TRF1 - 1001799-19.2021.4.01.3603
1ª instância - 2ª Sinop
Polo Ativo
Partes
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Polo Passivo
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Partes
Advogados
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Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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04/07/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Sinop-MT 2ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Sinop-MT SENTENÇA TIPO "D" PROCESSO: 1001799-19.2021.4.01.3603 CLASSE: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria) POLO PASSIVO:ROSANGELA DA ROSA REPRESENTANTES POLO PASSIVO: LARISSA INA GRAMKOW MESQUITA - MT8196/O e CASSIANE ELIS BRAGANHOL - RS115130 S E N T E N Ç A 1.
R e l a t ó r i o O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ofereceu denúncia em face de ROSÂNGELA DA ROSA, imputando-lhe a prática, por uma vez, do crime previsto no artigo 149 do Código Penal (redução de trabalhador a condição análoga à de escravo).
Eis a imputação e os fatos e condutas que a ampara: “Entre 17/12/2018 e 12/02/2020, na Fazenda 3 Poderes, Guarantã do Norte, coordenadas geográficas 9º46’55’’S 54º23’30’’W, ROSANGELA DA ROSA reduziu Valmir Ferraz Silvano a condição análoga à de escravo, sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, incorrendo na prática do art. 149 do Código Penal.
Em 12/02/2020, o Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM) da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, a Superintendência Regional do Trabalho do Estado de Mato Grosso, e integrantes do Ministério da Economia realizaram fiscalização na Fazenda Três Poderes, em Guarantã do Norte/MT, de propriedade do ROSANGELA DA ROSA.
Na diligência, a equipe constatou que o empregado e vítima Valmir Ferras Silvano, admitido em 17/12/2018, era submetido a condições degradantes de trabalho.
Conforme restou apurado, Valmir Ferras Silvano: (a) Estava sujeito a dormir dentro de um curral, com piso de terra, sem paredes, dividindo espaço com animais e seus excrementos, com acúmulo de lama e de dejetos. (b) Estava obrigado a urinar e defecar no mato ao redor do curral. (c) Estava sujeito a preparar e consumir suas refeições dentro do curral, em ambiente desprovido de mínimo de higiene, junto com animais. (d) Estava sujeito a descargas elétricas e incêndios dentro do curral, considerando o completo improviso das instalações elétricas dispostas no local. (e) Trabalhava sem antecipação, reconhecimento e avaliação dos riscos existentes e, consequentemente, sem a adoção das medidas de controle correspondentes. (f) Não estava submetido a registro e nem tinha suas CTPS anotada, o que lhe subtraia direitos como cobertura previdenciária, décimo terceiro salários e descansos remunerados. (…) A materialidade e os indícios suficientes de autoria (justa causa) exsurgem: (a) do Relatório de Fiscalização (fl. 3-94) ; (b) do testemunho da vítima Valmir Ferraz Silvano (fls. 38-39); (c) do interrogatório da acusada (fls. 109-110); (d) Dos registros fotográficos (fls. 25-30).” A acusação foi ancorada nos elementos colhidos no Inquérito Policial nº 2020.0127102-DPF/SIC/MT.
O MPF arrolou cinco testemunhas, a saber: 1) Adalto Araújo de Oliveira Júnior; 2) Geraldo Vaguino Alves dos Reis; 3) Gislene Ferreira dos Santos Stacholski; 4) Jonas Ratier Moreno; 5) Edilson Miranda.
Outrossim, requereu a oitiva da vítima Valmir Ferraz Silvano.
Recebimento da denúncia em 15/02/2022 (ID nº 929641147 - Pág. 1).
Citação pessoal da ré (ID nº 1136218343 - Pág. 2).
Resposta escrita à acusação.
A DEFESA sustentou, em síntese: preliminarmente, [i] ausência de justa causa para a ação penal.
No mérito: [ii] atipicidade da conduta.
Arrolou três testemunhas: 1) Ademilson Ribeiro de Souza; 2) José Clóvis Becker; 3) Ana Claudia dos Santos (ID nº 1110350292 - Pág. 1/9).
