TJRN - 0801221-93.2023.8.20.5159
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Cornelio Alves
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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03/05/2024 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0801221-93.2023.8.20.5159 Polo ativo SILVIA FERREIRA Advogado(s): HUGLISON DE PAIVA NUNES Polo passivo BANCO BRADESCO S/A Advogado(s): WILSON SALES BELCHIOR EMENTA: DIREITO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO ORDINÁRIA.
COBRANÇA DE SERVIÇOS BANCÁRIOS NÃO RECONHECIDOS PELA PARTE CONSUMIDORA.
EXTINÇÃO DO FEITO, SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO, COM FULCRO NO ART. 485, VI, DO CPC.
SENTENÇA QUE RECONHECEU A CARACTERIZAÇÃO DE LITIGIOSIDADE PREDATÓRIA.
INOCORRÊNCIA.
AÇÕES COM CAUSA DE PEDIR E PEDIDOS DIVERSOS.
RUBRICAS BANCÁRIAS QUESTIONADAS QUE SÃO DIFERENTES.
NULIDADE DA SENTENÇA.
NÃO CONFIGURAÇÃO DE JUDICIALIZAÇÃO PREDATÓRIA.
ART. 2º DA RECOMENDAÇÃO Nº 127 DE 15/2022 DO CNJ.
CAUSA QUE NÃO SE ENCONTRA MADURA PARA JULGAMENTO.
RETORNO DOS AUTOS AO PRIMEIRO GRAU PARA SEU REGULAR PROCESSAMENTO.
CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO.
ACÓRDÃO A Primeira Câmara Cível, nos termos do Art. 942 do CPC, por maioria de votos, conheceu e proveu o apelo, nos termos do voto vencedor.
Vencidos o Relator e o Des.
Ibanez Monteiro.
Redator para o acórdão o Des.
Claudio Santos.
RELATÓRIO Trata-se de Apelação Cível interposta por Silvia Ferreira em face da sentença prolatada pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Umarizal que, nos autos da “AÇÃO DECLARATÓRIA DE COBRANÇA INDEVIDA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA”, ajuizada em desfavor do Banco Bradesco S/A, julgou extinto o processo, sem resolução de mérito, nos moldes do art. 485, inciso VI, do CPC, condenando a parte autora ao pagamento de multa por litigância de má-fé, conforme dispositivo sentencial abaixo transcrito (id 22883514): “[...] Em razão do exposto, JULGO EXTINTO O PROCESSO, sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, IV e VI do CPC, podendo a parte autora, caso queira, ingressar com uma única ação discutindo todas as cobranças realizadas pelo demandado, .que entenda serem ilegítimas.
Publique-se, registre-se e intimem-se.
Sem custas em razão da gratuidade da justiça que nesta assentada defiro.
Sem honorários, ante a ausência de contestação.
Atente-se à gratuidade judicial ora deferida.” Contrapondo tal julgado (id 22883516), sustenta, em síntese, que: a) “as demandas apontadas pelo Douto Magistrado NÃO POSSUEM O MESMO PEDIDO NEM A MESMA CAUSA DE PEDIR, questionando descontos distintos, conforme se pode facilmente verificar ao analisar os autos”; b) “Uma vez restando clarividente que tratam-se de demandas absolutamente distintas, não há outra medida que venha a ser justo senão a reforma da sentença”; c) “a conduta protagonizada pelo recorrido demonstra um completo desrespeito para com os consumidores, seja pela negligência na prestação dos serviços, seja pelo desprezo a estes em momento extremamente delicado”; c) “deve-se o recorrido ser compelido a reparar, também, todos os danos extrapatrimoniais suportados pela recorrente, que são provenientes do péssimo trato do recorrido na prestação dos seus serviços”; d) “restou mais do que caracterizados os prejuízos causados à parte recorrente com a reprovável prática do recorrido, assim como sobejamente demonstrada a pertinência da reparação ora buscada”.
