TRF1 - 1002971-33.2025.4.01.3901
1ª instância - 2ª Maraba
Polo Ativo
Polo Passivo
Partes
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
-
22/05/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Marabá-PA 2ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Marabá-PA PROCESSO: 1002971-33.2025.4.01.3901 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: HERMESON VIEIRA DO VALE REPRESENTANTES POLO ATIVO: JOAO VICTOR FERNANDES BORGES FERREIRA - PA38308 POLO PASSIVO:INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS-IBAMA DECISÃO Trata-se de ação de conhecimento submetida ao procedimento comum, com pedido de tutela de urgência, ajuizada por HEMERSON VIEIRA DO VALE ME em face do INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS-IBAMA, por meio da qual se objetiva, liminarmente, seja determinada a imediata entrega do caminhão da Marca Volkswagen Modelo 30.330 CRC 8x2, ano 2017-2018 e placa QGJ3284, ficando o autor na condição de fiel depositário, até o trânsito em julgado administrativo.
Expõe a exordial, em síntese, que: a) o autor é proprietário de uma transportadora, exercendo, de forma lícita, o transporte rodoviário remunerado de cargas, utilizando, para tanto, o caminhão da Marca Volkswagen Modelo 30.330 CRC 8x2, ano 2017-2018, placa QGJ3284 e carroceria simples, dirigido no dia da apreensão por FRANCO BIONOR DA SILVA DANTAS; b) na data de 26/03/2024, o autor aceitou realizar frete de forma terceirizada pela empresa KOLYNA TRANSPORTES E LOGÍSTICAS LTDA, iniciando o transporte de uma carga de madeira proveniente do município de Pacajá/PA, sendo o motorista abordado pela fiscalização da Polícia Rodoviária Federal, que ao verificar a carga e após comparar com a GF3 (licença para o transporte), constatou que a volumetria era exatamente a mesma que constava na documentação apresentada, mas que havia divergência quanto as espécies da madeira transportada, pois foram encontradas outras espécies além da autorizada na guia de transporte; c) na ocasião, foi lavrado o auto de infração D5UQFA87, por “transportar 25,13 m³ de madeira serrada em desacordo com a licença (espécies divergentes - GF3i n° 1255492) outorgada pela autoridade ambiental competente” e o Termo de Apreensão n.º 3OAOID66, tendo por objeto 25,13 m³ de madeira serrada e o Veículo Volkswagen/30.330 CRC 8x2, de Placa QGJ3284, ficando este em depósito por meio do Termo de Depósito n.º 4QALLFQP; d) desde o depósito, o depositário do caminhão vem utilizando o bem de forma não autorizada e irregular, fato que já foi, inclusive, comunicado ao IBAMA, o qual vem ignorando os sucessivos pedidos de troca de fiel depositário apresentados no processo administrativo; e) o autor não se insurge contra o ato de apreensão levado a efeito pela autarquia ambiental; f) a multa administrativa já foi devidamente paga; g) o processo administrativo está na fase final de instrução, não havendo necessidade de que o veículo fique sob o depósito de terceiro.
Instado, o autor apresentou emenda à petição inicial (ID 2185059445).
Requereu a concessão de gratuidade da justiça. É o relatório.
Decido.
A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (art. 300, caput, do CPC).
No caso, o autor se insurge contra a apreensão do caminhão Marca Volkswagen Modelo 30.330 CRC 8x2, ano 2017-2018 e placa QGJ3284, apreendido por meio do Termo de Apreensão n.º 3OAOID66.
Infere-se dos autos que no dia 01/04/2024 foi lavrado em desfavor do motorista FRANCO BIONOR DA SILVA DANTAS, o Auto de Infração n.º DSUQFA87 (ID 2182020033 - Pág. 1) e na mesma data, foi apreendido o veículo acima descrito, formalizando-se o sobredito termo de apreensão (ID 2182020033 - Pág. 2) Ficou demonstrado que o caminhão apreendido pertence ao autor (ID 2185059951).
Em análise superficial, própria deste momento processual, entendo que a apreensão do caminhão do autor se mostra desproporcional e irrazoável. É certo que a Lei n.º 9.605/1998, em seu art. 72, inciso IV, autoriza a apreensão de veículos utilizados na infração.
Não menos certo que o art. 25, § 4º, da referida lei, autoriza o perdimento dos bens ou a sua destruição.
