TJRN - 0804335-33.2022.8.20.5108
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Cornelio Alves
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Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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01/08/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0804335-33.2022.8.20.5108 Polo ativo FRANCISCA ANTONIA DOS SANTOS Advogado(s): RAFAELA MAYARA CHAVES CARDOSO Polo passivo BANCO BRADESCO S/A Advogado(s): LARISSA SENTO SE ROSSI EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. 1) APELAÇÃO CÍVEL INTERPOSTA PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO E PREJUDICIAL DE DECADÊNCIA.
REJEITADAS.
MÉRITO: DESCONTO TARIFÁRIO INDEVIDO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR À HIPÓTESE VERTENTE.
AUSÊNCIA DE CONTRATAÇÃO.
VEDAÇÃO IMPOSTA PELO BACEN QUANTO A COBRANÇA DE SERVIÇOS ESSENCIAIS.
DISPONIBILIZAÇÃO DE SERVIÇOS ONEROSOS NÃO AVENÇADOS.
TARIFA BANCÁRIA "PACOTE SERVIÇOS PADRONIZADO PRIORITARIOS” COBRADA INDEVIDAMENTE.
APLICAÇÃO DO ART. 39, § ÚNICO DO CDC.
MÁ-FÉ.
REPETIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO.
PRECEDENTES.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO 2) APELO INTERPOSTO PELA AUTORA.
FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.
DANO EXTRAPATRIMONIAL.
DEVER DE INDENIZAR QUE SE IMPÕE.
PRECEDENTES DESTA CÂMARA CÍVEL.
REFORMA DO DECISUM.
CONHECIMENTO E PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO.
ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas.
Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, em conhecer dos apelos, e prover, em parte, apenas o recurso interposto pela autora, negando provimento ao apelo da instituição financeira, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.
RELATÓRIO Trata-se de apelações cíveis interpostas, respectivamente, pelo Banco Bradesco S.A. e por Francisca Antonia dos Santos em face de sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara da Comarca de Pau dos Ferros/RN que, nos autos deste processo, julgou procedentes, em parte, os pedidos autorais, nos seguintes termos (Id. 20115664): “[…] Ante o exposto, nos termos do art. 487, I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão deduzida na inicial, para o fim de: a) DECLARAR a nulidade das cobranças relativas à tarifa intitulada “CESTA B.
EXPRESSO1”; b) DETERMINAR a restituição da quantia de R$ 3.626,80 (três mil e seiscentos e vinte e seis reais e oitenta centavos), corrigida pelo IPCA desde a data da cobrança e acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, contados da citação.
Em consequência, CONFIRMO a DECISÃO LIMINAR, deferida no ID 90329387.
Ademais, ante a sucumbência recíproca, CONDENO as partes ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios sucumbenciais os quais, levando em consideração que se trata de demanda que dispensou instrução, fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.
Tendo em vista que o autor sucumbiu proporcionalmente na metade do pedido, deverá suportar o pagamento da proporção de 50% (cinquenta por cento) das custas e dos honorários advocatícios sucumbenciais, ficando os outros 50% (cinquenta por cento) restantes a cargo da parte demandada.
Com relação à parte autora, tendo em vista o deferimento da gratuidade da justiça, como consequência, a exigibilidade das custas e dos honorários ficará suspensa, na forma do art. 98, §1º, I e VI c/c §3º do CPC.
Dessa forma, o banco demandado deve efetuar o pagamento de 50% (cinquenta por cento) do valor total das custas e dos honorários advocatícios sucumbenciais. [...]” Irresignada com o resultado, a instituição financeira dele apelou, argumentando, em suas razões recursais: a) prejudicialmente, a prescrição de pretensão autoral e a fulminação do respectivo direito pela decadência; b) no mérito: b.1) que a utilização da conta corrente não se enquadra na conta isenta de tarifação e; b.2) a inexistência de ilegalidade ou ato ilícito ensejador do dever de indenizar, seja material ou moral, tendo agido em exercício legal de seu direito, tratando-se de tarifas legal e contratualmente previstas, anuídas pela autora.
