TRF1 - 1005841-18.2025.4.01.4300
1ª instância - 1ª Palmas
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Assistente Desinteressado Amicus Curiae
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Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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24/06/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Tocantins 1ª Vara Federal Cível da SJTO PROCESSO: 1005841-18.2025.4.01.4300 CLASSE: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) POLO ATIVO: ITPAC-INSTITUTO TOCANTINENSE PRESIDENTE ANTONIO CARLOS LTDA REPRESENTANTES POLO ATIVO: LUIZ GUSTAVO ANTONIO SILVA BICHARA - RJ112310 POLO PASSIVO:DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM PALMAS/TO e outros SENTENÇA RELATÓRIO ITPAC - INSTITUTO TOCANTINENSE PRESIDENTE ANTÔNIO CARLOS LTDA impetrou mandado de segurança em face do DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM PALMAS/TO e da UNIÃO (FAZENDA NACIONAL), objetivando o reconhecimento da inexistência de relação jurídico-tributária quanto ao Adicional da CSLL instituído pela Lei nº 15.079/2024.
Argumenta a impetrante, em síntese, que: (i) é mantenedora de instituição de ensino superior, aderente ao PROUNI, estando vinculada a grupo multinacional com receita superior a 750 milhões de euros, nos termos da Lei nº 15.079/2024; (ii) a nova contribuição, denominada Adicional da CSLL, foi instituída para viabilizar a implementação interna das regras GloBE da OCDE, aplicando-se exclusivamente a entidades pertencentes a grupos multinacionais com faturamento global superior ao mencionado patamar; (iii) referido adicional não se caracteriza como mera majoração de alíquota, mas como nova fonte de custeio da seguridade social, razão pela qual deveria ter sido instituído por lei complementar, nos termos dos arts. 195, §4º, e 154, inc.
I, da CF/88; (iv) além disso, a seletividade da incidência conforme critério de vinculação societária transnacional (grupo multinacional) viola os princípios da isonomia, da livre concorrência e da capacidade contributiva, afrontando os arts. 150, inc.
II, 173, inc.
IV e 195, §9º, da CF/88; (v) a nova exação colide frontalmente com a isenção prevista na Lei nº 11.096/2005, especialmente no tocante à CSLL, benefício outorgado às instituições de ensino aderentes ao PROUNI em contrapartida à concessão de bolsas de estudo; (vi) ainda que admitida a validade da exigência, deve ser reconhecido o direito da impetrante de usufruir plenamente da isenção, durante o prazo de vigência dos termos de adesão firmados no âmbito do PROUNI, em observância ao disposto no art. 178 do CTN e à Súmula 544 do STF.
Ao final, requer: (i) o reconhecimento da inexistência de relação jurídico-tributária quanto ao Adicional da CSLL instituído pela Lei nº 15.079/2024; ou (ii) subsidiariamente, o afastamento da exigência até o fim do prazo de vigência dos termos de adesão ao PROUNI ou o afastamento da exigência quanto aos fatos geradores de 2025, ou, ainda, apenas do primeiro trimestre daquele ano; bem como (iv) o reconhecimento do direito à compensação dos valores eventualmente recolhidos a tal título no curso da ação.
Deu à causa o valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais).
Juntou documentos.
A decisão de Id. 2186555820 postergou o exame da tutela para após as informações da autoridade impetrada.
A autoridade impetrada prestou informações no Id. 2188852590, defendendo a legalidade e constitucionalidade do Adicional da CSLL sob o enfoque da compatibilidade com as regras da OCDE e o modelo de tributação mínima efetiva global, rechaçando os argumentos da impetrante.
A UNIÃO (FAZENDA NACIONAL) manifestou interesse em integrar a lide e requereu sua inclusão formal no feito como parte passiva (Id. 2188307639).
O Ministério Público Federal, por sua vez, opinou no sentido de não haver interesse público primário a justificar sua atuação na causa (Id. 2187413738).
Vieram os autos conclusos para sentença. É o relatório.
Passo a decidir.
QUESTÕES PREFACIAIS QUESTÕES PRELIMINARES Não há questões preliminares pendentes de apreciação.
DAS PREJUDICIAIS DE MÉRITO Não há prejudiciais de mérito a serem analisadas.
FUNDAMENTAÇÃO DE MÉRITO Conforme relatado, busca a parte impetrante, ITPAC – INSTITUTO TOCANTINENSE PRESIDENTE ANTÔNIO CARLOS LTDA., a declaração de inconstitucionalidade da cobrança do Adicional da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL, instituído pela Lei nº 15.079/2024, ao fundamento de que tal exação não possui fundamento constitucional válido, com efeitos concretos na apuração e recolhimento da contribuição referente ao ano-calendário de 2025.
Para tanto, sustenta, em síntese, que o chamado “Adicional da CSLL” representa, na realidade, uma nova fonte de custeio da seguridade social, o que exigiria a edição de lei complementar, nos termos do art. 195, § 4º, da Constituição Federal.
Aduz, ainda, que a exação viola o princípio da isonomia e da livre concorrência ao adotar, como critério de sujeição passiva, a integração da pessoa jurídica brasileira a grupo multinacional com receita global superior a € 750 milhões.
Defende, outrossim, a aplicabilidade da isenção da CSLL prevista na Lei nº 11.096/2005 (PROUNI) também em relação ao adicional ora impugnado.
Alega, por fim, que a exigência do tributo para o ano-calendário de 2025 afronta os princípios da anterioridade nonagesimal e da irretroatividade, uma vez que a lei instituidora foi publicada apenas em 30 de dezembro de 2024.
