TJRN - 0800128-55.2019.8.20.5153
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Berenice Capuxu
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Partes
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Polo Passivo
Partes
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Partes
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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30/07/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE SEGUNDA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0800128-55.2019.8.20.5153 Polo ativo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RN Advogado(s): Polo passivo MARIA ALDA ROMAO SOARES e outros Advogado(s): MANOEL D AGONIA FERNANDES BRAGA, GRASIELE MIRANDA SOUTO registrado(a) civilmente como GRASIELE MIRANDA SOUTO, PAULO SERGIO JUVENAL JUNIOR EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESPONSABILIZAÇÃO PELA PRÁTICA DE ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA E RESSARCIMENTO AO ERÁRIO.
CONTRATAÇÃO DIRETA SEM LICITAÇÃO.
SUBCONTRATAÇÃO INTEGRAL DO OBJETO CONTRATUAL.
AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO DE DANO EFETIVO AO ERÁRIO E DE VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.
SENTENÇA MANTIDA.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
I.
CASO EM EXAME 1.
Apelação cível interposta pelo Ministério Público contra sentença que julgou improcedente ação de improbidade administrativa, envolvendo contratação direta, sem licitação, de serviços de locação de veículos destinados ao transporte de pacientes na área da saúde. 2.
A controvérsia gira em torno da subcontratação integral do objeto contratual e da suposta omissão no dever de fiscalização por parte da secretária municipal de saúde, com alegação de enriquecimento ilícito e violação aos princípios administrativos, nos termos dos artigos 10, inciso II, e 11 da Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992).
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 3.
A questão em discussão consiste em verificar: (i) se a subcontratação integral do objeto contratual configura ato de improbidade administrativa, considerando a ausência de comprovação de dolo específico e de dano efetivo ao erário; e (ii) se houve violação relevante aos princípios da Administração Pública que justifique a aplicação das sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 4.
A caracterização de ato de improbidade administrativa exige, conforme a Lei nº 14.230/2021, a comprovação de dolo específico e de dano patrimonial efetivo, não sendo suficiente a mera irregularidade formal. 5.
No caso concreto, embora tenha sido comprovada a subcontratação integral do objeto contratual, não há elementos que indiquem dolo específico por parte dos demandados ou prejuízo efetivo ao erário, como sobrepreço ou superfaturamento. 6.
A ausência de demonstração de direcionamento na contratação ou de vantagem indevida para os envolvidos reforça a inexistência de ato de improbidade administrativa, tanto sob o prisma do art. 10 quanto do art. 11 da Lei nº 8.429/1992. 7.
A jurisprudência consolidada pelo STF no Tema nº 1199 exige a comprovação de dolo para a tipificação de atos de improbidade administrativa, sendo aplicável ao caso concreto.
IV.
DISPOSITIVO 7.
Recurso desprovido.
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, §§ 4º e 5º; Lei nº 8.429/1992, art. 10, inc.
II e § 1º; Lei nº 14.230/2021; Lei nº 8.666/1993, art. 72.
Jurisprudência relevante citada: STF, Tema nº 1199, RE nº 656.558/SP, Rel.
Min.
Dias Toffoli, Tribunal Pleno, j. 28/10/2024; TJRN, Apelação Cível nº 0809893-94.2019.8.20.5106, Rel.
Des.
João Afonso Morais Pordeus, Primeira Câmara Cível, j. 11.06.2025, TJRN, Apelação Cível nº 0100512-73.2017.8.20.0127, Rel.
Des.
Eduardo Bezerra de Medeiros Pinheiro, Terceira Câmara Cível, j. 11.11.2024 e TJRN, Apelação Cível nº 0100446-93.2013.8.20.0140, Rel.
Des.
Erika de Paiva Duarte Tinoco, Terceira Câmara Cível, j. 03.04.2025.
ACÓRDÃO Acordam os Desembargadores da 2ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma e à unanimidade de votos, em dissonância com o parecer da 7ª Procuradoria de Justiça, conhecer e negar provimento à Apelação Cível, nos termos do voto da Relatora.
