TJRN - 0801451-48.2024.8.20.5112
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Amilcar Maia
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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11/07/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE TERCEIRA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0801451-48.2024.8.20.5112 Polo ativo BANCO SANTANDER Advogado(s): PAULO ROBERTO TEIXEIRA TRINO JUNIOR registrado(a) civilmente como PAULO ROBERTO TEIXEIRA TRINO JUNIOR Polo passivo AUGUSTO JOAQUIM DA SILVA Advogado(s): FRANCISCO JAMES SILVEIRA DE SOUZA EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL.
CUMPRIMENTO DE SENTENÇA.
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO E REPETIÇÃO DE INDÉBITO.
EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS.
CONTRATANTE IDOSO E ANALFABETO.
NULIDADE DOS CONTRATOS.
SENTENÇA TRANSITADA EM JULGADO.
CUMPRIMENTO DOS PARÂMETROS JUDICIAIS PELO EXEQUENTE.
AUSÊNCIA DE EXCESSO DE EXECUÇÃO.
REDISCUSSÃO DE MATÉRIA JÁ DECIDIDA.
IMPUGNAÇÃO GENÉRICA. ÔNUS DO ART. 525, § 4º, DO CPC NÃO OBSERVADO.
SENTENÇA MANTIDA.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. - O cumprimento de sentença deve observar rigorosamente os parâmetros fixados na decisão exequenda, sendo vedada qualquer reanálise de mérito transitado em julgado. - A planilha de cálculos apresentada pelo exequente atende ao comando judicial quanto aos índices de correção monetária, juros moratórios e compensação de valores já pagos. - O executado, ao alegar excesso de execução, atrai para si o ônus de apresentar demonstrativo detalhado e atualizado dos valores que entende devidos (CPC, art. 525, § 4º), encargo que não foi devidamente cumprido nos autos. - A tentativa de rediscutir a extensão da obrigação imposta por sentença transitada em julgado configura inovação vedada no cumprimento de sentença. - Apelação conhecida e desprovida.
ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas.
Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso e negar a ele provimento, nos termos do voto do relator que integra o presente acórdão.
RELATÓRIO Trata-se de Apelação Cível interposta pelo BANCO SANTANDER (BRASIL) S/A contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara da Comarca de Apodi/RN, que, em sede de cumprimento de sentença ajuizado nos autos da ação de indenização por danos morais c/c declaratória de inexistência de débito e repetição de indébito promovida por AUGUSTO JOAQUIM DA SILVA, assim estabeleceu: (…).
Ante o exposto, com supedâneo nas razões fático-jurídicas elencadas, REJEITO liminarmente a impugnação ao cumprimento de sentença, nos termos do § 5º do art. 525 do CPC, ao passo que DECLARO satisfeita a obrigação e julgo EXTINTA a presente execução, com resolução de mérito, com fulcro no art. 924, inciso II, do Código de Processo Civil.
Custas remanescentes, se houver, pela parte executada.
Sem condenação em honorários na fase executiva, tendo em vista que o depósito foi feito dentro do prazo concedido para pagamento.
Expeçam-se os alvarás na devida forma, ficando desde logo autorizada a retenção dos honorários contratuais, desde que seja juntado o respectivo instrumento contratual.
Dê-se baixa em eventuais constrições efetivadas pelo Juízo.
Transitada em julgado, dê-se cumprimento aos alvarás e arquivem-se os autos com baixa.
No caso de haver recurso da executada, defiro o imediato levantamento da quantia incontroversa.
Publique-se.
Registre-se.
Intime-se.
Cumpra-se.
Apodi/RN, datado e assinado eletronicamente.
Em suas razões recursais, o banco apelante alega, em síntese: (i) ocorrência de excesso de execução, indicando que os cálculos apresentados pelo exequente superestimam os valores efetivamente devidos; (ii) impropriedade dos índices aplicados e ausência de observância ao teor da sentença exequenda; (iii) necessidade de reavaliação da planilha de cálculos apresentada pelo recorrido, sob pena de enriquecimento ilícito.
Ao final, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso, para que seja cassada a sentença de extinção da execução, por não enfrentar a impugnação apresentada.
Contrarrazões apresentadas nos autos.
Ausentes às hipóteses legais a ensejar a intervenção ministerial. É o relatório.
VOTO Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do presente recurso.
Trata-se de apelação interposta pelo Banco Santander (Brasil) S.A. contra sentença que, nos autos do cumprimento de sentença, reconheceu como corretos os cálculos apresentados por AUGUSTO JOAQUIM DA SILVA, mantendo-se o montante total atualizado da condenação em R$ 74.145,07.
A controvérsia recursal centra-se na suposta existência de excesso de execução, sob o argumento de que os cálculos promovidos pelo exequente teriam extrapolado os limites da coisa julgada, e que o valor efetivamente devido seria, segundo o banco, de R$ 63.171,73.
Em análise acurada, verifico que não assiste razão ao recorrente.
A sentença exequenda reconheceu a nulidade de dois contratos de empréstimo consignado (nº 489861366 e nº 494782288), determinando a restituição em dobro dos valores indevidamente descontados, totalizando R$ 55.440,00, bem como condenou o banco ao pagamento de R$ 5.000,00 a título de danos morais, com aplicação de correção monetária pelo INPC desde cada desconto indevido, além de juros moratórios de 1% ao mês.
A planilha de cálculos apresentada pelo recorrido obedeceu fielmente às diretrizes estabelecidas no julgado, utilizando o índice correto (INPC), incidência a partir dos fatos geradores, bem como juros legais conforme fixado na sentença.
Ainda, foi realizada a devida compensação dos valores já pagos, conforme comando judicial.
Por outro lado, a impugnação apresentada pelo banco baseia-se em parâmetros próprios e interpretações distintas da sentença, sem lograr demonstrar de forma suficiente qualquer vício na quantificação do crédito executado.
