TJSC - 5063468-33.2025.8.24.0000
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Segunda C Mara de Direito Civil - Gabinetes
Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
-
12/09/2025 00:00
Intimação
Agravo de Instrumento Nº 5063468-33.2025.8.24.0000/SC AGRAVANTE: RAQUEL BARBOSA CARMOADVOGADO(A): LUCIANA DA VEIGA CASCAES (OAB SC037619)AGRAVADO: CONSTRUTORA MERIDIANA LTDAADVOGADO(A): Michel Scaff Junior (OAB SC027944) DESPACHO/DECISÃO Raquel Barbosa Carmo interpôs Agravo de Instrumento em face da decisão prolatada pela magistrada Alessandra Meneghetti, nos autos do cumprimento de sentença n. 5000175-23.2014.8.24.0082, movidos por Construtora Meridiana LTDA, na Vara de Cumprimentos de Sentença Cíveis e Execuções Extrajudiciais da Comarca da Capital, que rejeitou o pedido de reconhecimento de impenhorabilidade de verbas (evento 375, DESPADEC1 dos autos de origem, mantida pela decisão que improveu os embargos de declaração - evento 398, DESPADEC1).
Inconformada, a parte executada sustentou, em suma, que: a) "A Executada não possui grande número de pacientes, atua sem renda fixa e sem estabilidade mensal.
No presente momento está vinculada na atuação como psicóloga no projeto de Assistência de saúde Multidisciplinar: “Integralizar, acompanhamentos intervenções psicológicas para crianças e adolescentes” por meio do fomento 22/2024 com vigência até 30/09/2025 (segue anexo) que está sendo realizado junto ao Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente de São José – CMDCA/SJ, por meio da Organização da Sociedade Civil Educandário Santa Catarina.
A executada reside de aluguel, mora em um quarto alugado onde paga R$ 1.500,00 (hum mil e quinhentos reais por mês), e, além do aluguel, possui despesas com condomínio, iptu, energia elétrica, internet, além das despesas com saúde, medicação de uso contínuo e exames, conforme documentos anexos"; b) "Como se vê entre abril a novembro de 2024 a movimentação financeira se restringe a valores pequenos de pacientes, alguns acumulam em razão do atraso no pagamento.
A volatilidade dos valores reflete a situação de instabilidade de sua situação profissional.
Analisando os extratos bancários da Caixa Econômica Federal identificasse os depósitos ocorridos em 05/12/2024, 07/03/2025, 07/04/2025 todos no valor de R$ 7.800,00, que demonstram que a atuação da Executada junto ao ‘Projeto Assistência de saúde Multidisciplinar’ não remunera mensalmente de forma fixa, tratando-se assim de um valor originado na prestação de sérvios vinculada ao projeto e que se restringe apenas a alguns meses no ano, conforme declaração anexa indicando que a prestação de serviços da executada por meio do projeto está determinada ao período de 17/09/2024 a 30/09/2025"; c) "Segundo a r. decisão embargada pela ora Agravante, os rendimentos da agravante no mês do bloqueio (abril de 2025) teriam ultrapassado R$ 14.000,00, somando créditos de origem autônoma (R$ 7.000,00) e o recebimento do valor de R$ 7.800,00 referente ao Projeto com o Educandário Santa Catarin"; d) "A prova de que a renda da agravante nunca foi superior a oito salários mínimos é que em 30 dias de vigência da ordem reiterada (modo “teimosinha”), foi bloqueado apenas R$ 1.581,93 — valor irrisório diante de eventual renda de alta monta, valor que não corresponde à realidade financeira global da embargante nem representa excedente que autorize a exceção prevista no art. 833, §2º, do CPC"; e) "a r. decisão embargada afirma que a impenhorabilidade poderia ser mitigada em casos nos quais a penhora não comprometa a subsistência da parte devedora, e utiliza como paradigma jurisprudencial julgado em que o executado auferia renda superior a R$ 33.000,00 mensais.
Ocorre que tal valor está completamente dissociado da realidade fática da embargante, cuja renda não é fixa e tampouco alcança valores semelhantes"; f) "A singularidade do caso concreto não permite o afastamento da impenhorabilidade da verba alimentar da executada, pois não há como persistir a penhora em benefício da construtora sem comprometer a subsistência da executada"; g) "A agravante atua como psicoterapeuta autônoma, com rendimentos flutuantes, e apenas complementa sua renda com valores esporádicos vinculados ao Projeto “Integralizar”.