Em contraposição, argumenta a autoridade impetrada que o Adicional da CSLL tem natureza de mero acréscimo quantitativo à contribuição já existente, mantendo-se vinculado à mesma hipótese de incidência – o lucro das pessoas jurídicas – e à mesma destinação constitucional.
Alega, ainda, que a diferenciação por critério de receita global do grupo econômico multinacional encontra amparo no art. 195, § 9º, da CF/88, ao refletir o porte empresarial.
Sustenta, ademais, que a isenção conferida às entidades participantes do PROUNI se restringe à CSLL prevista na Lei nº 7.689/1988, não se estendendo a adicionais instituídos por legislação diversa.
Por fim, aduz que a exigência do tributo em 2025 respeita a noventena constitucional, tendo em vista a publicação da Medida Provisória nº 1.262/2024, de conteúdo materialmente equivalente, em data anterior.
Portanto, a análise da existência de direito líquido e certo a ser amparado pela via do mandado de segurança passa por: (i) aferir se o Adicional da CSLL configura nova fonte de custeio da seguridade social, exigindo lei complementar para sua instituição; (ii) verificar a constitucionalidade do critério de sujeição passiva adotado, à luz dos princípios da isonomia tributária e da livre concorrência; (iii) definir a extensão da isenção da CSLL prevista no PROUNI ao adicional impugnado; e (iv) apurar a observância dos princípios da anterioridade nonagesimal e da irretroatividade no tocante à exigência do tributo no exercício de 2025.
ADEQUAÇÃO AO PILAR 2 DA OCDE: ADICIONAL DE CSLL Com vistas a alinhar a legislação tributária brasileira ao Pilar 2 do projeto BEPS da OCDE – que estabelece diretrizes internacionais contra a erosão da base tributária e a transferência artificial de lucros –, foi editada a Medida Provisória nº 1.262/2024, posteriormente encampada pela Lei nº 15.079/2024.
Essa norma criou o Adicional de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (Adicional de CSLL), com o propósito de implementar uma tributação corporativa mínima sobre os lucros auferidos por grupos multinacionais no país.
O modelo internacional adotado estabelece que grupos empresariais com receita consolidada anual igual ou superior a €750.000.000 (setecentos e cinquenta milhões de euros) estejam sujeitos, em cada jurisdição em que operem, a uma tributação mínima de 15% (quinze por cento) sobre seus lucros.
Busca-se, com isso, inibir práticas de planejamento tributário agressivo – como a alocação artificial de lucros em países de baixa tributação – e assegurar que a arrecadação ocorra no país onde a riqueza é efetivamente gerada.
Dentro desse contexto, o ordenamento internacional permite que cada país institua uma tributação doméstica complementar, denominada Qualified Domestic Minimum Top-Up Tax (QDMTT), cujo objetivo é suprir eventual diferença entre a carga tributária efetiva suportada por essas entidades e a alíquota mínima exigida.
A adoção do QDMTT, como instrumento interno, garante ao país onde o lucro foi produzido – no caso, o Brasil – a primazia na arrecadação dessa diferença.
Assim, ao instituir o Adicional de CSLL com base nos parâmetros do QDMTT, a legislação nacional pretende não apenas combater a evasão fiscal transnacional, mas também preservar sua soberania fiscal e a integridade de sua arrecadação.
A Lei nº 15.079/2024 foi elaborada com observância aos conceitos e parâmetros técnicos definidos pelo modelo GloBE da OCDE.
Seu art. 1º deixa claro que o objetivo é assegurar a efetiva incidência de uma alíquota mínima de 15% (quinze por cento) sobre os lucros, nos exatos termos das regras internacionais.
Já o art. 4º restringe sua aplicação aos grupos multinacionais que, em pelo menos dois dos quatro exercícios anteriores, tenham atingido o patamar de receita consolidada previsto no modelo global.
A apuração do Adicional de CSLL parte do lucro contábil ajustado da entidade, conforme as normas contábeis aplicáveis (IFRS ou locais), sendo submetido a ajustes específicos estabelecidos pelas regras GloBE.
Esses ajustes envolvem, por exemplo, a consolidação dos resultados por jurisdição e a exclusão de parcelas relacionadas à substância econômica (carve-outs), nos termos do art. 21 da referida lei.
Tais mecanismos visam, em tese, garantir a qualificação do tributo como QDMTT perante a OCDE, além de assegurar conformidade com as limitações constitucionais aplicáveis à base de cálculo de tributos no Brasil.
A regulamentação do Adicional de CSLL foi atribuída à Receita Federal do Brasil, a quem compete editar atos normativos complementares com base nas diretrizes e comentários da OCDE.
A legislação exige, ainda, que esses atos sejam periodicamente atualizados para manter aderência ao marco interpretativo do chamado Inclusive Framework.
Importante ressaltar que, para preservar os princípios constitucionais da legalidade, da anterioridade nonagesimal e da anterioridade anual (art. 150, inc.
III, alíneas “b” e “c”, e art. 195, § 6º, da Constituição Federal), as alterações regulamentares que impliquem aumento de carga tributária só produzirão efeitos a partir do exercício seguinte e após decorrido o prazo de 90 (noventa) dias da respectiva publicação.
Por fim, destaca-se o art. 36 da Lei nº 15.079/2024, segundo o qual os valores referentes ao Adicional de CSLL serão considerados “não recolhidos” enquanto estiverem sob litígio judicial.