Sob esses fundamentos, pugnou pela reforma do decisum para julgar improcedentes os pedidos iniciais (Id. 20115668).
Ato contínuo, contrapondo o referido édito, a autora apresentou apelo, insurgindo-se em face do capítulo sentencial relativo a reparação extrapatrimonial, justificando que, com a declaração de inexistência de relação contratual e, em consequência, com a impropriedade dos descontos tarifários, evidencia-se o dever de compensação pecuniária pelos danos morais sofridos com subtração patrimonial ilícita em benefício previdenciário. (Id. 20116172).
Contrarrazões apresentadas aos Ids. 20116194 e 20116195.
Desnecessidade de intervenção do Órgão Ministerial, nos termos do art. 127 da CF/88, dos arts. 176 e 178 do CPC, da Recomendação Conjunta nº 001/2021-PGJ/CGMP, das Recomendações nº 34/2016 e nº 57/2017, do Conselho Nacional do Ministério Público e da Recomendação nº 001/2021-CGMP. É o relatório.
VOTO Antes de adentrar o mérito, passo a analisar as prejudiciais suscitadas nas razões recursais da instituição financeira.
I – DA PREJUDICIAL DE PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA De início, impende ressaltar que a demanda foi ajuizada dentro do prazo prescricional decenal estabelecido no art. 205 do Código Civil, sendo descabida a tese de ocorrência do instituto da decadência na situação descrita nos autos, bem assim que o direito pleiteado tenha sido fulminado pela prescrição.
Impõe-se destacar que esta Corte de Justiça tem se posicionado no sentido de que, nas demandas em que se questiona a validade de contrato de empréstimo consignado e cartão de crédito, não há que se falar em decadência do direito vindicado, vez que se trata de prestação de serviço que se dá de forma continuada, renovando-se mês a mês a cada desconto efetuado no contracheque do consumidor, o que faculta ao tomador do serviço bancário a possibilidade de discutir a relação jurídica a qualquer tempo.
Destaquem-se os seguintes julgados: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL.
CONSUMIDOR.
PROCESSO CIVIL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS.
EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO.
ALEGAÇÃO AUTORAL DE QUE PRETENDIA ADERIR A EMPRÉSTIMO CONSIGNADO COMUM.
SENTENÇA QUE RECONHECEU A DECADÊNCIA DA PRETENSÃO AUTORAL, NOS TERMOS DO ART. 487, II, DO CPC.
RECURSO INTERPOSTO PELA AUTORA PRETENDENDO O AFASTAMENTO DO RECONHECIMENTO DA DECADÊNCIA E A PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS INICIAIS.
PRESTAÇÃO DE TRATO SUCESSIVO.
DECADÊNCIA AFASTADA.
SENTENÇA CASSADA.
INVIABILIDADE DE JULGAMENTO DE MÉRITO NESTA INSTÂNCIA RECURSAL.
PRECEDENTES.
PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO A REFORMATIO IN PEJUS.
RETORNO DOS AUTOS A ORIGEM.
RESGUARDO DA AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJRN – APELAÇÃO CÍVEL - 0845528-97.2018.8.20.5001 - Terceira Câmara Cível – Rel.
Des.
Vivaldo Pinheiro – Julg. 19/02/2020) MENTA: PROCESSUAL CIVIL.
CONSUMIDOR.
AÇÃO REVISIONAL.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.
SENTENÇA QUE DECRETOU A DECADÊNCIA DO DIREITO DE AÇÃO.
APELAÇÃO CÍVEL.
MATÉRIA DE NATUREZA CONTINUADA, PODENDO SER QUESTIONADA DURANTE TODA A VIGÊNCIA DO CONTRATO.
PREJUDICIAL DE MÉRITO AFASTADA.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO TÍPICO E DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO CONSIDERADO EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.
INEXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE ERRO OU FRAUDE NA CONTRATAÇÃO.
CRÉDITO DO EMPRÉSTIMO OBTIDO MEDIANTE SAQUE.
POSSIBILIDADE DE COBRANÇA.
APELO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. É consabido, que a matéria questionada envolve prestação de serviço de natureza continuada, a qual se prolonga no tempo, durante toda a vigência do contrato, o que faculta ao consumidor discuti-la a qualquer tempo. 2.
No caso específico dos autos, a proposta de Adesão à Consignação de Descontos para Pagamento contraído pela apelante perante o Banco apelado, bem como a Ficha Cadastral e Proposta de Adesão à Consignação de Descontos para Pagamento de Empréstimos e Cartão de Crédito BONSUCESSO VISA, demonstram haver previsão de utilização de cartão de crédito com o desconto em folha de valor correspondente ao mínimo da fatura mensal do cartão de crédito, caso em que ocorreria a incidência dos respectivos juros do rotativo sobre o remanescente, hipótese sustentada pelo Banco. 3.
Precedentes do TJRS (*00.***.*14-58 RS, Relator: Lúcia de Fátima Cerveira, j. 29/06/2011, Segunda Câmara Especial Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 08/07/2011); do TJMG (100240160524410011 MG 1.0024.01.605244-1/001(1), Relator: MARCELO RODRIGUES, j. 07/10/2009, publicado em 27/10/2009) e do TJRN (AC n° 2013.004213-2, Terceira Câmara Cível, Relator Des.
Amaury Moura Sobrinho, j. 23/05/2013; AC n° 2013.006584-8, Rel.
Des.
Amaury Moura Sobrinho, 3ª Câmara Cível, j. 27/06/2013; AC n° 2013.005381-2, Relª.
Desª.
Judite Nunes, 2ª Câmara Cível, j. 30/07/2013; AC nº 2012.020125-2, Rel.
Des.
Amílcar Maia, 1ª Câmara Cível, j. 06.06.2013; AC nº 2009.004552-0, Rel.
Des.
João Rebouças, 2ª Câmara Cível, j. 02.07.2013; e AC nº 2013.009457-1, Rel.
Des.
Saraiva Sobrinho, 3ª Câmara Cível, j. 05.07.2013; e AC nº 2018.004026-7, Rel.
Desembargador Ibanez Monteiro, 2ª Câmara Cível, j. 22/05/2018). 4.
Apelo conhecido e parcialmente provido. (TJRN - APELAÇÃO CÍVEL – 0829051-33.2017.8.20.5001 - Segunda Câmara Cível – Rel.
Des.
Virgílio Macêdo Jr – Julg. 06/02/2020) Igualmente não merece acolhimento a prejudicial de prescrição, arguida pela demandada, vez que, conforme alhures mencionado, a violação do direito do consumidor se dá mês a mês, de sorte que o termo inicial para a contagem da prescrição ocorre a partir do vencimento da última parcela e não do ato de celebração do negócio jurídico.
Oportuno trazer à colação o seguinte julgado do STJ, acerca da questão: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS.
PRESCRIÇÃO.TERMO INICIAL.
HARMONIA ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E A JURISPRUDÊNCIA DO STJ.
SÚMULA 83/STJ.
AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, em se tratando de pretensão de repetição de indébito decorrente de descontos indevidos, por falta de contratação de empréstimo com a instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo prescricional do art. 27 do CDC. 2.
O termo inicial do prazo prescricional da pretensão de repetição do indébito relativo a desconto de benefício previdenciário é a data do último desconto indevido.
Precedentes. 3.
O entendimento adotado pelo acórdão recorrido coincide com a jurisprudência assente desta Corte Superior, circunstância que atrai a incidência da Súmula 83/STJ. 4.
Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp n. 1.412.088/MS, rel.
Min.
RAUL ARAÚJO, Quarta Turma, j. em 27.8.2019).
