TRF1 - 1033041-81.2025.4.01.3400
1ª instância - 20ª Brasilia
Polo Ativo
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Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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17/06/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Distrito Federal 20ª Vara Federal Cível da SJDF SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1033041-81.2025.4.01.3400 CLASSE: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) POLO ATIVO: BRUNO DE OLIVEIRA FÉLIX REPRESENTANTES POLO ATIVO: LEILIA MARIA DA SILVA PEREIRA - DF67674 POLO PASSIVO:CEBRASPE e outros SENTENÇA Trata-se de mandado de segurança, com pedido liminar, impetrado por BRUNO DE OLIVEIRA FÉLIX em face de ato atribuído à DIRETORA GERAL DO CENTRO BRASILEIRO DE PESQUISA EM AVALIAÇÃO E SELEÇÃO E DE PROMOÇÃO DE EVENTOS – CEBRASPE e à UNIÃO, objetivando inclusão na lista de candidatos negros/pardos no concurso público do Superior Tribunal de Justiça para o cargo de Analista Judiciário, Área Judiciária, bem como a reserva de uma vaga até o trânsito em julgado da presente ação.
No mérito, requer a anulação do ato administrativo que a excluiu da lista de cotistas, com sua consequente reintegração às vagas reservadas, alegando direito líquido e certo ao enquadramento como pessoa parda.
Narra que participou do referido concurso concorrendo às vagas destinadas a candidatos negros, nos termos da Lei nº 12.990/2014 e da Resolução CNJ nº 203/2015.
Afirma que apresenta histórico de participação exitosa em concursos anteriores nessa condição, com aprovação e nomeação nas vagas reservadas em certames do TJDFT e do TRF1, bem como nomeação e posse no TST como técnico judiciário, com reconhecimento formal de sua condição racial.
Diz que concurso do STJ, foi aprovado nas provas objetiva e discursiva, obtendo pontuação total superior à do primeiro colocado da lista de cotistas.
No entanto, foi eliminado do certame após procedimento de heteroidentificação, sob a justificativa de não possuir características fenotípicas compatíveis com a condição de pardo, em razão da tonalidade da pele, textura dos cabelos e traços faciais.
Relata que interpôs recurso administrativo, mas a decisão foi mantida, com fundamento na mesma argumentação fenotípica.
Aponta ilegalidade que no ato da banca de heteroidentificação por não ter observado critérios objetivos tampouco assegurado a necessária proteção à dignidade da pessoa humana.
Sustenta que o procedimento foi adotado de forma inadequada e em contrariedade às provas documentais e históricas que demonstram sua identidade racial.
Apresenta, como provas de sua condição, laudos, fotos, nomeações anteriores, homenagens institucionais e manifestações públicas de reconhecimento de sua condição de pardo.
Além disso, demonstra urgência na apreciação da tutela provisória em razão da homologação do concurso e da iminência de nomeações, afirmando que, se não for deferida liminarmente a reserva de vaga, poderá restar esvaziado o objeto do mandado de segurança por inexistência de vaga ao final do processo.
Inicial instruída com procuração e documentos.
Custas pagas IDs 2181674908 e 2181675360.
Valor atribuído à causa: R$ 1.000,00.
A decisão de id. 2181711011 deferiu a medida liminar.
Embargos de declaração opostos pelo Autor, id.2181873995, os quais foram acolhidos para fins de correção de erro material, id. 2181957264.
Informações prestadas pelo CEBRASPE, id. 2185107036.
Em preliminar, suscita inadequação da via eleita por ausência de direito líquido e certo.
No mérito, defende a inexistência de ilegalidade e requer o julgamento de improcedência.
O Ministério Público Federal declinou da intervenção, id. 2188424252.
Sem mais, vieram os autos conclusos. É o relatório.
DECIDO.
Afasto a preliminar de inadequação da via eleita por ausência de direito líquido e certo, considerando que o autor apresentou nos autos elementos suficientes para a análise do direito alegado, tratando-se de matéria atinente ao mérito.
Superada a preliminar, passo ao mérito.
O Autor se inscreveu no Concurso Público do Superior Tribunal de Justiça para o cargo de Analista Judiciário, Área Judiciária, concorrendo às vagas destinadas às Pessoas Negras e Pardas (PNP) sendo eliminado na fase de heteroidentificação, por não apresentar as características fenotípicas inerentes aos afrodescendentes.
Importante destacar que a legitimidade da Comissão de Avaliação de Heteroidentificação já restou sufragada pela Lei 12.990/2014 e pelo entendimento estabelecido na ADPF nº 186/DF e na ADC nº 41/DF, sendo lícito que todos os candidatos autodeclarados negros e pardos sejam a ela submetidos.