RELATÓRIO Apelação Cível interposta pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte (Id. 29385532) contra a sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de São José do Campestre/RN (Id. 29385525), que, nos autos da Ação Civil Pública de Responsabilização pela Prática de Atos de Improbidade Administrativa e Ressarcimento ao Erário n° 0800128-55.2019.8.20.5153, movida em desfavor de Maria Alda Romão Soares (ex-Prefeita de São José de Campestre), Maria Aurieneide Romão Arboés, (ex-Secretária de Saúde de São José de Campestre), Ramon Pereira de Pontes Nelo, julgou improcedentes os pedidos autorais, nos seguintes termos: “(...) Assim sendo, considerando a análise do conjunto fático-probatório presente nos autos, entende-se pela inexistência de fundamentação legal vigente que autorize a condenação dos requeridos pela irregularidade cometida enquanto ato de improbidade administrativa, motivo pelo qual a improcedência do pedido é medida que se impõe. (...) Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE a pretensão formulada na inicial.
Sem condenação das partes em custas e honorários advocatícios, com base no princípio da simetria, nos termos da pacífica jurisprudência do E.
STJ (Precedentes: EDcl no REsp 1320701e AgInt no AREsp 996.192) Sentença não sujeita ao reexame necessário, conforme alteração trazida pelo art. 17, § 19, IV, da Lei 8.429/92, com a redação dada pela Lei 14.230/2021. (...)” Em suas razões (Id. 29385532), aduz que se trata de Ação Civil Pública por improbidade administrativa e ressarcimento ao erário, proposta em face de Maria Alda Romão Soares, ex-prefeita de São José do Campestre/RN, Maria Aurieneide Romão Arboés, ex-secretária municipal de Saúde, e Ramon Pereira de Pontes Nelo, contratado, em razão da contratação direta, sem licitação, de Ramon Pereira para a locação de veículos destinados ao transporte de pacientes na área da saúde, tendo ocorrido, posteriormente, a subcontratação integral do serviço a terceiros.
Relata que a sentença recorrida absolveu todos os réus, fundamentando-se na inexistência de vedação expressa à subcontratação no contrato firmado, bem como na ausência de comprovação de dano ao erário, considerando que os serviços teriam sido efetivamente prestados, sem indícios de sobrepreço ou superfaturamento.
Além disso, baseou-se na reforma introduzida pela Lei nº 14.230/2021 à Lei de Improbidade Administrativa, a qual passou a exigir a demonstração de dano efetivo, não mais presumido por meras irregularidades formais, e restringiu as hipóteses de improbidade administrativa às condutas específicas descritas no rol taxativo do novo artigo 11 da LIA.
Inconformado, o Ministério Público busca a reforma da sentença, com a condenação de Maria Aurieneide e Ramon Pereira.
Sustenta, inicialmente, que a subcontratação integral do objeto contratual caracteriza ilegalidade, pois a Lei nº 8.666/93 somente admite subcontratação parcial e desde que expressamente autorizada, o que não ocorreu no caso concreto.
Alega que Ramon Pereira não possuía veículos nem estrutura operacional para executar o contrato, atuando apenas como intermediário, repassando integralmente a execução do serviço a Genilson Rodrigues, enquanto Maria Aurieneide teria se omitido no dever de fiscalizar a execução contratual.
Aponta, ainda, a ocorrência de dano ao erário, destacando o pagamento antecipado do valor total do contrato, no montante de R$ 7.315,00, efetuado apenas seis dias após o início da vigência contratual, embora o contrato estivesse previsto para durar até 31 de março de 2017, o que, segundo o recorrente, evidencia a possibilidade de que as viagens contratadas não tenham sido efetivamente realizadas.