A interpretação literal da norma parece vulnerar os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, implícitos no ordenamento jurídico, decorrentes do devido processo legal substantivo.
Não se pode olvidar que os princípios irradiam sua carga valorativa para as demais normas, a impor-lhes a interpretação em consonância com a Constituição Federal, que ocupa o ápice da pirâmide normativa.
O processamento da autuação e a cobrança da multa não exigem que fiquem os bens apreendidos, pois não são elementos indispensáveis ao julgamento da infração.
Por ser um objeto de prova, precisam ficar ao alcance da investigação, mas sua destinação ordinária, isto é, o uso que se faz dos bens normalmente, não é ilícita e a descrição do delito, deduzida da autuação, não faz com que seja indispensável a manutenção da apreensão para demonstração do ilícito.
Em outras palavras, o infrator pode ser julgado pelo fato descrito na autuação, sem que para isso seja preciso manter apreendido o bem.
Além disso, se a medida tinha caráter cautelar, objetivando evitar a continuidade da lesão ambiental, o objetivo foi alcançado, e, assim, depois de algum tempo do fato, deixou de ter sentido a sua manutenção.
Diante dessa situação, em que o interesse de preservar o bem para futura investigação infracional depara-se com o interesse econômico de sua utilização, a solução dada pelo Decreto n.º 6.514/08 ajusta-se perfeitamente ao caso.
O art. 105 do citado diploma prevê a entrega dos bens apreendidos a fiel depositário, o qual pode ser o autuado ou o proprietário, nos termos do art. 106.
Afinal, trata-se de liberação para o uso lícito do veículo, conforme autoriza o § 2º do mesmo artigo.
Que o bem possa vir a ser usado em atividade ilícita, o que desautorizaria o depósito (art. 106, II), é uma possibilidade.
Mas esse período em que ficou apreendido o bem e as consequências decorrentes do encargo de fiel depositário servem de desestímulo à prática de infrações.
Tal regulamento harmoniza interesses colidentes e, com base nele, é possível autorizar o depósito do bem apreendido nas mãos de seu dono, a título de depositário fiel.
A propósito, cito os seguintes julgados do Tribunal Regional Federal da 1ª Região: PROCESSUAL PENAL - RESTITUIÇÃO DE COISAS APREENDIDAS – VEÍCULO UTILIZADO EM CRIME AMBIENTAL - ART. 25, § 4º, DA LEI 9.605/98 - NOMEAÇÃO DO RECORRENTE, DURANTE O INQUÉRITO E O PROCESSO, COMO FIEL DEPOSITÁRIO - POSSIBILIDADE - INTERESSE EM EVITAR A DETERIORAÇÃO DO VEÍCULO, A MÉDIO E LONGO PRAZO – INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO À PERSECUÇÃO PENAL - PRECEDENTES.
I - Há, nos autos, prova de que o requerente é o proprietário do veículo apreendido na prática de crime ambiental, e, na forma da jurisprudência (ACR 2004.37.01.000679-9/MA, Rel.
Desembargador Federal Cândido Ribeiro), a ele não se aplica a pena de perdimento, prevista no art. 91, II, b, do Código Penal.
II - Orienta-se a jurisprudência do TRF/1ª Região no sentido de que "não foi intenção do legislador dirigir a norma do art. 25, § 4º, da Lei 9.605/98 aos bens que ocasionalmente são utilizados nos delitos ambientais", e, "não sendo o caminhão coisa cujo fabrico, alienação, uso ou detenção constitua fato ilícito, não há como considerá-lo, a princípio, instrumento de crime, até porque referido bem não é utilizado exclusivamente na prática de crimes" (ACR 2004.41.00.001763-1/RO, Rel.
Desembargador Federal Hilton Queiroz).
III - A nomeação do requerente como fiel depositário do veículo apreendido, na forma e sob as penas da lei, além de não impedir as diligências que se fizerem necessárias à persecução criminal – inclusive a apuração quanto à ocasionalidade da utilização do veículo para a prática de crime ambiental -, mostra-se cabível, porque o interesse em preservar o bem é manifesto, permitindo que, ao fim das investigações e de eventual ação penal, possa o julgador dar, ao bem, a destinação que entender mais adequada, a depender do que se apurar.
Precedentes do TRF/1ª Região.
