TRF1 - 1058256-66.2024.4.01.3700
1ª instância - 8ª Sao Luis
Polo Ativo
Advogados
Polo Passivo
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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10/04/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Maranhão 8ª Vara Federal Ambiental e Agrária da SJMA SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1058256-66.2024.4.01.3700 CLASSE: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) POLO ATIVO: DAGOBERTO ANTONIO FAEDO REPRESENTANTES POLO ATIVO: SONIVALTAIR DA SILVA CASTANHA - MA17474 POLO PASSIVO:(GO) SUPERINTENDENTE DO INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS (IBAMA) e outros SENTENÇA Trata-se de mandado de segurança impetrado por Dagoberto Antonio Faedo, com pedido de liminar, em face do Superintendente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA/MA e de Pedro José Pereira Neto, agente ambiental federal vinculado ao referido órgão.
O impetrante alega, em síntese: (a) que é proprietário da Fazenda Água Branca, situada no município de Riachão/MA, com área total de 6.004,69 ha, das quais 633,5 ha foram objeto de embargo ambiental; (b) que possui licenciamento ambiental válido emitido pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Naturais do Maranhão – SEMA/MA, por meio da LUAR nº 3011343/2019 e da RELUA nº 3069173/2023, autorizando atividades agrossilvipastoris; (c) que o IBAMA teria embargado irregularmente área licenciada, fundamentando-se em erro de identificação territorial, uma vez que as coordenadas indicadas apontam para zona urbana; (d) que o auto de infração (nº 8B7IJFDL) e o Termo de Embargo (nº G0GIQ715) foram lavrados sem observância do devido processo legal, comprometendo a atividade produtiva da fazenda e restringindo seu acesso a mercados e crédito rural.
O impetrante sustenta, em síntese, que a área embargada está devidamente licenciada para atividades agrossilvipastoris, consoante a Licença Única Ambiental de Regularização nº 3011343/2019 (LUAR) e sua renovação, sob o nº 3069173/2023 (RELUA), expedidas pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Naturais do Maranhão — SEMA/MA.
Com base nesses fatos, requereu: (a) em sede de tutela de urgência, a suspensão imediata dos efeitos do Termo de Embargo G0GIQ715 e do Auto de Infração nº 8B7IJFDL; (b) a declaração de nulidade dos atos administrativos lavrados pelo IBAMA; (c) a liberação da área embargada de 633,5 ha; (d) a retirada do registro de embargo nos sistemas do IBAMA e em outras plataformas de consulta pública ou de terceiros.
O juízo proferiu decisão interlocutória em 16/08/2024 (ID n.º 2143201245), na qual se reconheceu que a análise do pedido liminar demandaria a complementação da prova pré-constituída, determinando-se ao impetrante a emenda da inicial no prazo de 15 dias para apresentação: (a) do relatório de fiscalização elaborado pelo IBAMA; (b) da carta-imagem utilizada para embasar a autuação; (c) do processo administrativo completo referente à renovação da licença ambiental RELUA nº 3069173/2023.
O impetrante protocolou petição intercorrente (ID n.º 2148160085) instruída com: (a) processo administrativo completo da RELUA; (b) relatório de fiscalização lavrado pelo agente autuante; (c) carta-imagem plotada utilizada como base para a autuação.
O juízo entendeu necessária a oitiva da autoridade impetrada antes da apreciação da liminar (ID n.º 2149487671), determinando que o IBAMA, no prazo de 10 dias: (a) prestasse informações; (b) juntasse o processo administrativo sancionador completo; (c) manifestasse-se sobre os documentos apresentados pelo impetrante.
O IBAMA, por sua vez, apresentou manifestação (ID n.º 2155917304) sustentando que a fiscalização decorreu da Operação Polígonos III (2019); (b) que o desmatamento de 633,5 ha de vegetação nativa teria ocorrido entre 2016 e 2019, sem autorização válida; (c) que as licenças apresentadas (LUAR/2019 e RELUA/2023) não regularizam o passivo ambiental anterior; (d) que o embargo é medida cautelar legítima amparada na legislação ambiental e que a publicidade das informações é obrigatória; (e) que o princípio da precaução justifica a manutenção do embargo até o cumprimento das condicionantes legais.