Os valores depositados de R$ 7.800,00 não possuem regularidade nem garantias de continuidade, sendo recebidos em datas espaçadas, não justificando a presunção de renda elevada"; h) "ao concluir que “a movimentação da conta descaracteriza a poupança e permite a penhora”, a decisão, além de aludir valores irreais da movimentação financeira, desconsidera que os gastos decorrem da manutenção da vida digna da executada, e que a conta não abriga valores investidos ou reservados, mas sim, valores estritamente consumidos para sobrevivência"; i) "o pedido formulado pela agravante possui respaldo legal, sobretudo porque o valor bloqueado de suas contas possui natureza evidentemente alimentar e representa aproximadamente 1 (um) salário-mínimo – montante este protegido pela regra da impenhorabilidade mencionada no parágrafo anterior"; j) "O juízo a quo alegou preclusão quanto à discussão da penhora.
Contudo, caso fosse aplicável a preclusão, esta deveria ser reconhecida anteriormente à decisão embargada e ora agravada, em decisão do evento 322 e posteriormente evento 355, quando do reconhecimento da impenhorabilidade de valores constritos em contexto fático igual ao momento atual.
Somente as decisões supervenientes do Evento 375 e 398 reconheceram a possibilidade de penhora no caso em tela, em que pese nenhuma alteração do contexto fático e jurídico do caso".
Por fim, requereu a concessão do efeito ativo e, ao final, o provimento do Recurso para reformar a decisão agravada.
O feito foi redistribuído (evento 9, DESPADEC1).
Após, vieram os autos conclusos. É o relato do necessário. 1.
Do julgamento por decisão monocrática terminativa e admissibilidade recursal Primeiramente, saliento ser plenamente possível o julgamento do recurso por decisão unipessoal, haja vista que, sobre a matéria de direito, a posição desta Corte de Justiça é uniforme.
No mais, tendo em vista a documentação amealhada na origem, defiro a gratuidade da justiça à parte agravante para fins de isenção no recolhimento do preparo. 2. Do mérito Na hipótese em apreço, o agravante almeja a reforma da decisão interlocutória que determinou a penhora de valores bloqueados via SISBAJUD, alegando, em síntese, que o bloqueio incidiu sobre quantia ínfima frente à dívida, inferior a dois salários mínimos, totalmente destinada a despesas básicas.
Pois bem.
Consabido que, nos termos da legislação processual civil, impenhorável "os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o § 2º" (art. 833, IV, do Código de Processo Civil) e "a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos" (art. 833, X, do Código de Processo Civil).
A jurisprudência, porém, andou no sentido de relativizar a regra da impenhorabilidade de vencimentos, subsídios, salários, remunerações e proventos de aposentadoria, a fim de compatibilizar o direito do credor de ver satisfeito o seu crédito e a dignidade humana do devedor.
Nessa ordem de ideias, passou-se a permitir a penhora de percentual sobre essas somas, desde que se preservasse o mínimo para prover uma existência digna para o devedor.
Colho do precedente deste Tribunal de Justiça: PROCESSUAL CIVIL - CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - PENHORA - SALÁRIO - MEDIDA VIÁVEL - EXCEPCIONALIDADE CONFIGURADA - PRECEDENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA1 Via de regra, os vencimentos do devedor são impenhoráveis, salvo quando a dívida decorrer de prestação alimentícia, ou quando o salário/remuneração corresponder à importância excedente a cinquenta salários mínimos (CPC, art. 833, § 2º).2 A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, no entanto, "vem evoluindo no sentido de admitir, em execução de dívida não alimentar, a flexibilização da regra de impenhorabilidade quando a hipótese concreta dos autos revelar que o bloqueio de parte da remuneração não prejudica a subsistência digna do devedor e de sua família" (EREsp 1518169/DF, Rel.
Min.
Humberto Martins, Rel. p/ Acórdão Minª.
Nancy Andrighi).3 In casu, o valor dos rendimentos do ora agravado, embora não supere cinquenta salários mínimos, demonstra que a constrição de parte dele, visando satisfazer o débito executado, não prejudicará sua subsistência, o que autoriza a penhora de parte de seu salário.(TJSC, Agravo de Instrumento n. 5017135-62.2021.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel.
Luiz Cézar Medeiros, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 08-06-2021; destacou-se).