Ademais, o apelante não apresentou planilha de cálculos que demonstrasse objetivamente o alegado excesso, conforme exige o art. 525, § 4º, do Código de Processo Civil: Art. 525. (…). § 4º Quando o executado alegar que o exequente, em excesso de execução, pleiteia quantia superior à resultante da sentença, cumprir-lhe-á declarar de imediato o valor que entende correto, apresentando demonstrativo discriminado e atualizado de seu cálculo.
Assim, ao deixar de apresentar demonstrativo claro e em conformidade com os critérios fixados judicialmente, a impugnação do banco não atende ao ônus processual que lhe compete, sendo inviável a pretensão de rediscutir parâmetros já transitados em julgado.
Ressalte-se que a execução deve respeitar rigorosamente o comando sentencial, sendo vedada, nesta fase, a inovação ou revisão do mérito.
Por todo o exposto, voto no sentido de NEGAR PROVIMENTO ao recurso de apelação, mantendo-se incólume a decisão combatida.
Por fim, deixo de arbitrar honorários advocatícios recursais, uma vez que não houve condenação da parte executada, ora apelante, na instância de origem. É como voto.
Natal/RN, 7 de Julho de 2025. -
25/06/2025 00:00
Intimação
Poder Judiciário do Rio Grande do Norte Por ordem do Relator/Revisor, este processo, de número 0801451-48.2024.8.20.5112, foi pautado para a Sessão VIRTUAL (Votação Exclusivamente PJe) do dia 07-07-2025 às 08:00, a ser realizada no Terceira Câmara Cível.
Caso o processo elencado para a presente pauta não seja julgado na data aprazada acima, fica automaticamente reaprazado para a sessão ulterior.
No caso de se tratar de sessão por videoconferência, verificar o link de ingresso no endereço http://plenariovirtual.tjrn.jus.br/ e consultar o respectivo órgão julgador colegiado.
Natal, 24 de junho de 2025. -
26/02/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE TERCEIRA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0801451-48.2024.8.20.5112 Polo ativo BANCO SANTANDER Advogado(s): PAULO ROBERTO TEIXEIRA TRINO JUNIOR registrado(a) civilmente como PAULO ROBERTO TEIXEIRA TRINO JUNIOR Polo passivo AUGUSTO JOAQUIM DA SILVA Advogado(s): FRANCISCO JAMES SILVEIRA DE SOUZA EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO ORDINÁRIA.
EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS NÃO RECONHECIDOS PELA PARTE CONSUMIDORA.
INSTITUIÇÃO BANCÁRIA QUE NÃO COMPROVOU A PACTUAÇÃO DOS CONTRATOS COM PESSOA ANALFABETA.
FORMA LEGAL NÃO OBSERVADA (ART. 595, CC).
FALSIDADE DE DOCUMENTOS APRESENTADOS QUANDO DA CELEBRAÇÃO DOS CONTRATOS IMPUGNADOS.
FRAUDE EVIDENCIADA.
DEVER INERENTE À PARTE FORNECEDORA.
FALTA DE DILIGÊNCIA DA INSTITUIÇÃO BANCÁRIA.
DANOS MATERIAIS CONFIGURADOS.
COBRANÇA IRREGULAR.
INCIDÊNCIA DO ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC.
REPETIÇÃO DE INDÉBITO NA FORMA DOBRADA, JURISPRUDÊNCIA DO STJ QUE SOFREU ALTERAÇÃO AFASTANDO A NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA MÁ-FÉ PARA ENSEJAR REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO.
CONDUTA CONTRÁRIA A BOA-FÉ OBJETIVA CONFIGURADA NOS AUTOS.
REPETIÇÃO DOBRADA CABÍVEL.
DANO MORAL CARACTERIZADO.
LESÃO PRESUMIDA.
DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO (DANO IN RE IPSA).
QUANTUM INDENIZATÓRIO ARBITRADO EM CONSONÂNCIA COM OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE, E DE ACORDO COM A MÉDIA ARBITRADA POR ESTA CÂMARA CÍVEL.
MANUTENÇÃO.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
ACÓRDÃO Acordam os Desembargadores que compõem a 3ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso e negar a ele provimento, nos termos do voto do relator, que integra o julgado.
RELATÓRIO Trata-se de Apelação Cível interposta pelo BANCO SANTANDER (BRASIL) S/A contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara da Comarca de Apodi/RN, que, nos autos da ação ordinária promovida por AUGUSTO JOAQUIM DA SILVA, assim estabeleceu: III – DISPOSITIVO.
Ante o exposto, com supedâneo nas razões fático-jurídicas elencadas, julgo PROCEDENTE o pedido e, nos termos do art. 487, I, do CPC, EXTINGO o processo com resolução do mérito, para: 1)DECLARAR a nulidade dos contratos de empréstimo consignado nº 489861366 e 494782288e a inexistência da dívida deles decorrentes; 2) CONDENAR a parte demandada ao pagamento de indenização por repetição do indébito no valor de R$ 55.440,00 (cinquenta e cinco mil, quatrocentos e quarenta reais), relativo ao dobro dos descontos indevidos, além do valor em dobro dos descontos porventura efetuados durante o trâmite da ação, devendo incidir correção monetária pelo índice INPC e juros de mora de 1% ao mês, ambos a contar da data de cada desconto indevido; e 3) CONDENAR o requerido ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) à parte autora, a título de danos morais,acrescido da correção monetária pelo INPC a partir da data do arbitramento e de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir do evento danoso (Súmula nº 54-STJ).
Outrossim, determino a compensação entre a quantia depositada pela instituição financeira na conta da parte autora e o valor da condenação, devendo incidir correção monetária pelo índice INPC, desde a data do depósito.
Condeno o réu no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação. (...).
Em suas razões, a instituição financeira alegou, em síntese: a) regularidade da relação contratual, tendo em vista que cumpriu com o ônus de colacionar os contratos celebrados entre as partes, além de demonstrar que os valores da transação foram creditados em favor da parte consumidora por meio de TEDs; b) descabida a indenização por danos morais, porém, não sendo esse o entendimento, há excessividade do quantum indenizatório arbitrado; c) inexistência de repetição do indébito, contudo, não sendo esse o entendimento, entende que a devolução se dê de forma simples, pois não foi comprovada a má-fé.