Assim sendo, tendo em vista que não caducou o direito vindicado, tampouco foi alcançado pelo instituto da prescrição e, considerando que a demanda se encontra em condições de imediato julgamento, passo à análise do mérito.
II – DO MÉRITO Presentes os pressupostos de admissibilidade, intrínseco e extrínseco, conheço dos apelos e, dada a correlação entre os cernes recursais, passo a analisá-los de maneira concomitante.
Pois bem, cinge-se a discussão em aferir a (i)legalidade dos descontos tarifários realizados em conta de titularidade da parte autora, cuja contratação é por ela negada, e suas repercussões jurídicas, bem assim, se a conduta objeto da irresignação ensejaria compensação moral por violação a direitos personalíssimos.
De início, tenho que a relação jurídico-material estabelecida entre as partes litigantes é dotada de caráter de consumo, fazendo subsumir a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, consoante traduz o artigo 3º, § 2º, do referido Código.
Em se tratando de relação consumerista, a responsabilização do fornecedor independe da investigação da sua conduta, elemento anímico dos agentes, bastando para sua configuração apenas a existência de danos relacionados a defeitos pela falha na prestação dos serviços, nos moldes do art. 14, § 1º, da Lei nº 8.078/90 – Código de Defesa do Consumidor: Art. 14.
O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. § 1º O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I – o modo de seu fornecimento; II – o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam; III – a época em que foi fornecido.
Dispõe ainda, o §3° do art. 14 do CDC, que o fornecedor somente é isento de indenizar eventuais danos causados em caso de excludente de ilicitude, demonstrando que não houve defeito na prestação do serviço, ou que o consumidor tenha sido único responsável pelo ocorrido, ou, ainda, que o prejuízo tenha decorrido exclusivamente de ato de terceiro, sem que aquele tenha concorrido para o evento: § 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I – que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.” Logo, caberia à instituição financeira, a quem lhe foi atribuído o ônus quanto à demonstração de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito autoral, dos termos do art. 373, inciso II do CPC, além da inversão do dever probatório inserte no art. 6º, VIII, da Lei nº 8.078/90.
Pois bem, voltando os olhos ao caso, tenho que a Resolução nº 3.919/2010 do BACEN, em seu artigo 1º, exige a previsão contratual ou prévia autorização/solicitação do cliente para que haja a cobrança de qualquer tarifa pela prestação de serviços por parte das instituições financeiras, em harmonia com os preceitos consumeristas, in verbis: Art. 1º A cobrança de remuneração pela prestação de serviços por parte das instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil, conceituada como tarifa para fins desta resolução, deve estar prevista no contrato firmado entre a instituição e o cliente ou ter sido o respectivo serviço previamente autorizado ou solicitado pelo cliente ou pelo usuário.
Ainda acerca da temática, a Resolução n. 4.196/2013, também editada pelo Banco Central, dispõe: "Art. 1º As instituições financeiras devem esclarecer ao cliente pessoa natural, por ocasião da contratação de serviços relacionados às suas contas de depósitos, sobre a faculdade de optar, sem a necessidade de adesão ou contratação específica de pacote de serviço, pela utilização de serviços e pagamento de tarifas individualizados, além daqueles serviços gratuitos previstos na regulamentação vigente.
Parágrafo único.
A opção pela utilização de serviços e tarifas individualizados ou por pacotes oferecidos pela instituição deve constar, de forma destacada, do contrato de abertura de conta de depósitos." Logo, como corolário ao princípio da informação, este que norteia as relações de consumo, compete às instituições financeiras esclarecerem sobre a contratação realizada, de forma detalhada e compreensível, destacando-se, em avença, a opção de uso dos serviços pagos e quais serviços serão disponibilizados.
Entretanto, carecem, os autos, de prova quanto à ciência da parte autora na adesão do serviço aqui questionado, ausente o respectivo instrumento contratual, ônus este que competia ao banco, nos termos do art. 6º, inciso VII do Código de Defesa do Consumidor.