Com isso, tais montantes não poderão ser computados como tributo efetivamente pago para fins de apuração da alíquota global sob as regras GloBE, o que pode ensejar a tributação residual por outras jurisdições.
Apesar das críticas doutrinárias que apontam possível restrição ao acesso à jurisdição, o legislador buscou resguardar a arrecadação nacional e prevenir situações de dupla não tributação, que poderiam ocorrer em caso de contestação judicial sem compensação correspondente no cálculo global do grupo multinacional.
Estabelecido esse panorama introdutório, passa-se à análise dos aspectos constitucionais que envolvem a instituição do Adicional de CSLL pela Lei nº 15.079/2024.
I – (DES)NECESSIDADE DE LEI COMPLEMENTAR A primeira questão a ser analisada é se o Adicional de CSLL configura, ou não, uma “nova fonte de custeio da seguridade social”, o que demandaria edição via lei complementar, nos termos do art. 195, §4º, da CF/88.
O argumento baseia-se na ideia de que o adicional, apesar do nome, não seria mero acréscimo da CSLL existente, mas sim uma contribuição nova, com base de cálculo e fato gerador distintos dos já previstos, escapando das hipóteses do art. 195, inc.
I, da CF.
Assim, segundo o impetrante, a exação não se constitui como verdadeiro adicional, pois ressignifica o conceito de lucro tributável (adotando o lucro GloBE e lucros excedentes), criando, assim, nova forma de contribuição social não previamente contemplada na Constituição Federal.
Como se sabe, a CSLL tradicional, instituída pela Lei nº 7.689/1988, tem fundamento de validade no art. 195, inc.
I, “c”, da CF/88, que prevê a possibilidade de contribuição social sobre o lucro.
Essa previsão foi incluída no texto constitucional pela Emenda Constitucional nº 20/1998 e, desde então, consolidou-se entendimento no sentido de que, para as hipóteses expressamente previstas no caput do art. 195, basta a edição de lei ordinária para sua instituição, sendo exigida a via complementar apenas quando se tratar de nova base econômica não contemplada naquele rol (art. 195, § 4º, c/c art. 154, inc.
I, da Constituição) (STF.
Plenário.
RE 700.922/RS, Rel.
Ministro Marco Aurélio, Red.
Acórdão: Ministro Alexandre de Moraes, DJe 16/05/2023).
No caso, o Adicional da CSLL apoia-se exatamente na hipótese constitucional do lucro.
Trata-se, em essência, de contribuição social sobre o lucro das empresas, assim como a CSLL tradicional.
Ademais, a própria Lei 15.079/2024 afirma “mantida a destinação da CSLL” (art. 2º) e utiliza a nomenclatura de Adicional dessa contribuição, evidenciando a mesma natureza jurídica.
Como destacado nas informações apresentadas pela autoridade, tanto a CSLL original quanto o adicional fundam-se na competência da União para contribuir sobre o lucro (art. 149, caput, c/c art. 195, inc.
I, “c”), possuindo, portanto, idêntica natureza jurídica e finalidade. É verdade que o adicional adota critérios de apuração distintos da CSLL tradicional (por exemplo, cálculo por jurisdição consolidada e exclusão de parcela do lucro).
Porém, ambos os tributos partem do lucro contábil da entidade.
Com efeito, enquanto a Lei nº 7.689/88 fixa como base o “resultado do exercício antes da provisão para IR”, a Lei nº 15.079/2024 define o “lucro (ou prejuízo) GloBE” como o lucro líquido contábil do ano fiscal ajustado conforme Anexo I.
Ou seja, a grandeza econômica subjacente é a mesma – o lucro contábil da pessoa jurídica – ainda que o adicional aplique ajustes específicos seguindo as diretrizes internacionais.
As diferenças (consolidação multi-entidades, exclusão de itens etc.) não descaracterizam a essência da materialidade tributada, que permanece sendo o resultado lucrativo da atividade empresarial.
A distinção central é que o adicional incide apenas sobre um subconjunto do lucro: o chamado lucro excedente (lucro após a exclusão de substância e franquias).
Trata-se de espécie do gênero “lucro”, alcançada por disciplina de cálculo diversa, necessária para qualificar a exação como QDMTT no plano internacional.
Essa formatação específica atende a objetivos de política fiscal global (permitindo ao país captar o imposto mínimo) sem afrontar a Constituição, pois não extrapola os limites do conceito de lucro tributável autorizados pelo texto constitucional.
Em suma, o lucro excedente GloBE nada mais é do que parte do lucro da empresa, recortada por critérios legais – o que se insere na liberdade do legislador de definir bases, dentro do gênero autorizado.
Aliás, o art. 195, § 9º, da Constituição autoriza expressamente a adoção de bases diferenciadas para contribuições: Art. 195.
A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre: a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício; b) a receita ou o faturamento; c) o lucro; .............................. § 9º As contribuições sociais previstas no inciso I do caput deste artigo poderão ter alíquotas diferenciadas em razão da atividade econômica, da utilização intensiva de mão de obra, do porte da empresa ou da condição estrutural do mercado de trabalho, sendo também autorizada a adoção de bases de cálculo diferenciadas apenas no caso das alíneas “b” e “c” do inciso I do caput.
Dessa forma, não se vislumbra a criação de nova fonte de custeio da seguridade social, mas sim o exercício da competência tributária já existente, com modulação de alíquota e base de cálculo voltada à efetividade de um padrão fiscal internacional.