O processo administrativo sancionador nº 02012.001703/2024-27 foi juntado aos autos, demonstrando relato da ausência de documentação válida da Fazenda Água Branca no momento da fiscalização e referência à apresentação de documentos relativos a outro imóvel (Fazenda Pau Ferrado), sem vínculo com a área embargada.
Em nova decisão interlocutória (ID n.º 2156788029), o juízo reconheceu que o IBAMA atuou no exercício do poder de polícia ambiental, mas que eventual ilegalidade quanto à ausência de licenciamento anterior deveria ser apurada pela SEMA/MA, órgão competente para o licenciamento.
Asseverou, em sede de cognição sumária, que a Fazenda Água Branca possui licenciamento ambiental válido e que a manutenção do embargo geraria efeitos desproporcionais sobre atividade presumidamente regular, deferindo a tutela de urgência para suspender os efeitos do Termo de Embargo G0GIQ715, exclusivamente em relação ao Auto de Infração nº 8B7IJFDL.
Admitiu, ainda, o ingresso do IBAMA como litisconsorte passivo e determinou a remessa dos autos ao Ministério Público Federal.
O Ministério Público Federal opinou (ID n.º 2159979459) pela improcedência do pedido inicial, sustentando que o desmatamento de 633,5 ha ocorreu entre 2016 e 2019 e que a licença LUAR de 2019 não convalida atos pretéritos ilegais.
Ressaltou que não foi apresentada Autorização de Supressão de Vegetação para o período em questão e que o IBAMA atuou dentro da sua competência fiscalizatória, nos termos da LC 140/2011.
Asseverou, por fim, que não há sobreposição de competências entre IBAMA e SEMA/MA no caso concreto e que a revogação da liminar se justifica pela gravidade do dano ambiental e pela necessidade de preservação do bioma Cerrado.
Vieram os autos conclusos. É o relatório.
Decido.
O mandado de segurança, ação constitucional com regulamentação legal prevista na Lei nº 12.016/2009, visa “proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça” (art. 1º).
Requer, desse modo, a apresentação de prova pré-constituída do fato que demonstre o direito líquido e certo alegado pelo impetrante, de tal forma que se evidencie a respectiva violação, haja vista a ação inadmitir dilação probatória.
Feita esta breve introdução, cumpre voltar a atenção à controvérsia estabelecida nos autos, que diz respeito, em essência, a competência do IBAMA para autuação por ilícito ambiental quando a licença autorizadora da atividade haja sido expedida pelo órgão estadual componente do SISNAMA e se a extensão dos efeitos da Licença Única Ambiental de Regularização - LUAR obtida pelo impetrante lhe franquearia a supressão de vegetação nativa na área nela prevista.
No que diz com a competência material do IBAMA, faz-se necessário rememorar que a LC nº 140/2011 consagrou um regime de cooperação entre os órgãos ambientais e traçou diretrizes de atuação de cada um, justamente para evitar sobreposição de atribuições entre estes.
O art. 17 assim estabelece: Art. 17.
Compete ao órgão responsável pelo licenciamento ou autorização, conforme o caso, de um empreendimento ou atividade, lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo para a apuração de infrações à legislação ambiental cometidas pelo empreendimento ou atividade licenciada ou autorizada. § 1º Qualquer pessoa legalmente identificada, ao constatar infração ambiental decorrente de empreendimento ou atividade utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores, pode dirigir representação ao órgão a que se refere o caput, para efeito do exercício de seu poder de polícia. § 2º Nos casos de iminência ou ocorrência de degradação da qualidade ambiental, o ente federativo que tiver conhecimento do fato deverá determinar medidas para evitá-la, fazer cessá-la ou mitigá-la, comunicando imediatamente ao órgão competente para as providências cabíveis. § 3º O disposto no caput deste artigo não impede o exercício pelos entes federativos da atribuição comum de fiscalização da conformidade de empreendimentos e atividades efetiva ou potencialmente poluidores ou utilizadores de recursos naturais com a legislação ambiental em vigor, prevalecendo o auto de infração ambiental lavrado por órgão que detenha a atribuição de licenciamento ou autorização a que se refere o caput.