Por fim, requer o conhecimento e provimento do apelo, nos termos formulados nas suas razões.
Contrarrazões apresentadas nos autos.
Sem manifestação ministerial, por não se tratar de hipótese de intervenção do Ministério Público. É o relatório.
VOTO Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.
Cinge-se o mérito recursal em aferir se acertada a sentença que, ao julgar procedente a pretensão autoral, declarou nulos os negócios jurídicos objetos dos autos, condenando a instituição financeira: a) à restituição em dobro dos valores descontados no benefício previdenciário da parte autora, determinando, contudo, a compensação entre a quantia depositada pelo banco na sua conta bancária e o valor da condenação; b) ao pagamento de indenização por danos morais na quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
Inicialmente, é de se esclarecer que, no caso dos autos, tem-se por aplicável os dispositivos emanados do Código de Defesa do Consumidor – CDC, haja vista tratar-se de relação jurídico-material em que de um lado a recorrida figura como fornecedora de serviços, e do outro o Recorrente se apresenta como seu destinatário.
Ademais, cumpre ressaltar que, mesmo existindo pacto contratual livremente celebrado entre as partes, é assegurado ao Poder Judiciário intervir na relação jurídica, de modo a devolver ao negócio o equilíbrio determinado pela lei e a função social a ele inerente, sem que isso signifique interferência ilegal na autonomia da vontade das partes, ainda mais quando o negócio se encontra regido pelo CDC.
In casu, a autora afirma que jamais firmou qualquer contrato com o banco demandado, contudo este vem promovendo descontos em seu benefício previdenciário relativos a empréstimos consignados de nº 3494782288 e 489861366.
Por sua vez, o banco réu argui haver regularidade nas cobranças, pois teriam sido fundadas em contratos revestidos pela legalidade, além de que os valores teriam sido creditados em favor da autora.
Com efeito, o Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 14, estabeleceu a responsabilidade civil objetiva dos fornecedores de serviços, na qual, uma vez ocorrido o dano, será investigado tão somente o nexo de causalidade, inexistindo, portanto, aferição de culpa.
Pois bem.
O Código de Processo Civil estabelece, no art. 373, incisos I e II, o seguinte: Art. 373.
O ônus da prova incumbe: I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito; II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.
Nesse viés, ao autor também cumpre comprovar o fato constitutivo do direito alegado, cabendo ao réu demonstrar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo de tal direito.
Analisando o caderno processual, verifica-se que a postulante juntou cópia de extratos bancários e do histórico de empréstimo consignado emitido pelo INSS, contendo as informações da contratação discutida nos autos.
Por sua vez, a instituição financeira colacionou cópia de contratos, os quais afirma ter sido firmados com pessoa analfabeta mediante procuração pública.
Segundo o art. 107 CC, “a validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir”.
Por sua vez, o art. 595 do mesmo diploma legal estabelece que “no contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas”.
Em recente julgado, o Superior Tribunal de Justiça endossou a necessidade dos requisitos constantes no art. 595 do CC para reconhecimento da validade da contratação, nestes termos: DIREITO CIVIL.
RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C PEDIDOS DE RESTITUIÇÃO DE VALORES E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FIRMADO POR IDOSO INDÍGENA ANALFABETO.
VALIDADE.
REQUISITO DE FORMA.
ASSINATURA DO INSTRUMENTO CONTRATUAL A ROGO POR TERCEIRO, NA PRESENÇA DE DUAS TESTEMUNHAS.
ART. 595 DO CC/02.
PROCURADOR PÚBLICO.
DESNECESSIDADE. [...] 6.
Noutra toada, na hipótese de se tratar de contrato escrito firmado pela pessoa analfabeta, é imperiosa a observância da formalidade prevista no art. 595 do CC/02, que prevê a assinatura do instrumento contratual a rogo por terceiro, com a subscrição de duas testemunhas. 7.
Embora o referido dispositivo legal se refira ao contrato de prestação de serviços, deve ser dada à norma nele contida o máximo alcance e amplitude, de modo a abranger todos os contratos escritos firmados com quem não saiba ler ou escrever, a fim de compensar, em algum grau, a hipervulnerabilidade desse grupo social. 8.
Com efeito, a formalização de negócios jurídicos em contratos escritos - em especial, os contratos de consumo - põe as pessoas analfabetas em evidente desequilíbrio, haja vista sua dificuldade de compreender as disposições contratuais expostas em vernáculo.
Daí porque, intervindo no negócio jurídico terceiro de confiança do analfabeto, capaz de lhe certificar acerca do conteúdo do contrato escrito e de assinar em seu nome, tudo isso testificado por duas testemunhas, equaciona-se, ao menos em parte, a sua vulnerabilidade informacional. 9.
O art. 595 do CC/02 se refere a uma formalidade a ser acrescida à celebração de negócio jurídico por escrito por pessoa analfabeta, que não se confunde com o exercício de mandato.
O contratante que não sabe ler ou escrever declara, por si próprio, sua vontade, celebrando assim o negócio, recorrendo ao terceiro apenas para um auxílio pontual quanto aos termos do instrumento escrito. 10.
O terceiro, destarte, não celebra o negócio em representação dos interesses da pessoa analfabeta, como se mandatário fosse.
Por isso, não é necessário que tenha sido anteriormente constituído como procurador. 11.
Se assim o quiser, o analfabeto pode se fazer representar por procurador, necessariamente constituído mediante instrumento público, à luz do disposto no art. 654, caput, do CC/02.
Nessa hipótese, típica do exercício de mandato, não incide o disposto no art. 595 do Código e, portanto, dispensa-se a participação das duas testemunhas. 12.
Recurso especial conhecido e provido (STJ, REsp 1907394/MT, Rel.
Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/05/2021, DJe 10/05/2021).
E da análise minuciosa de todos os fatos narrados nestes autos e dos documentos juntados, observa-se, claramente, o acerto do juízo sentenciante ao julgar procedente a pretensão autoral, cujos fundamentos ali expostos adoto também como razão de decidir: “(…).