IV – Apelação parcialmente provida” (TRF1, ACR n. 2008.001548-0, MA, 3T, e-DJF1 27/3/09, p. 304).
ADMINISTRATIVO.
MANDADO DE SEGURANÇA.
INFRAÇÃO AMBIENTAL.
APREENSÃO DE VEÍCULO.
PENA DE PERDIMENTO.
ILEGALIDADE.
PROCESSO ADMINISTRATIVO NÃO CONCLUÍDO.
PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E DA RAZOABILIDADE. 1.
A jurisprudência deste Tribunal firmou entendimento de que a apreensão de veículo só é devida quando sua utilização é destinada para uso específico e exclusivo do delito ambiental, na forma do artigo 25, § 4º, da Lei 9.605/98.
Precedentes. 2.
No caso dos autos, há documentos que demonstram, a princípio, que o autor é reincidente, uma vez que veículo foi novamente apreendido praticando infração ambiental. 3.
Contudo, a aplicação da pena de perdimento, sem o devido processo legal, afigura-se desproporcional, uma vez que a aplicação das penalidades administrativas deve ser feita sob o prisma da razoabilidade, ou seja, a análise de legitimidade do ato administrativo deve ser realizada por meio do sopesamento da proporcionalidade e da adequação da medida para os fins pretendidos, ainda mais considerando-se que o valor da multa é de R$ 4.226,40 e o veículo está avaliado em R$ 65.000,00 (TRF1, AMS n. 5186- 84.2011, 5T, rel.
Des.
Federal Neviton Guedes, e-DJF1 28/1/2016).
A esse respeito, o Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp 1133965, sob o rito dos recursos repetitivos, o que dá mais força à aplicação desse entendimento nas instâncias ordinárias, concluiu pela possibilidade de colocação dos caminhões apreendidos em transporte ilegal de madeira à disposição de seus proprietários na condição de depositários fiéis, desde que estes assumam o compromisso com sua guarda e conservação.
Veja-se: AMBIENTAL.
RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA.
ART. 543-C DO CPC.
PODER DE POLÍCIA.
APREENSÃO DE VEÍCULO UTILIZADO NO CARREGAMENTO DE MADEIRA SEM AUTORIZAÇÃO.
ART. 25, § 4º, DA LEI N. 9.605/98 VS.
ART. 2º, § 6º, INC.
VIII, DO DECRETO N. 3.179/99.
LIBERAÇÃO CONDICIONADA AO PAGAMENTO DE MULTA.
INVIABILIDADE.
LIBERAÇÃO CONDICIONADA AO OFERECIMENTO DE DEFESA ADMINISTRATIVA.
POSSIBILIDADE.
CONSTITUIÇÃO DE FIEL DEPOSITÁRIO NA PESSOA DO PROPRIETÁRIO. 1.
Na origem, trata-se de mandado de segurança em que se discute a liberação de veículo de carga apreendido pelo transporte de madeira sem a competente autorização para transporte - ATPF, mediante ao pagamento de multa. 2.
O art. 25, § 4º, da Lei n. 9.605/98 determina que "[o]s instrumentos utilizados na prática da infração serão vendidos, garantida a sua descaracterização por meio da reciclagem".
A seu turno, o art. 2º, § 6º, do inc.
VIII, do Decreto n. 3.179/99 (na redação vigente à época dos fatos - abril/2005 -, alterada pelo Decreto n. 5.523/05, ambos hoje superados pelo Decreto n. 6.514/08), diz que "os veículos e as embarcações utilizados na prática da infração, apreendidos pela autoridade competente, somente serão liberados mediante o pagamento da multa, oferecimento de defesa ou impugnação, podendo ser os bens confiados a fiel depositário na forma dos arts. 1.265 a 1.282 da Lei 3.071, de 1916, até implementação dos termos mencionados, a critério da autoridade competente". 3.
A partir daí, surgiu a controvérsia posta em exame: a compatibilidade entre as disposições da lei e a da legislação infralegal. É que o § 4º do art. 25 da LCA determina a alienação dos instrumentos do crime (compreendidos em sentido lato), mas, a seu turno, o Decreto n. 3.179/99 possibilita a liberação dos veículos e embarcações apreendidos pela prática de infração administrativa ambiental mediante pagamento de multa ou oferecimento de defesa. 4.
O art. 2º, § 6º, inc.