O art. 17, § 3º destacado foi questionado por meio da ADI 4.757/DF, tendo o STF dado a este dispositivo interpretação conforme a Constituição para estabelecer que: "a prevalência do auto de infração lavrado pelo órgão originalmente competente para o licenciamento ou autorização ambiental não exclui a atuação supletiva de outro ente federado, desde que comprovada omissão ou insuficiência na tutela fiscalizatória".
O STF, ao analisar especificamente este dispositivo, fez as seguintes reflexões no âmbito da ADI 4.757/DF: "Nesse contexto, para melhor compreensão, coloco exercício de abstração comparativa: na hipótese de atuação em duplicidade de dois órgãos ambientais fiscalizadores, de entes subnacionais distintos, como o IBAMA e outro estadual, para o controle de dano ambiental decorrente de empreendimento ou atividade licenciada ou autorizada, a quem competirá levar a termo o auto de infração? Quem demonstrou efetividade na sanção adotada ou capacidade institucional para a apuração do dano? Ou a competência prévia e estática do órgão responsável pelo licenciamento ou autorização? A escolha da alternativa normativa estática de competência para o poder de polícia ambiental, na função fiscalizatória, com efeito, ainda em juízo abstrato, frustra o parâmetro normativo dos deveres fundamentais de proteção, assim como a lógica do sistema constitucional de tutela do meio ambiente, baseado na responsabilidade solidária e objetiva (arts. 23 e 225).
Ademais, conforme já desenvolvido como razão de decidir deste voto, a dupla feição do federalismo cooperativo, estática e dinâmica, não encontra guarida nesse desenho institucional, que apenas favorece a dimensão estática, sem possibilidade de atuação supletiva adequada, porque o critério pela prevalência do auto de infração lavrado pelo órgão licenciador ou autorizador afasta qualquer possibilidade interpretativa de prevalência da máxima proteção do meio ambiente. 75.
Convergente com essa linha interpretativa, tem-se a argumentação sustentada pela Procuradora-Geral da República, no sentido de que tal previsão do §3º do art. 17 não se coaduna com o dever de máxima proteção do meio ambiente, uma vez que o auto lavrado pelo órgão originalmente competente não será necessariamente o mais adequado para a proteção do meio ambiente.
Em suas palavras: "se dois ou mais órgãos ambientais atuaram em determinado caso, deve prevalecer aquele que apresentou tutela efetiva, adequada e suficiente quanto repressão da lesão ao meio ambiente, sob pena de afronta ao princípio da vedação da proteção deficiente". (...) Há clara antinomia na regra do § 3º do art. 17.
Para além de oferecer alternativa normativa insuficiente aos deveres de proteção ambiental e ao requisito da capacidade institucional dos órgãos ambientais. 77.
Frente a esse arcabouço argumentativo, entendo inconstitucional a parte que atribui prevalência do auto de infração ambiental lavrado por órgão que detenha a atribuição de licenciamento ou autorização a que se refere o caput, porque abstratamente é possível inferir a incompatibilidade desse desenho institucional com os deveres de proteção ambiental, e também com a lógica da eficiência e racionalidade administrativa, uma vez que a duplicidade da atuação fiscalizatória é decorrente e autorizada pela competência comum material.
A fórmula para resolver a atuação fiscalizadora simultânea não encontra guarida constitucional.
Acresço ao ponto, para justificar a inconstitucionalidade parcial do referido § 3º do art. 17, que o critério da prevalência de auto de infração do órgão licenciador não oferece resposta aos deveres fundamentais de proteção, nas situações de omissão ou falha da atuação daquele órgão na atividade fiscalizatória e sancionatória, por insuficiência ou inadequação da medida adotada para prevenir ou reparar situação de ilícito ou dano ambiental.
Como já dito, um dos princípios fundamentais do funcionamento do sistema legal de tutela do meio ambiente é o da atuação supletiva do órgão federal, seja em matéria de licenciamento seja em matéria de controle e fiscalização das atividades ou empreendimentos potencialmente poluidores ou degradantes do meio ambiente.
No exercício da cooperação administrativa, portanto, cabe atuação suplementar ainda que não conflitiva da União com a dos órgãos estadual e municipal.
