TRF1 - 1031261-68.2023.4.01.3500
1ª instância - 2ª Goi Nia
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
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Polo Passivo
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Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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27/09/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária de Goiás 2ª Vara Federal Cível da SJGO SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1031261-68.2023.4.01.3500 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: AUGUSTO CESAR CAVALCANTE REPRESENTANTES POLO ATIVO: FABIO SANTOS MARTINS - GO21828, JULIO WGLESIO NERES MAGALHAES - GO30570 e GABRIEL MELO MATIAS - GO67912 POLO PASSIVO:UNIÃO FEDERAL e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: GILBERTO VACILES BILACCHI JUNIOR - DF26224, THIAGO LOPES CARDOSO CAMPOS - BA23824, BRUNA LETICIA TEIXEIRA IBIAPINA - PI7964, PAULA CECILIA RODRIGUES DE SOUZA - AM4482 e FERNANDA RAMOS VON FLACH - BA32354 SENTENÇA Trata-se de ação de rito comum ajuizada por AUGUSTO CESAR CAVALCANTE em face da UNIÃO, da FUNDAÇÃO DE APOIO AO HOSPITAL DAS CLINICAS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIAS – FUNDAHC e da EMPRESA BRASILEIRA DE SERVIÇOS HOSPITALARES – EBSERH, objetivando “seja deferida, liminarmente e inaudita altera parte, a antecipação dos efeitos da tutela, diante da gravidade da situação, para que as Requeridas concedam ao Requerente a internação no CEROF/HOSPITAL DAS CLINICAS, para a realização de avaliação e cirurgia oftalmológica, com evisceração e enucleação de urgência no globo ocular esquerdo mitigando a proliferação dos fungos, no prazo máximo de 48 (quarenta e oito) horas” (sic).
Ao final, o autor pediu: “g) (...) seja confirmada a antecipação da tutela, bem como a Requerida seja condenada, em definitivo, ao pagamento do tratamento, bem como a arcar com todo o custo da internação, materiais e instrumentos cirúrgicos; h) como pedido alternativo caso, se verifique a impossibilidade de realização dos procedimentos nas dependências das requeridas requer seja determinado a realização de tratamento na rede privada de saúde, com custeio integral pelas requeridas, sob pela de bloqueio e sequestro de valores” (sic) e a condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos morais no valor de dez salários mínimos.
Consta da inicial, em resumo: 1) “O autor é um homem adulto, de 53 anos de idade, que se encontra internado no HOSPITAL DE URGENCIAS OTAVIO LAGE - HUGOL em Goiânia para tratamento do quadro de sinusopatia complicada com celulite orbitaria por provável mucomicose, com acometimento do olho esquerdo.
Necessita de avaliação de evisceração e enucleação de urgência” (sic); 2) “Segundo o laudo médico/odontológico emitido pelo Cirurgião Bucomaxilo Dr.
Luiz Carlos Pires Sobrinho, CRG/GO 20.553 o autor deu entrada no HUGOL no dia 05/05/2023, apresentando paralisia em hemifacie à esquerda, amaurose, edema difuso em região periorbital e bucinatória, além das zonas de necrose em palato duro e em pálpebra inferior” (sic); 3) “Informa que o autor foi submetido a uma primeira intervenção cirúrgica em 06/05/2023, de exérese de tecido para analise histopatológica e realização de cultura, de forma concomitante a realização de sinusectomia maxilar à esquerda” (sic); 4) “Ainda pelo mencionado laudo é possível extrair que a equipe já possui hipótese diagnostica de zigomicose, sendo prescrito ao paciente inicialmente o uso de anfotericina b+ clindamicina + ceftiaxona.
E que o autor foi submetido.
No dia 18/05/2023, a uma segunda intervenção cirúrgica para debridamento de tecidos desvitalizados em regiões: malar, infraorbital, nasal infratemporal, palatar e etmoidal à esquerda além da maxilectomia parcial à esquerda. (dente 24 a 28)” (sic); 5) “E conclui: ao momento, paciente encontra-se sob necessidade de avaliação oftalmológica de urgência devido a amaurose, debito secretivo de pus de forma ativa na região periorbitária e zonas de necrose.