VIII, primeira parte (pagamento de multa), do Decreto n. 3.179/99, na redação original (em vigor na época dos fatos, frise-se) constitui verdadeira inovação no ordenamento jurídico, destituída de qualquer base legal, o que afronta os incs.
IV e VI do art. 84 da Constituição da República vigente (CR/88): o primeiro dispositivo porque o decreto exorbitou do âmbito da "fiel execução" da lei; o segundo dispositivo porque houve a edição de preceito normativo primário fora das hipóteses lá discriminadas. 5.
Nada obstante, dizer que a autoridade administrativa deve seguir pura e simplesmente o art. 25, § 4º, da LCA em qualquer caso poderia levar à perpetração de violação aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, incs.
LIV e LV, da CR/88), especialmente em situações nas quais o suposto infrator oferecesse defesa administrativa - porque esta, eventualmente, poderia vir a ser provida e, daí, seria incabível o perdimento do bem. 6.
Assim, evitar-se-ia a irreversibilidade de um provimento, que embora sancionador, também é acautelatório (a apreensão do veículo suposto instrumento de infração) – diferente do art. 2º, inc.
IV, da Lei n. 9.605/98, em que a apreensão é a própria sanção. 7.
Para estes casos, é legítimo admitir, como fez a parte final do inc.
VIII do § 6º do art. 2º do Decreto n. 3.179/99 (redação original), que a apresentação de defesa administrativa impeça a imediata alienação dos bens apreendidos pois esta conclusão necessariamente deve vir precedida da apreciação da demanda instaurada entre a Administração e o infrator.
E, neste sentido, por este interregno até a decisão, veículos e embarcações ficariam depositados em nome do proprietário. 8.
Este recorte na ilegalidade do Decreto n. 3.179/99 (redação primeva) é tão importante que o superveniente Decreto n. 5.523/05, o qual deu nova disciplina à matéria, acabou por consagrando-a, de modo que "os veículos e as embarcações utilizados na prática da infração, apreendidos pela autoridade ambiental competente, poderão ser confiados a fiel depositário até a sua alienação". 9.
Despiciendo lembrar, ainda, que a manutenção dos bens apreendidos com a Administração Pública, sem uso, estagnados, apenas tem o condão de causar-lhes depreciação econômica, o que não é proveitoso nem ao Poder Público, nem ao proprietário. 10.
Em resumo: o art. 2º, § 6º, inc.
VIII, do Decreto n. 3.179/99 (redação original), quando permite a liberação de veículos e embarcações mediante pagamento de multa, não é compatível com o que dispõe o art. 25, § 4º, da Lei n. 9.605/98; entretanto, não há ilegalidade quando o referido dispositivo regulamentar admite a instituição do depositário fiel na figura do proprietário do bem apreendido por ocasião de infração nos casos em que é apresentada defesa administrativa - anote-se que não se está defendendo a simplória liberação do veículo, mas a devolução com a instituição de depósito (e os consectários legais que daí advêm), observado, entretanto, que a liberação só poderá ocorrer caso o veículo ou a embarcação estejam regulares na forma das legislações de regência (Código de Trânsito Brasileiro, p. ex.). 11.
Não aproveita ao Ibama a alegação desenvolvida desde a origem no sentido de que o art. 2º, § 6º, inc.
VIII, do Decreto n. 3.179/99 aplica-se apenas à esfera de punição administrativa, não sendo autorizada legalmente a liberação do veículo com ou sem instituição do depósito para as hipóteses de conduta criminosa (como ocorre no caso concreto - art. 46, p. ún., LCA). 12. É que - e aqui voltando ao início da exposição - a aplicação da LCA deve observar as disposições do Código Penal e do Código de Processo Penal (CPP).
Segundo os arts. 118 e ss. do CPP, existem regras próprias, as quais também guardam consonância com o dever de promover o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa.
E estas regras, muito mais densas do que as a Lei n. 9.605/98 e seus decretos, não permitem sob qualquer condição a alienação imediata de veículos e embarcações utilizadas como instrumentos de crime. 13.
Mas, até pela sua antigüidade, é verdade que este regramento também nada dispõe sobre a possibilidade de deferimento da liberação do veículo ao proprietário que assume sua guarda e conservação na condição de depositário fiel.
Acontece que, ao contrário da imediata restituição dos bens apreendidos ao proprietário ou sua alienação, a instituição da liberação com ônus de depósito é perfeitamente compatível com as previsões dos arts. 118 e ss. do CPP. 14.