Outrossim, com relação ao inciso X do art. 833 do CPC, ainda que o dispositivo legal faça referência à quantia depositada em conta poupança, consolidou-se no âmbito jurisprudencial o entendimento de que a impenhorabilidade alcança também valores mantidos em fundo de investimento, conta corrente ou papel-moeda, ressalvado eventual abuso, má-fé ou fraude.
Nesse sentido é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: TRIBUTÁRIO.
PROCESSUAL CIVIL.
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015.
APLICABILIDADE.
AUSÊNCIA DE COMBATE A FUNDAMENTOS AUTÔNOMOS DO ACÓRDÃO.
APLICAÇÃO DO ÓBICE DA SÚMULA N. 283/STF.
QUANTIA DE ATÉ 40 SALÁRIOS MÍNIMOS. IMPENHORABILIDADE.
CADERNETA DE POUPANÇA.
ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA.
APLICAÇÃO DE MULTA.
ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015.
DESCABIMENTO.I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado.
In casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015.II - A falta de combate a fundamento suficiente para manter o acórdão recorrido justifica a aplicação, por analogia, da Súmula n.283 do Supremo Tribunal Federal.III - É pacífico o entendimento no Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a impenhorabilidade da quantia de até quarenta salários mínimos poupada alcança não somente a aplicação em caderneta de poupança, mas, também, a mantida em fundo de investimento, em conta-corrente ou guardada em papel-moeda, ressalvado eventual abuso, má-fé ou fraude.
IV - Em regra, descabe a imposição da multa, prevista no art. 1.021, § 4º, do Código de Processo Civil de 2015, em razão do mero improvimento do Agravo Interno em votação unânime, sendo necessária a configuração da manifesta inadmissibilidade ou improcedência do recurso a autorizar sua aplicação, o que não ocorreu no caso.V - Agravo Interno improvido.(AgInt no REsp 1858456/RO, Rel.
Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/06/2020, DJe 18/06/2020; sem grifo no original) Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça recentemente superou o entendimento até então vigente a respeito da impenhorabilidade prevista no art. 833, X, do CPC, passando a exigir prova efetiva, cujo ônus incumbe ao executado, do alegado caráter de poupança da verba eventualmente constrita via Sisbajud.
Com efeito, retiro do julgado proferido pelo STJ no REsp n. 1677144/RS: "PROCESSUAL CIVIL.
BLOQUEIO DE DINHEIRO VIA BACEN JUD.
DINHEIRO DISPONÍVEL EM CONTA-CORRENTE, NÃO EM CADERNETA DE POUPANÇA. IMPENHORABILIDADE ABSOLUTA.
ART. 833, X, DO CPC (ANTIGO ART. 649, X, DO CPC/1973).
NORMA RESTRITIVA.
INTERPRETAÇÃO AMPLIATIVA.
IMPOSSIBILIDADE.
PRESTÍGIO À JURISPRUDÊNCIA FIRMADA NESSE SENTIDO.
AUSÊNCIA DE JUSTIFICATIVA EXCEPCIONAL OU RELEVANTES RAZÕES PARA ALTERAÇÃO.
DEVER DOS TRIBUNAIS SUPERIORES DE MANTER SUAS ORIENTAÇÕES ESTÁVEIS, ÍNTEGRAS E COERENTES.
DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA"1.
A controvérsia cinge-se ao enquadramento das importâncias depositadas em conta-corrente até 40 (quarenta) salários mínimos na impenhorabilidade prevista no art. 649, X, do CPC/1973, atual art. 833, X, do CPC/2015."2.
O Tribunal de origem reformou a decisão de primeiro grau para considerar impenhorável o valor de R$ 15.088,97 depositado em conta-corrente do executado, pois tal garantia 'pode ser estendida a outras formas de reserva financeira além da poupança' (fl. 127, e-STJ).
JURISPRUDÊNCIA DO STJ A RESPEITO DA QUESTÃO CONTROVERTIDA"3.
A orientação cediça do STJ, desde a introdução do instituto no Código de Processo Civil de 1973, sempre foi no sentido de que a disposição contida no art. 649, X, do CPC/1973 - atual art. 833, X, do CPC/2015 - era limitada aos valores depositados em caderneta de poupança, consoante dicção expressa da lei.
Por todos: 'O art. 649, X, do CPC, não admite intepretação extensiva, de modo a abarcar outras modalidades de aplicação financeira, de maior risco e rentabilidade, que não detêm o caráter alimentício da caderneta de poupança' (REsp 1.330.567/RS, Rel.
