TRF1 - 1000954-09.2025.4.01.3906
1ª instância - Paragominas
Polo Ativo
Polo Passivo
Advogados
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Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
-
07/03/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Paragominas-PA Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Paragominas-PA PROCESSO: 1000954-09.2025.4.01.3906 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: OZIEL MIRANDA DA SILVA REPRESENTANTES POLO ATIVO: ALISON BERNARDINO FARIAS - PA31171 POLO PASSIVO:UNIÃO FEDERAL e outros DECISÃO Trata-se de ação de procedimento comum ajuizada por OZIEL MIRANDA DA SILVA em face da UNIÃO FEDERAL e da FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS (FGV), objetivando. liminarmente, a suspensão de ato administrativo que eliminou o autor das vagas destinadas a candidatos negros do concurso público, reservando a vaga e com direito à nomeação, posse e exercício.
Aduz o autor que é autodeclarado pardo e se inscreveu no concurso público para concorrer às vagas destinadas a candidatos negros para o cargo de Analista Judiciário do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), conforme o Edital nº 1/2024.
Informou que após aprovação nas provas objetiva e discursiva, foi convocado para o procedimento de heteroidentificação, conduzido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), no entanto a comissão avaliadora não o reconheceu como pessoa negra (preta ou parda), com a justificativa que “não foi identificado características fenotípicas que justificassem a classificação do candidato como pessoa negra, foram observadas características como: boca fina, nariz estreito e cabelos lisos”, resultando em sua eliminação das vagas reservadas para ações afirmativas.
Alega, por fim, que recorreu administrativamente, apresentando documentos, incluindo laudo técnico, fotos e aprovações anteriores em concursos como cotista, para comprovar sua condição de pardo.
Contudo, a comissão manteve a decisão sem fundamentação adequada, limitando-se a repetir a argumentação inicial.
Com a inicial, vieram a procuração e documentos (ID 2172249291).
Dada a urgência, os autos vieram conclusos. É o breve relatório.
Decido.
No que se refere ao pedido de liminar, sabe-se que todo provimento de urgência encontra-se vinculado ao preenchimento de duas exigências: fumus boni iuris e periculum in mora.
Nesse sentido, nos dizeres de Elpídio Donizetti: dar-se o nome de tutela provisória ao provimento jurisdicional que visa adiantar os efeitos da decisão final no processo ou assegurar o seu resultado prático.
A tutela provisória (cautelar ou antecipada) exige dois requisitos: a probabilidade do direito substancial (o chamado fumus boni iuris) e perigo de dano ou risco de resultado útil do processo (periculum in mora). (...) Na tutela denominada de evidência (as hipóteses estão contempladas no art. 311), a probabilidade do direito é de tal ordem que dispensa o perigo de dano o risco do resultado útil do processo – dispensa a urgência.
Ressalta-se que o acolhimento do pedido de tutela provisória pressupõe a presença cumulativa dos elementos acima delineados, a teor do disposto no art. 300 do Código de Processo Civil de 2015, bem como importante observar que o §3º do supracitado artigo traz como requisito para a tutela provisória de urgência a possibilidade de reversão dos efeitos da decisão.
Noutro giro, o instituto em espeque requer, como pressuposto de ordem lógica, a necessidade da medida.
Em um exame perfunctório dos fatos e fundamentos expendidos, entendo cabíveis os requisitos que autorizam a concessão da tutela de urgência.
Isso porque, no presente caso, os argumentos aduzidos pela parte autora demonstram, pelo menos num juízo preliminar, a plausibilidade do direito vindicado, vejamos.
De acordo a Lei nº 12.990/2014, “poderão concorrer às vagas reservadas a candidatos negros aqueles que se autodeclararem pretos ou pardos no ato da inscrição no concurso público, conforme o quesito cor ou raça utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE” (art. 2º).
Ocorre que o IBGE não estabelece quais as características definidoras de cada um dos quesitos de cor ou raça que atualmente utiliza (negro, pardo, indígena, amarelo ou branco).
Ou seja, não há em vigor diploma normativo que defina critérios objetivos para diferenciar pessoas negras, pardas, indígenas, amarelas ou brancas.
Na verdade, o IBGE utiliza apenas a autodeclaração como método de determinação da cor ou raça de cada indivíduo.