Tem-se, aí, uma integração possível entre a norma do art. 25, § 4º, da LCA, na forma como regulamentada pelo Decreto n. 3.179/99 (na redação original e conforme o Decreto n. 5.523/05), e o CPP.
Por isto, pode ser plenamente aplicada a interpretação antes resumida nos casos em que, além de infração administrativa, a conduta também pode ser enquadrada como crime ambiental - até porque, repise-se, não atenta contra os princípios constitucionais-processuais básicos ou contra o que determina os arts. 118 e ss. do CPP. 15.
Então, em mais um esforço de abreviação de tudo o quanto se disse, qualquer destino dado aos bens apreendidos, seja em razão de infração administrativa, seja em razão de crime ambiental, deve ser precedido do devido processo legal.
No primeiro caso, evidente que haverá sumarização, na forma das regulamentações da Lei n. 9.605/95; no segundo caso, do modo como previsto no CPP, sendo facultada, pela peculiaridade do tipo penal (crime ambiental), as inflexões da LCA e decretos no que for compatível (p. ex., a liberação ao proprietário com instituição do depósito em seu nome). 16.
Submetendo esta linha de argumentação à situação que deu origem ao presente especial, tendo ficado assentado pelas instâncias ordinárias que a liberação do veículo era medida que se impunha em razão do oferecimento de defesa administrativa - e não do pagamento de multa -, entendo que é caso de dar parcial provimento à pretensão recursal, permitindo a liberação do veículo (como determinada pelo acórdão recorrido), mas condicionada à instituição do depósito em nome do proprietário (com as premissas acima alinhadas). 17.
Enfatize-se, por fim, que toda esta sistemática é inaplicável aos casos ocorridos já na vigência do Decreto n. 6.514/08, que deu tratamento jurídico diverso à matéria (arts. 105 e ss. e 134 e ss.). 18.
Recurso especial parcialmente provido, admitindo a liberação do veículo sob depósito.
Julgamento submetido à sistemática do art. 543-C do CPC e à Resolução n. 8/2008 (STJ, REsp n. 1.133.965/BA, rel.
Min.
Mauro Campbell Marques, DJ 25/4/2018).
Esse posicionamento, que já vinha sendo adotado por este Juízo de longa data, não deixa de fazer sentido diante do julgamento, pelo STJ, do Tema 1.043, em sede do rito de recursos especiais repetitivos, o qual fixou a tese de que o proprietário do caminhão apreendido em razão de transporte irregular de madeira não possui o direito subjetivo de ser nomeado fiel depositário do bem, cabendo à administração a adoção das providências previstas nos arts. 105 e 106 do Decreto n.º 6.514/2008, conforme seu juízo de oportunidade e conveniência.
Pode-se manter o entendimento que vinha sendo adotado, apesar da fixação da referida tese, por não haver choque entre as decisões. É que a decisão do STJ obsta a colocação do proprietário do caminhão como fiel depositário de forma automática, isto é, não existe direito líquido e certo do dono do bem apreendido, para que se torne fiel depositário.
A administração, que apreendeu o caminhão, é que deve aquilatar, segundo a conveniência e oportunidade, a quem irá entregar a posse do bem na condição de depositário fiel.
Entretanto, e é aqui que se aplica o entendimento deste Juízo sobre o assunto, a condição de depositário fiel ao dono do caminhão pode ser conferida se verificada razoabilidade e proporcionalidade da medida, tendo em vista a desproporcionalidade eventualmente existente no ato de apreensão, justamente o que se conclui do caso em tela, haja vista o fato de o caminhão estar parado e sujeito à deterioração causada pelas intempéries.
A propósito, confira-se o seguinte julgado do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, que vai ao encontro desse entendimento: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA EMENTA PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO.
AUTO DE INFRAÇÃO.
EXTRAÇÃO DE AREIA.
LICENÇA AMBIENTAL.
REQUERIMENTO DE RENOVAÇÃO PELO INTERESSADO EFETUADO ANTES DA PERDA DA VALIDADE.
PRORROGAÇÃO AUTOMÁTICA (ART. 18, § 4º, DA RESOLUÇÃO 237/97, DO CONAMA).
NOMEAÇÃO DE DEPOSITÁRIO FIEL.
JUÍZO DE RETRATAÇÃO NÃO EXERCIDO. 1.
