeiro grau, segundo o qual “quanto à confissão espontânea, destaco que deve ser vista, nestes autos, com ressalvas, uma vez que foi induzida apenas após o desencadeamento das investigações e diligências policiais que resultaram na prisão em flagrante do acusado, devendo incidir na razão de 1/9 (um nono)”.
Nesse ponto, ressalta-se que a jurisprudência desta Câmara Criminal tem adotado o patamar de 1/6 como proporcional e suficiente à atenuante prevista no art. 65, III, d, do CP, ainda que a confissão seja parcial ou qualificada, seguindo o entendimento dos tribunais superiores.
In casu, o apelante confessou, sem ressalvas, a prática delitiva, confirmando que estava ciente do transporte de produtos ilícitos e que recebeu o pagamento em dinheiro, fazendo jus à fração de 1/6.
Tecidas as considerações acima, passa-se à nova dosimetria.
Na primeira fase, presentes duas circunstâncias desfavoráveis, e observando a proporcionalidade vinculada, tem-se a pena-base em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 520 (quinhentos e vinte) dias-multa.
Na segunda fase, ausentes agravantes e presente a atenuante da confissão espontânea, adotando-se o patamar de atenuação em 1/6 e em atenção ao óbice da Súmula 231/STJ, resta a pena intermediária em 05 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa.
Na terceira fase, ausente causa de diminuição e presente a causa de aumento prevista no art. 40, VI, da Lei n. 11.343/2006, adotando-se o patamar de 1/6, mínimo previsto no tipo penal, tem-se a pena final em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa.
Por fim, considerando o quantum de pena aplicada e a presença de circunstâncias judiciais desfavoráveis, mantém-se o regime inicial fechado, conforme determinado em sentença, nos moldes do art. 33, § 2º, “a”, do Código Penal.
Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS.
TRÁFICO DE DROGAS.
REGIME SEMIABERTO.
CIRCUNSTÂNCIAS DESFAVORÁVEIS.
AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1.
A escolha do regime inicial de cumprimento de pena deve levar em consideração a quantidade da reprimenda imposta, a eventual existência de circunstâncias judiciais desfavoráveis, bem como as demais peculiaridades do caso concreto. 2.
O regime semiaberto foi fixado com base nas peculiaridades do caso concreto, notadamente em razão de a pena-base haver sido fixada acima do mínimo legal. 3.
Agravo regimental não provido. (AgRg no HC n. 813.272/MS, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 19/6/2023, DJe de 22/6/2023.) (destaques acrescidos) CONCLUSÃO Ante o exposto, em consonância parcial com o parecer da 2ª Procuradoria de Justiça, conheço e nego provimento ao apelo ministerial, para manter a sentença absolutória quanto ao réu Paulo Roberto da Silva; e conheço e dou parcialmente provimento ao apelo do réu José Antônio da Silva, para afastar o desvalor atribuído ao vetor da culpabilidade, na primeira da dosimetria, modificar, ex officio, a fração empregada para a atenuante da confissão e adotar a fração de 1/6 (um sexto) para a causa de aumento do art. 40, VI, da Lei n. 11.343/2006, redimensionando a pena concreta e definitiva para 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, em regime inicial fechado. É como voto.
Natal, 11 de outubro de 2023.
Juiz Convocado Ricardo Tinoco Relator [1] § 4o Em caso de dúvida sobre quem seja o verdadeiro dono, o juiz remeterá as partes para o juízo cível, ordenando o depósito das coisas em mãos de depositário ou do próprio terceiro que as detinha, se for pessoa idônea.
Natal/RN, 23 de Novembro de 2023. -
25/10/2023 00:00
Intimação
Poder Judiciário do Rio Grande do Norte Câmara Criminal Por ordem do Relator/Revisor, este processo, de número 0805003-10.2022.8.20.5300, foi pautado para a Sessão VIRTUAL (votação exclusivamente pelo PJe) do dia 13-11-2023 às 08:00, a ser realizada no Sala de Sessão da Câmara Criminal.
Caso o processo elencado para a presente pauta não seja julgado na data aprazada acima, fica automaticamente reaprazado para a sessão ulterior.
No caso de se tratar de sessão por videoconferência, verificar o link de ingresso no endereço http://plenariovirtual.tjrn.jus.br/ e consultar o respectivo órgão julgador colegiado.
Natal, 24 de outubro de 2023. -
24/08/2023 14:16
Conclusos para julgamento
-
24/08/2023 08:50
Juntada de Petição de parecer
-
16/08/2023 17:22
Expedição de Outros documentos.
-
16/08/2023 15:26
Juntada de Petição de ciência
-
14/08/2023 10:39
Expedição de Outros documentos.
-
14/08/2023 10:39
Juntada de termo
-
14/08/2023 10:01
Proferido despacho de mero expediente
-
26/07/2023 16:16
Recebidos os autos
-
26/07/2023 16:16
Conclusos para despacho
-
26/07/2023 16:16
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
26/07/2023
Ultima Atualização
24/11/2023
Valor da Causa
R$ 0,00
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