Sendo necessário que o mesmo seja encaminhado a outra Unidade Hospitalar, devido a ausência de profissionais especializados na área de atuação oftalmológica na unidade hospitalar” (sic); 6) “Em linguagem (...), a face esquerda do autor encontra-se tomada por dois fundos, zigomicose (mucomicose) e aspergillus fumigatus, os quais já provocaram a morte de tecidos biológicos, e que implicou na necessidade do desbridamento de diversos tecidos inclusive dentes, conforme indicado alhures” (sic); 7) “ observa-se a necessidade de extração do globo ocular esquerdo, e os tecidos subjacentes, tendo em vista que os tecidos estão mortos e com secreção, fato que contribui com a proliferação dos fungos que podem atingir o lado direito da face do autor e cérebro, levando-o a óbito” (sic); 8) “mesmo após duas intervenções cirúrgicas na face do autor, o olho esquerdo continua a expelir secreção e proliferar fungos” (sic); 9) “mesmo com a intervenção medicamentosa, anfotericina b+ clindamicina + ceftiaxona, a manutenção de tecidos necrosados da face do paciente contribuem para os risco de morte, tendo em vista que o aspergillus fumigatus é atualmente uma das infecções com índices de mortalidade mais elevados, chegando a atingir os 85% mesmo após a administração de terapêutica antifúngica” (sic); 10) “mesmo diante do quadro de urgência e emergência indicado pelos médicos, é possível identificar que o Complexo Regulador do Estado de Goiás não conseguiu disponibilizar ao autor o tratamento exigido pelos médicos assistentes” (sic); 11) “Pelo extrato do complexo regulador é possível identificar que o paciente já passou por três avaliações no Hospital Fundação Banco de Olhos de Goiânia - FUBOG, todavia, em todas as avaliações foi indicado a necessidade de realização de procedimento em um hospital com maior suporte, no caso o CEROF – Centro de Referência em Oftalmologia da Universidade Federal de Goiás, mantido pela UNIÃO, através da FUNDAHC e EBSERH” (sic); 12) “O maior suporte é exigido em razão do grau de especialidade dos profissionais do CEROF e da previsão de utilização de Unidade de Terapia Intensiva, caso o paciente/autor necessite para o pós-operatório.
Sendo certo que na rede publica de Goiás apenas o CEROF/HOSPITAL DAS CLINICAS possuem o aparato necessário para acudir a necessidade urgente do autor” (sic); 13) “Calha ainda informar, que o complexo hospitalar integrado CEROF/HOSPITAL DAS CLINICAS é administrado e mantido em conjunto pela FUNDACAO DE APOIO AO HOSPITAL DAS CLINICAS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIAS – FUNDAHC e EBSERH – EMPRESA BRASILEIRA DE SERVIÇOS HOSPITALARES, ambas vinculadas à União, o que indica a legitimidade passiva para figurar na presente demanda” (sic); 14) “Portanto, Excelência, a presente ação busca a tutela jurisdicional para fins da internação do autor no CEROF/HOSPITAL DAS CLINICAS, para a realização de avaliação e cirurgia oftalmológica, com evisceração e enucleação de urgência no globo ocular esquerdo mitigando a proliferação dos fungos e por consequência o risco de óbito” (sic).
Mediante decisão de fls. 44/51, foram deferidos os benefícios da gratuidade da justiça e a tutela provisória, a fim de determinar que os requeridos adotassem os procedimentos administrativos necessários a fornecer a internação da parte autora em hospital de referência habilitado a realizar o procedimento cirúrgico oftalmológico descrito para o caso incluídos, ainda, todos os procedimentos preparatórios da cirurgia, tais como exames, consultas, material e medicação correlata.
Em caso de inexistência de vagas na rede pública ou conveniada ao SUS para realização do tratamento em referência, a UNIÃO deveria garantir ao autor a internação em hospital da rede privada de saúde habilitado a realizar o procedimento cirúrgico indicado para o caso, incluídos, ainda, todos os procedimentos preparatórios da cirurgia, tais como exames, consultas, material e medicação correlata.
A parte autora peticionou e juntou documentos às fls. 76/81, aduzindo: 1) “A FUNDACAO DE APOIO AO HOSPITAL DAS CLINICAS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIAS – FUNDAHC, fora citada e intimada no ID 1644296374, no dia 30/05/2023, e se limitou inicialmente a informar que a Fundação de Apoio ao Hospital das Clínicas da UFG - FUNDAHC administra financeiramente alguns projetos clínicos do CEROF, e não tem responsabilidade na gestão do hospital” (sic); 2) “se extraí da Certidão ID 1644296374 que a analista de secretaria - SOLANGE CARNEIRO encaminhou (comprovante de e-mail anexado a este) para a DIRETORIA DO CEROF o mandado de CITAÇÃO e INTIMAÇÃO” (sic); 3) “A EBSERH – EMPRESA BRASILEIRA DE SERVIÇOS HOSPITALARES, responsável pelo Hospital das Clínicas, fora citada e intimada no ID 1644386871 1644386849, no dia no dia 30/05/2023 e apenas informou que não cabe a eles providenciar os meios referentes a questões oftalmológicas junto ao hospital das clínicas da UFG” (sic); 3) “Já a UNIÃO FEDERAL fora citada e intimada no ID 1645111873 - Certidão de Oficial de Justiça mantendo-se inerte até a presente data” (sic); 4) “No ID 1646949353 - E-mail (Ofício nº 091 2023 CEROF UFG e mail) o CEROF fora cientificado da decisão e manifestou no ID 1646949356 - Ofício (Ofício nº 091 2023 CEROF UFG), no qual indicou que está em processo de desvinculação do HC- UFG/EBSERH, para qual fora criado inclusive um Grupo de Trabalho A Portaria-SEI nº 71, de 12 de março de 2020” (sic); 5) “Informou ainda, que em razão de uma reforma que se arrasta desde outubro de 2021, não pode realizar o procedimento nas dependências do CEROF, porém em razão da urgência disponibilizou equipe médica do CEROF para realização de cirurgia no hospital das clinicas” (sic); 6) “o paciente encontra-se internado no HUGOL, e em razão da urgência e diante da impossibilidade de realizar o tratamento nas dependências do nosocômio estadual, encaminhou mais uma vez o paciente à FUNDAÇÃO BANCO DE OLHOS, ao qual hoje pela manhã, informou que não consegue realizar o procedimento e solicitou encaminhamento com urgência ao CEROF” (sic); 7) “no dia 04/06 fora realizado exame de tomografia o qual indica que a proliferação de fundos está evoluindo muito rápido, e está bem próxima de atingir ao cérebro, fato que se ocorrer fatalmente levará o autor a óbito” (sic); 8) “No presente caso as requeridas foram intimadas da r.