Aduz, também, que houve significativa diferença entre o valor contratado e os valores pagos ao subcontratado, que variaram entre R$ 80,00 e R$ 180,00 por viagem, configurando sobrepreço indireto e enriquecimento ilícito de Ramon Pereira, mencionando jurisprudência do Tribunal de Contas da União, segundo a qual a subcontratação integral gera presunção de dano ao erário pela diferença entre o valor contratado e o efetivamente repassado ao executor do serviço.
Por fim, defende o enquadramento da conduta no artigo 10, inciso II, da Lei de Improbidade Administrativa, por entender que houve ato lesivo ao erário, imputando a Maria Aurieneide omissão no dever de fiscalização e a Ramon Pereira a prática de fraude ao procedimento contratual e enriquecimento ilícito, na qualidade de intermediário desprovido de capacidade operacional.
Requer, ao final, o provimento do recurso, para reformar a sentença e condenar Maria Aurieneide e Ramon Pereira pela prática de atos de improbidade administrativa, com a aplicação das sanções legais cabíveis, incluindo ressarcimento ao erário, multa civil e suspensão dos direitos políticos.
Isento de preparo, nos termos da lei.
Nas contrarrazões (Id. 29385537), os apelados refutam os argumentos recursais e pugnam pelo desprovimento do recurso.
O Ministério Público, por intermédio de sua 7ª Procuradora de Justiça, Iadya Gama Maio, emitiu parecer pelo conhecimento e provimento do recurso (Id. 30760840). É o relatório.
VOTO Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
O cerne da controvérsia consiste na análise acerca da configuração, ou não, de ato de improbidade administrativa na contratação direta, sem licitação, de Ramon Pereira de Pontes Nelo para a prestação de serviços de locação de veículos destinados ao transporte de pacientes na área da saúde, tendo em vista que a integralidade da execução contratual foi repassada a terceiro mediante subcontratação, bem como na verificação da ocorrência de eventual dano ao erário e da responsabilidade de Maria Aurieneide Romão Arboés pela suposta omissão no dever de fiscalização do contrato, fatos que, segundo o Ministério Público, caracterizariam enriquecimento ilícito e violação aos princípios administrativos, passíveis de enquadramento no artigo 10, inciso II, da Lei de Improbidade Administrativa.
De início, impende destacar que a Constituição da República, em seu art. 37, §§ 4º e 5º, consagra o regime jurídico das sanções aplicáveis aos atos de improbidade administrativa, prevendo, dentre elas, o dever de ressarcimento ao erário, tudo com o escopo de resguardar a moralidade administrativa e a probidade no manejo da coisa pública: “Art. 37.
A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: ... §4º – Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. §5º – A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento.” Por sua vez, a Lei n° 8.429/92 (Lei da Improbidade Administrativa - LIA), recentemente alterada pela Lei n° 14.230, de 25 de outubro de 2021, tipifica as condutas que importam enriquecimento ilícito (art. 9º), que causam prejuízo ao erário (art. 10), e, ainda, que violem os princípios da Administração Pública (art. 11), bem como regulamenta o dispositivo constitucional acima retratado instituindo as sanções cabíveis de acordo com a conduta praticada.
Para tanto, revela-se indispensável, para a caracterização de improbidade, que a conduta do agente seja dolosa, em todos os casos, de acordo com o que dispõe a nova Lei em vigor.
No caso concreto, a narrativa feita pelo Ministério Público indica suposta subsunção dos fatos ao prescrito no caput do artigo 10 e inciso II e 11 da LIA, cuja redação transcrevo: “Art. 10.
Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: II - permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie; (...) § 1º Nos casos em que a inobservância de formalidades legais ou regulamentares não implicar perda patrimonial efetiva, não ocorrerá imposição de ressarcimento, vedado o enriquecimento sem causa das entidades referidas no art. 1º desta Lei. “Art. 11.
Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: I - (revogado); II - (revogado); III - revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que deva permanecer em segredo, propiciando beneficiamento por informação privilegiada ou colocando em risco a segurança da sociedade e do Estado; IV - negar publicidade aos atos oficiais, exceto em razão de sua imprescindibilidade para a segurança da sociedade e do Estado ou de outras hipóteses instituídas em lei; V - frustrar, em ofensa à imparcialidade, o caráter concorrencial de concurso público, de chamamento ou de procedimento licitatório, com vistas à obtenção de benefício próprio, direto ou indireto, ou de terceiros; VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo, desde que disponha das condições para isso, com vistas a ocultar irregularidades; ...................................................................................................
IX - (revogado); X - (revogado); XI - nomear cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas; XII - praticar, no âmbito da administração pública e com recursos do erário, ato de publicidade que contrarie o disposto no § 1º do art. 37 da Constituição Federal, de forma a promover inequívoco enaltecimento do agente público e personalização de atos, de programas, de obras, de serviços ou de campanhas dos órgãos públicos. (...)” A análise do caso deve ser conjugada, ainda, com a tese fixada pelo STF, no Tema n° 1199, que dispõe o seguinte: “Tese: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.” Assim, repiso, por oportuno, que a nova Lei nº 14.230/2021 aplica-se ao presente caso, mesmo em relação a fatos praticados sob a vigência do texto anterior, uma vez que não houve condenação transitada em julgado, em conformidade com a orientação fixada pelo Supremo Tribunal Federal no Tema n° 1199, cujo item 3 estabelece que “a nova Lei nº 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior”.
Compulsando os autos, observo que foi objeto da dispensa de licitação (Id. 41683504, p. 15) a locação de veículos destinada a suprir a necessidade da Secretaria Municipal de Saúde, para transporte de pacientes às cidades vizinhas, visando a realização de atendimentos médicos específicos.
Maria Aurieneide, na qualidade de secretária e ordenadora de despesas, foi a responsável por autorizar a referida contratação (Id. 41683504, p. 36-80).
Além disso, constata-se que o contrato, datado de 14 de março de 2017, no valor de R$ 7.315,00, em sua cláusula 3.4, estabeleceu que caberia à contratada: “CLÁUSULA TERCEIRA - DOS ENCARGOS, OBRIGAÇÕES E RESPONSABILIDADES DA CONTRATADA: (...) 3.4 Assumir integralmente a responsabilidade por todo o ônus decorrente da execução deste contrato, especialmente com relação aos encargos trabalhistas e previdenciários do pessoal utilizado para a consecução dos serviços.” Da análise do conjunto probatório, verifica-se que foram observadas as formalidades legais relativas ao procedimento de dispensa de licitação, inclusive com o recebimento de propostas de outros interessados além do réu Ramon Pereira (Id. 41683504, p. 22).
Por outro lado, a exordial sustenta a ocorrência de subcontratação irregular do objeto contratual, atribuindo às requeridas Maria Alda e Maria Aurieneide a omissão no dever de fiscalizar a execução do ajuste.
No que se refere à execução das viagens, tal fato restou incontroverso, uma vez que o demandado Ramon Pereira, em depoimento colhido pelo Ministério Público (Id. 41683504, p. 69), admitiu ter transferido a realização dos serviços ao Sr.
Genilson Rodrigues, o qual, em seu próprio depoimento perante o Parquet, confirmou tais informações (Id. 41683504, p. 71).
Assim, em que pese a comprovação da subcontratação integral do objeto contratual, fato incontroverso nos autos, não há elementos que permitam afirmar ter ocorrido dolo específico dos demandados com o intuito de lesar o erário ou obter vantagem ilícita, requisito indispensável para a configuração do ato de improbidade administrativa após as alterações introduzidas pela Lei nº 14.230/2021.
Ressalte-se que, conforme disposto no art. 10, caput, da LIA, exige-se, para a configuração do ato ímprobo que cause lesão ao erário, a prática de ação ou omissão dolosa que resulte, efetiva e comprovadamente, em perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação do patrimônio público, não sendo suficiente, para tanto, a mera irregularidade formal.