Ou seja, exercício subsidiário e condicional de competência material, cuja condicionante reside justamente na configuração das situações de omissão ou ineficiência do órgão ambiental estadual ou municipal.
As potenciais omissões e falhas no exercício da atividade fiscalizatória do poder de polícia ambiental por parte dos órgãos que integram o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA) não são irrelevantes e devem ser levadas em consideração para constituição da regra de competência fiscalizatória.
Diante das características concretas que qualificam a maioria dos danos e ilícitos ambientais de impactos significativos, mostra-se irrazoável e insuficiente regra que estabeleça competência estática do órgão licenciador para a lavratura final do auto de infração".
Sendo assim, havendo omissão do órgão competente para o licenciamento na fiscalização de desmatamento ilegal, surge a possibilidade de outros órgãos ambientais atuarem supletivamente.
Isso, porque o dever de fiscalizar não se confunde com o poder de licenciar.
Nesta perspectiva, no caso dos autos, em que houve omissão da SEMA/MA, prevalecerá o auto de infração lavrado pelo primeiro órgão ambiental que atuou (no caso, o IBAMA), por força do entendimento do STF na ADI 4757/DF.
A propósito, tal entendimento se coaduna com o federalismo cooperativo, previsto nos art. 23, III, VI e VII, art. 24, VI, VII e VII, e art. 225, da Constituição, que rege a matéria ambiental.
Forçoso concluir, portanto, inexistir vício de competência no regular exercício do poder de polícia ambiental pelo IBAMA que resultou na lavratura do auto de infração em desfavor do impetrante.
A Constituição Federal (art. 225, §1º, III e VII) e a Lei Complementar nº 140/2011 (art. 17, §§ 2º e 3º) conferem competência à União para exercer o poder de polícia ambiental, sem prejuízo da atuação dos órgãos estaduais e municipais, cabendo ao IBAMA a fiscalização e autuação de infrações ambientais, independentemente de quem tenha realizado o licenciamento da atividade.
Trata-se de atribuição fiscalizatória autônoma e plenamente legítima, conforme pacificado pelo TRF1: "A fiscalização ambiental é atividade administrativa autônoma em relação ao licenciamento, não sendo afastada a competência do IBAMA para promover autuações mesmo quando o licenciamento for estadual." (TRF1, AC 2003.39.00.013179-1/PA) A concessão da LUAR e sua renovação pela SEMA/MA não tem o condão de, por si só, afastar a validade do auto de infração e do embargo federal.
A doutrina ambiental é uníssona ao reconhecer que o licenciamento ambiental, sobretudo o de regularização, não possui efeito retroativo nem afasta automaticamente penalidades impostas por infrações anteriores.
Nesse ponto, o licenciamento é um instrumento jurídico preventivo cujo objetivo primordial é autorizar a instalação ou operação de atividades, não se confundindo com anistia ambiental.
Ademais, compete salientar que a Licença Única Ambiental também não se confunde com a Autorização para Supressão de Vegetação, conforme explicita a Portaria SEMA n.º 13/2013: "Art. 33.
A Supressão de Vegetação nativa será vinculada à concessão da Licença Única Ambiental - LUA. § 1º No caso de deferimento do processo será emitida a Licença Única Ambiental - LUA e a Autorização para Supressão de Vegetação - ASV." Tratam-se, portanto, de institutos com finalidades diferentes.
A obtenção da Licença Única de Ambiental de Regularização e da Renovaçaõ de Licença Única Ambiental, portanto, sem a correspondente Autorização de Supressão Vegetal referente ao período de 2016 a 2019 não é suficiente para afastar a ilicitude da supressão de vegetação detectada pelo IBAMA.
A Portariai SEMA n.º 13/2013 também dispõe, no art. 25, que "o imóvel rural detentor da Licença Única Ambiental - LUA não é isento da obrigação de obter isoladamente o Licenciamento Ambiental para atividades não enquadradas na tipologia Agrossilvipastoril e consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras, bem como os utilizadores de recursos ambientais".