Decisão afastando as questões preliminares, rejeitando o pedido de absolvição sumária e determinando o prosseguimento do processo (ID nº 1332942282 - Pág. 1/3).
Em audiência de instrução realizada no dia 26/01/2023, foram inquiridas as testemunhas Adalto Araújo de Oliveira Júnior; Gislene Ferreira dos Santos Stacholski; Jonas Ratier Moreno; Ademilson Ribeiro de Souza; José Clóvis Becker; Ana Cláudia Dos Santos e ouvida a vítima Valmir Ferraz Silvano, além do interrogatório da ré (ID nº 1469142358 - Pág. 1/2).
Sem diligências finais.
O MPF apresentou alegações finais orais, manifestando-se pela absolvição da ré.
Ressaltou que a prova dos autos demonstrou que a suposta vítima possuía animais seus na propriedade rural da ré e que somente dormia no local de trabalho esporadicamente, quando assim exigiam as circunstâncias.
Pontuou certa contradição entre os depoimentos da vítima em sede policial e judicial, mas que há dúvida acerca da ocorrência do delito de redução a condição análoga à de escravo.
A prova dos autos também demonstrou que a ré dormia no local esporadicamente e que mantinha certa parceria comercial com a suposta vítima.
Por tudo isso o MPF manifestou-se pela absolvição da ré, não por estar provada a inexistência do falto, mas por ausência de provas acerca da ocorrência deste (ID nº 1469142358 - Pág. 1/2).
A DEFESA também apresentou alegações finais orais e, do mesmo modo, requereu a absolvição da ré.
Argumentou que os elementos probatórios são insuficiências para a condenação da ré.
Para que se configure o ilícito é necessário a demonstração de submissão a trabalhos forçados, jornadas exaustivas, condições degradantes e restrição de liberdade.
Ficou claro pelos elementos probatórios que Valmir não era submetido a trabalhos forçados e tampouco a jornadas exaustivas.
Destacou que todas as questões trabalhistas envolvendo o caso foram devidamente cumpridas pela ré.
Há prova nos autos, ainda, de que a situação empregatícia de Valmir foi devidamente resolvida.
Ressaltou que não houve restrição de liberdade de Valmir.
Não houve submissão a condições degradantes de trabalho e o comparecimento de Valmir na fazenda por vezes se dava porque necessitava cuidar de suas criações que mantinha na propriedade rural da ré.
O curral não era a residência permanente de Valmir.
Pontuou a ausência de dolo.
Por tudo, a DEFESA pugnou pela absolvição da ré, nos termos do artigo 386, inciso I ou VII, do CPP (ID nº 1469142358 - Pág. 1/2).
Certidões de antecedentes criminais (ID’s nº 1476364866 - Pág. 1; 1476364867 - Pág. 1; 1477144383 - Pág. 1/2).
Em seguida, vieram-me os autos conclusos. É o relato do necessário.
Passo a decidir. 2.
F u n d a m e n t a ç ã o Sem questões preliminares, passo direto ao exame do mérito.
No mérito, a pretensão punitiva é improcedente.
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL imputou à ré ROSANGELA DA ROSA a prática, por uma vez, do crime previsto no artigo 149 do Código Penal (redução de trabalhador a condição análoga à de escravo), pois esta teria, entre 17/12/2018 e 12/02/2020, na Fazenda 3 Poderes, localizada no Município de Guarantã do Norte/MT (coordenadas geográficas 9º46’55’’S 54º23’30’’W), reduzido o trabalhador Valmir Ferraz Silvano a condição análoga à de escravo, sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, notadamente as seguintes: a) Estava sujeito a dormir dentro de um curral, com piso de terra, sem paredes, dividindo espaço com animais e seus excrementos, com acúmulo de lama e de dejetos; b) Estava obrigado a urinar e defecar no mato ao redor do curral; c) Estava sujeito a preparar e consumir suas refeições dentro do curral, em ambiente desprovido de mínimo de higiene, junto com animais; d) Estava sujeito a descargas elétricas e incêndios dentro do curral, considerando o completo improviso das instalações elétricas dispostas no local; e) Trabalhava sem antecipação, reconhecimento e avaliação dos riscos existentes e, consequentemente, sem a adoção das medidas de controle correspondentes; e, f) Não estava submetido a registro e nem tinha suas CTPS anotada, o que lhe subtraia direitos como cobertura previdenciária, décimo terceiro salário e descansos remunerados.