Nesse contexto, pode-se afirma que o atual cenário legislativo estabelece como única forma de determinação de cor ou raça a autodeterminação, conforme o art. 2º da Lei nº 12.990/2014, que reproduziu o critério definido no art. 1º, IV, da Lei nº 12.288/2010 (Estatuto da Igualdade Racial).
Veja-se que, apesar de a Lei nº 12.990/2014 ter previsto a possibilidade de exclusão do certame, e até mesmo dos quadros do serviço público, em caso de declaração falsa, a verdade é que, conforme dito acima, não há norma ou parâmetro estabelecido que possibilite avaliar a cor das pessoas.
Ainda que se pudesse considerar como válida a possibilidade da Administração Pública suprir a lacuna legislativa e criar critério de diferenciação de cor entre os candidatos, tais critérios deveriam ser expressa e claramente previstos no Edital do concurso, o que não ocorre no presente caso, uma vez que o instrumento editalício (ID 2172250372) limitou-se a estabelecer que a comissão para avaliar tal quesito “utilizará exclusivamente o critério fenotípico para aferição da condição declarada pelo candidato” (item 7.7.4), não sendo efetivamente possível compreender quais os critérios objetivos que serão utilizados para apreciar as características físicas, morfológicas e fisiológicas dos candidatos.
Nesse passo, com suporte no item acima descrito, a banca examinadora considerou que o autor não se enquadrava nos critérios da Lei nº 12.990/2014, sob o fundamento de que “não foi identificado características fenotípicas que justificassem a classificação do candidato como pessoa negra, foram observadas características como: boca fina, nariz estreito e cabelos lisos” (ID 2172250344).
Como se vê, a decisão da Comissão Examinadora sobre a presença de características fenotípicas do candidato envolve uma dose considerável de subjetividade, dada a significativa miscigenação em nossa população e a falta de critérios objetivos para de diferenciação de cor entre os candidatos.
Ademais, o edital não estabeleceu que esse seria o critério a ser analisado, de modo que a comissão utilizou procedimento não constante do Edital para aferir a cor ou raça dos candidatos, o que torna nula a decisão administrativa que desqualificou a autodeclaração de cor apresentada pelo autor, que, aliás, já foi considerado pardo em outras ocasiões e para o mesmo propósito, conforme evidenciado pelos documentos de Certificado de Habilitação do Exame Nacional de Magistratura realizado pela banca FGV em 2024 e aprovação em cargo de Técnico Administrativo do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) realizado pela banca Cesbrape em 2018 (ID 2172250432/2172250438).
Assim, mesmo considerando que a avaliação da condição de negro ou pardo envolva certo grau de subjetividade, o reconhecimento por comissões anteriores, em seleções similares, de que a parte autora possui características típicas de pessoas pardas/pretas torna a decisão da comissão atual desarrazoada, inadmissível e fora da sua esfera legítima de atuação.
Nesse sentido já decidiu este Egrégio Tribunal: ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
CONCURSO PÚBLICO.
LEI 12.990/2014.
VAGA DESTINADA A CANDIDATO NEGRO E PARDO.
AUTODECLARAÇÃO.
COMISSÃO DE VERIFICAÇÃO.
HETEROIDENTIFICAÇÃO.
DECISÕES CONFLITANTES.
FALTA DE RAZOABILIDADE E INCOERÊNCIA ADMINISTRATIVA.
RECONHECIMENTO DO FENÓTIPO PARDO DO CANDIDATO EM CERTAMES ANTERIORES.
VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA ISONOMIA.
SEGURANÇA CONCEDIDA.
SENTENÇA MANTIDA.
RECURSO PROVIDO. 1.
No julgamento da Ação Direta de Constitucionalidade nº 41, de relatoria do Ministro Roberto Barroso, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade da reserva de vagas a candidatos negros, bem como a legitimidade na utilização de critérios subsidiários de heteroidentificação.
Precedente do TRF1. 2.
A recorrente já foi considerada em cotista em outros 05 concursos, dessa forma não verifico nenhuma justificativa plausível para o fato da banca examinadora obter conclusões completamente diferentes de outros cinco procedimentos de heteroidentificação realizados por bancas examinadoras diferentes (Prouni, na UNB, na UFMG, pelo Cebraspe e pela FGV), o que demonstra a elevada carga de subjetivismo na avaliação da autora.