O art. 26 prossegue aduzindo que, para efeito de regularidade ambiental, os empreendimentos agrossilvipastoris ficam obrigados ao cumprimento da legislação florestal e de recursos hídricos, devendo, sempre que solicitado pela fiscalização ambiental apresentar, entre outros, os seguintes documentos: I - Comprovação de regularidade da área de Reserva Legal e servidões florestais ou ambientais, quando for o caso; II - Autorização para Supressão de Vegetação, quando couber; III - Outorga de Uso de Recursos Hídricos, quando for o caso.
Ressalte-se, ainda, que a Portaria SEMA nº 380/2023 é categórica ao vedar a regularização de supressão de vegetação por meio de simples “limpeza de área”: “Art. 60.
A Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Naturais- SEMA não expedirá autorização para limpeza de área.
Parágrafo único - Qualquer descaracterização da vegetação nativa que implique em conversão de área para uso alternativo do solo deverá ser caracterizada e solicitada sob a forma de Autorização para Uso Alternativo do Solo.” O art. 373, inciso I, do Código de Processo Civil atribui ao impetrante o ônus da prova quanto aos fatos constitutivos do seu direito, incumbindo-lhe demonstrar que o embargo recai sobre área devidamente regularizada e livre para uso.
Todavia, não houve demonstração de que os projetos técnicos, relatórios ambientais ou os estudos que subsidiaram a LUAR efetivamente abrangem ou afastam o embargo.
Ao contrário, o Relatório de Desempenho Ambiental (ID n.º 2137281784) enfatizou que: “Conforme observação realizada in loco no imóvel e através da imagem satélite, pode-se concluir que não há necessidade de recomposição/regeneração das áreas de APP e ARL neste imóvel.” O laudo técnico da Licença Única Ambiental de Regularização (ID n.º 2137283672, pág. 4) também constatou que não havia necessidade de recomposição de Áreas de Preservação Permanente e Reserva Legal.
Esse dado revela a inexistência de recomposição da área degradada e que a supressão irregular não foi objeto de convalidação pelo licenciamento superveniente.
O princípio da precaução (CF, art. 225) ampara a adoção de medidas restritivas pela Administração Pública, independentemente de conclusão do processo sancionador, sempre que houver risco ou dano ao meio ambiente.
Nesse cenário, a expedição de licenças estaduais ou municipais de regularização para determinado imóvel ou empreendimento não tem o condão de, automaticamente, sustar os efeitos e quanto menos invalidar os autos de infração federal para a mesma área.
Eventual reverberação deletéria dessas licenças sobre os efeitos das autuações anteriores validamente aplicadas precisa ser concretamente demonstrada.
Em outras palavras, a licença ambiental de regularização não afasta, por si só, os embargos aplicados sobre a área em anterior autuação.
Ela pode, no entanto, impedir que esses embargos surtam efeitos, não por invalidá-los, porque lavrados sem vícios, mas por haver, eventualmente, incompatibilidade entre o processo de regularização da área e a vedação ao seu uso (embargo).
Essa incompatibilidade, contudo, precisa ser concretamente comprovada pela parte interessada, na medida em que, como dito, a simples obtenção da licença não reabilita, automaticamente, o uso da área embargada.
Os exatos termos da licença, notadamente suas condições e exigências, precisam ser cotejados com o teor do embargo que se pretende ver derrubado.
E o conteúdo da licença, nesse contexto, só pode ser avaliado efetivamente a partir dos documentos que a fundamentam, a saber: os projetos apresentados, os relatórios ambientais simplificados – RAS e/ou os monitoramentos de impactos ambientais.
Somente mediante a análise de tais documentos, trazidos preferencialmente por meio da apresentação da íntegra do processo administrativo em que concedida a licença de regularização, é que se pode saber se sua execução e suas condicionantes afetam o embargo aplicado.
Contudo, a parte autora não trouxe tal argumentação.
Nesse trilhar, não se pode afirmar que a licença de regularização tem alguma repercussão sobre a área embargada e, sem a prova concreta de que o embargo não mais se justifica ou que é incompatível com as condições da licença superveniente, sua manutenção revela-se juridicamente adequada.
Outro óbice quanto à procedência da pretensão do impetrante se materializa na disciplina da supressão de vegetação para uso alternativo do solo disposta na Lei n. 12.651/2012 (Código Florestal), que inequivocamente exige a autorização do órgão ambiental competente.
Autorização, e não licença.