Decisão de V.
Exª ID 1642659867 ainda no dia 30/05.
Passados 06 dias da intimação, até a presente data não tomaram qualquer medida para internar e tratar o autor tornando imperiosa a instituição de multa diária (ou qualquer outra medida de tempo), incidente no patrimônio pessoal dos representantes das requeridas ou sobre as pessoas físicas respectivas, a fim de compeli-los a cumprir o determinado” (sic); 9) “Assim sendo, requer seja determinada a imediata internação do autor no Hospital das Clinicas de Goiânia, administrado pela EBSERH, para tratamento pela equipe do CEROF, conforme indicado no ofício ID 1646949356” (sic).
Decisão de fls. 82/84 determinou a intimação dos réus para providenciarem a transferência do autor para o Hospital das Clínicas da UFG, onde deveria ser submetido a cirurgia no prazo máximo de 48 (quarenta e oito) horas.
Na oportunidade, ficou consignado que o procedimento cirúrgico deveria ser realizado por equipe disponibilizada pelo CEROF, cabendo aos réus o acompanhamento clínico do paciente, com todas as medidas e despesas a ele inerentes.
Em caso de inexistência de vaga no Hospital das Clínicas ou outro nosocômio da rede pública ou conveniada ao SUS para realização do tratamento em referência, deveriam os réus adotar as medidas, no mesmo prazo de 48 (quarenta e oito) horas, para que o requerente fosse internado em hospital da rede privada de saúde habilitado a realizar o procedimento cirúrgico indicado para o caso, incluídos, ainda, todos os procedimentos preparatórios da cirurgia, tais como exames, consultas, material e medicação correlata” (sic).
A EBSERH manifestou-se às fls. 94/95, aduzindo: 1) “a Superintendência do HC-UFG/EBSERH informou que ‘a regulação do atendimento médico no Hospital das Clínicas, CNES 2338424, é realizada pela Central de Regulação da Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia’, conforme convênio anexo” (sic); 2) “Consta ainda que, ‘segundo informações do Chefe do Setor de Contratualização e Regulação, hoje, dia 05/06/2023, às 14h54 foi dado o aceite no e-mail da Central de Vagas da Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia para admissão no HC-UFG/EBSERH na Unidade de Internação Cirúrgica aos cuidados das equipes médicas de otorrinolaringologia e oftalmologia’” (sic).
Juntou documentos.
A UNIÃO peticionou às fls. 124/126, requerendo que o cumprimento da decisão judicial fosse “direcionado ao ente federado com melhores condições para cumprimento da determinação judicial, a qual demanda uma estrutura material que a União não possui” (sic).
Subsidiariamente, requereu a “dilação de prazo para prestação das informações ou, caso se repute mais eficiente, seja demandado diretamente à CGJUD/MS para prestá-las” (sic). Às fls. 129/147, a UNIÃO apresentou contestação, alegando, em suma: 1) “falta de interesse de agir em relação à União (...) porque A CIRURGIA/internação É REALIZADA PELO SUS e a União NÃO se encontra em mora com sua obrigação de repassar, continuamente, ao Município ao Estado, os recursos federais para o co- financiamento dos serviços do SUS, e, portanto, NÃO concorreu com a negativa de atendimento alegada nesta demanda” (sic); 2) “o procedimento pleiteado nesta contenda é realizado pelo SUS e tem valores e materiais já designados para o procedimento, que é ressarcido mediante AIH, com financiamento através dos recursos do Bloco MAC - Média e Alta complexidade” (sic); 3) “Os procedimentos hospitalares são regulados pelos pactos intermunicipais ou inter-regionais, em suas respectivas PPI, e ressarcidos mediante AIH, com financiamento através dos recursos do Bloco MAC - Média e Alta Complexidade, devendo o pedido do requerente ser direcionado para o Gestor Municipal do SUS e sua respectiva Central de Regulação” (sic); 4) “A União não possui poder hierárquico sobre os prestadores de serviço de saúde localizados em âmbito municipal ou estadual, visto que o seu perfil é de agente fomentador e financiador das ações de saúde, mas não executor/operacional, o que faz o Ministério da Saúde depender de eventual colaboração do gestor local para o efetivo cumprimento da decisão judicial, consistente em providenciar a realização do procedimento cirúrgico” (sic); 5) “a decisão no sentido de determinar o fornecimento de tratamento de saúde não constante do protocolo clínico do SUS deveria ser precedida de perícia judicial, pois só assim é possível aferir com segurança que o presente caso concreto se enquadra na excepcionalidade autorizadora da judicialização da saúde pública: a caracterização de omissão/inadequação da política pública de saúde existente” (sic); 6) “ad cautelam, caso a União venha a ser condenada, o que se admite apenas por remota hipótese, para efetuar algum ressarcimento, inclusive a entidade privada, este somente poderia ser efetivado nos limites da tabela do SUS, e não no valor integral pretendido nesta demanda, já que o ente estatal em nenhuma hipótese poderá arcar com valores superiores àqueles despendidos na esfera pública e devidamente previstos nas regras orçamentárias, senão em grave prejuízo ao erário e à isonomia” (sic); 7) “sendo inestimável o proveito econômico da parte, ante as características precípuas do direito à saúde, devem-se arbitrar os honorários advocatícios por apreciação equitativa, na forma do art. 85, § 8º, do CPC/2015” (sic); 8) deve ser “julgado IMPROCEDENTE O PEDIDO EM FACE DA UNIÃO, porquanto ela não se encontra em mora com sua obrigação de repassar, continuamente, ao Município e ao Estado, os recursos federais para o co-financiamento dos serviços do SUS, e, portanto, NÃO concorreu com a negativa de atendimento alegada nesta demanda” (sic).