Assim, à luz do que preconiza o Banco Central e tendo por fundamento os princípios da transparência e informação, há que se concluir que a cobrança desarrazoada de serviços bancários, com o consequente desconto automático, fere o princípio da boa-fé contratual, além de consistir em vedação legal.
Lado outro, o fato de existir na conta da autora eventual movimentação financeira que exceda os limites disponibilizados como serviços essenciais, por si só, não altera a natureza da conta bancária aberta para recebimento de benefício da Previdência Social, posto que patente o vício de informação.
Colaciono precedente desta Câmara Cível: EMENTA: DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO INDENIZATÓRIA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS.
DESCONTO DE TARIFA BANCÁRIA.
AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA CONTRATAÇÃO.
DESCUMPRIMENTO.
DESCONTOS INDEVIDOS.
UTILIZAÇÃO DE OUTROS SERVIÇOS BANCÁRIOS QUE NÃO ELIDE A OBRIGAÇÃO DE INFORMAR SOBRE A COBRANÇA DAS TARIFAS DELA CORRENTES.
FALHA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO, NOS TERMOS DO ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC.
DANO MORAL CONFIGURADO.
FIXAÇÃO DO VALOR INDENIZATÓRIO EM OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE.
REFORMA DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE.
CONHECIMENTO E PARCIAL PROVIMENTO DO APELO. (APELAÇÃO CÍVEL, 0800391-73.2021.8.20.5135, Des.
Claudio Santos, Primeira Câmara Cível, ASSINADO em 29/11/2021) – Destaque acrescido.
A disponibilização unilateral de serviços tarifados – não contratados – insere-se, pois, no conceito de amostra grátis, nos termos do art. 39, parágrafo único do CDC[1], não podendo o consumidor arcar com os custos daquilo que sequer foi consentido.
Friso ainda que, o Código de Defesa do Consumidor, elencou práticas consideradas abusivas vedadas ao fornecedor, dentre as quais, no art. 39, III, tem-se a prática de “enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço”.
Assim, caracterizado o ilícito danoso, patente o dever de indenizar, cuja responsabilidade independe de elemento subjetivo de culpa ou dolo, nos termos do art. 14 do CDC.
Este é, inclusive, o entendimento desta Câmara Cível, que em outras oportunidades já se debruçou sobre o tema: EMENTA: CIVIL, PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR.
APELAÇÕES CÍVEIS.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS.
SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DO PEDIDO AUTORAL.
COBRANÇA INDEVIDA.
NÃO APRESENTAÇÃO DE CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES.
DESCONTO EM PROVENTOS DE APOSENTADORIA SOB A FORMA DE PACOTE DE SERVIÇOS.
VEDAÇÃO IMPOSTA PELO BACEN.
DEVER DE INFORMAÇÃO.
DESCUMPRIMENTO.
RESTITUIÇÃO EM DOBRO DOS VALORES.
DANO MORAL CONFIGURADO.
QUANTUM INDENIZATÓRIO MAJORADO.
NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE.
REFORMA EM PARTE DO VEREDICTO SINGULAR.
DESPROVIMENTO DO APELO INTENTADO PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA E PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO INTERPOSTO PELA AUTORA. (APELAÇÃO CÍVEL, 0800991-19.2021.8.20.5160, Des.
Cornélio Alves, Primeira Câmara Cível, ASSINADO em 17/06/2022) EMENTA: PROCESSO CIVIL.
AGRAVO DE INSTRUMENTO.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS.
COBRANÇA NÃO AUTORIZADA DE TARIFA BANCÁRIA “PACOTE SERVIÇOS PADRONIZADO PRIORITÁRIOS II”.
DESCONTOS INDEVIDOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
INTELIGÊNCIA DO ART. 1ª, DA RESOLUÇÃO Nº 3.919/2010, DO BACEN.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (AGRAVO DE INSTRUMENTO, 0800540-17.2022.8.20.0000, Des.