Feito que retorna da Presidência deste Regional, nos termos do art. 1.040, II, do CPC/2015, para realização do juízo de retratação, caso se entenda pertinente, em relação ao decidido pelo STJ no Tema 1.036 (REsp 1.133.965/BA, sob o sistema dos recursos repetitivos). 2.
Quando da apreciação do mérito, a Segunda Turma deste Regional, na sessão de 12/05/2020, por unanimidade, negou provimento à remessa oficial e à apelação, mantendo sentença que concedeu a segurança, declarando a nulidade do Termo de Apreensão 712073 e ordenando a liberação do veículo máquina retroescavadeira 310K, 4X4, cabine fechada, ano e modelo 2014, cor amarela, chassi IBZ310KXEEC000279, apreendido administrativamente. 3.
Considerado, à época, que: "A Lei 9.605/1998 prevê a possibilidade de apreensão de instrumentos, petrechos e veículos utilizados para o cometimento de infrações ambientais, a teor dos seus arts. 25 e 72, IV.
Por sua vez, o Decreto 6.514/2008 permite que o bem retido seja liberado e que, de forma excepcional, seja o seu proprietário nomeado depositário fiel, até que haja o julgamento do processo administrativo.
Consta que, à época da autuação, a pessoa jurídica interessada já havia requerido com a antecedência necessária a renovação da licença de operação para extração de areia, cuja apreciação ainda se encontrava pendente na Semace.
A situação se enquadra na hipótese prevista no art. 18, § 4º, da Resolução 237/97 do Conama, qual seja, há prorrogação automática da licença anterior até a manifestação definitiva do órgão ambiental.
Como ressaltado pelo sentenciante,"deste modo, o motivo que ensejou a lavratura do auto de infração e aplicação das sanções administrativas é inidôneo.
O pressuposto de fato indicado pela autoridade coatora é insubsistente para a prática de tais atos administrativos". 4.
O STJ, por ocasião do julgamento de representativos de controvérsia afetados ao Tema 1.036, firmou a seguinte tese: "a apreensão do instrumento utilizado na infração ambiental, fundada na atual redação do § 4º do art. 25 da Lei 9.605/1998, independe do uso específico, exclusivo ou habitual para a empreitada infracional". 5.
Igualmente, no julgamento de representativos de controvérsia afetados ao Tema 1.043, firmou tese neste sentido: "o proprietário do veículo apreendido em razão de infração de transporte irregular de madeira não titulariza direito público subjetivo de ser nomeado fiel depositário do bem, as providências dos arts. 105 e 106 do Decreto Federal n. 6.514/2008 competindo ao alvedrio da Administração Pública, em fundamentado juízo de oportunidade e de conveniência". 6. É certo que o paradigma somente se aplica aos fatos ocorridos até o advento dos Decretos 3.179/1999 e 5.523/2005 (o que não corresponde à hipótese dos autos – apreensão ocorrida em 2016). 7.
In casu, a insurgência recursal é contra a liberação do veículo, não se ocupando da possibilidade ou não da designação do proprietário como fiel depositário.
Ocorre que, conforme destacado na sentença, "afere-se que à época da autuação (27/06/2016), a pessoa jurídica interessada já havia requerido com a antecedência necessária a renovação da licença de operação para extração de areia, cuja apreciação ainda se encontrava pendente na Semace.
Ora, da tempestividade do requerimento de renovação e da pendência decisória administrativa decorrem necessariamente o efeito previsto na parte final do art. 18, § 4º, da Resolução nº 237/97 do Conama: a prorrogação automática da licença anterior até a manifestação definitiva do órgão ambiental.
Deste modo, o motivo que ensejou a lavratura do auto de infração e aplicação das sanções administrativas é inidôneo.
O pressuposto de fato indicado pela autoridade coatora é insubsistente para a prática de tais atos administrativos.
Assim, o Termo de Apreensão nº 712073/E é nulo e tem cabimento a concessão da segurança." 8.
Ademais, permanece o entendimento da Segunda Turma deste Regional, no sentido de que, "embora a apreensão do veículo seja conduta amparada em lei, na forma do art. 25 da Lei 9.605/1998, que, inclusive, prevê a alienação dos instrumentos utilizados na prática de ilícitos ambientais, estas normas devem ser interpretadas dentro dos parâmetros definidos pela proporcionalidade e razoabilidade da conduta administrativa, levando em consideração, também, os direitos que possam a vir ser afetados por esta prática.(...) O veículo, por si só, não sofre de qualquer restrição legal e a sua apreensão ora importa em prejuízo despropositado ao seu proprietário, ora o põe em risco de avarias ou perecimento sob a guarda administrativa.