Pois bem.
Nos autos há provas suficientes demonstrando que o fato narrado pelo MPF não ocorreu, de forma que a ré ROSÂNGELA deve ser absolvida.
Com efeito, a acusação amparou-se no Relatório de Fiscalização do Ministério do Trabalho, no depoimento extrajudicial da suposta vítima e no interrogatório extrajudicial da ré ROSÂNGELA.
Entretanto, após o término da instrução processual, e tendo como quadro de fundo todos os elementos de prova (produzidos tanto na fase inquisitiva quanto judicial), restou provado que a suposta vítima Valmir Ferraz Silva jamais foi submetido a condições degradantes de trabalho com intuito deliberado de redução a condição análoga à de escravo.
De fato, as condutas imputadas pelo MPF à ré ROSÂNGELA constam no Relatório de Fiscalização lavrado pelo Ministério do Trabalho após a realização de vistoria na Fazenda 3 Poderes, de propriedade da ré, o qual tem por base não apenas o registro fotográfico e as condições encontradas no local no momento da vistoria, mas também as declarações da suposta vítima Valmir Ferraz Silva, prestadas aos fiscais do trabalho (ID nº 534487848 - Pág. 3/34).
Este juízo inquiriu as testemunhas Adalto Araújo de Oliveira Júnior, Gislene Ferreira dos Santos Stacholski e Jonas Ratier Moreno, todos integrantes da equipe de fiscalização do Ministério do Trabalho, tendo estas, em linhas gerais, confirmado os fatos que foram descritos no indigitado Relatório de Fiscalização (ID nº 1469142358 - Pág. 1/2).
A Polícia Federal ouviu a ré ROSÂNGELA durante a investigação, a qual disse o seguinte sobre os fatos em epígrafe (ID nº 685243491 - Pág. 7/8): “QUE questionado qual sua profissão, disse que é pecuarista; QUE trabalha na FAZENDA TRÊS PODERES, da qual é proprietária; QUE possui ciência sobre o teor do inquérito policial, assim como sobre o Relatório da Fiscalização feita na referida FAZENDA, pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, deflagrada em 12/02/2020; QUE questionada sobre os fatos, disse que não tinha o costume de conduzir a FAZENDA, pois quem fazia era o seu ex-marido; QUE após se separar do marido, em meados de 2018, passou a administrar a FAZENDA; QUE antes disso não tinha qualquer familiaridade com o assunto, pois apenas cuidava dos filhos e netos; QUE no período de transição da administração da FAZENDA, VALMIR FERRAZ SILVANO, que trabalhava na FAZENDA TARUMÃ, de propriedade do seu ex-marido, passou a fazer diária na FAZENDA TRÊS PODERES; QUE não conhecia a forna de contratação; QUE achava se tratar de ‘diarista’, pois VALMIR prestava serviços para fazendas vizinhas; QUE VALMIR possuía (ainda possui) criação de galinhas, gado e animal cavalar na FAZENDA; QUE não via VALMIR como empregado, mas sim como membro da família; QUE no dia da mencionada fiscalização, VALMIR prestava serviços para a fazenda do CLÓVIS, fazenda essa vizinha a sua; QUE nesse dia não estava na FAZENDA, mas sim em Sorriso; QUE aos finais de semana levava VALMIR para Guarantã, no sítio da mãe dele; QUE sobre a situação precária encontrada no dia da fiscalização, alega que a casa sede foi vítima de um incêndio; QUE o incêndio ocorreu após a separação do marido; QUE por esse motivo VALMIR passou a dormir no curral, dentro de uma barraca; QUE ela mesma, assim como o seu genro, possuíam barracas no mesmo curral; QUE todos dormiam e comiam no local; QUE quem cozinhava era ela mesma; QUE VALMIR tinha a liberdade de ir e vir; QUE passa um ônibus escolar passa em frente as fazendas; QUE ele possuía acesso celular, internet; QUE possuía acesso a água de poço semi-artesiano; QUE utilizavam o banheiro da casa que foi queimada, pois a mesma não foi completamente destruída pelo incêndio; QUE nos dias atuais, VALMIR continua sendo considerado como membro da família; QUE inclusive o mesmo foi contratado com os devidos registros na carteira de trabalho em 01/07/2021”.