Ao final, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso, “para reformar a sentença vergastada, a fim de que sejam os pleitos autorais deferidos e a parte autora seja indenizada pelos danos materiais e morais sofridos, subsidiariamente, caso entenda que a causa não esteja madura para julgamento, requer a anulação da sentença, determinando o retorno do feito para a vara de origem, para que se proceda ao seu regular processamento e julgamento.” Contrarrazões apresentadas ao id 22883519.
Ausentes as hipóteses do art. 178, do CPC, desnecessária a intervenção do Ministério Público. É o relatório.
VOTO Conheço do presente recurso, pois atende aos requisitos de admissibilidade.
Cinge-se o mérito recursal em aferir a regularidade da sentença, que extinguiu o feito, sem resolução de mérito, com fulcro no art. 485, IV e VI do CPC.
O juízo de primeiro grau motivou, em suma, que o demandante ajuizou diversas ações, que, a seu ver, são dotadas de narrativa dos fatos é praticamente idênticas, incorrendo em prática de litigiosidade predatória.
Nesse norte, o magistrado de primeiro grau extinguiu o feito por entender que o demandante deveria ter ingressado com uma única demanda a fim de discutir todas as cobranças realizadas pela instituição financeira.
Sobre o tema, cumpre inicialmente verificar o que dispõe a norma encartada no art. 55 do Código de Processo Civil, confira-se: Art. 55.
Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir. § 1º Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta, salvo se um deles já houver sido sentenciado. § 2º Aplica-se o disposto no caput: I – à execução de título extrajudicial e à ação de conhecimento relativa ao mesmo ato jurídico; II – às execuções fundadas no mesmo título executivo. § 3º Serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre eles. (destaquei) Depreende-se que são conexas duas ou mais ações que tenham em comum o pedido ou a causa de pedir, o que não me parece ser a situação posta em análise.
No caso, ao proceder à consulta no Pje, depura-se que a parte autora ajuizou diversas ações, mas que, ao contrário do entendido na sentença vergastada, são demandas possuem causa de pedir e pedidos diversos, já que os serviços bancários impugnados são diferentes, cada um com suas peculiaridades.
Logo, apesar de existir identidade de partes, os contratos das ações são distintos, inexistindo, portanto, relação de conexão ou de prejudicialidade a determinar a reunião dos processos, notadamente porque nada impede que a decisão de uma das ações seja contrária à da outra; tudo dependerá da análise das circunstâncias fático-probatórias de cada relação jurídica contratual, o que afasta a necessidade do julgamento conjunto previsto no § 3º do art. 55 do referido Codex, no qual “serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre eles”.
Esclareço que, conquanto seja possível a reunião de diversos processos em que se discute o mesmo tema entre as mesmas partes, independentemente da conexão, nada impede que sejam eles também julgados individualmente, posto que o resultado de um não dependa nem se vincula, necessariamente, à solução dada ao outro, pois as provas de cada um deles devem ser analisadas individualmente, o que se configura no presente caso.
Aliás, esse é o entendimento adotado por esta Corte de Justiça ao julgar conflitos de competências em ações com identidade de partes, mas em que se questionava contratos diversos.
Confira-se: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA.
AÇÃO DECLARATÓRIA C/C REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS PROPOSTA NO JUÍZO DA 6ª VARA CÍVEL (SUSCITADO).
DECISÃO DECLINATÓRIA FUNDAMENTADA NA EXISTÊNCIA DE PROCESSO NA 9ª VARA CÍVEL (JUÍZO SUSCITANTE) CUJA DECISÃO PODE VIR A SER CONFLITANTE.
INCONSISTÊNCIA.
AÇÕES CUJAS CAUSA DE PEDIR E PEDIDO NÃO COINCIDEM, EIS REFERENTES A CONTRATOS DIVERSOS.