Ao analisar o instrumento de mandato anexado aos contratos de empréstimo, fica evidente que se trata de um documento claramente falsificado, dada as diversas inconsistências encontradas, senão vejamos:(i) o documento foi assinado por um tabelião que não é o titular do cartório de Portalegre/RN, cuja verdadeira titular é a Sra.
Maria Bernadete Nunes Rego Gomes; (ii) a pessoa de Antônia Marlene Dias da Silva Nobre, identificada na procuração como filha do autor, é por ele desconhecida, assim como Tainá Silva Ferreira, que assina a rogo o documento; (iii) o documento de identidade de Antônia Marlene Dias da Silva Nobre anexado no ID 131711263 apresenta a informação de que ela é filha de Augusto Joaquim da Silva e natural de Iracema-CE, enquanto que no ID 131711264 consta a informação de que ela é filha de Odilon Benigno da Silva e natural de Inajá-PE, donde se conclui que, além de a procuração ser falsa, a procuradora também possui documento falso.
Soma-se a isso a certidão negativa de ID 135012906, na qual o Cartório Único de Portalegre/RN certifica a inexistência de qualquer registro de procuração em nome do autor, além de atestar que a procuração apresentada pela parte ré é falsa.
Desse modo, a lei exige que a validade de um contrato firmado com pessoa analfabeta dependa da demonstração clara de sua manifestação de vontade, seja por meio de documento assinado a rogo, com a presença de duas testemunhas, ou por procuração pública.
Em ambos os casos, é essencial o cumprimento dos requisitos legais para que o negócio jurídico seja considerado válido.
No entanto, no caso em questão, tais requisitos não foram observados, tornando os contratos impugnados inválidos.
Caberia à parte ré, no momento da contratação do negócio jurídico, verificar a validade da procuração pública apresentada, a fim de evitar fraudes perpetradas por terceiros.
A conduta de aceitar documentação fraudulenta nas transações bancárias realizadas no cotidiano da instituição configura uma clara negligência da parte ré, que poderia ser facilmente evitada por meio de simples medidas de cautela.
Frise-se, ainda, que a 2ª seção do STJ fixou a seguinte tese referente ao Tema 1061: “Na hipótese em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em contrato bancário juntado ao processo pela instituição financeira, caberá a esta o ônus de provar a sua autenticidade (CPC, arts. 6º, 368 e 429, II)”. (REsp 1846649/MA, Rel.
Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 24/11/2021, DJe 09/12/2021).
No caso em apreço, do cotejo dos elementos coligidos, constata-se que o contrato em discussão foi realizado com pessoa analfabeta mediante procuração pública fraudada, circunstâncias que inquinam o negócio de vício insanável, acarretando em nulidade absoluta.
Assim, deixando de demonstrar a legalidade dos descontos referentes as parcelas dos empréstimos consignados, deve arcar com o ônus do qual não se desincumbiu (art. 373, inciso II, do CPC).
Demais disso, entendo desnecessária a realização de qualquer perícia nos contratos acostados, visto que estes, evidentemente, apresentam vícios de contratação, considerando que, supostamente, foram formalizados por meio de procuração pública, a qual não preenche os requisitos necessários para validade contratual.
Ademais, quando o contratante não observa os requisitos necessários aptos a validar negócio jurídico envolvendo pessoa analfabeta, é desnecessária a realização de perícia, vejamos: (…).
Desse modo, entendo plenamente caracterizada a falha na prestação do serviço, pela qual a parte ré efetuou descontos indevidamente no benefício previdenciário do(a) autor(a) em virtude de dívida não contratada, exsurgindo daí sua responsabilidade e o consequente dever de indenizar. (…).
Nesses termos, considerando que a instituição financeira está inserida no conceito de prestadora de serviço, ela é responsável objetivamente pelos prejuízos e danos causados ao consumidor.
Logo, basta que se comprove o nexo causal entre o ato perpetrado pela instituição bancária e o consequente dano oriundo desta conduta para que surja o dever de indenizar o lesado, sem que seja necessária qualquer investigação acerca do elemento culpa.
Sabe-se, outrossim, que a fornecedora tem o dever de aferir a autenticidade dos documentos apresentados por um pretenso cliente, para, além de resguardar seus direitos (garantia do cumprimento da obrigação contraída), prevenir eventual agressão a interesses de terceiros, como se deu no caso em deslinde.
A conduta desidiosa do demandado, decerto, acarretou dano moral a autora, cujos dados pessoais foram indevidamente utilizados para celebrar contrato de empréstimo, configurando-se o dano imaterial, bem assim o dever de indenizar por parte daquele que o causou.
Nesse viés, cumpre ao prestador de serviço ser diligente na execução de seu mister, não podendo contratar sem se certificar sobre a idoneidade das informações prestadas pela pessoa interessada, de modo que é inquestionável a má prestação do serviço e a ocorrência do dano moral infligido à demandante, decorrente deste fato.
Ademais, tratando-se de uma relação consumerista, cumpria ao banco réu, comprovar que o contrato de empréstimo foi celebrado efetivamente pela autora, ônus do qual não se desincumbiu, restando, assim, caracterizado o dano moral indenizável.
Certo, portanto, é o direito à indenização decorrente do dano moral infligido à pessoa física.
Inexistindo no feito qualquer prova capaz de evidenciar a contratação pela parte autora do empréstimo e a relação jurídica havida entre os litigantes e, opostamente, em estando evidenciada a ocorrência de fraude, imperioso reconhecer que os descontos realizados no benefício da demandante foram indevidos, se demonstrando cabível a condenação do demandado em reparar à autora pelos danos materiais e morais sofridos.
Ressalte-se que a cobrança indevida não foi provocada por engano justificável da instituição bancária, mas pela prestação de um serviço defeituoso.
Logo, o dano material configurado pela cobrança irregular executada pelo banco réu conduz à responsabilidade desta em restituir em dobro o valor pago a mais pela autora, consoante estatuído no art. 42, parágrafo único, do CDC.