Ministra Nancy Andrighi, DJe 27.5.2013).
No mesmo sentido: AgRg no REsp 1.371.567/SP, Rel.
Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, DJe 12.6.2013; AgRg no AREsp 385.316/RJ, Rel.
Ministro João Otávio de Noronha, Terceira Turma, DJe 14.4.2014; AgRg no AREsp 511.240/AL, Rel.
Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 30.3.2015; AgInt no AgInt no AREsp 886.532/SP, Rel.
Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, DJe 14.6.2017."4.
Vale acrescentar que, nos casos em que os depósitos realizados eram utilizados mais para fins de movimentação financeira do que de poupança, o entendimento jurisprudencial era de que estava descaracterizada a proteção conferida pela regra da impenhorabilidade, pois destinada a conferir segurança alimentícia e familiar, o que deixava de ocorrer no caso de uso como fluxo de caixa para despesas diversas."5.
Esse posicionamento começou a sofrer alteração a partir de alguns julgados do STJ que passaram a adotar posição diametralmente oposta, no sentido de que 'a impenhorabilidade da quantia de até quarenta salários mínimos poupada alcança não somente as aplicações em caderneta de poupança, mas também as mantidas em fundo de investimentos, em conta-corrente ou guardadas em papel-moeda, ressalvado eventual abuso, má-fé, ou fraude, a ser verificado de acordo com as circunstâncias do caso concreto' (REsp 1.582.264/PR, Rel.
Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 28.6.2016)."No mesmo sentido: REsp 1.230.060/PR, Rel.
Ministra Isabel Gallotti, Segunda Seção, DJe 29.8.2014; AgRg no REsp 1.566.145/RS, Rel.
Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 18.12.2015; e REsp 1.666.893/PR, Rel.
Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 30/6/2017."6.
O acórdão a quo se baseou em precedente da Segunda Seção, firmado por maioria, no REsp 1.230.060/PR, DJe 29.8.2014, Rel.
Ministra Isabel Gallotti, para desbloquear as verbas penhoradas da conta-corrente do executado.
INTERPRETAÇÃO DO ART. 833, X, DO CPC À LUZ DA CF/1988 E DO ART. 5º DA LINDB 7.
Originalmente, o voto apresentado aplicava solução coerente com a posição jurisprudencial que vinha sendo aplicada pacificamente no STJ até 2014, isto é, restringindo a impenhorabilidade do montante de até quarenta (40) salários mínimos para o dinheiro aplicado exclusivamente em cadernetas de poupança, com lastro na interpretação literal das normas do CPC/1973 e do atual CPC."8.
Não obstante, dado o brilhantismo dos fundamentos lançados no Voto-Vista divergente apresentado pelo Ministro Luis Felipe Salomão, pedi Vista Regimental para sobre eles refletir e apresentar solução intermediária."9.
Saliento, conforme exposição abaixo, que a modificação adequada e ora submetida ao colegiado possui abrangência menor do que a veiculada na proposta do eminente par."10.
Primeiramente, reitero, com base nos precedentes acima citados, que o STJ procedeu à alteração jurisprudencial acerca do tema no ano de 2014, situação que não pode ser desconsiderada no julgamento da presente causa."11.
Em segundo lugar, tem-se como claro e incontroverso, pela leitura dos dois votos até aqui apresentados, que a redação literal do Código de Processo Civil (tanto o de 1973 - art. 649, X - como o atual - art. 833, X) sempre especificou que é absolutamente impenhorável a quantia de até quarenta (40) salários mínimos aplicada apenas em caderneta de poupança."12.
Sucede que não é despropositado observar que realmente houve alteração na realidade fática relativamente às aplicações financeiras."13.
Na cultura generalizada vigente nas últimas décadas do século passado, o cidadão médio, quando pensava em reservar alguma quantia para a proteção própria ou de sua família, pensava naturalmente na poupança."14.
Hoje em dia, não é incomum verificar a grande expansão de empresas especializadas em atender a um crescente mercado voltado ao investimento no mercado financeiro, sendo frequente que um segmento social (ainda que eventualmente pequeno) relativamente privilegiado sabe muito bem que, atualmente, a poupança é a aplicação que dá menor retorno."15.