CONFLITO JULGADO PROCEDENTE, DETERMINANDO A COMPETÊNCIA DA 6ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE NATAL. (CC 0800864-12.2019.8.20.0000, Relatora Desembargadora Maria Zeneide Bezerra, Tribunal Pleno, assinado em 17/07/2019) PROCESSUAL CIVIL.
CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA ENTRE O JUÍZO DA 5ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE NATAL E O DA 9ª VARA CÍVEL DA MESMA COMARCA.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS.
DEMANDA SIMILAR A OUTRA ANTERIORMENTE PROPOSTA E DISTRIBUÍDA AO JUÍZO SUSCITANTE, PROMOVIDA PELA MESMA PARTE AUTORA.
ALEGADA CONEXÃO POR PREJUDICIALIDADE.
INOCORRÊNCIA.
NÃO EVIDENCIADO RISCO DE DECISÕES CONFLITANTES.
AUSÊNCIA DE IDENTIDADE ENTRE AS RELAÇÕES JURÍDICAS QUE DERAM ENSEJO AO AJUIZAMENTO DAS AÇÕES.
NÃO INCIDÊNCIA DA REGRA DO ART. 55, § 3.º, DO CPC.
PRESERVAÇÃO DO PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL.
PRECEDENTES DESTA CORTE.
COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO.1.
A discussão trazida em cada uma das ações diz respeito a contratos diversos, resultantes de supostas fraudes operadas em momentos distintos e que teriam importado em inscrição indevida do nome da parte autora, de modo a se concluir serem diferentes as causas de pedir, inexistindo, ainda, qualquer risco de decisões conflitantes que ponha em risco a segurança jurídica ou a prestação jurisdicional justa e adequada. 2.
Precedentes desta Corte (Conflito Negativo de Competência n.º 2017.021711-9, Relator Desembargador João Rebouças, Tribunal Pleno, j. 11/4/2018; Conflito Negativo de Competência n.º 2017.014026-5, Relator Desembargador Amílcar Maia, Tribunal Pleno, j. 21/3/2018; Conflito Negativo de Competência n° 2016.008165-2, Relator Desembargador Cornélio Alves, Tribunal Pleno, j. 24/08/2016; Conflito Negativo de Competência n° 2016.009807-3, Relatora Desembargador Judite Nunes, Tribunal Pleno, j. 14/09/2016)3.
Conflito conhecido para declarar a competência do juízo suscitado para processar e julgar a ação. (CC 0805828-82.2018.8.20.0000, Relator Desembargador Virgílio Macêdo Júnior, Tribunal Pleno, assinado em 12/12/2018) Portanto, vislumbro que não resta configurada hipótese de conexão ou reunião de demandas no presente feito.
Outrossim, diversamente do fundamento sentencial, entendo que a conduta do causídico da parte demandante não caracteriza prática de litigiosidade predatória, nos termos parametrizados na Recomendação nº 127 de 15/02/2022 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que dispõe: “Art. 2º Para os fins desta recomendação, entende-se por judicialização predatória o ajuizamento em massa em território nacional de ações com pedido e causa de pedir semelhantes em face de uma pessoa ou de um grupo específico de pessoas, a fim de inibir a plena liberdade de expressão.” Nesse contexto, considerando que as demandas ajuizadas pelo autor possuem causas de pedir e pedido diferentes, notadamente, porque, diferem quanto à natureza dos serviços alegadamente não contratados.
Vislumbro, desse modo, que se encontra rechaçada a hipótese de judicialização predatória, notadamente, porque consiste na provocação do Poder Judiciário mediante o ajuizamento de demandas massificadas com elementos de abusividade e/ou fraude[1], o que não se constata na espécie, até mesmo em preconização ao princípio do livre acesso ao Judiciário insculpido no art. 5º, inc.
XXXV, da Constituição Federal.
Ato contínuo, não estando à causa madura para julgamento, a teor do que autoriza o art. 1.013, § 3º, III, do Novo Código de Processo Civil, necessário o retorno do feito ao juízo de primeiro grau, para proceder ao seu regular processamento.