Claudio Santos, Primeira Câmara Cível, ASSINADO em 10/06/2022) Reconhecido o dever de indenizar, resta-nos ponderar o quantum indenizatório devido.
Pois bem, não há no ordenamento jurídico pátrio a definição de regras concretas acerca de sua estipulação do dano moral, porém, tanto a doutrina quanto a jurisprudência são unânimes em afirmar que o julgador deve se utilizar da razoabilidade como parâmetro para atender ao duplo aspecto, quais sejam: a compensação e a inibição.
Assim, o montante arbitrado não pode gerar enriquecimento ilícito, mas também não pode ser ínfimo, a ponto de não atender ao seu caráter preventivo e repressor.
Por oportuno, destaque-se que o dano moral não se avalia apenas mediante o cálculo matemático/econômico das repercussões patrimoniais negativas da violação, porém necessita ser estipulado levando-se em consideração a capacidade econômica das partes, função pedagógica da condenação, extensão e gravidade da ofensa, além do que deve figurar em patamar suficiente para desestimular a ocorrência de novos eventos da mesma natureza.
Assim, em atenção aos parâmetros acima delineados, bem assim, em consonância com o quantum arbitrado por esta Câmara em situações semelhantes, tenho por razoável a aplicação de R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de indenização por danos morais, merecendo, o decisum, ser reformado quanto ao referido capítulo: EMENTA: DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO INDENIZATÓRIA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS.
DESCONTO DE “TÍTULO DE CAPITALIZAÇÃO”.
AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA CONTRATAÇÃO DA TARIFA BANCÁRIA.
DESCUMPRIMENTO.
DESCONTOS INDEVIDOS.
CONTA UTILIZADA PARA SAQUE DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
COBRANÇA IRREGULAR.
DANO MORAL CARACTERIZADO.
PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE.
LESÃO PRESUMIDA.
DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO (DANO IN RE IPSA).
DANO MORAL QUE SE DEMONSTRA CABÍVEL.
NECESSIDADE DE FIXAÇÃO DA INDENIZAÇÃO SEGUINDO OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE.
PRECEDENTES DESTA CORTE DE JUSTIÇA.
INVERSÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL.
CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO APELO. (APELAÇÃO CÍVEL, 0801260-58.2021.8.20.5160, Des.
Claudio Santos, Primeira Câmara Cível, ASSINADO em 17/10/2022).
Sobre tal condenação, deverão incidir correção monetária (pelo INPC), a partir do julgamento deste recurso (Súmula 362 do STJ), e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, incidentes desde o evento danoso (desde o primeiro desconto indevido – Súmula 54 do STJ), a serem devidamente apurados na fase de cumprimento de sentença.
Por fim, evidenciado o dano pela falha na prestação, igualmente caracterizado o dever de reparação material.
Quanto a este tópico, convém assinalar que o parágrafo único do art. 42, do Código de Defesa do Consumidor, prevê a possibilidade de o consumidor receber, em dobro, as quantias indevidamente cobradas: “O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável".
Sobreleva ressaltar, ainda, que a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça fixou a tese de que "a repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo" (EREsp n. 1.413.542/RS, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, relator para acórdão Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, julgado em 21/10/2020, DJe de 30/3/2021.).
Assim, na linha do que restou assentado pela Corte Superior, a repetição do indébito em dobro prescinde da comprovação do elemento volitivo (má-fé), bastando, pois, que a conduta seja contrária a boa-fé objetiva.
Nada obstante, a tese fixada no citado precedente teve seus efeitos modulados, passando a incidir somente nas cobranças realizadas após a data da publicação do acórdão, que se deu em 30/03/2021.
Confira-se: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR.
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA.
HERMENÊUTICA DAS NORMAS DE PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR.
REPETIÇÃO DE INDÉBITO.