A instituição do adicional por meio de lei ordinária está em conformidade com os arts. 149 e 195, inc.
I, “c”, da Constituição, inexistindo afronta ao §4º do art. 195 ou ao art. 154, inc.
I, do mesmo diploma.
II – (IN)CONSTITUCIONALIDADE MATERIAL A segunda linha de argumentação da impetrante reside na alegação de inconstitucionalidade material do Adicional da CSLL, por suposta afronta aos princípios da isonomia tributária (art. 150, inc.
II, CF), da livre concorrência (art. 170, inc.
IV, CF) e da vedação à diferenciação sem amparo constitucional (art. 195, §9º, CF).
O cerne da discussão está, portanto, no critério de sujeição passiva do tributo, que recai exclusivamente sobre entidades pertencentes a grupos multinacionais com receita anual consolidada superior a €750 milhões.
Como visto, o Adicional de CSLL não alcança universalmente todas as pessoas jurídicas, mas somente aquelas vinculadas a grupos multinacionais de grande porte (receita consolidada acima de €750 milhões).
Em consequência, empresas estritamente nacionais – ainda que faturem quantias elevadas – não estarão sujeitas a essa exação, ao passo que subsidiárias brasileiras de multinacionais, ou mesmo grupos brasileiros com operações externas, acima do limiar, serão tributadas.
Há, de fato, uma discriminação quanto à sujeição passiva do tributo, que, contudo, no meu entender, não se afasta da autorização constitucional.
A regra matriz da isonomia tributária (art. 150, inc.
II, CF) veda tratamento desigual entre contribuintes que se encontram em situação equivalente, salvo distinções razoáveis e objetivas previstas em lei.
Em princípio, nada impede o legislador de tributar de forma distinta contribuintes de maior capacidade contributiva ou diferentes circunstâncias de atuação, desde que haja justificativa plausível.
A própria Constituição prevê, por exemplo, alíquotas progressivas conforme o salário de contribuição (art. 195, inc.
II) e admite isenções e regimes especiais para estimular determinados setores ou situações.
A isonomia requer avaliar se há racionalidade e coerência no recorte adotado.
No caso do Adicional da CSLL, a razoabilidade do discrímen reside em dois fatores: (1) capacidade contributiva/capitalização global – grupos multinacionais gigantes possuem, em tese, maior aptidão econômica e recursos para planejamento tributário agressivo, justificando uma medida contra erosão de base dirigida a eles; e (2) simetria com padrão internacional – o recorte não é arbitrário, mas deriva de um consenso multilateral (limite de €750 mi constante das regras GloBE) para focalizar grupos que apresentam risco significativo de deslocamento de lucros.
Como expressamente justificado na Exposição de Motivos da MPv 1.262/2024: 19.
A subtributação pode decorrer de uma série de motivos, dentre os quais estão a adoção de alíquotas nominais reduzidas e a generosa oferta de incentivos fiscais, os quais podem ser revertidos, respectivamente, por meio da elevação das referidas alíquotas e da supressão daqueles benefícios.
Caso bem-sucedida na eliminação da subtributação, é provável que a jurisdição eleve as suas receitas tributárias e não seja necessária a aplicação da IIR ou da UTPR.
Tais medidas, embora solucionem o problema, podem requerer tempo demasiado, bem como acabar onerando, de forma indesejada, outras entidades que não estariam dentro do escopo das Regras GloBE.
Do Tributo Complementar Mínimo Doméstico Qualificado 20.
Nesse contexto, as Regras GloBE preveem outra forma de as jurisdições em que ocorre a subtributação recolherem o tributo complementar.
Trata-se da adoção de um Tributo Complementar Mínimo Doméstico Qualificado (Qualified Domestic Minimum Top-up Tax - QDMTT).
A adoção de um QDMTT altera a ordem de aplicação das Regras GloBE, na medida em que a jurisdição com baixa tributação que o adotar terá prioridade no recolhimento do tributo em detrimento das jurisdições que implementaram a IIR e a UTPR, nas quais, em geral, estão localizadas as investidoras ou outras entidades constituintes do grupo multinacional.
Assim, ao introduzir um QDMTT, a própria jurisdição em que restou configurada a subtributação recolhe a receita tributária dela decorrente, ao invés de outras jurisdições. 21.
As Regras GloBE definem um QDMTT como um tributo mínimo incluído na legislação doméstica de uma jurisdição que: (i) determina os lucros excedentes (excess profit) das entidades constituintes localizadas na jurisdição em consonância com o determinado pelas Regras GloBE; (ii) opera para aumentar para 15% (quinze por cento) o montante devido de tributo doméstico relativamente aos lucros excedentes; e (iii) é implementado e administrado de maneira consistente com os resultados previstos nas Regras GloBE, Comentário às Regras (Tax Challenges Arising from the Digitalisation of the Economy - Commentary to the Global Anti-Base Erosion Model Rules) e nas Orientações Administrativas (Administrative Guidance), e desde que a jurisdição não conceda benefícios relacionados a tais regras.
Do Brasil Enquanto Jurisdição Onde Ocorre a Subtributação 22.
A adoção de alíquotas nominais elevadas por si só não garante que uma jurisdição não será considerada subtributada.
A existência de regimes fiscais favorecidos e a divergência de tratamento conferida pela legislação doméstica e pelas Regras GloBE para os mesmos fatos econômicos podem resultar em alíquotas efetivas superiores ou inferiores às alíquotas nominais e à alíquota efetiva mínima de 15% (quinze por cento), parâmetro inicial adotado para a caracterização como jurisdição subtributada para fins de aplicação das Regras GloBE. 23.