Face ao exposto, voto pelo conhecimento e provimento do apelo, para declarar nula a sentença, determinando o retorno dos autos ao juízo de primeiro grau, para seu regular processamento. É como voto.
Desembargador CLAUDIO SANTOS Relator VOTO VENCIDO VOTO Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do apelo.
O propósito recursal cinge-se à reforma da sentença, para que se dê provimento aos pleitos contidos na exordial, “subsidiariamente, caso entenda que a causa não esteja madura para julgamento, requer a anulação da sentença, determinando o retorno do feito para a vara de origem, para que se proceda ao seu regular processamento e julgamento.” O caso em debate revela, verdadeiramente, uma estratégia de engenho advocatício que tem por escopo diluir a suposta pretensão da parte autora no maior número possível de ações (fracionamento da pretensão).
Esse método, também denominado “modelo de negócio”, traz, muitas vezes, grandes benefícios aos demandantes e seus patronos, porque incrementa as chances de, ao menos em uma das ações, por exemplo, ocorrer a revelia ou deixar a instituição demandada de apresentar provas - em especial o contrato firmado entre as partes - que possam refutar as alegações autorais, sobretudo no âmbito das relações de consumo, onde se tem a possibilidade da inversão do ônus da prova.
Na espécie, ao identificar as ações ajuizadas pela parte autora, a magistrada a quo entendeu por bem extinguir o feito, sem resolução do mérito, na forma do art. 485, inciso VI, do CPC, conforme se vê da fundamentação declinada na sentença.
Deflui do álbum processual que a parte autora lançou mão de uma prática que tem se tornado comum no Poder Judiciário, qual seja, o ajuizamento de ações de forma fracionada e pulverizada, as quais poderiam ser aglutinadas em um único processo.
Consoante se observa do caderno processual, as demandas foram ajuizadas contra a mesma instituição financeira e, tal como assentado no julgado recorrido, as ações possuem causa de pedir e pedidos semelhantes, diferenciando-se, tão somente, quanto aos descontos, que se referem a nomenclaturas diversas e possíveis contratos distintos, mas vinculados à mesma conta bancária.
Seguramente, tal prática – a fragmentação da pretensão – vem acarretando embaraços à atividade jurisdicional, sobretudo nas Comarcas de menor porte, desprovidas de maiores recursos materiais e humanos.
A pulverização ou fracionamento de demandas consiste em artifício que viola, frontalmente, os princípios da transparência, da lealdade, da boa-fé processual, da cooperação e da economia processual, uma vez que, sendo possível solucionar o conflito em um único processo, a parte opta por ingressar com várias ações, movimentando desnecessariamente o judiciário, com o nítido propósito de dificultar a defesa dos réus e obter a cumulação de indenizações.
Conforme se deixou antever em linhas pretéritas, tal manobra ocasiona entraves à função jurisdicional, obstaculizando o regular fluxo dos demais processos e, ainda, forçando as unidades judiciais a elevarem substancialmente a carga de trabalho e os custos materiais, situação que, a toda evidência, reflete no aumento do acervo processual e no tempo de duração das ações, em prejuízo dos jurisdicionados que, de maneira séria e responsável, buscam a tutela de um direito legítimo e concreto.
Ressalte-se, por oportuno, que as balizas processuais encontram-se expressamente previstas no CPC, consoante se observa nos artigos 4º, 5º, 6º e 8º: “Art. 4º.
As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.
Art. 5º.
Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé.
Art. 6º.
Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva. (...) Art. 8º.
Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência".
Nessa ótica, a conclusão encampada na sentença encontra-se ancorada na demonstração inequívoca de que a presente demanda se caracteriza como uma demanda predatória, justificando-se, assim, a extinção do feito, conforme intelecção do art. 485, inciso VI do CPC, ante a ausência de interesse processual.