DEVOLUÇÃO EM DOBRO.
PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC.
REQUISITO SUBJETIVO.
DOLO/MÁ-FÉ OU CULPA.
IRRELEVÂNCIA.
PREVALÊNCIA DO CRITÉRIO DA BOA-FÉ OBJETIVA.
MODULAÇÃO DE EFEITOS PARCIALMENTE APLICADA.
ART. 927, § 3º, DO CPC/2015.
IDENTIFICAÇÃO DA CONTROVÉRSIA [...] MODULAÇÃO DOS EFEITOS 29.
Impõe-se MODULAR OS EFEITOS da presente decisão para que o entendimento aqui fixado - quanto a indébitos não decorrentes de prestação de serviço público - se aplique somente a cobranças realizadas após a data da publicação do presente acórdão. [...]” (EREsp n. 1.413.542/RS, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, relator para acórdão Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, julgado em 21/10/2020, DJe de 30/3/2021.) Nessa tessitura, forçoso concluir que, para as cobranças indevidas anteriores à publicação do acórdão do Superior Tribunal de Justiça, tal como ocorre na hipótese em apreço, subsiste a necessidade da efetiva violação da boa-fé objetiva.
Casuisticamente, tenho por nítida a presença de má-fé na conduta da instituição financeira, esta evidenciada pela inserção do consumidor em pacote de conta bancária oneroso, mesmo havendo disposição normativa vedando a respectiva inclusão quando o intuito do cliente cinge-se exclusivamente a percepção de seu benefício previdenciário.
Ressalto ainda a inexistência de engano justificável, máxime por não haver sequer prova sobre a celebração do negócio jurídico impugnado.
Assim, feita essas considerações, tem-se que a repetição do indébito deverá ser realizada em dobro, nos termos decido pelo Juízo a quo.
Pelo exposto, conheço dos apelos, dando provimento, em parte, apenas ao recurso interposto pela parte autora para, reformando a decisão a quo, condenar a instituição financeira no pagamento de R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de indenização extrapatrimonial, mantendo-se a sentença incólume nos demais termos.
Nego provimento a apelação cível intentada pela instituição financeira.
Em virtude do resultado acima, majoro em 5% os honorários advocatícios sobre o percentual fixado pelo Juízo de primeiro grau (art. 85, § 11º, do CPC). É como voto.
Natal/RN, data do registro no sistema.
Desembargador Cornélio Alves Relator [1] Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: [...] Parágrafo único.
Os serviços prestados e os produtos remetidos ou entregues ao consumidor, na hipótese prevista no inciso III, equiparam-se às amostras grátis, inexistindo obrigação de pagamento.
Natal/RN, 24 de Julho de 2023. -
04/07/2023 00:00
Intimação
Poder Judiciário do Rio Grande do Norte Primeira Câmara Cível Por ordem do Relator/Revisor, este processo, de número 0804335-33.2022.8.20.5108, foi pautado para a Sessão VIRTUAL (votação exclusivamente pelo PJe) do dia 24-07-2023 às 08:00, a ser realizada no Primeira Câmara Cível (NÃO VIDEOCONFERÊNCIA).
Caso o processo elencado para a presente pauta não seja julgado na data aprazada acima, fica automaticamente reaprazado para a sessão ulterior.
No caso de se tratar de sessão por videoconferência, verificar o link de ingresso no endereço http://plenariovirtual.tjrn.jus.br/ e consultar o respectivo órgão julgador colegiado.
Natal, 3 de julho de 2023. -
23/06/2023 13:14
Recebidos os autos
-
23/06/2023 13:14
Conclusos para despacho
-
23/06/2023 13:14
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
23/06/2023
Ultima Atualização
31/07/2023
Valor da Causa
R$ 0,00
Detalhes
Documentos
ACÓRDÃO • Arquivo
ATO ORDINATÓRIO • Arquivo
ATO ORDINATÓRIO • Arquivo
SENTENÇA • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
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