No tocante à discussão se a repetição dos valores indevidamente adimplidos devem ser na forma simples ou em dobro, cumpre destacar que o Superior Tribunal de Justiça, ao concluir o julgamento dos Embargos de Divergência 1.413.542, uniformizou o entendimento do tribunal sobre a questão no Tema 929, sedimentando que, mediante cobrança indevida do consumidor, a repetição do indébito em dobro prevista no art. 42 do CDC não carece mais da demonstração da má-fé, mas, apenas, da configuração de conduta contrária a boa-fé, nos termos do aresto que destaco a seguir: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR.
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA.
HERMENÊUTICA DAS NORMAS DE PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR.
REPETIÇÃO DE INDÉBITO.
DEVOLUÇÃO EM DOBRO.
PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC.
REQUISITO SUBJETIVO.
DOLO/MÁ-FÉ OU CULPA.
IRRELEVÂNCIA.
PREVALÊNCIA DO CRITÉRIO DA BOA-FÉ OBJETIVA.
MODULAÇÃO DE EFEITOS PARCIALMENTE APLICADA.
ART. 927, § 3º, DO CPC/2015. [...] TESE FINAL 28.
Com essas considerações, conhece-se dos Embargos de Divergência para, no mérito, fixar-se a seguinte tese: A REPETIÇÃO EM DOBRO, PREVISTA NO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC, É CABÍVEL QUANDO A COBRANÇA INDEVIDA CONSUBSTANCIAR CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA, OU SEJA, DEVE OCORRER INDEPENDENTEMENTE DA NATUREZA DO ELEMENTO VOLITIVO.
MODULAÇÃO DOS EFEITOS 29.
Impõe-se MODULAR OS EFEITOS da presente decisão para que o entendimento aqui fixado - quanto a indébitos não decorrentes de prestação de serviço público - se aplique somente a cobranças realizadas após a data da publicação do presente acórdão.
RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO 30.
Na hipótese dos autos, o acórdão recorrido fixou como requisito a má-fé, para fins do parágrafo único do art. 42 do CDC, em indébito decorrente de contrato de prestação de serviço público de telefonia, o que está dissonante da compreensão aqui fixada.
Impõe-se a devolução em dobro do indébito.
CONCLUSÃO 31.
Embargos de Divergência providos (STJ - EREsp: 1413542 RS 2013/0355826-9, Relator: Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Data de Julgamento: 21/10/2020, CE - CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: DJe 30/03/2021).
Nesse sentido, afastando a necessidade de comprovação de má-fé, o STJ fixou a seguinte tese: “A repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo”.
Desse modo, verifica-se que a repetição do indébito em dobro se demonstra cabível independentemente da demonstração de má-fé por parte do fornecedor, desde que consubstanciada cobrança indevida advinda de conduta contrária à boa-fé objetiva, o que se verificou nos autos, uma vez que constatada a contratação de fraudulenta de empréstimo consignado.
Nesse desiderato, me alinho ao novel entendimento jurisprudencial adotado pelo Superior Tribunal de Justiça e, uma vez a configuração nos autos as cobranças indevidas, vislumbro admissível a repetição do indébito em dobro no caso concreto, pelo que irretocável a sentença nesse aspecto.
Quanto ao dano moral, registre-se que não se necessita da demonstração do prejuízo, e sim da prova do fato que deu ensejo ao resultado danoso à moral da vítima, fato esse que deve ser ilícito e guardar nexo de causalidade com a lesão sofrida.
Assim, tem-se que no caso em tela se trata de danum in re ipsa, o qual prescinde de prova da ocorrência de prejuízo concreto, que, na questão em debate, se presume, conforme as regras de experiência comum.
A indenização por dano moral objetiva compensar a dor moral sofrida pela vítima, punir o ofensor e desestimular a ocorrência de outros episódios dessa natureza.
No nosso ordenamento jurídico, essa fixação ficou entregue ao prudente arbítrio do juiz, que, levando em conta critérios doutrinários e jurisprudenciais, deve apresentar uma proporcionalidade com a lesão à honra, à moral ou à dignidade do ofendido, atentando, ainda, para as circunstâncias do fato, de maneira que a reparação não se converta em fonte de enriquecimento, nem seja inexpressiva.
Destarte, seu arbitramento é questão de difícil análise, pois não há como se aferir monetariamente o valor exato a cobrir a eventual ofensa ao lesado; não existem critérios objetivos, devendo prevalecer a subjetividade, ou melhor, devendo ser observado em cada caso a repercussão do dano, as condições financeiras da parte que causou o ilícito e as do ofendido, devendo sempre se buscar um valor justo, sendo cabível, portanto, a intervenção da Corte quando exagerado, ínfimo ou absurdo, fugindo de qualquer parâmetro razoável.
Sendo assim, em atenção aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, bem como em consonância com o entendimento da 3ª Câmara Cível deste Tribunal, entendo que o valor estipulado em sentença não se demonstra excessivo, devendo ser mantido por atender à tais pressupostos.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso e, em consequência, majoro os honorários advocatícios de 10% (dez por cento) para 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da condenação, conforme no art. 85, § 11, do CPC. É como voto.
Natal/RN, 17 de Fevereiro de 2025. -
06/02/2025 00:00
Intimação
Poder Judiciário do Rio Grande do Norte Terceira Câmara Cível Por ordem do Relator/Revisor, este processo, de número 0801451-48.2024.8.20.5112, foi pautado para a Sessão VIRTUAL (Votação Exclusivamente PJe) do dia 17-02-2025 às 08:00, a ser realizada no Terceira Câmara Cível.
Caso o processo elencado para a presente pauta não seja julgado na data aprazada acima, fica automaticamente reaprazado para a sessão ulterior.
No caso de se tratar de sessão por videoconferência, verificar o link de ingresso no endereço http://plenariovirtual.tjrn.jus.br/ e consultar o respectivo órgão julgador colegiado.