Naturalmente, o exercício abusivo do direito de ação pode e deve ser reprimido pelo Judiciário, mormente porque o ajuizamento indevido e massificado de litígios, ao fim e ao cabo, prejudica o próprio acesso à justiça por quem realmente necessita de uma tutela jurisdicional célere e eficiente, eis que assoberba as unidades judiciais.
A propósito do tema, não é demasiado salientar que, à luz do disposto no art. 375, do CPC, deve o Julgador aplicar as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e, nesse contexto, ninguém melhor do que o magistrado a quo para observar e combater o fenômeno da litigiosidade predatória.
Em verdade, o Juízo primevo deu fiel interpretação e correta aplicação à norma legal, fazendo uso adequado dos poderes e deveres que lhe são conferidos pelo art. 139, III, do CPC, in verbis: Art. 139.
O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: [..] III - prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça e indeferir postulações meramente protelatórias. (Grifos acrescidos).
Nessa linha de cognição, esta Corte Estadual vem reconhecendo o poder-dever do magistrado de repelir demandas predatórias, inclusive em idêntico caso ao aqui tratado.
Veja-se: “EMENTA: PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO C/C PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS.
ALEGAÇÃO DE DESCONTOS INDEVIDOS.
EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO.
MULTIPLICIDADE DE AÇÕES DA AUTORA.
VEDAÇÃO À CONDUTA DA PARTE QUE ASSIM PROCEDE POR INFRINGIR NORMA CONSTITUCIONAL (ART. 5° LXXVIII) QUE ASSEGURA AO DEMANDANTE PROBO O DIREITO À RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO E OS MEIOS QUE GARANTAM A CELERIDADE DA SUA TRAMITAÇÃO E OS PRINCÍPIOS DA TRANSPARÊNCIA, COOPERAÇÃO, LEALDADE, ECONOMIA E BOA-FÉ PROCESSUAIS.
INTERESSE DE AGIR E DE PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS AUSENTES.
INCIDÊNCIA DA RECOMENDAÇÃO Nº 127/2022 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA E NOTA TÉCNICA Nº 01/2020 DO CENTRO DE INTELIGÊNCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS DO RN - CIJESP/TJRN.
LITIGIOSIDADE ARTIFICIAL EXAUSTIVAMENTE COMPROVADA MEDIANTE INSERÇÃO, NA SENTENÇA, DE DADOS EXTRAÍDOS DO PJe E GPS-JUS QUE ATESTARAM O CRESCIMENTO EXPONENCIAL E IMOTIVADO DE DEMANDAS COM CARACTERÍSTICAS DE DEMANDA PREDATÓRIA E ASSÉDIO PROCESSUAL (REsp 1.817.845).
DEVER DO MAGISTRADO DE REPRIMIR ATO ATENTATÓRIO À DIGNIDADE DA JUSTIÇA (ART. 139, III, CPC) SENTENÇA MANTIDA.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
I – Comprovado que a parte utilizou o processo em flagrante abuso do direito de demandar, na mera busca pela condenação da instituição financeira ré nas verbas de sucumbência, congestionando o Poder Judiciário com ações fragmentadas e idênticas em face do mesmo demandado, a extinção do processo por ausência de interesse processual não acarreta a menor lesão ao princípio constitucional do acesso à Justiça e da inafastabilidade da Jurisdição (artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal).
II - O exercício abusivo do direito de acesso à justiça pode e deve ser reprimido pelo Judiciário e o ajuizamento em massa de litígios que portam pretensões frívolas, prejudica o acesso à justiça do demandante probo, assoberba o Judiciário, escasseia seus recursos, diminui a qualidade e a celeridade da prestação jurisdicional e faz do processo “um simulacro de processo." (STJ - REsp: 1817845/MS Relator: Ministra Nancy Andrighi, j. 10/10/2019, 3ª Turma, DJe 17.10.2019) III - "O processo não é um jogo de esperteza, mas instrumento ético da jurisdição para efetivação dos direitos da cidadania" (STJ - REsp nº 65.906/DF, Rel.
Min.
Sávio de Figueiredo Teixeira, 4ª Turma, Dj. 02.03.1998).