Destaquei A ré ROSÂNGELA também foi interrogada por este juízo, oportunidade em que, de maneira firme e coerente, manteve integralmente a versão do fato que sustentou desde o início.
Disse que era dona de casa e, após separar-se de seu marido, obrigou-se a entrar no ramo da pecuária, passando a administrar a propriedade rural denominada Fazenda 3 Poderes.
Afirmou que conheceu Valmir através de seu ex-marido e que então o contratou para trabalhar na diária em sua propriedade rural.
Disse que levava Valmir bem cedo para a Fazenda para trabalhar e que ao final do dia retornavam para casa, sendo que na época de vacinação do gado eventualmente não conseguiam terminar o trabalho no mesmo dia, e, portanto, nestes dias, dormiam na fazenda.
Esclareceu que, para não incomodar os vizinhos, preparou um lugar para pernoitarem na própria fazenda.
Ressaltou que a sede da propriedade rural foi queimada, mas que restou ainda um banheiro, o qual então utilizavam.
Disse que as barracas de camping que estava no local, de fato, era para dormirem naqueles dias em que não conseguissem voltar para casa.
Pontuou, que, no dia da fiscalização, Valmir estava trabalhando na diária para o seu vizinho Clóvis e que foi a fiscalização que pediu que Valmir fosse até a fazenda.
Ressaltou que havia no local o material de construção para a edificação da nova sede.
Frisou que jamais faria mal para o Valmir, pois o considera da família, destacando que, inclusive, Valmir possuía porcos, galinhas e cavalos na Fazenda 3 Poderes, tendo este, após a fiscalização, retornado para a fazenda dias depois para cuidar de seus animais.
Por fim, disse que fez tudo o que a fiscalização do trabalho pediu, inclusive providenciou os documentos pessoais de Valmir, asseverando que este trabalha atualmente registrado na Fazenda 3 Poderes (ID nº 1469142358 - Pág. 1/2).
A versão da ré foi corroborada in totum pelas declarações das testemunhas Ademilson Ribeiro de Souza, José Clóvis Becker e Ana Cláudia Dos Santos, inquiridas por este juízo.
Ademilson Ribeiro de Souza disse em juízo que conhece a ré ROSÂNGELA há mais de 20 anos e que ela é a proprietária da Fazenda 3 Poderes, na qual exerce a atividade de criação de gado.
Afirmou que, anteriormente, ela era do lar, pois seu ex-marido era quem cuidava da fazenda.
Disse que conhece Valmir e que este morava na linha 31.
Afirmou que ficou sabendo da fiscalização na fazenda de ROSÂNGELA.
Disse que naquela época Valmir falava que fazia algumas diárias e, inclusive, já presenciou ele trabalhando no curral da Fazenda 3 Poderes.
Asseverou que Valmir trabalhava na diária e de empreitada para outras pessoas também.
Disse que conhece mais ou menos a Fazenda 3 Poderes e que ficou sabendo de um incêndio na sede desta fazenda, ressaltando que somente não queimou a parte do banheiro e de uma área, mas que o resto queimou tudo.
Afirmou que Valmir possuía gado e cavalo na Fazenda 3 Poderes e que este às vezes ia para a Fazenda de carro com a proprietária ou mesmo de moto e que sabe que eles iam e voltavam no mesmo dia, dormindo na fazenda mesmo só em épocas de vacinação do gado (ID nº 1469142358 - Pág. 1/2).