A EBSERH apresentou contestação às fls. 161/177, sustentando: 1) “os autos devem tramitar em segredo de justiça uma vez que constam dos diversos documentos que trazem informações sensíveis relativas à intimidade da parte autora, tal como seu prontuário médico, sendo dever do Poder Judiciário e das próprias partes, pelo instituto da colaboração, assegurar a adoção de meios que minimizem os riscos de acesso indevido aos autos por terceiros estranhos à lide” (sic); 2) “a EBSERH requer o tratamento análogo ao de Fazenda Pública, com o reconhecimento da isenção de custas processuais e o pagamento de eventual condenação por meio de precatório” (sic); 3) perda superveniente do interesse processual, tendo em vista que o autor foi operado no dia 07/06/2023; 4) “Acaso não reconhecida a perda do objeto, no mérito, requer o julgamento de IMPROCEDÊNCIA dos pedidos autorais em face do HC-UFG/EBSERH, em razão da competência dos entes federativos para prestação de serviços de saúde, prevista no art. 196 da Constituição Federal, da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RE nº 855178/SE – Tema 793), do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional Federal da 1ª Região” (sic). Às fls. 184, foi declarada a revelia da FUNDAÇÃO DE APOIO AO HOSPITAL DAS CLÍNICAS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS e determinada a intimação das partes para especificação das provas a serem produzidas.
Na fase de especificação de provas, a EBSERH manifestou o desinteresse na produção de novas provas e a UNIÃO requereu a produção de prova pericial.
As demais partes não se manifestaram. É o relatório.
Decido.
Inicialmente, indefiro o pedido formulado pela EBSERH, a fim de que o presente feito passasse a tramitar em segredo de justiça, por não vislumbrar no caso concreto nenhuma das hipóteses previstas no art. 189 do CPC.
Em passo seguinte, verifico que a preliminar de ausência de interesse processual suscitada pela UNIÃO não merece prosperar.
Deve ser destacado que, na análise das condições da ação, aplica-se a teoria da asserção, de modo que o enfrentamento dessas questões processuais deve considerar as alegações da parte autora.
Nesse contexto, é de se ter em mente que a análise do pedido de realização da cirurgia descrita na inicial, à luz das peculiaridades do caso concreto, refere-se ao próprio mérito da causa e, como tal, deve ser examinado.
Ademais, a parte ré apresentou contestação se opondo ao pleito autoral, de modo que resta evidenciada a pretensão resistida.
Assim, rejeito essa preliminar.
Além disso, rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam arguida pela UNIÃO, considerando que o objeto da presente ação é a proteção à vida e à saúde e que a responsabilidade dos entes públicos federados, no que tange a obrigações do SUS, é solidária.
A propósito, confiram o seguinte julgado: AGRAVO DE INSTRUMENTO.
PROCESSUAL CIVIL.
TRATAMENTO MÉDICO.
FORNECIMENTO DE FOSFOETANOLAMINA SINTÉTICA.
LEGITIMIDADE PASSIVAS DE ENTES FEDERADOS.
GRATUIDADE DE JUSTIÇA.
DEFERIMENTO.
FORNECIMENTO DA SUBSTÂNCIA.
TEMA NÃO ANALISADO EM PRIMEIRA GRAU.
SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA.
RECURSO NÃO CONHECIDO NO PARTICULAR. 1.
Cinge-se a questão em torno (I) do reconhecimento da legitimidade passiva ad causam de entes federados; (II) do pedido de gratuita de justiça; e (III) da discussão acerca da concessão da substância FOSFOETANOLAMINA SINTÉTICA para o tratamento do câncer. 2.
O entendimento pacificamente perfilhado por esta E.
Corte quanto ao tema é no sentido de que "Sendo o Sistema Único de Saúde composto pela União, Estados-Membros, Distrito Federal e Municípios, qualquer um deles tem legitimidade para figurar no pólo passivo de demandas que objetivem assegurar, à população carente, o acesso a medicamento e a tratamentos médicos.
Preliminar de ilegitimidade passiva suscitada pela União e pelo Estado de Minas Gerais rejeitada" (AC 0006576-66.2009.4.01.3803 / MG, Rel.