Parte superior do formulário de todo modo, não se revela plausível que a administração atue de forma tão incoerente, sendo necessário assegurar a razoabilidade e a isonomia no tratamento aos cidadãos em questões idênticas ou muito semelhantes. 3.
Na espécie, mesmo considerando que a avaliação da condição de negro ou pardo envolva certo grau de subjetividade, o reconhecimento por cinco comissões anteriores, em bancas diferentes, em seleções similares, de que a parte autora possui características típicas de pessoas pardas/pretas torna a decisão da comissão atual desarrazoada, inadmissível e fora da sua esfera legítima de atuação . 4.
Na espécie, diante dos elementos trazidos aos autos pelas partes, não se vislumbra qualquer indício de inconsistência contida na autodeclaração apresentada pela candidata desclassificada, mesmo em face dos critérios fenotípicos referenciados, tendo o acervo documental apresentado pelo autora (documentos oficiais com foto e fotografias) demonstrado de forma contundente seu fenótipo pardo, sem espaço para que se argumente por possíveis artifícios ou manipulações das imagens apresentadas, ao passo que as decisões administrativas que não a consideraram como negra, por sua vez, se apresentam igualmente desprovidas de motivação idônea..
Precedente do TRF1 5.
Apelação provida. (TRF-1 - APELAÇÃO CIVEL: 10448252620234013400, Relator.: DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE LARANJEIRA, Data de Julgamento: 01/04/2024, DÉCIMA-SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: PJe 01/04/2024 PAG PJe 01/04/2024 PAG) Por fim, observa-se que os assentos funcionais do autor no seu órgão de trabalho (TRF da 1ª Região, mesmo órgão para o qual prestou o presente concurso) trazem a informação de que sua cútis é negro/preto (ID 2172250438, fl. 02), o que apenas reforça a veracidade da autodeclaração por ele prestado.
Quanto ao requisito do dano ou risco ao resultado útil do processo, resta também evidenciado, no plano de cognição sumária, pois o concurso público em comento já fora homologado, bem como já houve as primeiras nomeações e, eventual classificação fora do contexto acima fundamento pode prejudicar eventual nomeação do autor, ainda mais considerando-se a escassez de cargos vagos no âmbito do TRF da 1ª Região.
A eventual reversibilidade da medida advém da possibilidade de retorno do candidato a classificação pretérita, bem como ajuste de classificação no critério de cotas ou ampla concorrência.
Preenchidos os requisitos exigidos pelo art. 300, caput, do CPC/2015, a concessão da tutela requerida é medida que se impõe.
Ante o exposto: 1.
DEFIRO a tutela provisória, para determinar a suspensão a decisão da Banca Examinadora que deixou de considerar o autor como negro para os fins da Lei nº 12.990/2014, devendo a UNIÃO e o FGV incluí-lo na listagem de cotas de vagas destinadas a negros. 1.1.
INTIME-SE a UNIÃO e a FGV para inclui o autor na listagem de cotas de vagas destinadas a negros. 2.
Considerando ser o autor servidor público federal e não haver demonstração de hipossuficiência para arcar com os ônus processuais, indefiro o pedido de gratuidade judiciária e concedo o prazo de 5 (cinco) dias para que providencie o recolhimento das custas processuais, sob pena de cancelamento da distribuição. 3.
DETERMINO a citação das partes requeridas para contestarem no prazo de 15 (quinze) dias, nos termos do art. 335, inciso III do CPC/15. 4.
Contestada a demanda pelas requeridas com a juntada de documentos, intime-se a parte autora para réplica e para indicar as provas que pretende reproduzir, apontando, desde logo, a finalidade de cada uma delas, no prazo de 15 (quinze) dias; 5.
No mesmo prazo, fica as requeridas intimado para, caso queira, indicar as provas que pretende produzir e a sua respectiva finalidade.
Por conseguinte, com ou sem manifestação pela produção probatória, façam-me os autos conclusos.
Intimem-se.
Paragominas/PA, (data da assinatura eletrônica). (assinado eletronicamente) Juiz(a) Federal -
17/02/2025 11:36
Recebido pelo Distribuidor
-
17/02/2025 11:36
Autos incluídos no Juízo 100% Digital
-
17/02/2025 11:36
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
17/02/2025
Ultima Atualização
07/03/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Despacho • Arquivo
Despacho • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
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