José Clóvis Becker disse que a ré ROSÂNGELA é sua vizinha de propriedade rural e que esta é pecuarista.
Disse que conhece Valmir desde criança e que ele trabalhava na diária para as pessoas da região.
Afirmou que, no dia da fiscalização, Valmir estava prestando serviço na diária para o declarante e que toda vez que precisou Valmir prestou-lhe serviços na diária.
Asseverou que conhece a Fazenda 3 Poderes e que soube de um incêndio que ocorreu na sede desta fazenda, recordando-se que o que sobrou desse incêndio foi somente um banheiro, o qual era utilizado normalmente.
Disse que, inclusive, quando este foi demolido, foi com o seu próprio trator.
Afirmou que a ré ROSÂNGELA sempre estava na fazenda.
Disse que o curral era normal e que, de fato, havia uma cozinha no curral, e que inclusive já foi convidado para almoçar lá.
Afirmou que vacas e cavalos não ficavam no curral.
Disse que Valmir tinha animais na Fazenda 3 Poderes também e que o acesso a esta é fácil.
Disse que tem conhecimento de que ROSÂNGELA e Valmir dormiam no local às vezes.
Que ROSÂNGELA buscava Valmir para as diárias e que estas eram esporádicas.
Por fim, disse que nunca teve que contatar a ROSÂNGELA para contratar as diárias de Valmir (ID nº 1469142358 - Pág. 1/2).
Ana Cláudia Dos Santos, por sua vez, disse em juízo que conhece a ré ROSÂNGELA há mais de 15 anos e que ela é a proprietária da Fazenda 3 Poderes, onde desenvolve a atividade de pecuária.
Que antes ROSÂNGELA era somente dona de casa.
Afirmou que conheceu Valmir através de ROSÂNGELA e que soube da fiscalização na referida fazenda.
Disse que Valmir era diarista da ré ROSÂNGELA, trabalhando com a vacinação do gado, conserto de cercas e outros serviços de fazenda.
Afirmou que Valmir também sempre fez diárias para todos os fazendeiros da região.
Valmir morava na linha 31.
Asseverou que Valmir também tinha gado, cavalo e porcos na Fazenda 3 Poderes, de propriedade de ROSÂNGELA, e que estes, inclusive, participavam juntos de provas de laço.
Disse que ficou sabendo de um incêndio na referida fazenda e que esta ficou totalmente destruída, salvo um banheiro e um pedaço de uma área.
Disse que ROSÂNGELA planejava construir uma nova sede no local, tanto assim que haviam materiais de construção no local.
Afirmou que já foi no local e gostava de lá e que este não era sujo.
Pontuou que Valmir nunca foi tratado como funcionário pela ROSÂNGELA e que esta o tratava como membro da família (ID nº 1469142358 - Pág. 1/2).
Vê-se, pois, que as últimas três testemunhas acima referidas apresentaram um quadro diametralmente oposto àquele relatado pelos fiscais do Ministério do Trabalho, sendo de se destacar a coerência e firmeza de todas estas testemunhas em suas declarações, sem mencionar a harmonia entre si das versões de cada uma destas, e, inclusive e sobretudo, com a versão do fato apresentada pela ré ROSÂNGELA.
Não bastasse, este juízo também ouviu em juízo Valmir Ferraz Silvano, apontado como vítima na denúncia do MPF.
Valmir disse em juízo que não morava na barraca de camping que ficava no curral da Fazenda 3 Poderes, e sim na casa de sua mãe.
Disse que quando deslocava-se para trabalhar na diária percorria o trajeto de moto e voltava no final do dia, pontuando que não dormia na barraca de camping.
Em seguida, disse que às vezes ROSÂNGELA o buscava de carro e que o trajeto até a fazenda era de cerca de 90 km.
Afirmou que trabalhava na diária para a ré, ganhando cerca de R$ 100,00 (cem reais) por dia de trabalho.
Afirmou na sequência que a barraca estava lá para dormirem quando não dava tempo de voltarem no mesmo dia, de forma que dormiam de vez em quando na referida barraca.