DESEMBARGADOR FEDERAL JIRAIR ARAM MEGUERIAN, SEXTA TURMA, e-DJF1 p.1377 de 18/01/2013).
Assim, a apreciação e julgamento Omissis (TRF1, AG 0061716-38.2015.4.01.0000/DF, Relator DESEMBARGADOR FEDERAL KASSIO NUNES MARQUES, SEXTA TURMA, DJF1 04/07/2016) grifei Outrossim, não merece ser acatada a preliminar de perda superveniente do interesse processual suscitada pela EBSERH, considerando que a cirurgia pleiteada pelo polo ativo no caso concreto só foi realizada por força da decisão deste juízo que deferiu o pedido de tutela provisória.
Compulsando os autos, observo que a documentação coligida aos autos fornece substrato suficiente para o julgamento da causa.
Esse o quadro, indefiro o pedido de produção de prova pericial formulado pela UNIÃO e passo, desde já, ao exame do mérito.
Ao apreciar o pedido formulado em sede de tutela provisória, este juízo assim decidiu: “ (...) O art. 300 do CPC prevê a possibilidade de tutela de urgência de natureza antecipada, estabelecendo como requisitos para tal antecipação a probabilidade do direito, a ser aferida mediante cognição sumária, de viabilidade da versão dos fatos e da tese jurídica defendida pelo autor, conjugada com a presença do perigo de dano irreparável ou risco ao resultado útil do processo, desde que não haja perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.
Acerca do tema discutido nestes autos, a Carta Magna preceitua: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes.
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
Art. 196.
A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
Insta salientar que o intérprete deve entender que tais normas, por sua natureza fundamental, são de aplicabilidade imediata, cabendo ao Poder Público promover sua concretização.
No caso concreto, o autor pretende “seja deferida, liminarmente e inaudita altera parte, a antecipação dos efeitos da tutela, diante da gravidade da situação, para que as Requeridas concedam ao Requerente a internação no CEROF/HOSPITAL DAS CLINICAS, para a realização de avaliação e cirurgia oftalmológica, com evisceração e enucleação de urgência no globo ocular esquerdo mitigando a proliferação dos fungos, no prazo máximo de 48 (quarenta e oito) horas” (sic).
A fim de demonstrar o atual quadro de saúde do autor e a necessidade e urgência do procedimento cirúrgico pretendido, foi apresentado, entre outros documentos, Receituários assinados por médicos integrante dos quadros do HUGOL, onde o requerente está internado, atestando que (vide fls. 26 e 27): “ATESTO A PEDIDO DO PACIENTE, O MESMO DEU ENTRADA NESSA UNIDADE HOSPITALAR NO DIA 05/05/2023, APRESENTANDO PARALISIA EM HEMIFACE À ESQUERDA, AMAUROSE, EDEMA DIFUSO EM REGIÃO PERIORBITÁRIA E BUCINATÓRIA, ALÉM DE ZONAS DE NECROSE EM PALATO DURO E EM PÁLPEBRA INFERIOR, ESSE QUAL SENDO SUBMETIDO A UMA PRIMEIRA INTERVENÇÃO CIRÚRGICA NO DIA 06/05/2023, DE EXERESE DE TECIDO PARA ANÁLISE HISTOPATOLÓGIA E REALIZAÇÃO DE CULTURA, DE FORMA CONCOMITANTE A REALIZAÇAÕ DE SINUSECTOMIA MAXILAR À ESQUERDA.
NESSE MOMENTO, EQUIPE JÁ COM HIPÓTESE DIAGNÓSTICA DE ZIGOMICOSE, SENDO PRESCRITO AO PACIENTE INICIALMENTE O USO DE ANFOTERICINA B + CLINDAMICINA + CEFTRIAXONA.
UMA SEGUNDA INTERVENÇÃO CIRÚRGICA FOI REALIZADA NO DIA 18/05/2023, PARA DEBRIDDAMENTO DE TECIDOS DESVITAIZADOS EM REGIÕES: MALAR, INFRAORBITÁRIA, NASAL, INFRATEMPORAL, PALATAL E ETMOIDAL À ESQUERDA +MAXILECTOMIA PARCIAL À ESQUERDA (DE DENTE 24 A 28).
AO MOMENTO, PACIENTE ENCONTRA-SE SOB NECESSIDADE DE AVALIAÇÃO OFTALMOLÓGICA DE URGÊNCIA DEVIDO AMAUROSE, DÉBITO SECRETIVO DE PUS DE FORMA ATIVA EM REGIÃO PERIORBITÁRIA E ZONAS DE NECROSE.
SENDO NECESSÁRIO QUE O MESMO SEJA ENCAMINHADO A OUTRA UNIDADE HOSPITALAR, DEVIDO A AUSÊNCIA DE PROFISSIONAIS ESPECIALIZADOS NA ÁRIA DE ATUAÇÃO OFTALMOLÓGICA NESSA UNIDADE HOSPITAL”. “ATESTO A PEDIDO DO PACIENTE.
ENCONTRA-SE INTERNADO PARA TRATAMENTO PARA CELULITE DE FACE DE ETIOLOGIA FÚNGICA (ASPERGILLUS) FULMINANTE, COM ACOMETIMENTO DE FACE E ÓRBITA ESQUERDA, COM PERDA DE FUNCIONALIDADE DA VISÃO IPSILATERAL.