Sabe-se que a metodologia de avaliação pelo fenótipo adotada pela Banca de Heteroidentificação tem a missão de garantir a isonomia, a transparência e a aplicação irrestrita das regras firmadas pelo Edital.
Com efeito, tenho considerado que as cotas raciais visam a reparar e compensar a discriminação social eventualmente sofrida por afrodescendentes, sendo imprescindível que os ocupantes das vagas reservadas apresentem, de forma explícita, as características relacionadas aos fatores de discriminação.
Ainda sobre a legitimidade do critério fenotípico, vale colacionar trecho do voto proferido pelo Ministro Luís Roberto Barroso, ao julgar a ADC nº 41/DF, esclarecendo que, no Brasil foram defendidos 3 (três) posicionamentos relativos a cotas sociais, e que hoje, o que prevalece é a terceira posição, vejamos: “A terceira posição é a de que é fora de dúvida que negros e pessoas de pele escura, em geral, enfrentam dificuldades e discriminações ao longo da vida, claramente decorrentes de aspectos ligados à aparência física.
Uma posição inferior, que vem desde a escravidão e que foi potencializada por uma exclusão social renitente”.
Neste mesmo sentido, a Ministra Rosa Weber, consagrou em seu voto no julgamento da ADPF 186/DF que: “No mesmo diapasão, votou a Min.
Rosa Weber: Enfim, no que diz com as comissões de classificação formadas pela UnB para avaliar o preenchimento, pelos candidatos às vagas de cotistas, da condição de negro, deve-se considerar que a discriminação, no Brasil, é visual. (...) Fez Oracy Nogueira, extensas pesquisas entre 1940 e 1955 sobre o preconceito racial no Brasil e nos Estados Unidos, forjando os conceitos de preconceito de origem e preconceito de marca.
Segundo o seu magistério, enquanto nos Estados Unidos prevalece o preconceito de origem, que elege como critério de discriminação a ascendência, a gota de sangue (qualquer que seja a presença de ancestrais do grupo discriminador ou discriminado na ascendência de uma pessoa mestiça, ela é sempre classificada no grupo discriminado), no Brasil viceja o preconceito de marca, em que o fenótipo, a aparência racial é o critério da discriminação, consideradas não só as nuanças da cor como os traços fisionômicos”.
Registro, ademais, que o Supremo Tribunal Federal, na ADPF 186, consolidou que a finalidade legal das leis de cotas raciais não é proteger as pessoas que se sentem negras (pretas ou pardas), mas, antes, aquelas detentoras de vulnerabilidade racial e que estão sujeitas a preconceito no mercado de trabalho. É por isso que o procedimento de verificação da condição autodeclarada de negro (preto ou pardo) tem como critério a avaliação fenotípica que consiste na manifestação visível ou detectável da condição genética de um determinado indivíduo.
Neste ponto, são considerados negros aqueles candidatos pretos ou pardos que possuem traços fenotípicos que induzam a uma vulnerabilidade racial consoante avaliado pela banca verificadora.
No caso dos autos, o Impetrante foi aprovado nas etapas objetiva e discursiva do concurso público do Superior Tribunal de Justiça para o cargo de Analista Judiciário, Área Judiciária, regido pelo Edital nº 1 de 16 de agosto de 2024, (ID 2181675902).
Contudo, foi excluído da lista destinada às cota raciais com fundamento em parecer da comissão de heteroidentificação, que concluiu pela ausência de características fenotípicas associadas à negritude.
No entanto, apresenta elementos probatórios objetivos demonstrando reconhecimento prévio de sua identidade racial, pois atualmente ocupa cargo no TST em vaga destinada a pessoas negras, e foi inclusive homenageado no Dia da Consciência Negra pela referida Corte (ID 2181676299).
Ademais, trouxe fotografias e manifestações públicas de apoio que reforçam a sua autodeclaração (ID 2181676230).
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal reconhece a validade do procedimento de heteroidentificação como medida subsidiária de controle de fraudes, desde que preservada a dignidade da pessoa humana e os princípios do contraditório e da ampla defesa (ADC 41/DF).
Contudo, a prevalência da autodeclaração, especialmente quando amparada por elementos objetivos e reiteradamente reconhecida por instituições públicas, como no caso, deve ser resguardada, sob pena de violação do princípio da segurança jurídica.
Nesse contexto, a decisão que negou a autodeclaração do candidato se mostra incoerente e contraditória, tendo em vista a aprovação do impetrante em vagas reservadas para negros de outro concurso realizado, Nesse sentido, a orientação jurisprudencial do eg.
TRF-1ª Região: APELAÇÃO CÍVEL.
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO.
CONCURSO PÚBLICO.
COTAS RACIAIS.
COMISSÃO DE HETEROIDENTIFICAÇÃO.