Sobre esse ponto, cumpre destacar a redação do § 1º do art. 10 da LIA, introduzido pela Lei nº 14.230/2021, segundo o qual: “Art. 10. (...) § 1º Nos casos em que a inobservância de formalidades legais ou regulamentares não implicar perda patrimonial efetiva, não ocorrerá imposição de ressarcimento, vedado o enriquecimento sem causa das entidades referidas no art. 1º desta Lei.” Tal disposição deixa claro que a mera inobservância de formalidades legais ou regulamentares, por si só, não é suficiente para caracterizar o ato de improbidade administrativa, salvo se resultar em efetiva perda patrimonial, o que não se comprovou nos autos.
No presente caso, embora o Ministério Público tenha sustentado que a subcontratação integral seria vedada pela Lei nº 8.666/93 e pudesse, em tese, ensejar dano ao erário, não há nos autos qualquer comprovação concreta de que o valor pago à contratada tenha causado prejuízo efetivo à Administração Pública.
Não foram produzidos documentos ou perícias capazes de demonstrar sobrepreço, superfaturamento ou diferença significativa entre o valor contratado e aquele praticado no mercado pelos serviços efetivamente prestados.
Assim, embora o contrato firmado expressamente vedasse a subcontratação integral do objeto, impondo ao contratado a responsabilidade exclusiva pela execução dos serviços, e o artigo 72 da Lei nº 8.666/93 igualmente proibisse a subcontratação total, permitindo apenas a subcontratação parcial, desde que expressamente autorizada pela Administração, tendo tal previsão legal como objetivo assegurar que o contratado mantenha vínculo direto e responsabilidade pela execução do contrato, garantindo à Administração Pública o controle efetivo sobre a prestação do serviço e sobre quem o executa, não se verifica nos autos qualquer comprovação de que a subcontratação integral, realizada em desconformidade com o contrato e a legislação, tenha ocasionado dano efetivo ao erário.
Portanto, na ausência de demonstração concreta de prejuízo, como sobrepreço, superfaturamento ou comprometimento da execução do serviço, não é possível imputar ato de improbidade administrativa com base exclusiva na violação da vedação contratual ou legal, nos termos pretendidos.
No tocante à suposta violação aos princípios da Administração Pública, prevista no art. 11 da Lei nº 8.429/1992, entendo não se encontrarem presentes os requisitos legais para configuração do ato de improbidade.
Embora tenha havido infração à vedação legal e contratual quanto à subcontratação integral do objeto, a atual redação do art. 11 da LIA exige, para configuração do ato ímprobo, a demonstração de conduta dolosa com o propósito específico de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outrem (§1º), além de lesividade relevante ao bem jurídico tutelado (§4º).
No presente caso, não há nos autos qualquer elemento concreto que indique ter sido a contratação direcionada, tampouco que a demandada Maria Aurieneide Romão Arboés tenha agido com dolo específico de favorecer terceiros ou auferir vantagem indevida.
A irregularidade verificada restringe-se ao âmbito administrativo, sem comprovação de dano efetivo ao erário ou violação relevante aos princípios da administração que justifique a imposição das sanções da LIA.
Assim, concluo pela inexistência de ato de improbidade administrativa também sob o prisma do art. 11 da LIA, devendo ser mantida a sentença de improcedência.
A corroborar: “EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
CONVERSÃO DE AÇÃO DE IMPROBIDADE EM AÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO.
AUSÊNCIA DE INDÍCIOS DE DANO AO ERÁRIO.
RECURSO DESPROVIDO.
I.
CASO EM EXAME 1.
Apelação cível interposta pelo Ministério Público contra sentença que julgou improcedente Ação de Improbidade Administrativa e indeferiu sua conversão em ação de ressarcimento ao erário, nos termos do art. 17, §16, da Lei nº 8.429/1992, com redação dada pela Lei nº 14.230/2021. 2.
A demanda originária questiona a contratação de assessoria jurídica por inexigibilidade de licitação, alegando diferença entre os valores praticados em contratações anteriores e os valores pagos na contratação impugnada.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 3.