SEGUE EM USO DE ANTIFÚNGICO ENDOVENOSO.
EM ACOMPANHAMENTO COM CLÍNICA MÉDICA E BUCOMAXILO, NECESSITANDO DE AVALIAÇÃO E SEGUIEMNTO DE URGÊNCIA COM OFTALMOLOGIA, ESPECIALIDADE QUE O HOSPITAL NÃO POSSUI, NECESSITANDO DE TRANSFERÊNCIA PARA OUTRA UNIDADE” Esse o cenário, tem-se por demonstrada prima facie a gravidade do quadro de saúde da parte autora, ensejando a imposição ao Estado de cumprimento de obrigação que a própria Constituição Federal lhe atribui.
A jurisprudência já está sedimentada no sentido de se assegurar ao cidadão o tratamento necessário a sua sobrevivência.
Nesse sentido, confira-se a seguinte ementa do STJ: RECURSO ESPECIAL.
SUS.
FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO.
PACIENTE PORTADOR DO VÍRUS HIV.
DIREITO À VIDA E À SAÚDE.
DEVER DO ESTADO. 1.
Ação ordinária objetivando a condenação do Estado do Rio Grande do Sul e do Município de Porto Alegre ao fornecimento gratuito de medicamento não registrado no Brasil, mas que consta de receituário médico, necessário ao tratamento de paciente portador do vírus HIV. 2.
O Sistema Único de Saúde - SUS visa a integralidade da assistência à saúde, seja individual ou coletiva, devendo atender aos que dela necessitem em qualquer grau de complexidade, de modo que, restando comprovado o acometimento do indivíduo ou de um grupo por determinada moléstia, necessitando de determinado medicamento para debelá-la, este deve ser fornecido, de modo a atender ao princípio maior, que é a garantia à vida digna. 3.
Configurada a necessidade do recorrente de ver atendida a sua pretensão, posto legítima e constitucionalmente garantida, uma vez assegurado o direito à saúde e, em última instância, à vida.
A saúde, como de sabença, é direito de todos e dever do Estado. 4.
Precedentes desta Corte, entre eles, mutadis mutandis, o Agravo Regimental na Suspensão de Tutela Antecipada nº 83/MG, Relator Ministro EDSON VIDIGAL, Corte Especial, DJ de 06.12.2004: "1.
Consoante expressa determinação constitucional, é dever do Estado garantir, mediante a implantação de políticas sociais e econômicas, o acesso universal e igualitário à saúde, bem como os serviços e medidas necessários à sua promoção, proteção e recuperação (CF/88, art. 196). 2.
O não preenchimento de mera formalidade – no caso, inclusão de medicamento em lista prévia – não pode, por si só, obstaculizar o fornecimento gratuito de medicação a portador de moléstia gravíssima, se comprovada a respectiva necessidade e receitada, aquela, por médico para tanto capacitado.
Precedentes desta Corte. 3.Concedida tutela antecipada no sentido de, considerando a gravidade da doença enfocada, impor, ao Estado, apenas o cumprimento de obrigação que a própria Constituição Federal lhe reserva, não se evidencia plausível a alegação de que o cumprimento da decisão poderia inviabilizar a execução dos serviços públicos." 5.
Ademais, o STF sedimentou entendimento no sentido de que "PACIENTE COM HIV/AIDS - PESSOA DESTITUÍDA DE RECURSOS FINANCEIROS - DIREITO À VIDA E À SAÚDE - FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS - DEVER CONSTITUCIONAL DO PODER PÚBLICO (CF, ARTS. 5º, CAPUT, E 196) - PRECEDENTES (STF) - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.
O DIREITO À SAÚDE REPRESENTA CONSEQÜÊNCIA CONSTITUCIONAL INDISSOCIÁVEL DO DIREITO À VIDA. - O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196).
Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir, aos cidadãos, inclusive àqueles portadores do vírus HIV, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar. - O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida.
O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional.
A INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROGRAMÁTICA NÃO PODE TRANSFORMÁ- LA EM PROMESSA CONSTITUCIONAL INCONSEQÜENTE. - O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado.
DISTRIBUIÇÃO GRATUITA DE MEDICAMENTOS A PESSOAS CARENTES. - O reconhecimento judicial da validade jurídica de programas de distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes, inclusive àquelas portadoras do vírus HIV/AIDS, dá efetividade a preceitos fundamentais da Constituição da República (arts. 5º, caput, e 196) e representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas que nada têm e nada possuem, a não ser a consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade.
Precedentes do STF." (RE 271286 AgR/RS, Relator Min.
CELSO DE MELLO, Segunda Turma, DJ de 24.11.2000) 6.
Recursos especiais desprovidos. (STJ RESP 684646 Processo: 200401187914/RS 1ª Turma Data da decisão: 05/05/2005 Documento: STJ000614292 DJ DATA:30/05/2005 P.:247 Relator(a) LUIZ FUX).
Assim, evidencia-se a probabilidade de êxito da tese esposada na inicial.