Natal, 5 de fevereiro de 2025. -
24/01/2025 13:17
Recebidos os autos
-
24/01/2025 13:17
Conclusos para despacho
-
24/01/2025 13:17
Distribuído por sorteio
-
22/11/2024 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE 1ª Vara da Comarca de Apodi BR 405, KM 76, Portal da Chapada, APODI - RN - CEP: 59700-000 Processo nº: 0801451-48.2024.8.20.5112 Classe: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) AUTOR: AUGUSTO JOAQUIM DA SILVA REU: BANCO SANTANDER SENTENÇA I – RELATÓRIO.
Vistos.
AUGUSTO JOAQUIM DA SILVA promove AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS em face do BANCO SANTANDER S.A., ambos devidamente qualificados nos autos.
Na inicial, a parte autora afirma que, ao consultar seus extratos previdenciários, identificou dois empréstimos consignados, de números 494782288 e 489861366, vinculados à instituição demandada.
Declara que não contratou tais operações, embora os valores de R$ 385,00 (trezentos e oitenta e cinco reais) estejam sendo descontados mensalmente desde maio de 2021 em seu benefício previdenciário.
Requer assim o pagamento de indenização por danos materiais e morais, bem como declaração de inexistência de negócio jurídico.
Em decisão interlocutória proferida por este juízo foi indeferido o pedido liminar, entretanto foi deferida a gratuidade da justiça e determinada a inversão do ônus da prova em favor da parte demandada, bem como designada audiência de conciliação.
Termo de audiência de conciliação acostado nos autos, ocasião em que a tentativa restou infrutífera.
Citada, a parte requerida apresentou contestação, suscitando preliminarmente a ausência de interesse de agir, a inépcia da inicial e a prescrição.
No mérito, sustentou a regularidade do contrato, alegando que o contrato foi devidamente firmado por meio de procuração pública e aduzindo que a parte autora se beneficiou do empréstimo, e, ao empreender os descontos das parcelas, afirma ter agido no exercício regular de direito, ou no mínimo, a contratação se deu por terceiro fraudador, o que afastaria sua responsabilidade, e, por consequência, o dever de indenizar, assim, pugnou pela improcedência do pedido.
Em réplica, o autor reafirmou integralmente os termos da inicial, impugnou os fundamentos apresentados na contestação e questiona a validade do contrato e da procuração pública apresentado pela ré, sustentando que se trata de documento fraudulento.
Devidamente intimada para manifestar-se acerca da necessidade de produção de outras provas, a parte demandada pugnou pelo julgamento antecipado.
Vieram os autos conclusos. É o relatório.
Fundamento e decido.
II – FUNDAMENTAÇÃO.
Analisando os autos, observa-se que matéria em debate, embora seja de fato e de direito, independe da produção de outras provas, incidindo ao caso a hipótese de julgamento antecipado do mérito, nos termos do art. 355, inciso I, do NCPC.
Por essa razão, entendo desnecessária a expedição de ofício ao cartório, tendo em vista que o tabelião já reconheceu a falsidade da procuração apresentada no momento da assinatura do contrato.
De modo semelhante, a prova pericial e testemunhal são desnecessárias porque a prova documental produzida é suficiente para a análise do caso.
Antes de adentrar nas questões de mérito propriamente ditas, passo à análise das preliminares suscitadas.
Em relação a inépcia da inicial suscitada, verifica-se que o argumento que baseia tal preliminar confunde-se com o mérito da demanda, e como tal será apreciada.
A parte requerida sustenta a ausência de pretensão resistida por parte do autor, por não ter feito prova de que buscou solucionar a problemática pela via administrativa.
Entretanto, tal argumento não merece acolhida por este juízo, pois, se faz desnecessário que a parte autora esgote as vias administrativas para, só então, poder buscar judicialmente a satisfação de sua pretensão, sob pena de violação ao art. 5º, XXXV, da CF/88.
Dessa forma, REJEITO a preliminar arguida.
Em relação à prescrição, observo que não ocorreu no caso concreto, uma vez que, em se tratando de fato do serviço, aplica-se o prazo prescricional previsto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor.
De igual modo, considerando a relação jurídica de trato sucessivo, a prescrição quinquenal não atinge o fundo de direito, alcançando, tão somente, os descontos efetuados anteriormente aos cinco anos que antecedem a propositura da ação.
Por essas razões, REJEITO a prejudicial arguida, ressalvando-se que os descontos efetuados anteriormente aos cinco anos que antecedem a propositura da ação, estão fulminados pela prescrição.
Passando adiante, a presente ação deve ser analisada sob a ótica do Código de Proteção e Defesa do Consumidor (CDC), já que, a despeito da alegação de inexistência de relação contratual entre as partes, tem pertinência o disposto no art. 17 do CDC, segundo o qual se equiparam aos consumidores todas as vítimas do evento.
Logo, sendo a parte autora consumidor por equiparação, a responsabilidade do réu é objetiva, incidindo na espécie o art. 14 do CDC.
Nesse caso, onde se discute a responsabilidade por defeito no serviço, o fornecedor responde objetivamente (art. 14, caput, do CDC), a não ser quando prove a inexistência do defeito ou a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro (art. 14, § 3º, incisos I e II, do CDC), donde se conclui que a inversão probatória se opera ope legis.
Desse modo, incide neste processo a aplicação da Súmula nº 479 do STJ, ao dispor que “as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”.
Assim, a configuração da responsabilidade civil assenta-se na comprovação do fato ilícito, da existência do dano efetivo, do nexo de causalidade entre ambos, pressupostos que devem ser demonstrados.
Compulsando os autos, restou incontroverso que o contrato em discussão foi realizado com pessoa analfabeta mediante procuração pública, conforme se extrai dos instrumentos anexados aos autos (IDs 131711263 e 131711264).
Em casos dessa espécie, o art. 595 do Código Civil/2002 dispõe que “No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas”.
Ao analisar o instrumento de mandato anexado aos contratos de empréstimo, fica evidente que se trata de um documento claramente falsificado, dada as diversas inconsistências encontradas, senão vejamos: (i) o documento foi assinado por um tabelião que não é o titular do cartório de Portalegre/RN, cuja verdadeira titular é a Sra.