IV - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.” (APELAÇÃO CÍVEL, 0800699-55.2023.8.20.5001, Des.
Vivaldo Pinheiro, Terceira Câmara Cível, JULGADO em 24/11/2023, PUBLICADO em 24/11/2023).
Não destoa o entendimento dos Tribunais pátrios: “EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO - DEMANDA ARTIFICIAL E PREDATÓRIA - IRREGULARIDADE REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL - EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO - CABIMENTO.
Para evitar a litigiosidade artificial e práticas predatórias no âmbito do Poder Judiciário, o Magistrado possui o poder-dever de tomar medidas saneadoras para coibir o uso abusivo do acesso à Justiça.
A capacidade processual e a representação judicial das partes constituem pressupostos processuais de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo.
Tendo o procurador dado ensejo à movimentação indevida do aparato judicial, pelo princípio da causalidade, cabível sua condenação ao pagamento das custas e despesas do processo.” (TJMG - Ap.
Civ. 1.0000.23.169309-4/001, Rel.
Des.
Estevão Lucchesi, 14ª CÂMARA CÍVEL, j. em 19/10/2023, pub. da súmula em 19/10/2023) “EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA - NEGATIVAÇÃO INDEVIDA - NOTA TÉCNICA Nº 01/2022 EMITIDA PELO CIJMG - LITIGÂNCIA PREDATÓRIA - VICIO DE REPRESENTAÇÃO - AUSENCIA DE PODERES VÁLIDOS - PRESSUPOSTO DE VALIDADE INOCORRENTE - EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. - A nota técnica nº 01/2022 - emitida pelo CIJMG - aponta parâmetros para identificação de demandas predatórias e orienta boas práticas de gestão de processos judiciais para o enfrentamento (prevenção e combate) da litigância predatória.” (TJMG - Ap.
Civ. 1.0000.23.091864-1/001, Relatora: Des.(a) Lílian Maciel, 20ª CÂMARA CÍVEL, j. em 18/10/2023, pub. da súmula em 19/10/2023) “Para evitar a litigiosidade artificial e práticas predatórias no âmbito do Poder Judiciário, o Magistrado possui o poder-dever de tomar medidas saneadoras para coibir o uso abusivo do acesso à Justiça.
A capacidade processual e a representação judicial das partes constituem pressupostos processuais de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo.
Tendo o procurador dado ensejo à movimentação indevida do aparato judicial, pelo princípio da causalidade, cabível sua condenação ao pagamento das custas e despesas do processo.” (TJMG - Ap.
Cív. 1.0000.22.107335-6/002, Rel.
Des.
Estevão Lucchesi, 14ª CÂMARA CÍVEL, J. em 05/10/2023, pub. da súmula em 06/10/2023) Ainda no que pertine à temática, é notório que a implementação do “Juízo 100% digital”, pelo CNJ, também trouxe, como consequência da redução do custo para o ajuizamento das ações judiciais, o aumento vertiginoso de demandas indenizatórias em massa, com petições padronizadas, elaboradas em mídias digitais, que narram fatos idênticos e que, em muitos casos, sequer consta a qualificação da parte autora.
Com isso, a despeito da patente necessidade de modernização do acesso à justiça e de adequação do Poder Judiciário às novas vertentes tecnológicas, criou-se ambiente propício ao incremento da litigiosidade predatória.
Realce-se, por especial importância, que este Eg.
Tribunal de Justiça é reconhecido como um dos precursores no combate às demandas dessa natureza, como se vê da Nota Técnica nº 01/2020, emitida pelo Centro de Inteligência do Poder Judiciário do Rio Grande do Norte.
Mais recentemente, em outubro de 2023, o Núcleo de Cooperação Judiciária – NUCOOP, vinculado à Vice-Presidência, ex vi do Ato Concertado de Cooperação Jurisdicional n° 01/2023, estabeleceu o Protocolo de Cooperação Judicial para o tratamento e combate às demandas predatórias, com a criação de Núcleo próprio para tratar as ações que tramitarem nas Unidades do 11°, 12° e 13° Juizado Especial Cível da Comarca de Natal, mediante análise minuciosa da petição inicial e documentos que a acompanham.