Disse que perto de onde queimou a casa na fazenda havia um banheiro.
Afirmou que levava comida em marmitas e não cozinhava no local.
Disse que havia no local os materiais de construção para a edificação de um alojamento.
Não possuía CTPS assinada, pois toda a vida trabalhou na diária.
Sobre as declarações que prestou aos fiscais do trabalho, disse que eles inventaram o teor de seu depoimento.
Em seguida, indagado acerca de seu grau de escolaridade, disse que sabe ler e escrever pouco e que conheceu ROSÂNGELA quando trabalhava para o ex-marido dela e que depois começou a fazer diárias para esta.
Afirmou que também possuía gado na Fazenda Três Poderes, inclusive três cavalos.
Além de diárias para a ré, fazia também para outras pessoas na região, pois tinha liberdade para trabalhar para os vizinhos, não necessitando de autorização de ROSÂNGELA.
Disse para os fiscais que tinha liberdade para sair da fazenda quando quisesse.
Deixava alguns pertences seu no local e tinha um fogão para esquentar sua comida.
Tinha um banheiro nas proximidades, o qual era utilizado.
Afirmou que ROSÂNGELA tinha planos de construir uma sede no local, tanto assim que havia comprado os materiais de construção.
Por fim, asseverou que possuía uma ótima relação com ROSÂNGELA e que esta nunca o obrigou a nada (ID nº 1469142358 - Pág. 1/2).
Pois bem.
Embora o quadro fático encontrado na Fazenda 3 Poderes pelos Fiscais do Ministério do Trabalho tenha sido interpretado por estes como submissão do trabalhador Valmir a condição análoga à de escravo, reiterado por estes em juízo, as demais provas produzidas na presente ação penal demonstram um quadro diametralmente oposto, o qual também é corroborado pelo depoimento da própria "vítima", conforme visto alhures.
Com efeito, ressalto que os elementos informativos colhidos na fase investigativa não podem servir de fundamento exclusivo para fundamentar a convicção judicial, devendo, pois, serem corroborados pela prova colhida sob o crivo do contraditório judicial, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas, nos termos do artigo 155 do Código de Processo Penal.
No caso dos autos, o MPF manifestou-se afirmando que a acusação não logrou confirmar em juízo os elementos informativos colhidos na fase judicial, havendo, portanto, insuficiência de provas.
Este juízo entente, entretanto, que está provada nos autos a não ocorrência da conduta de submissão de Valmir a condição análoga à de escravo, sendo este, portanto, o fundamento da absolvição.
Como visto alhures, as testemunhas de DEFESA apresentaram em juízo um quadro fático bem diferente daquele descrito na denúncia, nem de longe sinalizando a ocorrência do crime de redução de trabalhadores a condição análoga à de escravo.
Esse quadro probatório, inclusive, fez com que o próprio Órgão Ministerial recuasse e pedisse a absolvição do réu.
O que se pode concluir, a partir da prova oral colhida, a qual é corroborada não apenas pelo interrogatório da ré, mas sobretudo pela oitiva da própria "vítima" (Valmir), que esta trabalhava para a ré esporadicamente na realização de diárias, oportunidade em que ajudava a cuidar do gado, das cercas e demais serviços típicos da lida campesina.
Valmir prestava este tipo de serviço não apenas para a ré ROSÂNGELA, mas para os demais fazendeiros na região.
Valmir não estava alojado permanentemente no curral e nas condições mencionados na denúncia, pois a referida estrutura na Fazenda 3 Poderes era provisória e utilizada somente de maneira excepcional, caso o serviço diário não fosse terminado no mesmo dia, o que ocorria quase sempre em épocas de vacinação do gado.
A própria ré ROSÂNGELA ajudava na lida diária da fazenda e, quando ocorria tais situações esporádicas, também dormia no local submetendo-se às mesmas condições que Valmir.
Não bastasse, a prova dos autos revelou que Valmir possuía uma relação estreita de amizade com a ré, pois este, inclusive, mantinha na Fazenda 3 Poderes, de propriedade desta, seus animais, tais como gado, cavalos, porcos e galinhas.