Maria Bernadete Nunes Rego Gomes; (ii) a pessoa de Antônia Marlene Dias da Silva Nobre, identificada na procuração como filha do autor, é por ele desconhecida, assim como Tainá Silva Ferreira, que assina a rogo o documento; (iii) o documentos de identidade de Antônia Marlene Dias da Silva Nobre anexado no no ID 131711263 apresenta a informação de que ela é filha de Augusto Joaquim da Silva e natural de Iracema-CE, enquanto que no ID 131711264 consta a informação de que ela é filha de Odilon Benigno da Silva e natural de Inajá-PE, donde se conclui que, além de a procuração ser falsa, a procuradora também possui documento falso.
Soma-se a isso a certidão negativa de ID 135012906, na qual o Cartório Único de Portalegre/RN certifica a inexistência de qualquer registro de procuração em nome do autor, além de atestar que a procuração apresentada pela parte ré é falsa.
Desse modo, a lei exige que a validade de um contrato firmado com pessoa analfabeta dependa da demonstração clara de sua manifestação de vontade, seja por meio de documento assinado a rogo, com a presença de duas testemunhas, ou por procuração pública.
Em ambos os casos, é essencial o cumprimento dos requisitos legais para que o negócio jurídico seja considerado válido.
No entanto, no caso em questão, tais requisitos não foram observados, tornando os contratos impugnados inválidos.
Caberia à parte ré, no momento da contratação do negócio jurídico, verificar a validade da procuração pública apresentada, a fim de evitar fraudes perpetradas por terceiros.
A conduta de aceitar documentação fraudulenta nas transações bancárias realizadas no cotidiano da instituição configura uma clara negligência da parte ré, que poderia ser facilmente evitada por meio de simples medidas de cautela.
Frise-se, ainda, que a 2ª seção do STJ fixou a seguinte tese referente ao Tema 1061: “Na hipótese em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em contrato bancário juntado ao processo pela instituição financeira, caberá a esta o ônus de provar a sua autenticidade (CPC, arts. 6º, 368 e 429, II)”. (REsp 1846649/MA, Rel.
Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 24/11/2021, DJe 09/12/2021).
No caso em apreço, do cotejo dos elementos coligidos, constata-se que o contrato em discussão foi realizado com pessoa analfabeta mediante procuração pública fraudada, circunstâncias que inquinam o negócio de vício insanável, acarretando em nulidade absoluta.
Assim, deixando de demonstrar a legalidade dos descontos referentes as parcelas dos empréstimos consignados, deve arcar com o ônus do qual não se desincumbiu (art. 373, inciso II, do CPC).
Demais disso, entendo desnecessária a realização de qualquer perícia nos contratos acostados, visto que estes, evidentemente, apresentam vícios de contratação, considerando que, supostamente, foram formalizados por meio de procuração pública, a qual não preenche os requisitos necessários para validade contratual.
Ademais, quando o contratante não observa os requisitos necessários aptos a validar negócio jurídico envolvendo pessoa analfabeta, é desnecessária a realização de perícia, vejamos: AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS – RECURSO DO BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S/A – PRELIMINARES DE PRESCRIÇÃO E DE CERCEAMENTO DE DEFESA AFASTADOS – MÉRITO – DA VALIDADE DO CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES – IMPOSSIBILIDADE – DA MORAL CONFIGURADO – RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO NA FORMA SIMPLES – QUANTUM INDENIZATÓRIO A TÍTULO DE DANOS MORAIS MAJORADOS – RECURSO IMPROVIDO.
Nos termos do art. 27, do CDC, prescreve em cinco anos a pretensão de obter reparação em vista de cobrança indevida (CDC, art. 27), sendo o termo inicial da contagem do prazo prescricional a data do último desconto.
Restando incontroverso que a autora é analfabeta, e, não tendo sido observadas as formalidades mínimas necessárias à validade do negócio, a contratação de empréstimo consignado deve ser considerada nula, sendo desnecessária a realização de prova pericial (perícia datiloscópica). (...) omissis. (TJ-MS: Apelação nº 0800233-81.2015.8.12.0016, 4ª Câmara Cível, Rel(a).
Des.
Claudionor Miguel Abss Duarte, julgado em 03/05/2017).
RECURSO INOMINADO.
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO.
SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.
INSCRIÇÃO INDEVIDA EM ÓRGÃO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO.
AUSÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA.
AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA EXISTÊNCIA DA DÍVIDA.
CONTRATANTE ANALFABETO.
DESNECESSIDADE DE PERÍCIA DATILOSCÓPICA.
NÃO OBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS INDISPENSAVÉIS À VALIDADE DO CONTRATO ANTE A CONDIÇÃO DO AUTOR.
DEVER DE INDENIZAR.
APLICAÇÃO DO ENUNCIADO 12.15 DA TRU/PR.
SENTENÇA REFORMADA.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJ-PR: RI nº 0002046-49.2015.8.16.0087, 2ª Turma Recursal, Rel(a).
Manuela Tallão Benke, julgado em 15.08.2016).
Desse modo, entendo plenamente caracterizada a falha na prestação do serviço, pela qual a parte ré efetuou descontos indevidamente no benefício previdenciário do(a) autor(a) em virtude de dívida não contratada, exsurgindo daí sua responsabilidade e o consequente dever de indenizar.
Portanto, no caso em debate estão presentes tanto o dano como o nexo de causalidade, na medida em que efetuou descontos nos rendimentos auferidos pelo(a) autor(a) sem que este(a) tivesse anuído.
Tais circunstâncias são suficientes para afastar a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros, pois se trata de hipótese de fortuito interno, devendo, portanto, ser responsabilizado objetivamente.
Está, pois, configurado o dever de indenizar (art. 14 do CDC), ante a demonstração da conduta do réu e do dano ao autor, bem como o nexo causal.