No ponto, cite-se julgado do Tribunal de Justiça de Alagoas (Apelação Cível nº 0700130-60.2021.8.02.0040), em que o eminente Des.
Relator, mencionando a Nota Técnica do CIJ/TJRN, fez as seguintes ponderações: “[...] O que rechaço, deste modo, é o exercício desenfreado, repetitivo, com peças e fundamentos genéricos, com a interposição de processos em lotes, que, a meu sentir, demonstram ato ilícito de abuso do direito de ação. É importante salientar que a figura do abuso de direito é mais conhecida e estudada no Brasil sob a perspectiva do direito material e, sobretudo, no âmbito do direito privado.
No entanto, embora não seja da tradição do direito processual civil brasileiro, é admissível o reconhecimento da existência do ato ilícito de abuso processual, tais como o abuso do direito fundamental de ação ou de defesa, não apenas em hipóteses previamente tipificadas na legislação, mas também quando configurada a má utilização dos direitos fundamentais processuais.
Assim, conforme entendimento sedimentado pelo Superior Tribunal de Justiça, o ajuizamento de sucessivas ações judiciais, desprovidas de fundamentação idônea e intentadas com propósito doloso, pode configurar ato ilícito de abuso do direito de ação ou de defesa, o denominado assédio processual. (STJ. 3ª Turma.
REsp 1.817.845-MS, Rel.
Min.
Paulo de Tarso Sanseverino, Rel.
Acd.
Min.
Nancy Andrighi, julgado em 10/10/2019), motivo pelo qual, entendo que a extinção da ação, sem resolução de mérito, é medida imperativa.
Para além, saliento que não verifico qualquer ausência de fundamentação praticada pelo magistrado.
Ao revés, em sua sentença, o magistrado argumentou pontualmente o porquê de entender pelo indeferimento da peça vestibular, não havendo que se falar em ofensa ao dever de fundamentação das decisões.
Saliento, por fim, que não merecem retoques a condenação do próprio advogado ao adimplemento das custas processuais.
Conforme esclarecido na sentença, deve ser aplicado o princípio da causalidade, extraído a partir do art. 85 do CPC, ou seja: arca com as custas e com os honorários advocatícios a parte que deu causa, indevidamente, à demanda.
No caso vertente, quem deu azo à movimentação indevida de todo o aparato do Poder Judiciário estatal foi o próprio patrono da parte autora, o qual, desde a petição inicial, não se preocupou em cumprir seu dever legal de advogado, em nítido abuso do direito do acesso à justiça.” (TJAL – Apelação Cível n. 0700130-60.2021.8.02.0040 – 2ª Câmara Cível, Relator: Des.
Otávio Leão Praxedes, j. em 22/4/2021) A propósito, já se posicionou o Superior Tribunal de Justiça: "Ocorre que o ardil, não raro, é camuflado e obscuro, de modo a embaralhar as vistas de quem precisa encontrá-lo.
O chicaneiro nunca se apresenta como tal, mas, ao revés, age alegadamente sob o manto dos princípios mais caros, como o acesso à justiça, o devido processo legal e a ampla defesa, para cometer e ocultar suas vilezas.