Demais disso, no dia da fiscalização, Valmir sequer estava trabalhando na Fazenda 3 Poderes, tendo se deslocado até esta somente após ter sido instado a tanto pelos fiscais do Ministério do Trabalho.
Portanto, diante desse contexto, entendo que, para além da insuficiência de provas para a condenação, sustentada pelo MPF, há prova suficiente para se concluir que inexistiu a conduta de redução do trabalhador Valmir Ferraz Silva a condição análoga à de escravo em razão de sua submissão a condição degradante de trabalho.
Sem mais delongas, a absolvição do réu se impõe. 3.
D i s p o s i t i v o Ante o exposto, ABSOLVO a réu ROSÂNGELA DA ROSA da prática do crime previsto no 149 do Código penal, nos termos do artigo 386, inciso I, do Código de Processo Penal, por estar provada a inexistência do fato, nos termos da fundamentação.
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.
Após, não havendo recurso, certifique-se o trânsito em julgado e remetam-se os autos ao arquivo.
Sinop/MT, datado eletronicamente.
Assinado eletronicamente MARCEL QUEIROZ LINHARES Juiz Federal da 2ª Vara -
28/02/2023 19:22
Juntada de Certidão
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02/02/2023 14:13
Juntada de Certidão
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01/02/2023 20:16
Conclusos para julgamento
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01/02/2023 20:16
Juntada de Certidão
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01/02/2023 19:59
Audiência de instrução e julgamento realizada, conduzida por Juiz(a) em/para 26/01/2023 14:00, 2ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Sinop-MT.
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30/01/2023 15:17
Juntada de Ata de audiência
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28/01/2023 03:51
Decorrido prazo de Ministério Público Federal (Procuradoria) em 27/01/2023 23:59.
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28/01/2023 03:33
Decorrido prazo de Ministério Público Federal (Procuradoria) em 27/01/2023 23:59.
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24/01/2023 15:14
Juntada de Certidão
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23/01/2023 14:36
Mandado devolvido entregue ao destinatário
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23/01/2023 14:36
Juntada de Certidão de oficial de justiça
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20/01/2023 08:10
Recebido o Mandado para Cumprimento
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19/01/2023 15:52
Expedição de Mandado.
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17/01/2023 09:29
Juntada de parecer
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16/01/2023 16:23
Processo devolvido à Secretaria
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16/01/2023 16:23
Juntada de Certidão
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16/01/2023 16:23
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
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16/01/2023 16:23
Proferido despacho de mero expediente
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16/01/2023 14:05
Conclusos para despacho
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16/01/2023 13:53
Juntada de Certidão
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13/01/2023 17:15
Juntada de manifestação
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11/01/2023 14:57
Juntada de Certidão
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11/01/2023 13:58
Juntada de Certidão
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11/01/2023 13:58
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
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11/01/2023 13:58
Ato ordinatório praticado
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11/01/2023 13:54
Juntada de Certidão
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09/01/2023 17:33
Juntada de Certidão
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15/12/2022 19:59
Juntada de Certidão
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15/12/2022 15:48
Juntada de Certidão
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15/12/2022 09:46
Expedição de Carta precatória.
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15/12/2022 09:46
Expedição de Carta precatória.
-
13/12/2022 04:03
Decorrido prazo de Ministério Público Federal (Procuradoria) em 12/12/2022 23:59.
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05/12/2022 15:41
Juntada de parecer
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05/12/2022 11:42
Juntada de Certidão
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05/12/2022 11:42
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
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05/12/2022 11:42
Ato ordinatório praticado
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04/12/2022 23:08
Mandado devolvido não entregue ao destinatário
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04/12/2022 23:08
Juntada de Certidão de oficial de justiça
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25/11/2022 17:44
Juntada de Certidão
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25/11/2022 17:44
Mandado devolvido entregue ao destinatário
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25/11/2022 17:44
Juntada de Certidão de oficial de justiça
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16/11/2022 17:26
Mandado devolvido não entregue ao destinatário
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16/11/2022 17:26
Juntada de Certidão de oficial de justiça
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09/11/2022 17:09
Mandado devolvido entregue ao destinatário
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09/11/2022 17:09
Juntada de Certidão de oficial de justiça
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08/11/2022 17:47
Recebido o Mandado para Cumprimento
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20/10/2022 09:23
Juntada de Certidão
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17/10/2022 15:03
Expedição de Carta precatória.