A questão em discussão consiste em verificar: (i) se há indícios concretos de dano ao erário que justifiquem a conversão da ação de improbidade administrativa em ação de ressarcimento ao erário; e (ii) se a contratação direta de serviços advocatícios pela Administração Pública, nos moldes do art. 25, II, da Lei nº 8.666/1993, foi realizada de forma regular e proporcional.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 4.
A conversão da ação de improbidade administrativa em ação de ressarcimento ao erário, nos termos do art. 17, §16, da Lei nº 8.429/1992, exige a demonstração de ilegalidades ou irregularidades administrativas que tenham causado prejuízo ao erário.
No caso concreto, não há elementos que indiquem a ocorrência de dano ao erário. 5.
A comparação entre os valores praticados na contratação impugnada e os valores de contratações posteriores, de profissionais distintos, não é suficiente para comprovar superfaturamento ou prejuízo ao erário, especialmente considerando a especificidade dos serviços prestados e a discricionariedade da Administração Pública. 6.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça exige a demonstração de dolo e de dano ao erário para a configuração de ato de improbidade administrativa, não sendo possível presumir prejuízo com base em irregularidades formais ou diferenças de valores. 7.
A sentença recorrida está em consonância com a legislação e jurisprudência aplicáveis, não havendo elementos que justifiquem sua reforma.
IV.
DISPOSITIVO E TESE 8.
Recurso desprovido.
Tese de julgamento: (i) A conversão de ação de improbidade administrativa em ação de ressarcimento ao erário, nos termos do art. 17, §16, da Lei nº 8.429/1992, exige a demonstração de dano ao erário, não sendo suficiente a mera alegação de diferença de valores entre contratações. (ii) A contratação direta de serviços advocatícios pela Administração Pública, por inexigibilidade de licitação, é válida desde que observados os critérios de notória especialização, natureza singular do serviço, adequação da prestação do serviço pelos integrantes do Poder Público e cobrança de preço compatível com os padrões do mercado.
Dispositivos relevantes citados: Lei nº 8.429/1992, art. 17, §16; Lei nº 8.666/1993, art. 25, II.
Jurisprudência relevante citada: STF, RE nº 656.558/SP, Rel.
Min.
Dias Toffoli, Tribunal Pleno, j. 28/10/2024; STJ, AgInt no AREsp nº 1.364.829/RJ, Rel.
Min.
Sérgio Kukina, Primeira Turma, j. 10/05/2021. (APELAÇÃO CÍVEL, 0809893-94.2019.8.20.5106, Mag.
JOAO AFONSO MORAIS PORDEUS, Primeira Câmara Cível, JULGADO em 11/06/2025, PUBLICADO em 11/06/2025)” “EMENTA: CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
CONTRATAÇÃO PELA EDILIDADE DE SERVIÇOS DE DIVULGAÇÃO DE AÇÕES/EVENTOS MUNICIPAIS.
DISPENSA DE LICITAÇÃO.
PROCEDIMENTO DE ESCOLHA QUE SEGUIU OS DITAMES LEGAIS.
SUPOSTA SUBSUNÇÃO DOS FATOS AO PRESCRITO NO ARTIGO 9º, CAPUT, DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA NÃO EVIDENCIADA.
AUSÊNCIA DE DOLO E DANO À FAZENDA PÚBLICA.
MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (APELAÇÃO CÍVEL, 0100512-73.2017.8.20.0127, Mag.
EDUARDO BEZERRA DE MEDEIROS PINHEIRO, Terceira Câmara Cível, JULGADO em 11/11/2024, PUBLICADO em 11/11/2024)” “Ementa: DIREITO ADMINISTRATIVO.
AÇÃO CIVIL POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
IRREGULARIDADES EM LICITAÇÕES.
NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE DOLO ESPECÍFICO.
INSUFICIÊNCIA DE PROVAS.
RECURSO DESPROVIDO.
I.