Em relação ao dano material, extrai-se dos extratos previdenciários acostados pela parte autora nos IDs 122691244 e 122691245 que os descontos mensais dos empréstimos de n° 489861366 e 494782288, no valor de R$ 385,00, iniciaram em 05/2021, sendo que até o momento foi descontado a quantia total de R$ 27.720,00 (vinte e sete mil setecentos e vinte reais) referente à ambos os contratos.
Com isso, na exata conformidade ao art. 42, parágrafo único, do CDC, deve o demandado ressarcir à parte autora a quantia de R$ 55.440,00 (cinquenta e cinco mil, quatrocentos e quarenta reais), relativa ao dobro dos descontos indevidamente realizados na conta do promovente, além do ressarcimento em dobro dos valores porventura descontados durante o trâmite desta ação, acrescendo-se juros de mora e correção monetária, uma vez que não logrou êxito em comprovar a existência de erro justificável apto a afastar a repetição do indébito.
Isso porque, o entendimento atual do Superior Tribunal de Justiça acerca da questão é no sentido de que a repetição em dobro independe do elemento volitivo, não havendo que se falar em necessidade de comprovação da ma-fé.
Em relação ao dano moral, é sabido que situações dessa natureza independe da prova do prejuízo, uma vez que predomina na jurisprudência a tese de que se configura in re ipsa, estando vinculado à própria existência do fato ilícito, cujos resultados são presumidos.
Confira-se: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DO INDÉBITO E PEDIDO DE DEVOLUÇÃO EM DOBRO C/C DANOS MORAIS E PEDIDO LIMINAR DE SUSPENSÃO DOS DESCONTOS – FRAUDE EM CONTRATO DE EMPRÉSTIMO – DESCONTOS INDEVIDOS EM APOSENTADORIA – DANO MORAL IN RE IPSA – PRETENSÃO DE REDUÇÃO DO MONTANTE INDENIZATÓRIO – IMPOSSIBILIDADE – RECURSO CONHECIDO DESPROVIDO.
I – Os descontos de parte de proventos de aposentadoria com base em contrato de empréstimo bancário inexistente ou fraudulento gera, por si só, o direito à indenização pelos danos morais.
II – No ordenamento jurídico brasileiro não existem critérios objetivos para a quantificação do dano moral, até porque esta espécie de dano, por atingir a esfera psíquica do indivíduo e estar intimamente ligada à sua moral, não permite que se criem parâmetros concretos para a análise de sua extensão.
Por isso, a doutrina menciona que a indenização desta espécie de dano deve ser arbitrada de acordo com a possibilidade econômica do ofensor, as necessidades do ofendido, a potencialidade do dano e o grau de culpa ou dolo envolvido no ato lesivo.
Se assim o fez o julgador na origem, não há que se reduzir o quantum indenizatório fixado. (TJMS – APL 08012683720148120008, 3ª Câmara Cível, Julgado em 22/09/2015, Relator Des.
Marco André Nogueira Hanson).
De outro modo, acerca do quantum indenizatório do dano moral, levando-se em consideração a conduta do réu, o bem jurídico ofendido, a extensão do dano, as condições econômicas do ofensor e o potencial inibitório do valor a ser estabelecido – já que o valor deve servir também como o fator desestimulador para a reiteração de práticas ilícitas –, bem como atendendo aos critérios da razoabilidade e da proporcionalidade, a fim, também, de evitar o enriquecimento ilícito da vítima, arbitro a indenização em R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
Por fim, entendo que é cabível a compensação entre o valor da condenação e a quantia depositada pelo demandado na conta da autora.
Deve-se salientar que, de fato, a instituição financeira transferiu valores para conta bancária da autora, conforme extratos bancários acostados no ID 124422483, constando a disponibilização dos valores de R$ 16.684,43 (dezesseis mil, seiscentos e oitenta e quatro reais e quarenta e três centavos) em 26/04/21 e R$ 16.920,77 (dezesseis mil, novecentos e vinte reais e setenta e sete centavos) em 10/05/21, para conta da parte autora.
Com isso, visando-se a não consecução do enriquecimento sem causa, é necessário que haja a compensação de valores entre a condenação e a quantia de R$ 33.605,20 (trinta e três mil, seiscentos e cinco reais e vinte centavos), que foi transferida pela demandada para a conta bancária da promovente, devendo incidir correção monetária pelo índice INPC, desde a data do depósito na conta da parte autora.
III – DISPOSITIVO.
Ante o exposto, com supedâneo nas razões fático-jurídicas elencadas, julgo PROCEDENTE o pedido e, nos termos do art. 487, I, do CPC, EXTINGO o processo com resolução do mérito, para: 1) DECLARAR a nulidade dos contratos de empréstimo consignado nº 489861366 e 494782288 e a inexistência da dívida deles decorrentes; 2) CONDENAR a parte demandada ao pagamento de indenização por repetição do indébito no valor de R$ 55.440,00 (cinquenta e cinco mil, quatrocentos e quarenta reais), relativo ao dobro dos descontos indevidos, além do valor em dobro dos descontos porventura efetuados durante o trâmite da ação, devendo incidir correção monetária pelo índice INPC e juros de mora de 1% ao mês, ambos a contar da data de cada desconto indevido; e 3) CONDENAR o requerido ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) à parte autora, a título de danos morais, acrescido da correção monetária pelo INPC a partir da data do arbitramento e de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir do evento danoso (Súmula nº 54-STJ).
Outrossim, determino a compensação entre a quantia depositada pela instituição financeira na conta da parte autora e o valor da condenação, devendo incidir correção monetária pelo índice INPC, desde a data do depósito.
Condeno o réu no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação.
Havendo depósito voluntário, ouça-se a parte autora a respeito e efetue-se a liberação imediata da quantia incontroversa, vindo os autos conclusos em seguida.
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.
Cumpra-se.
Com o trânsito em julgado, arquivem-se os autos.
Apodi/RN, datado e assinado eletronicamente. (Assinado Digitalmente - Lei nº 11.419/2006) ANTONIO BORJA DE ALMEIDA JUNIOR Juiz de Direito
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
24/01/2025
Ultima Atualização
10/07/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Detalhes
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