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17/10/2022 15:03
Expedição de Carta precatória.
-
17/10/2022 10:27
Recebido o Mandado para Cumprimento
-
14/10/2022 15:33
Expedição de Mandado.
-
13/10/2022 17:20
Recebido o Mandado para Cumprimento
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13/10/2022 17:19
Recebido o Mandado para Cumprimento
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13/10/2022 17:05
Recebido o Mandado para Cumprimento
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13/10/2022 16:44
Expedição de Mandado.
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13/10/2022 16:44
Expedição de Mandado.
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13/10/2022 16:44
Expedição de Mandado.
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12/10/2022 00:01
Decorrido prazo de Ministério Público Federal (Procuradoria) em 11/10/2022 23:59.
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12/10/2022 00:01
Decorrido prazo de Ministério Público Federal (Procuradoria) em 11/10/2022 23:59.
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11/10/2022 18:00
Audiência de instrução e julgamento designada, conduzida por #Não preenchido# em/para 26/01/2023 14:00, 2ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Sinop-MT.
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30/09/2022 12:05
Juntada de manifestação
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27/09/2022 13:30
Juntada de petição intercorrente
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26/09/2022 16:38
Processo devolvido à Secretaria
-
26/09/2022 16:38
Juntada de Certidão
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26/09/2022 16:37
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
26/09/2022 16:37
Outras Decisões
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27/07/2022 16:36
Conclusos para decisão
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09/06/2022 19:07
Juntada de Certidão
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17/05/2022 18:42
Juntada de Certidão
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02/03/2022 18:57
Juntada de Certidão
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17/02/2022 16:33
Expedição de Carta precatória.
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16/02/2022 19:42
Classe Processual alterada de INQUÉRITO POLICIAL (279) para AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283)
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16/02/2022 09:15
Juntada de petição intercorrente
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15/02/2022 15:52
Processo devolvido à Secretaria
-
15/02/2022 15:52
Juntada de Certidão
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15/02/2022 15:52
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
15/02/2022 15:52
Recebida a denúncia contra ROSANGELA DA ROSA - CPF: *21.***.*90-15 (INVESTIGADO)
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20/09/2021 10:00
Juntada de resposta
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25/08/2021 16:24
Expedição de Outros documentos.
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25/08/2021 16:23
Juntada de pedido do mp ao juiz em procedimento investigatório
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25/08/2021 09:37
Expedição de Outros documentos.
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25/08/2021 09:37
Juntada de documento da polícia em procedimento investigatório
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20/08/2021 15:57
Conclusos para despacho
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20/08/2021 15:20
Processo devolvido à Secretaria
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20/08/2021 15:20
Expedição de Outros documentos.
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20/08/2021 15:20
Juntada de denúncia
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16/08/2021 12:07
Expedição de Outros documentos.
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16/08/2021 12:07
Juntada de documento da polícia em procedimento investigatório
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21/05/2021 10:15
Juntada de resposta
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10/05/2021 17:24
Expedição de Outros documentos.
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10/05/2021 17:22
Juntada de documento do ministério público em procedimento investigatório
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10/05/2021 13:39
Processo Encaminhado a tramitação MP-Polícia
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10/05/2021 13:39
Expedição de Outros documentos.
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10/05/2021 13:39
Expedição de Outros documentos.
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10/05/2021 12:15
Expedição de Outros documentos.
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10/05/2021 12:14
Juntada de documento da polícia em procedimento investigatório
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10/05/2021 12:12
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
10/05/2021
Ultima Atualização
04/07/2023
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Sentença Tipo D • Arquivo
Ata de Audiência • Arquivo
Despacho • Arquivo
Decisão (anexo) • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
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