Transcreve-se: Art. 26.
A supressão de vegetação nativa para uso alternativo do solo, tanto de domínio público como de domínio privado, dependerá do cadastramento do imóvel no CAR, de que trata o art. 29, e de prévia autorização do órgão estadual competente do Sisnama. § 1º (VETADO). § 2º (VETADO). § 3º No caso de reposição florestal, deverão ser priorizados projetos que contemplem a utilização de espécies nativas do mesmo bioma onde ocorreu a supressão. § 4º O requerimento de autorização de supressão de que trata o caput conterá, no mínimo, as seguintes informações: I - a localização do imóvel, das Áreas de Preservação Permanente, da Reserva Legal e das áreas de uso restrito, por coordenada geográfica, com pelo menos um ponto de amarração do perímetro do imóvel; II - a reposição ou compensação florestal, nos termos do § 4º do art. 33; III - a utilização efetiva e sustentável das áreas já convertidas; IV - o uso alternativo da área a ser desmatada.
Art. 27.
Nas áreas passíveis de uso alternativo do solo, a supressão de vegetação que abrigue espécie da flora ou da fauna ameaçada de extinção, segundo lista oficial publicada pelos órgãos federal ou estadual ou municipal do Sisnama, ou espécies migratórias, dependerá da adoção de medidas compensatórias e mitigadoras que assegurem a conservação da espécie.
Art. 28.
Não é permitida a conversão de vegetação nativa para uso alternativo do solo no imóvel rural que possuir área abandonada.
Noutro norte, conforme constatado no Processo Administrativo n.º 02012.001703/2024-27, as coordenadas lançadas no campo específico do Auto de Infração e do Termo de Embargo correspondem, de fato, ao local de lavratura dos referidos documentos — isto é, ao local físico onde o ato administrativo foi formalizado (a sede da Superintendência do IBAMA no Maranhão) — e não ao local da infração ambiental em si, máxime porquanto na contextualização do relatório de fiscalização constam as coordenadas geográficas da fazenda autuada.
A correta localização da área embargada encontra-se devidamente demonstrada na Carta Imagem e no Relatório de Fiscalização juntados aos autos administrativos, documentos que foram elaborados com base em imagens de satélite (SENTINEL-2 e LANDSAT 8), cujos polígonos foram claramente inseridos sobre a área da Fazenda Água Branca.
Essa metodologia é plenamente aceita pela jurisprudência especializada, a qual reconhece a legitimidade da utilização de geotecnologias e imagens de satélite para delimitação de infrações ambientais, especialmente em biomas com características de cerrado, onde a análise remota é essencial à fiscalização.
Cumpre destacar que o IBAMA, em sua manifestação formal, esclareceu que as coordenadas corretas da infração constam dos anexos técnicos do processo e que eventual imprecisão pontual na indicação do campo “local da lavratura” dos autos não comprometeu, em momento algum, a adequada individualização do imóvel, tampouco a delimitação do polígono embargado.
Sendo assim, impõe-se a denegação da segurança pleiteada.
DISPOSITIVO Ante o exposto, DENEGO A SEGURANÇA, extinguindo o feito com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC, mantendo hígidos os atos praticados pela parte impetrada.
Revogo, por conseguinte, a tutela provisória deferida (ID n.º 2156788029).
Custas pelo impetrante.
Honorários advocatícios incabíveis (art. 25 da Lei nº 12.016/2009).
Preclusas as vias impugnatórias, certifique-se o trânsito em julgado e arquivem-se os autos.
Publique-se.
Intimem-se.
Registro digital.
Brasília, 2 de abril de 2025.
GABRIELA BUARQUE PEREIRA DE CARVALHO Juíza Federal Substituta -
12/07/2024 16:41
Recebido pelo Distribuidor
-
12/07/2024 16:41
Juntada de Certidão
-
12/07/2024 16:41
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
12/07/2024
Ultima Atualização
10/04/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Sentença Tipo A • Arquivo
Despacho • Arquivo
Despacho • Arquivo
Documento Comprobatório • Arquivo
Sentença Tipo A • Arquivo
Decisão • Arquivo
Despacho • Arquivo
Decisão • Arquivo
Documentos Diversos • Arquivo
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