Exatamente por essa razão é que se entende, após melhor ponderação sobre o tema, que o nome da aplicação financeira, por si só, é insuficiente para viabilizar a proteção almejada pelo legislador.
Em outras palavras, a se considerar que a reserva de numerário mínimo, destinada a formar patrimônio necessário ao resguardo da dignidade da pessoa humana (aqui incluída a do grupo familiar a que pertence), constitui o fim social almejado pelo legislador, não seria razoável, à luz da Constituição Federal e do art. 5º da LINDB, consagrar entendimento no sentido de proteger apenas a parte processual que optou por fazer aplicação em 'cadernetas de poupança', instituindo tratamento desigual para outros que, aplicando sua reserva monetária em aplicações com características e finalidade similares à da poupança, buscam obter retorno financeiro mais bem qualificado."16.
No sentido acima, chama-se atenção para o fato de que a hipótese não é de interpretação ampliativa - incabível em relação às normas de exceção em um microssistema jurídico -, mas de sua exegese à luz da Constituição Federal de 1988 e do art. 5º da LINDB."17.
Não sensibiliza, todavia, a genérica menção à ampliação da impenhorabilidade, que passaria a ser geral e irrestrita, a todo e qualquer tipo de aplicação financeira de até quarenta salários mínimos, com amparo na necessidade de se proceder à exegese da norma em conformidade com outros valores prestigiados constitucionalmente."18.
Isso porque, embora, evidentemente, as normas não possam ser interpretadas contra outros valores constitucionais, a ciência jurídica impõe o acato e a observância à rigorosa técnica da hermenêutica e de ponderação de valores de normas aparentemente conflitantes.
Assim, a menção abstrata a outros valores de estatura constitucional, por si só, é insuficiente para justificar, como resultado exegético, interpretação que entre em atrito com outras máximas, ou princípios e fundamentos técnico-jurídicos, como os de que a lei não contém palavras inúteis, ou de que as normas de exceção devem ser interpretadas restritivamente."19.
Dito de outro modo, o que se tem por razoável é considerar, na melhor das hipóteses, que a norma sobre a impenhorabilidade deve ser interpretada, à luz da CF/1988, sob a perspectiva de preservar direitos fundamentais, sem que isso autorize, entretanto, a adoção de interpretação ampliativa em relação a normas editadas com finalidade eminentemente restritiva (já que a impenhorabilidade, como se sabe, constitui exceção ao princípio da responsabilidade patrimonial), pois, em tal contexto, não haveria interpretação buscando compatibilizar normas jurídicas, mas construção de um ordenamento jurídico sustentado por sistema hermenêutico autofágico, em que uma norma aniquilaria o espírito e a razão de existir de outra."20. É precisamente por esse motivo que merece reprodução o seguinte excerto lançado no próprio Voto-Vista do Ministro Luis Felipe Salomão, o qual se reporta à 'lapidar lição de Fredie Didier Jr' (destaques meus, em negrito): '(...) a restrição à penhora de certos bens apresenta-se como uma técnica processual tradicional e bem aceita pela sociedade contemporânea.
Mas essas regras não estão imunes ao controle de constitucionalidade in concreto e, por isso, podem ser afastadas ou mitigadas se, no caso concreto, a sua aplicação revelar-se não razoável ou desproporcional.'"21.
Como base no acima exposto, à luz do princípio da proporcionalidade e da razoabilidade, é absolutamente inadequado formar-se posicionamento jurisprudencial que consubstancie orientação no sentido de que toda aplicação de até quarenta 40 (quarenta), em qualquer tipo de aplicação bancária ou financeira, estará sempre enquadrada na hipótese do art. 833, X, do CPC."22.
A partir do raciocínio acima, a melhor interpretação e aplicação da norma é aquela que respeita as seguintes premissas:"a) é irrelevante o nome dado à aplicação financeira, mas é essencial que o investimento possua características e objetivo similares ao da utilização da poupança (isto é, reserva contínua e duradoura de numerário até quarenta salários mínimos, destinada a conferir proteção individual ou familiar em caso de emergência ou imprevisto grave) - o que não ocorre, por exemplo, com aplicações especulativas e de alto risco financeiro (como recursos em bitcoin, etc.);"b) não possui as características acima o dinheiro referente às sobras que remanescem, no final do mês, em conta-corrente tradicional ou remunerada (a qual se destina, justamente, a fazer frente às mais diversas operações financeiras de natureza diária, eventual ou frequente, mas jamais a constituir reserva financeira para proteção contra adversidades futuras e incertas);"c) importante ressalvar que a circunstância descrita no item anterior, por si só, não conduz automaticamente ao entendimento de que o valor mantido em conta-corrente será sempre penhorável.