NÃO HOMOLOGAÇÃO DA AUTODECLARAÇÃO.
APROVAÇÃO EM CONCURSO ANTERIOR NA CONDIÇÃO DE COTISTA.
COMPROVAÇÃO DA CONDIÇÃO DE PRETO OU PARDO.
SEPARAÇÃO DE PODERES.
NÃO VIOLAÇÃO.
POSSIBILIDADE EXCEPCIONAL DE INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO.
NOMEAÇÃO E POSSE.
POSSIBILIDADE.
APELAÇÕES DESPROVIDAS. 1.
A Lei nº 12.990/2014 estabeleceu, no âmbito da Administração Pública Federal, das Autarquias, das Fundações Públicas, das Empresas Públicas e das Sociedades de Economia Mista controladas pela União, a reserva de 20% das vagas de concursos públicos aos candidatos negros, assim entendidos como aqueles que se autodeclararam pretos ou pardos, conforme o quesito cor ou raça utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (art. 2ª, caput). 2.
No caso dos atos administrativos que eliminam candidatos de certame público, fundamentado em conclusão da comissão de heteroidentificação, a jurisprudência desta Corte admite a interferência do Poder Judiciário quando, dos documentos juntados aos autos, for possível verificar que as características e aspectos fenotípicos do candidato são evidentes, de acordo com o conceito de negro - pretos e pardos - utilizado pelo legislador, baseado nas definições do IBGE. 3. "Se o candidato foi considerado negro para fins de concorrência pelo sistema de cotas raciais em concurso público pretérito organizado pela mesma banca examinadora, faz jus à mesma conclusão em certame realizado pouco tempo depois, sob pena de violação dos princípios da razoabilidade e da isonomia, mormente se fotografias corroboram a conclusão de que o candidato possui características fenotípicas de pessoas negras" (AMS 1022834-33.2019.4.01.3400, Rel.
Juiz Federal Convocado Ilan Presser, TRF1 Quinta Turma, PJe 07/08/2020). 4.
O conjunto probatório constante dos autos demonstrou que a parte autora possui fenótipo negro, o que permite a sua participação no certame na condição de cotista. 5.
Quanto à impossibilidade de nomeação e posse da parte autora, este Tribunal entende que, "como regra, não se permite ao candidato sub judice o direito à nomeação e posse no cargo antes do trânsito em julgado da decisão, ante a inexistência de posse precária em cargo público.
Contudo, as duas Turmas que integram a 3ª Seção deste Tribunal vêm admitindo a nomeação e posse do candidato, mesmo antes do trânsito em julgado da decisão judicial, quando se tratar de questão reiteradamente decidida e o acórdão do Tribunal for unânime.
Precedentes declinados no voto" (AC 1024380-26.2019.4.01.3400, Desembargador Federal Jamil Rosa de Jesus Oliveira, TRF1 - Sexta Turma, PJe 20/06/2023). 6.
Apelações desprovidas. ( TRF-1ª Região; AC 1061963-06.2023.4.01.3400; Rel.
Des.
Federal NEWTON PEREIRA RAMOS NETO, DJ 03/12/2024) De fato, não é possível a fixação de critérios meramente objetivos a serem aplicados no procedimento de verificação previsto na Lei nº 12.990/14, sendo constitucional a aplicação de avaliação fenotípica – de caráter subjetivo – conforme já definiu o STF na ADPF 186.
No entanto, a decisão administrativa deve ser pautada pelos princípios da razoabilidade e isonomia, fazendo jus o Autor a ser considerado enquadrado no sistema de cotas raciais se em certame recente obteve conclusão semelhante.
Ante o exposto, CONCEDO A SEGURANÇA para fins de determinar a anulação da decisão referente a sua avaliação pela comissão do procedimento de heteroidentificação no concurso público objeto dos autos, e para determinar a inclusão do impetrante na lista de candidatos negros/pardos do concurso público para o cargo de Analista Judiciário – Área Judiciária, do Superior Tribunal de Justiça.
Custas adimplidas.
Sem honorários.
Havendo recurso de apelação, à parte recorrida para contrarrazões.
Apresentadas preliminares nas contrarrazões, vista ao apelante.
Tudo cumprido, remetam-se ao TRF.
Publique-se.
Intimem-se.
Oportunamente, arquivem-se.
Brasília, 16 de junho de 2025 (assinado eletronicamente) ADVERCI RATES MENDES DE ABREU Juíza Federal da 20ª Vara/SJDF -
11/04/2025 12:01
Recebido pelo Distribuidor
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11/04/2025 12:01
Autos incluídos no Juízo 100% Digital
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11/04/2025 12:01
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
11/04/2025
Ultima Atualização
17/06/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Despacho • Arquivo
Sentença Tipo A • Arquivo
Sentença Tipo A • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
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