Dados revelam que há número considerável de grupos multinacionais dentro do escopo das Regras GloBE que está sujeito a alíquotas efetivas inferiores a 15% (quinze por cento) no Brasil, ao passo que a alíquota nominal chega a aproximadamente 34% (trinta e quatro por cento), o que pode ser explicado em razão da fruição combinada dos variados incentivos fiscais previstos na legislação brasileira. 24.
Diante desse contexto, verifica-se que o Brasil se enquadra no conceito de jurisdição com regimes de baixa tributação.
Consequentemente a falta de adoção de mecanismos de resposta à subtributação poderá dar margem ao recolhimento de tributo complementar pelos grupos multinacionais em outras jurisdições, o que representaria uma “exportação” de receita tributária pelo não exercício do direito de tributar.
Da Introdução do Adicional da CSLL no Brasil com Características de QDMTT 25.
A fim de exercer a prioridade na arrecadação das receitas tributárias que surgirão com a implementação das regras GloBE, esta Medida Provisória propõe a instituição do Adicional da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, devendo as suas características serem estabelecidas de modo que lhe possibilitem ser qualificada como um QDMTT. 26.
Ao implementar um QDMTT na legislação brasileira, a medida confere ao Brasil a prioridade na arrecadação do tributo complementar que, caso contrário, seria recolhido em outra jurisdição.
Além disso, a qualificação do Adicional da CSLL como um QDMTT tem o potencial de reduzir eventual tributo complementar residual a ser recolhido em outra jurisdição. 27.
Percebe-se, assim, a importância do processo de qualificação das regras a serem introduzidas no ordenamento jurídico doméstico, que devem estar em total conformidade com o modelo de regras, com as orientações administrativas acordadas e com os demais documentos publicados pelo Quadro Inclusivo sobre BEPS, e o perigo de uma eventual “customização” da legislação proposta.
Caso ocorra essa “customização”, as empresas que atuam no Brasil poderão ser tributadas além do necessário. .............................. 54.
Em relação à instituição do Adicional de CSLL, cabe mencionar que a medida implica aumento de receita tributária estimada na ordem de R$ 3,44 bilhões (três bilhões e quatrocentos e quarenta milhões de reais) em 2026, R$ 7,28 bilhões (sete bilhões e duzentos e oitenta milhões de reais) em 2027, e R$ 7,69 bilhões (sete bilhões e seiscentos e noventa milhões de reais) em 2028.
Assim, a opção legislativa teve fundamento em parâmetros técnicos e acordados internacionalmente, não se tratando de discriminação caprichosa ou arbitrária.
Ressalta-se que a própria Constituição explicitamente autoriza tratar contribuições sociais de forma diferenciada conforme certas características dos contribuintes.
O art. 195, § 9º, com base no princípio da equidade na participação no custeio, dispõe que a lei poderá estabelecer alíquotas ou bases de cálculo diferenciadas “em razão da atividade econômica, da utilização intensiva de mão de obra, do porte da empresa ou da condição estrutural do mercado de trabalho”.
No caso em tela, o legislador fundamentou a diferenciação principalmente no porte da empresa/grupo.
Ao restringir o adicional apenas a grupos de grande porte (acima de €750 mi), a lei efetivamente elegeu o critério do tamanho empresarial, o que se amolda à hipótese autorizada (porte da empresa) no texto constitucional.
Ademais, o critério de sujeição passiva adotado pela Lei nº 15.079/2024 – vinculação a grupo multinacional com receita global superior a €750 milhões – expressa, ainda que de forma indireta, o porte econômico da entidade controladora do grupo, o que, segundo o modelo GloBE da OCDE, reflete maior capacidade contributiva do conjunto econômico como um todo.
Dessa forma, a vinculação jurídica da controlada brasileira a esse conglomerado multinacional justifica a diferenciação tributária com base no art. 195, § 9º, da Constituição Federal, especialmente na medida em que os efeitos econômicos e fiscais da atuação do grupo são projetados sobre suas entidades locais.
Ou seja, ainda que se trate de subsidiária brasileira, o vínculo jurídico com o grupo multinacional gera repercussões patrimoniais e operacionais que justificam, sob a ótica da capacidade contributiva agregada, tratamento tributário diferenciado.
O critério adotado visa capturar essa realidade econômica consolidada, tal como reconhecido no art. 195, § 9º, da Constituição.
E não deve prosperar o argumento de que essa distinção criaria uma desigualdade entre empresas nacionais e estrangeiras atuantes no Brasil, em possível afronta à livre concorrência.
De fato, imaginem-se duas empresas com igual faturamento e setor, mas uma pertencente a grupo estrangeiro e outra integralmente brasileira: somente a primeira pagaria o adicional.
No entanto, a diferença não decorre de nacionalidade do capital em si (a lei não tributa “estrangeiros” por serem estrangeiros), mas sim de uma realidade econômica diferenciada – grupos multinacionais tendem a ter facilidades de planejamento global, usufruindo de jurisdições de baixa tributação, o que não ocorre com empresas domésticas.
A finalidade da norma foi alcançar lucros que potencialmente escapam à tributação plena no Brasil, cenário típico de multinacionais.
Assim, sob o prisma material, pode-se defender que os grupos multinacionais não estão em condição idêntica às empresas estritamente nacionais, justificando regime distinto.
Ou seja, o princípio da isonomia tributária não impede o tratamento diferenciado quando houver fatores de distinção legítimos e razoáveis, consonantes com a capacidade contributiva.