Com efeito, deve subsistir a orientação jurisprudencial de que o devedor poderá solicitar a anulação da medida constritiva, desde que comprove que o dinheiro percebido no mês de ingresso do numerário possui natureza absolutamente impenhorável (por exemplo, conta usada para receber o salário, ou verba de natureza salarial);"d) para os fins da impenhorabilidade descrita na hipótese 'a', acima, ressalvada a hipótese de aplicação em caderneta de poupança (em torno da qual há presunção absoluta de impenhorabilidade), é ônus da parte devedora produzir prova concreta de que a aplicação similar à poupança constitui reserva de patrimônio destinado a assegurar o mínimo existencial ou a proteger o indivíduo ou seu núcleo familiar contra adversidades."SÍNTESE DA TESE OBJETIVA AQUI APRESENTADA "23.
A garantia da impenhorabilidade é aplicável automaticamente, no patamar de até 40 (quarenta), ao valor depositado exclusivamente em caderneta de poupança.
Se a medida de bloqueio/penhora judicial, por meio físico ou eletrônico (Bacenjud), atingir dinheiro mantido em conta-corrente ou quaisquer outras aplicações financeiras, poderá eventualmente a garantia da impenhorabilidade ser estendida a tal investimento - respeitado o teto de quarenta salários mínimos -, desde que comprovado, pela parte processual atingida pelo ato constritivo, que o referido montante constitui reserva de patrimônio destinada a assegurar o mínimo existencial. "HIPÓTESE DOS AUTOS"24.
No caso concreto, conforme descrito pela parte recorrida, a penhora incidiu sobre numerário em conta-corrente, constituindo-se, em tese, verba perfeitamente penhorável."25.
Superada a exegese adotada na Corte regional, devem os autos retornar para que esta, em respeito ao princípio da não supressão de instância, prossiga no julgamento do Agravo de Instrumento, no que concerne aos demais argumentos veiculados pela parte contrária, isto é, de liberação da penhora em razão de: a) o débito se encontrar parcelado (importante identificar se eventual parcelamento foi concedido antes ou depois da medida constritiva); e b) necessidade de utilização dos valores para sobrevivência da parte devedora."26.
Recurso Especial provido." (REsp n. 1.677.144/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, julgado em 21/2/2024, DJe de 23/5/2024).
Assim, entende-se que, embora possa ser reconhecida a impenhorabilidade de numerário guardado em outras formas de aplicação além da poupança, é curial que o devedor, para fazer jus à proteção legal, se desincumba do ônus de comprovar que a quantia penhorada lhe servia para constituir poupança, independentemente de onde estivesse depositada.
Na hipótese, o valor penhorado encontrava-se na esfera de disponibilidade da agravante, já que não havia sido consumido integralmente para o suprimento de necessidades básicas, compondo uma reserva de capital, e, por conseguinte, perdendo seu caráter alimentar, tornando-se penhorável.
Ademais, a agravante, apesar de alegar que os valores existentes são usados para a sua subsistência, nada trouxe aos autos para corroborar firmemente suas alegações.
Sobre o tema, já se decidiu: "PROCESSO CIVIL - CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - BLOQUEIO DE VALORES VIA SISTEMA BACENJUD - INSURGÊNCIA DO EXECUTADO - PENHORA DE SOBRA SALARIAL DEPOSITADA HÁ CINCO MESES EM CONTA-CORRENTE - PERDA DO CARÁTER ALIMENTAR - PRECEDENTES DO STJ "'A impenhorabilidade salarial não é absoluta, sendo que, existindo sobra salarial, esta poderá ser penhorada em razão da perda da natureza alimentar' (AgRg no REsp n. 1.492.174/PR, Min.
Ricardo Villas Bôas Cueva). "VALORES INFERIORES A QUARENTA SALÁRIOS MÍNIMOS - ART. 833, INCISO X, CPC - IMPENHORABILIDADE - INEXISTÊNCIA DE CARÁTER POUPADOR NA VERBA CONSTRITA "Para haver a proteção legal prevista no artigo 833, inciso X, do Código de Processo Civil, é indispensável que esteja presente o caráter poupador no numerário constrito, ainda que não esteja depositado em caderneta de poupança.