Presente a probabilidade de êxito da tese autoral, analiso o segundo requisito autorizador da antecipação da tutela pretendida.
Com relação ao periculum in mora, é evidente a presença do mesmo, pois o estado geral do requerente é grave, havendo o risco de morte caso não sejam disponibilizadas a internação em unidade especializada em oftalmologia, a avaliação e cirurgia oftalmológica de que necessita, a fim de garantir ao autor a sobrevivência com um mínimo de dignidade.
Por outro lado, a determinação para que o Estado disponibilize vaga de internação e cirurgia, incluídos os procedimentos inerentes à realização do referido ato médico, para um único paciente não apresenta potencial lesivo capaz de provocar sérios danos à ordem, à saúde ou à economia públicas.
Deve ser destacado que, se fosse efetuar uma interpretação isolada do art. 300, § 3º, do CPC/2015, dissociada dos temperamentos impostos pelo princípio constitucional da razoabilidade, não se poderia conceder a tutela de urgência, visto que, diante da situação econômica da parte autora, não se poderia exigir contra cautela, e a reversão aos cofres da ré dos valores pagos com a internação seria quase que impossível.
Não obstante, mesmo em caso de possibilidade de irreversibilidade da situação fática gerada pelo provimento da antecipação da tutela, há que se fazer a ponderação, aplicando-se o princípio constitucional da razoabilidade, entre os interesses em perigo de perecimento.
No presente caso, em não havendo a antecipação dos efeitos da tutela, há perigo de perecimento da sobrevivência com o mínimo de dignidade por parte do autor; e,
por outro lado, caso ocorra a antecipação, há possibilidade de prejuízo econômico para a ré.
Diante deste conflito, prefiro antecipar os efeitos da tutela e resguardar a sobrevivência da pessoa debilitada com o mínimo de dignidade.
Por fim, dadas as peculiaridades do caso, é oportuno destacar que, se se trata de tratamento aparentemente previsto em rol do SUS, sua realização deve se dar preferencialmente em hospital da rede pública ou conveniada ao SUS com aptidão técnica para os procedimentos pré-operatórios, de internação e cirúrgicos como um todo.
Contudo, caso se mostre necessária a internação do autor em hospital particular, dada eventual inviabilidade de atendimento do autor na rede pública, conforme pedido que também constou da inicial, é oportuno destacar, desde logo, que tal observará a tese fixada pelo STF no julgamento do tema 1.033, in verbis: Tese: O ressarcimento de serviços de saúde prestados por unidade privada em favor de paciente do Sistema Único de Saúde, em cumprimento de ordem judicial, deve utilizar como critério o mesmo que é adotado para o ressarcimento do Sistema Único de Saúde por serviços prestados a beneficiários de planos de saúde. (grifei) Ementa: Direito constitucional e sanitário.
Recurso extraordinário.
Repercussão geral.
Impossibilidade de atendimento pelo SUS.
Ressarcimento de unidade privada de saúde. 1.
Em razão da ausência de vaga na rede pública, decisão judicial determinou o atendimento de paciente em hospital privado, às expensas do Poder Público.
Discute-se, no presente processo, o critério a ser utilizado para esse ressarcimento. 2.
O acórdão recorrido fixou o reembolso no montante cobrado pelo estabelecimento hospitalar privado, que considerou ser o valor praticado no mercado.
O Distrito Federal, por sua vez, postula no presente recurso que o valor do ressarcimento tenha como limite a Tabela do SUS. 3.
A Constituição admite duas modalidades de execução de serviços de saúde por agentes privados: a complementar e a suplementar.
A saúde complementar designa ações e serviços de saúde que a entidade privada pratica mediante convênio com o Poder Público e sujeitando-se às regras do SUS. 4.
A saúde suplementar, por sua vez, abrange atividades de profissionais de saúde, clínicas, hospitais particulares e operadoras de planos de saúde que não têm uma relação negocial com o Poder Público, sujeitando-se, apenas, à regulação da Agência Nacional de Saúde – ANS. 5.
O ressarcimento, segundo as diretrizes e valores do SUS, a um agente privado que não aderiu ao sistema público pela celebração de convênio, viola a livre iniciativa (CF, art. 170, caput) e a garantia de propriedade privada (CF, arts. 5º, XXII e 170, II).
Por outro lado, a execução privada do serviço de saúde não afasta sua relevância pública (CF, art. 177). 6.
Diante disso, é razoável que se adote, em relação ao ressarcimento da rede privada, o mesmo critério utilizado para ressarcimento do Sistema Único de Saúde por serviços prestados a beneficiários de planos de saúde.
Até dezembro de 2007, tal critério era a Tabela Única Nacional de Equivalência de Procedimentos – TUNEP.
Após, passou a ser a Tabela do SUS, ajustada de acordo com as regras de valoração do SUS e multiplicada pelo Índice de Valoração do Ressarcimento – IVR. 7.
Os valores de referência constantes da TUNEP, bem como o IVR multiplicador da Tabela do SUS, são fixados pela ANS, que tem o dever de atuar como árbitro imparcial do sistema.
Naturalmente, sempre poderá ser feita uma avaliação da existência efetiva e razoabilidade dos tratamentos adotados. 8.