O abuso se configura não pelo que se revela, mas pelo que se esconde. É preciso repensar o processo à luz dos mais basilares cânones do próprio direito, não para frustrar o regular exercício dos direitos fundamentais pelo litigante sério e probo, mas para refrear aqueles que abusam dos direitos fundamentais por mero capricho, por espírito emulativo, por dolo ou que, em ações ou incidentes temerários, veiculem pretensões ou defesas frívolas, aptas a tornar o processo um simulacro de processo." (STJ - REsp: 1817845 MS 2016/0147826-7, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 10/10/2019, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/10/2019) Também no âmbito do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a litigância predatória é objeto de inúmeras medidas, v.g., a publicação da Portaria nº 389 de 04/11/2022, que institui Grupo de Trabalho com o objetivo de apresentar propostas para o enfrentamento da litigância predatória associativa; a disponibilização de banco de decisões e notas técnicas, através da “Rede de Informações sobre a Litigância Predatória”; a estipulação da Diretriz Estratégia 7, da Meta 5, que visa regulamentar e promover práticas e protocolos para o combate à litigância predatória; a realização de seminários sobreo tema etc.
Com efeito, a litigância predatória compromete sobremaneira a garantia constitucional do acesso à justiça, exatamente por obstruir o funcionamento do Poder Judiciário, violando a norma constitucional inserta no art. 5º, LXXVII, da CF/88, que assegura ao cidadão probo o direito à “razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.
No caso concreto, sob o enfoque do direito processual constitucional (constitucionalização do processo), agiu a magistrada a quo de acordo com o ordenamento jurídico, sistematicamente interpretado à luz dos preceitos constitucionais de acesso à justiça (art. 5º, XXXV), da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII) e do contraditório e ampla defesa (art. 5º, LV), todos sopesados frente ao combate à litigância predatória.
Nessa rota, forçoso concluir que a sentença encontra-se em perfeita consonância com a Recomendação nº 127/2022, do Conselho Nacional de Justiça, bem assim com a Nota Técnica nº 01/2020, do Centro de Inteligência dos Juizados Especiais do RN – CIJESP/TJRN, de sorte que, estando evidenciado que a conduta da parte autora violou os princípios norteadores do processo civil, deve ser mantido o entendimento adotado pelo Juízo singular, ao menos quanto à extinção do feito, sem resolução meritória.
Afinal, como bem pontuado pelo saudoso Min.
Sávio de Figueiredo Teixeira, que, no século passado, já se preocupava com problemas como este, sempre é salutar lembrar que "O processo não é um jogo de esperteza, mas instrumento ético da jurisdição para efetivação dos direitos da cidadania" STJ.
REsp nº 65.906/DF, Quarta Turma, Dj: 02.03.1998.
Logo, entende-se acertada a fundamentação expendida na sentença, eis que o fracionamento de ações, devidamente comprovado nos autos, pode ser caracterizado como litigiosidade predatória.
Ante o exposto, conheço e nego provimento à Apelação Cível interposta pela parte autora, mantendo incólume a sentença recorrida. É como voto.
Natal, data de registro no sistema Desembargador Cornélio Alves Relator Natal/RN, 4 de Março de 2024. -
06/02/2024 00:00
Intimação
Poder Judiciário do Rio Grande do Norte Primeira Câmara Cível Por ordem do Relator/Revisor, este processo, de número 0801221-93.2023.8.20.5159, foi pautado para a Sessão VIRTUAL (votação exclusivamente pelo PJe) do dia 26-02-2024 às 08:00, a ser realizada no Primeira Câmara Cível (NÃO VIDEOCONFERÊNCIA).
Caso o processo elencado para a presente pauta não seja julgado na data aprazada acima, fica automaticamente reaprazado para a sessão ulterior.
No caso de se tratar de sessão por videoconferência, verificar o link de ingresso no endereço http://plenariovirtual.tjrn.jus.br/ e consultar o respectivo órgão julgador colegiado.
Natal, 5 de fevereiro de 2024. -
10/01/2024 17:48
Recebidos os autos
-
10/01/2024 17:48
Conclusos para despacho
-
10/01/2024 17:48
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
10/01/2024
Ultima Atualização
26/04/2024
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
ACÓRDÃO • Arquivo
ACÓRDÃO • Arquivo
ATO ORDINATÓRIO • Arquivo
ATO ORDINATÓRIO • Arquivo
SENTENÇA • Arquivo
SENTENÇA • Arquivo
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