Isso porque, certamente, a intenção do legislador não é impossibilitar qualquer penhora de dinheiro inferior a 40 salários mínimos, mas tão somente salvaguardar aquele valor conservado pelo devedor com o fim de economia." (TJSC, Agravo de Instrumento n. 4025742-52.2019.8.24.0000, de Caçador, rel.
Luiz Cézar Medeiros, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 17-09-2019).
Em vista desse contexto, deve-se filiar ao entendimento adotado pela magistrada de origem, segundo o qual "a parte executada não comprovou que a conta em que efetivada a constrição era utilizada com o intuito de poupar valores. Ao revés, os extratos bancários demonstram a utilização massiva da conta bancária com diversas entradas e saídas de valores, o que afasta o caráter de poupança das verbas lá depositadas" (evento 375, DESPADEC1).
Nesse cenário, não evidenciada prova de que a verba bloqueada via Sisbajud era proveniente de salário e/ou destinada à poupança, solução não resta senão manter a decisão agravada em todos os seus termos.
Por todo o exposto, deve ser mantida intacta a decisão atacada. É o quanto basta.
Ante o exposto, conheço do recurso e nego-lhe provimento. -
21/08/2025 11:26
Conclusos para decisão/despacho - DCDP -> GCIV0202
-
21/08/2025 11:26
Juntada de Certidão
-
20/08/2025 22:51
Remessa Interna para Revisão - GCIV0202 -> DCDP
-
20/08/2025 17:55
Redistribuído por prevenção ao magistrado - (de GCIV0504 para GCIV0202)
-
20/08/2025 17:54
Remetidos os Autos para redistribuir - GCIV0504 -> DCDP
-
20/08/2025 17:54
Determina redistribuição por incompetência
-
14/08/2025 00:00
Lista de distribuição
Processo 5063468-33.2025.8.24.0000 distribuido para Gab. 04 - 5ª Câmara de Direito Civil - 5ª Câmara de Direito Civil na data de 12/08/2025. -
13/08/2025 22:34
Juntada de Petição
-
13/08/2025 13:03
Conclusos para decisão/despacho - DCDP -> GCIV0504
-
13/08/2025 13:02
Juntada de Certidão
-
13/08/2025 12:59
Alterado o assunto processual - De: Pagamento (Direito Civil) - Para: Compra e venda
-
13/08/2025 12:34
Remessa Interna para Revisão - GCIV0504 -> DCDP
-
12/08/2025 21:26
Expedida/certificada a comunicação eletrônica - Custas: Justiça gratuita: Requerida
-
12/08/2025 21:26
Expedida/certificada a comunicação eletrônica - Parte: RAQUEL BARBOSA CARMO. Justiça gratuita: Requerida.
-
12/08/2025 21:26
Distribuído por sorteio - Ref. ao Despacho/Decisão do(s) evento(s) 398, 375 do processo originário.Autos com o Relator
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
20/08/2025
Ultima Atualização
12/09/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Detalhes
Documentos
DESPACHO/DECISÃO • Arquivo
DESPACHO/DECISÃO • Arquivo
Informações relacionadas
Processo nº 5063377-40.2025.8.24.0000
Caixa Economica Federal
Condominio Beija Flor
Advogado: Geraldo Gregorio Jeronimo
2ª instância - TJSC
Ajuizamento: 12/08/2025 17:59
Processo nº 5022413-26.2025.8.24.0090
Ivo Eduardo Rodrigues Candido
Estado de Santa Catarina
Advogado: Marcio Luiz Fogaca Vicari
1ª instância - TJSC
Ajuizamento: 01/04/2025 16:27
Processo nº 5061772-80.2025.8.24.0090
Bianca Dias Bastos
Estado de Santa Catarina
Advogado: Raquel Soares
1ª instância - TJSC
Ajuizamento: 11/08/2025 08:39
Processo nº 5022002-80.2025.8.24.0090
Lisiane Ruschel
Estado de Santa Catarina
Advogado: Maria Eduarda Nohatto Gattiboni
1ª instância - TJSC
Ajuizamento: 31/03/2025 15:23
Processo nº 5026628-97.2025.8.24.0008
Giselle Coelho de Souza
Condominio Morada dos Manacas
Advogado: Matheus de Oliveira Bini
1ª instância - TJSC
Ajuizamento: 12/08/2025 11:30