CASO EM EXAME 1.
Apelação cível interposta pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte contra sentença que julgou improcedentes os pedidos de condenação dos réus por improbidade administrativa, com fundamento nos artigos 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429/92, alterada pela Lei nº 14.230/2021.
Alegou-se prejuízo ao erário decorrente de supostas irregularidades em processos licitatórios no município de Governador Dix-Sept Rosado.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.
Há duas questões em discussão: (i) determinar se a conduta dos réus configura mera irregularidade ou ato de improbidade administrativa; e (ii) verificar se há provas concretas da existência de dolo específico, essencial para a configuração do ato ímprobo.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 3.
A tipificação de atos de improbidade administrativa exige, na forma da Lei nº 14.230/2021, a comprovação do dolo específico, consistente na vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito.
A mera irregularidade formal não caracteriza improbidade administrativa (art. 1º, §§ 2º e 3º, da LIA). 4.
No caso concreto, não se verificou dolo específico por parte dos agentes públicos, mas apenas irregularidades procedimentais.
Não foram demonstrados vínculos prévios entre os réus e as empresas vencedoras das licitações ou desvio de valores em benefício próprio. 5.
A ausência de comprovação de dano efetivo ao erário e a inexistência de elementos indicativos de má-fé ou enriquecimento ilícito justificam a improcedência do pedido inicial.
IV.
DISPOSITIVO 6.
Recurso desprovido.
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXVI; Lei nº 8.429/92, arts. 9º, 10 e 11; Lei nº 14.230/2021; Lei nº 8.666/93.
Jurisprudência relevante citada: STF, ARE 843.989, Rel.
Min.
Alexandre de Moraes, Tema 1199, j. 18.08.2022; TJRN, AC nº 0834006-05.2020.8.20.5001, Rel.
Des.
Cornélio Alves, 1ª Câmara Cível, j. 28.02.2024.
ACÓRDÃOAcordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma e à unanimidade, em desprover o recurso, nos termos do voto da relatora. (APELAÇÃO CÍVEL, 0100446-93.2013.8.20.0140, Mag.
ERIKA DE PAIVA DUARTE TINOCO, Terceira Câmara Cível, JULGADO em 03/04/2025, PUBLICADO em 04/04/2025)” Assim, ausente prova robusta de dolo específico e de dano patrimonial efetivo, não há como subsumir a conduta dos demandados ao tipo previsto no art. 10, inciso II, e 11 da LIA, razão pela qual deve ser mantida a sentença que julgou improcedente a ação.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público, mantendo, na íntegra, a sentença recorrida por seus próprios fundamentos.
Sem custas ou honorários. É como voto.
Desembargadora BERENICE CAPUXÚ Relatora Natal/RN, 21 de Julho de 2025. -
09/07/2025 00:00
Intimação
Poder Judiciário do Rio Grande do Norte Por ordem do Relator/Revisor, este processo, de número 0800128-55.2019.8.20.5153, foi pautado para a Sessão VIRTUAL (Votação Exclusivamente PJe) do dia 21-07-2025 às 08:00, a ser realizada no 2ª CC Virtual (Votação Exclusivamente PJE).
Caso o processo elencado para a presente pauta não seja julgado na data aprazada acima, fica automaticamente reaprazado para a sessão ulterior.
No caso de se tratar de sessão por videoconferência, verificar o link de ingresso no endereço http://plenariovirtual.tjrn.jus.br/ e consultar o respectivo órgão julgador colegiado.
Natal, 8 de julho de 2025. -
28/04/2025 13:07
Conclusos para decisão
-
25/04/2025 12:11
Juntada de Petição de petição
-
15/04/2025 10:52
Expedição de Outros documentos.
-
15/04/2025 07:27
Proferido despacho de mero expediente
-
13/02/2025 14:26
Recebidos os autos
-
13/02/2025 14:26
Conclusos para despacho
-
13/02/2025 14:26
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
13/02/2025
Ultima Atualização
28/07/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
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