Ademais, consta do processo administrativo Termo de Compromisso firmado pelo apelado em face da autoridade policial competente.
Neste contexto, a liberação do veículo se impõe em face dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade." (TRF5, 2ª T., PJE 0800415-63.2015.4.05.8401, Rel.
Des.
Federal Leonardo Henrique de Cavalcante Carvalho, Data da assinatura: 12/08/2021) 9.
Juízo de retratação não exercido.
Mantido o desprovimento da remessa oficial e da apelação.
Nbs (TRF-5 - ApelRemNec: 08002136120164058107, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO MACHADO CORDEIRO, Data de Julgamento: 28/09/2021, 2ª TURMA) Considerando o poder geral de cautela conferido ao Juízo, mostra-se razoável a suspensão de eventual pena de perdimento e o deferimento da disposição do bem apreendido nas mãos da parte autora, pelo menos, até a prolação da decisão final deste Juízo.
Do mesmo modo, com base nesse mesmo poder de cautela, tendo em vista que a condição para o depositário do bem é manter sua conservação e vinculação ao processo administrativo e judicial, deve-se restringir a disponibilidade do caminhão através do RENAJUD, caso sejam passível desse tipo de registro, devendo-se oficiar ao DETRAN/RN, previamente se for necessário, para que faça o registro do caminhão em questão e o bloqueie para alienação.
Ante o exposto, defiro o pedido de tutela de urgência, para determinar a liberação do caminhão de Marca Volkswagen Modelo 30.330 CRC 8x2, ano 2017-2018 e placa QGJ3284, ficando o autor na condição de fiel depositário, lavrando-se novo termo de depósito, dentro do prazo de 5 (cinco) dias.
Presentes os pressupostos do art. 98 do CPC, defiro ao autor o benefício da gratuidade da justiça.
Proceda-se ao bloqueio do caminhão no sistema RENAJUD, proibindo a sua alienação.
Fica o autor advertido de que, em caso de eventual ordem judicial de devolução do bem, deverá disponibilizar, às suas expensas, o veículo no lugar e nas mesmas condições em que o recebeu.
Intimem-se as partes.
Cite-se.
Oportunamente, retornem conclusos.
Marabá/PA, datada e assinada eletronicamente.
HEITOR MOURA GOMES Juiz Federal -
14/04/2025 16:59
Recebido pelo Distribuidor
-
14/04/2025 16:59
Autos incluídos no Juízo 100% Digital
-
14/04/2025 16:59
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
22/04/2025
Ultima Atualização
22/05/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Documento Comprobatório • Arquivo
Decisão • Arquivo
Despacho • Arquivo
Decisão • Arquivo
Informações relacionadas
Processo nº 1009328-29.2024.4.01.0000
Joao Azedo e Brasileiro Sociedade de Adv...
Monteiro e Monteiro Advogados Associados
Advogado: Bruno Romero Pedrosa Monteiro
2ª instância - TRF1
Ajuizamento: 25/03/2024 11:06
Processo nº 0004103-12.2015.4.01.3314
Joao dos Santos
Instituto Nacional do Seguro Social
Advogado: Sostenes Lima da Silva
1ª instância - TRF1
Ajuizamento: 10/08/2015 09:29
Processo nº 1000872-69.2025.4.01.3908
Jose Tarcisio da Silva Austriaco
Instituto Nacional do Seguro Social - In...
Advogado: Poliana Petri
1ª instância - TRF1
Ajuizamento: 10/04/2025 11:52
Processo nº 1005556-46.2025.4.01.4002
Jose Arteiro Alves de Lima Filho
Instituto Nacional do Seguro Social
Advogado: Gerardo Jose Amorim dos Santos
1ª instância - TRF1
Ajuizamento: 22/03/2025 12:08
Processo nº 1004419-36.2024.4.01.4302
Raimundo Neto Dias da Silva
Instituto Nacional do Seguro Social - In...
Advogado: Italo Jose Pereira da Silva
2ª instância - TRF1
Ajuizamento: 30/06/2025 16:17