Recurso extraordinário provido em parte, com a fixação da seguinte tese de julgamento: “O ressarcimento de serviços de saúde prestados por unidade privada em favor de paciente do Sistema Único de Saúde, em cumprimento de ordem judicial, deve utilizar como critério o mesmo que é adotado para o ressarcimento do Sistema Único de Saúde por serviços prestados a beneficiários de planos de saúde”. (RE 666094, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 30/09/2021, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-020 DIVULG 03-02-2022 PUBLIC 04-02-2022) Tema 1033 - Saber se a imposição de pagamento pelo Poder Público de preço arbitrado pela unidade hospitalar, para ressarcir serviços de saúde prestados por força de decisão judicial, viola o regime de contratação da rede complementar de saúde pública (art. 199, §§ 1º e 2º, da CF/1988).
Ante o exposto, decido: 1) defiro o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, a fim de determinar que os requeridos adotem os procedimentos administrativos necessários a fornecer a internação da parte autora em hospital de referência habilitado a realizar o procedimento cirúrgico oftalmológico descrito para o caso incluídos, ainda, todos os procedimentos preparatórios da cirurgia, tais como exames, consultas, material e medicação correlata; 2) também defiro a tutela provisória, garantindo ao autor, apenas no caso de inexistência de vagas na rede pública ou conveniada ao SUS para realização do tratamento em referência (item 1, supra), que seja internado em hospital da rede privada de saúde habilitado a realizar o procedimento cirúrgico indicado para o caso, incluídos, ainda, todos os procedimentos preparatórios da cirurgia, tais como exames, consultas, material e medicação correlata; 2.1) a providência fixada no item 2, supra, correrá a expensas da UNIÃO; 2.2) para fins de eventual efetivação da providência constante do item 2, supra, deverá o autor apresentar nos autos a identificação completa do nosocômio particular apto à realização do procedimento cirúrgico ora descrito e orçamento em conformidade com as diretrizes fixadas pelo STF no Tema 1.033”.
Compulsando os autos, não se vislumbra a existência de elementos hábeis a alterar o quadro fático e jurídico delineado à época da análise do pleito de tutela provisória, de modo que o raciocínio externado naquela oportunidade quanto ao meritum causae subsiste incólume.
Examino o pedido de condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos morais.
Aduz a parte autora que deve ser indenizada “pelo sofrimento de necessitar de urgente procedimento cirúrgico, pelo desgaste de procurar seus direitos estando com doença grave que impossibilita a locomoção e, ainda, como medida pedagógica” (sic).
Embora se reconheça que o ora autor tenha sofrido enorme desgaste com a não realização imediata do procedimento cirúrgico de que necessitava pela parte ré, não se pode desconsiderar que as dificuldades notórias de atendimento universal à saúde retiram a possibilidade de responsabilização das rés.
Com efeito, o Sistema Brasileiro de Atendimento à Saúde tem uma abrangência dificilmente verificada em outros países.
Essa atitude estatal de buscar atendimento universal gera dificuldades gerenciais de abertura de fontes financeiras.
A fixação de reparação por danos morais só geraria maior dificuldade financeira ao Estado, impedindo o alcance do propósito de atendimento universal à saúde da população.
Não se pode esquecer que a intervenção judicial se deu de forma excepcional, interferindo na condução das opções do gestor público, para resolver a situação do ora autor, resguardando direito fundamental desse.
Assim, diante da notória escassez de recursos e da imensa demanda gerada pela audaciosa opção constitucional, não se poderia qualificar a conduta omissiva dos entes que compõem o polo passivo como hábil a ensejar reparação moral.
Da mesma forma que se buscou harmonizar a dificuldade orçamentária das rés com o direito à proteção à vida e à saúde, fazendo com que prevalecessem os valores vida e saúde, neste momento, considera-se necessário desconsiderar eventual valor moral individual, a fim de que prevaleça melhor condição financeira estatal para atender os encargos da saúde coletiva.
Ante o exposto: A) julgo procedente o pedido de realização de procedimento cirúrgico, confirmando os efeitos da decisão que deferiu a tutela provisória; B) julgo improcedente o pedido de condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos morais.
Considerando a situação de intensa judicialização da saúde, o que notoriamente agrava a situação de deficiência de recursos dos entes públicos, com base no princípio da razoabilidade, entendo adequado afastar nesse tipo de ação os ônus da sucumbência.
Isso porque, se há uma excepcionalidade que justifique a intervenção judicial para determinar uma ação de saúde ao Executivo, também há que se considerar a excepcionalidade de agravar o menos possível a situação financeira catastrófica dos entes públicos, afastando condenação em honorários advocatícios.
Em nome do princípio da equidade, também deixo de condenar o autor ao pagamento de verba honorária em favor das rés.
Sem custas finais.
Após o trânsito em julgado e nada sendo requerido, arquivem-se.
P.R.I.
Goiânia, vide data da assinatura no rodapé.
Documento assinado eletronicamente pelo Juiz Federal abaixo identificado -
29/05/2023 12:45
Recebido pelo Distribuidor
-
29/05/2023 12:45
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
29/05/2023
Ultima Atualização
15/12/2023
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Despacho • Arquivo
Sentença Tipo A • Arquivo
Decisão • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
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