Tampouco se vislumbra afronta ao princípio da livre concorrência (art. 170, inc.
IV, CF), o qual exige que o Estado não favoreça nem prejudique, indevidamente, certos agentes econômicos em detrimento de outros, preservando condições competitivas equilibradas.
Conquanto no curto prazo, a incidência do adicional apenas sobre filiais de multinacionais possa elevar a carga tributária dessas em relação às empresas nacionais, o que a priori seria desfavorável à sua competitividade no mercado interno, deve-se ponderar que: (i) Nível de tributação prévio: conforme apresentado na exposição de motivos, muitas multinacionais alcançadas possivelmente vinham recolhendo menos de 15% sobre seus lucros (por incentivos, planejamentos etc.), de modo que o adicional tende a equiparar sua carga a um patamar mínimo, reduzindo eventuais vantagens competitivas indevidas que elas tinham sobre concorrentes locais que pagam alíquota cheia; e (ii) Dimensão internacional da concorrência: a preocupação maior é garantir que tais grupos paguem impostos em algum lugar, evitando concorrência fiscal predatória entre países.
Sob essa ótica, o adicional promove equidade fiscal global, com reflexos domésticos potencialmente neutros ou até benéficos à concorrência leal.
Não parece caracterizar-se, portanto, uma medida de proteção de mercado interno nem de ataque a estrangeiros, mas sim cumprimento de acordo internacional visando justiça tributária.
Ademais, diferenciações tributárias setoriais ou por categoria de empresa não são inéditas nem vedadas – exemplos: alíquotas mais altas de CSLL para instituições financeiras (art. 18 da Lei 13.169/2015, CSLL de 20% para bancos), regimes diferenciados para SIMPLES vs. grandes empresas etc.; o importante é que haja base constitucional, finalidade legítima e proporcionalidade.
No caso de instituições financeiras e seguradoras, o STF já rechaçou a alegação de falta de isonomia por compreender que a maior capacidade e peculiaridades do setor justificavam a contribuição majorada (STF.
Plenário.
ADIs 4.101/DF e 5.485/DF, Rel.
Ministro Luiz Fux, DJe 06/07/2020).
Por analogia, grupos multinacionais de grande porte também formam um subsetor diferenciado, o que autoriza tratamento tributário específico com fundamento nos princípios da equidade e da capacidade contributiva, sem violar a livre concorrência quando orientado pelo interesse público (coibir fuga de receitas tributárias).
Portanto, o critério de sujeição passiva do Adicional de CSLL, embora inovador, encontra amparo na Constituição.
A diferença por porte da empresa está literalmente prevista no art. 195, § 9º, e a situação dos grupos multinacionais, notadamente quanto à possibilidade de elisão internacional, constitui fundamento idôneo para distinção, atendendo à isonomia vertical (capacidade contributiva proporcional) e sem afrontar a igualdade concorrencial de forma ilegítima.
Ademais, a medida visa preservar a justiça fiscal e a concorrência leal em âmbito global, o que está em harmonia com os princípios constitucionais informadores da ordem econômica e tributária.
III – ISENÇÃO DO PROUNI (ART. 8º, LEI 11.096/2005) O art. 8º, inc.
II, da Lei nº 11.096/2005 (Programa Universidade para Todos – PROUNI) concede às instituições de ensino superior que aderem ao programa, mediante oferta de bolsas a estudantes carentes, isenção integral de diversos tributos federais, incluídos o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e a CSLL.
Enquanto perdurar sua adesão e cumprimento das condições, essas entidades usufruem do benefício isentivo sobre tais exações.
Trata-se de um incentivo fscal concedido sob condição onerosa e por prazo determinado, já que vinculado à manutenção de bolsas (condição onerosa) e formalizado em termos de adesão periódicos.
Com a instituição do Adicional da CSLL em 2024, questiona-se se as entidades educacionais benefcentes participantes do PROUNI estariam dispensadas também do pagamento desse adicional, por força da isenção de CSLL que já possuem.
Duas interpretações são possíveis: (a) se o Adicional for considerado meramente parte da CSLL, a isenção do art. 8º, inc.
II, Lei 11.096/05 abarcaria tanto a CSLL “normal” quanto o adicional (já que a lei não distinguiu alíquotas ou parcelas da CSLL, falando genericamente em isenção de CSLL); (b) se o Adicional for tido como tributo autônomo (embora acessório), então, por não estar expressamente mencionado na lei do PROUNI, não haveria isenção, exigindo seu recolhimento pelas instituições, sob pena de confguração de nova contribuição não coberta pela franquia legal.
Tenho que deve ser acolhida a segunda linha de interpretação.
Isso, porque, ainda que o novo adicional da contribuição esteja estruturado sobre a mesma base econômica da CSLL original, isto é, o lucro ajustado das pessoas jurídicas – não se trata de mera majoração da alíquta daquela contribuição originária, mas de efetiva criação de uma nova espécie de contribuição, com regime jurídico próprio, fato gerador específico e sujeição passiva restrita.
O próprio art. 2º da Lei nº 15.079/2024 deixa claro que se trata de contribuição nova, com teleologia voltada à conformidade com compromissos multilaterais assumidos pelo Estado brasileiro.
Diante dessa natureza normativa autônoma, não se pode presumir a extensão da isenção prevista para a CSLL ordinária a esse adicional específico, nos termos do art. 111, inc.
II, do Código Tributário Nacional, que consagra o princípio da literalidade das isenções tributárias: Art. 111.
Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sôbre: ..............................
II - outorga de isenção; Como visto, o benefício fiscal do PROUNI foi concedido em contrapartida ao cumprimento de obrigações pactuadas com o Poder Público, como a oferta de bolsas de estudo em condições determinadas.
A isenção outorgada tem caráter objetivo e restrito, voltado à configuração legal da CSLL prevista na Lei nº 7.689/1988.
Não há, na Lei nº 11.096/2005, qualquer remissão genérica que autorize a aplicação automática do benefício a outras contribuições que venham a incidir sobre a mesma base econômica.
Sustenta a impetrante que a isenção do PROUNI abrangeria todo e qualquer acréscimo tributário incidente sobre o lucro, inclusive o adicional ora impugnado.
Tal entendimento, contudo, conflita com o regime jurídico da isenção tributária.
Como já destacado, a interpretação extensiva de norma isentiva não é admitida, razão pela qual eventual ampliação da desoneração dependeria de previsão legislativa expressa, que inexiste no presente caso.
Ademais, o caráter oneroso e bilateral da adesão ao PROUNI não altera esse panorama.
Embora a jurisprudência reconheça que benefícios fiscais concedidos sob condição onerosa e por prazo certo não podem ser suprimidos discricionariamente pelo Poder Público (S. 544/STF), tal vedação se refere à revogação ou redução do benefício já instituído, e não à incidência de nova exação fundada em regime jurídico distinto.
Não se verifica, portanto, qualquer supressão indevida da isenção concedida – apenas a sua inaplicabilidade a contribuição diversa, não contemplada pela norma originária.
Vale ressaltar que não há, no caso, qualquer conflito normativo entre a Lei nº 11.096/2005 e a Lei nº 15.079/2024, quanto à previsão de isenção.
Trata-se de objetos distintos: a CSLL comum continua isenta para as instituições de ensino, e o adicional é cobrado à parte.
Conforme salientado nas informações da União, “nada se alterou e não se suprimiu a isenção prevista pelo art. 8º, II, da Lei 11.096/2005, tendo o legislador somente optado por não a estender também ao Adicional de CSLL”.
Ou seja, não houve revogação tácita da isenção, mas apenas a não-inclusão do novo tributo no alcance daquela.
Nesse cenário, não cabe falar em prevalência de lei especial anterior sobre geral posterior, pois a lei posterior convive harmonicamente com a anterior, atuando em esferas diferentes (a CSLL originária continua sujeita à isenção especial; já o Adicional, por não ter previsão na lei especial, segue a regra geral de incidência).
Por fim, deve ser afastada a alegação de que a cobrança do Adicional retiraria parcialmente a contrapartida fscal que o Poder Público ofereceu às instituições em troca das bolsas, representando um retrocesso em política pública educacional.
A uma, porque o valor do Adicional da CSLL é de no máximo 15% sobre o lucro efetivo excedente; muitas instituições PROUNI talvez nem tenham “lucro” contábil signifcativo após oferecer bolsas (podem operar no equilíbrio), ou se tiverem, o impacto marginal precisa ser ponderado; a duas, porque o programa permanece em vigor e seu incentivo principal (isenção de IRPJ, CSLL base, PIS/COFINS) segue intacto.
Não houve revogação do benefício, mas sim a instituição de um novo ônus que, embora mitigue um pouco a vantagem, não a elimina.
Em outras palavras, o ente público não “quebrou” o pacto – ele continua honrando a isenção dos tributos listados na lei do PROUNI; o surgimento de um tributo novo não prometido naquele pacto não confgura traição da confança, mas exercício regular da competência tributária dentro dos limites legais.
Portanto, a isenção do PROUNI, tal como redigida na Lei 11.096/2005, não alcança automaticamente o Adicional de CSLL da Lei 15.079/2024.
A literalidade da norma isentiva e a ausência de previsão específca impedem sua aplicação extensiva ao novo tributo.
Consequentemente, as instituições de ensino participantes do PROUNI, em princípio, estão sujeitas ao pagamento do Adicional da CSLL, se preencherem os critérios de sujeição (i.e., integrarem grupo multinacional acima do porte mínimo).
Não há violação frontal à Constituição nesse ponto, pois não se retirou isenção previamente garantida – manteve-se a existente, e o novo encargo incide de forma prospectiva, geral e isonômica dentro de sua classe de contribuintes.
Além disso, qualquer ampliação judicial da isenção sem amparo legal afrontaria o art. 111 do CTN.
IV – ANTERIORIDADE TRIBUTÁRIA Por fim, sustenta a impetrante que a exigência do tributo para o ano-calendário de 2025 afrontaria os princípios da anterioridade nonagesimal e da irretroatividade, uma vez que a lei instituidora foi publicada apenas em 30 de dezembro de 2024.
A tese, contudo, não merece prosperar.
De fato, a Medida Provisória nº 1.262/2024 foi publicada em 3 de outubro de 2024, produzindo efeitos imediatos desde então, nos termos do art. 62, § 3º, da Constituição Federal.
E, apesar da perda de eficácia formal, o seu conteúdo material foi integralmente encampado pela Lei nº 15.079/2024.
Ou seja, tratou-se, na hipótese, apenas de alteração da forma jurídica, mas com clara continuidade normativa, pois, a despeito da revogação tácita da medida provisória (art. 2º, § 1º, LINDB), a disciplina jurídica nela estabelecida permaneceu inalterada e ininterrupta com a edição da nova lei.
Nessa perspectiva, é legítima a contagem do prazo de anterioridade nonagesimal a partir da publicação da medida provisória, como propugna a autoridade impetrada, sobretudo diante da identidade substancial entre os comandos normativos e da ausência de inovação material relevante no processo legislativo.
A própria Lei nº 15.079/2024, em seu art. 3º, § 5º, reafirma que alterações que impliquem aumento de carga tributária somente produzirão efeitos após o ano subsequente à sua publicação ou após 90 dias, o que corrobora o respeito aos princípios constitucionais de anterioridade.
Não se desconhece que a CSLL e seu adicional, a exemplo do que ocorre com o imposto de renda, possuem fato gerador de natureza complexiva, com apuração periódica baseada no lucro do contribuinte ao longo do exercício financeiro.
O Supremo Tribunal Federal reconheceu que, nesse tipo de hipótese, a lei aplicável ao tributo deve estar vigente antes do início do período de apuração, sob pena de se configurar aplicação retroativa da exação (STF.
Plenário.
RE 159.180/MG, Rel.
Ministro Marco Aurélio, DJe 17/08/2020).
Assim, não se exige que a anterioridade nonagesimal se projete até a data da ocorrência do fato imponível em si (o encerramento do exercício ou a apuração trimestral), mas apenas que se observe sua fluência antes do marco inicial do período de referência.
No caso concreto, a medida provisória foi publicada em 03/10/2024 e completou o prazo de 90 (noventa) dias em 01/01/2025 – exatamente na data em que se inicia o período de apuração do exercício de 2025.
Assim, tanto a anterioridade nonagesimal quanto a anterioridade do exercício foram integralmente respeitadas, não havendo qualquer violação aos arts. 150, inc.
III, “b” e “c”, ou 195, § 6º, da Constituição Federal.
Dessa forma, não se constata qualquer ofensa à segurança jurídica ou retroação indevida da norma, sendo legítima a exigência do Adicional da CSLL a partir dos fatos geradores ocorridos no ano-calendário de 2025.
CONCLUSÃO Em resumo, deve ser denegada a segurança pleiteada por ITPAC – INSTITUTO TOCANTINENSE PRESIDENTE ANTÔNIO CARLOS LTDA, diante da ausência de direito líquido e certo quanto ao afastamento da cobrança do Adicional da CSLL instituído pela Lei nº 15.079/2024.
A análise demonstrou que o adicional não configura nova fonte de custeio da seguridade social, mas sim exercício da competência tributária já prevista no art. 195, inc.
I, “c”, da Constituição Federal, sendo legítima sua instituição por lei ordinária.
O critério de sujeição passiva baseado no porte empresarial e na vinculação a grupos multinacionais encontra amparo no art. 195, § 9º, da CF/88, não violando os princípios da isonomia tributária e da livre concorrência, na medida em que reflete diferenciação razoável fundada na capacidade contributiva e na necessidade de coibir práticas de elisão fiscal internacional.
Ademais, deve ser rejeitada a pretensão de extensão da isenção do PROUNI ao Adicional da CSLL, tendo em vista que o benefício previsto no art. 8º, inc.
II, da Lei nº 11.096/2005 alcança exclusivamente a CSLL tradicional, não abrangendo contribuições instituídas por legislação posterior e com regime jurídico autônomo.
A interpretação literal das normas isentivas, conforme determina o art. 111, inc.
II, do CTN, impede a aplicação extensiva do benefício a tributos não expressamente contemplados na lei concessiva.
Por fim, deve ser afastada a alegação de violação aos princípios da anterioridade tributária, considerando que a Medida Provisória nº 1.262/2024, de conteúdo materialmente idêntico à lei posterior, foi publicada em 03/10/2024, respeitando tanto a anterioridade nonagesimal quanto a anterioridade do exercício para a exigência do tributo no ano-calendário de 2025.
Destarte, não restou demonstrada qualquer inconstitucionalidade material ou formal do Adicional da CSLL, sendo legítima sua cobrança nos termos estabelecidos pela Lei nº 15.079/2024, em observância aos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil no âmbito do Pilar 2 da OCDE e aos princípios constitucionais aplicáveis à tributação.
DELIBERAÇÃO JUDICIAL Diante do exposto: (a) DENEGO a segurança, nos termos do art. 487, inc.
I, do Código de Processo Civil. (b) CONDENO o impetrante ao recolhimento das custas processuais.
PROVIDÊNCIAS DE IMPULSO PROCESSUAL A Secretaria da Vara deverá: (i) intimar as partes desta sentença; (ii) aguardar o prazo para interposição de recurso; (iii) havendo a interposição de recurso, colher contrarrazões e remeter os autos ao TRF-1, independentemente de juízo de admissibilidade; (iv) não havendo interposição de recurso, certificar o trânsito em julgado e, não havendo novos requerimentos, arquivar o feito com as formalidades de praxe.
Palmas(TO), data abaixo. (assinado digitalmente) CAROLYNNE SOUZA DE MACEDO OLIVEIRA Juíza Federal Titular da 1ª Vara SJTO ESTA VARA FEDERAL TEM O SELO OURO DE EXCELÊNCIA NO CUMPRIMENTO DAS METAS ESTRATÉGICAS EM 2024 -
13/05/2025 18:57
Recebido pelo Distribuidor
-
13/05/2025 18:57
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
13/05/2025
Ultima Atualização
23/06/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Sentença Tipo A • Arquivo
Despacho • Arquivo
Despacho • Arquivo
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