TRF1 - 1039810-91.2023.4.01.0000
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gab. 16 - Des. Fed. Flavio Jardim
Polo Ativo
Partes
Polo Passivo
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Partes
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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26/06/2025 00:00
Intimação
JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1039810-91.2023.4.01.0000 PROCESSO REFERÊNCIA: 0019192-92.2016.4.01.3200 CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) POLO ATIVO: POTASSIO DO BRASIL LTDA.
REPRESENTANTES POLO ATIVO: CAROLINA MAR AZEVEDO - AM8627-A, LUIZ GUSTAVO ESCORCIO BEZERRA - RJ127346-A e LUIS INACIO LUCENA ADAMS - DF29512-A POLO PASSIVO:FUNDACAO NACIONAL DOS POVOS INDIGENAS - FUNAI e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: ISAEL FRANKLIN GONCALVES - AM12054-A, IVAN DE SOUZA QUEIROZ - AM4297, RAIMUNDO GUARACY GUEDES MOTTA - AM4131-A e JOSE GEBRAN BATOKI CHAD - SP427778-A RELATOR(A):FLAVIO JAIME DE MORAES JARDIM PODER JUDICIÁRIO FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PJe/TRF1ª – Processo Judicial Eletrônico AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 1039810-91.2023.4.01.0000 RELATÓRIO Ao deferir a medida cautelar, adotei o seguinte relatório: "Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por POTÁSSIO DO BRASIL LTDA contra decisão proferida pelo Juízo Federal da 1ª Vara da Seção Judiciária do Amazonas nos autos da Ação Civil Pública n. 0019192-92.2016.4.01.3200, proposta pelo Ministério Público Federal contra a ora agravante e outros, e pela qual foram determinadas diversas medidas que, a critério do juízo prolator, demonstram-se necessárias para viabilizar a exploração dos recursos minerais de Potássio indicados pela empresa interessada e impugnados na Ação Civil Pública de origem, sob a argumentação de que não há licenciamento ambiental regular e que as populações indígenas potencialmente atingidas não foram regularmente consultadas.
A agravante POTÁSSIO DO BRASIL LTDA sustenta estar há mais de 6 anos tentando comprovar a regularidade de seu empreendimento sob a alegação de que o este não incide sobre área indígena demarcada, estando prejudicada por entendimentos firmados em estudos realizados pelo corpo técnico do Ministério Público Federal relativo a suposta terra indígena que não estaria demarcada em razão de as áreas serem sujeitas a inundações e não permitirem uma efetiva delimitação em conformidade com a legislação brasileira para efeito de registro.
Apresenta a cronologia da ação de origem, esclarecendo ter adotado medidas para a consulta dos povos indígenas que poderiam ser afetados, em que pese entenda que o empreendimento não se estende por áreas indígenas, nem provocará destruição da floresta em razão da exploração ocorrer a centenas de metros de profundidade, sendo resultado de seus rejeitos o sal de cozinha e areia, materiais que não produzem grande impacto ambiental e são estocados a seco, havendo a realocação da areia para o interior dos túneis de escavação quando se verificarem o esgotamento dos veios de exploração.
Afirma que o empreendimento apresenta uma distância de 8 km da área indígena demarcada mais próxima, situação que não impediu que concordasse, em audiência de conciliação, pela realização de consulta prévia ao povo MURA, os indígenas que teriam direito à ocupação das terras com localização mais próxima ou sobreposta à área de exploração definida pelo DNPM (atual ANM), ressaltando que a consulta está em fase de conclusão, ficando seu resultado comprometido em razão da decisão impugnada, que se refere à ausência de manifestação do Congresso Nacional sobre a possibilidade de exploração de minerais na área em razão das comunidades indígenas envolvidas e da necessidade de participação do IBAMA na condução dos estudos de impacto ambiental em razão da magnitude das questões envolvidas, as quais suplantam a atribuição legal de licenciamento por parte do órgão ambiental do Estado do Amazonas.
Rejeita a indicação de que seria necessária a intervenção do Congresso Nacional em face do art. 231 da Constituição, uma vez que não há terra indígena demarcada na área do projeto, respaldando-se para tal posicionamento, na Informação Técnica FUNAI n. 470/2022/SECART/COCART/CGGEO/DPT-FUNAI, da qual destaca: "(...) 1.
A localização do referido empreendimento está sobreposta à área indígena? Se sim, qual etapa de demarcação em que a TI se encontra? Informamos que, a área industrial do Projeto Potássio Amazonas - Autazes encontra-se distante aproximadamente:1 km da terra indígena Jauary, com status de Delimitada e não homologada até a presente data, 7 km da terra indígena Paracuhuba, sob domínio da União conforme Decreto nº 310, de 29 de outubro de 1991 e 5 km da aldeia Soares.
Informamos Ainda que o porto de Urucurituba do Projeto Potássio Amazonas - Autazes, encontra-se distante aproximadamente 13 km da terra indígena Paracuhuba, sob domínio da Unido conforme Decreto nº 310, de 29 de outubro de 1991.(...)" Informa ter sido reconhecido, no Pedido de Suspensão de Liminar - PSL n. 1038484-33.2022.4.01.0000, requerido pela UNIÃO, a possibilidade de prosseguimento do licenciamento ambiental e a expedição de licenças ambientais sem a necessidade de autorização judicial, afastando o que foi considerado como indevida interferência do Juízo Federal na esfera administrativa.
Aponta ser a decisão extra petita, pois não há nos autos da Ação Civil Pública pedido ou menção à necessidade de intervenção do Congresso Nacional, notadamente em razão de não haver previsão de exploração de recursos minerais em área indígena.
Assevera ser necessário afastar a suspensão do resultado da consulta ao Povo Mura e demais comunidades indígenas que o MPF indica como possivelmente impactadas pelo empreendimento (em conformidade com a Convenção 169 da OIT), uma vez que tal consulta decorre de acordo entre as partes, no qual ficou definido um prazo de 6 (seis) meses para a conclusão dos estudos, já tendo decorrido mais de 6 (seis) anos sem conclusão, não sendo razoável suspender ou desconsiderar todos os esforços já empreendidos.
A despeito de todos os atos praticados, o MPF peticionou nos autos de origem requerendo a suspensão de todo e qualquer ato administrativo de licenciamento, inclusive a Consulta aos povos indígenas, indicando a necessidade de efetiva demarcação do território indígena e de ocupação por povos tradicionais denominada SOARES/URUCURITUBA, cujos estudos estão em fase de conclusão e denotam sobreposição direta sobre o perímetro da área a ser explorada no projeto Potássio Autazes, situação que reforçaria a pretensão de devido cumprimento das regras de proteção ambiental e legal relativa às populações indígenas e à necessidade de prévia autorização do Congresso Nacional para a exploração mineral em terras indígenas.
Por fim, relata recear a prolação de sentença sem que seja cumprida a devida instrução do processo, podendo decorrer danos irreparáveis à agravante, pois o processo de licenciamento ambiental, que teve início perante o IPAAM, já tramita sem conclusão há mais de 14 (catorze) anos, sendo possível obrigar o empreendimento a retornar ao princípio, começando a tramitar praticamente do zero.
Fundado em tal argumentação, requer: (...) a) seja o presente Agravo de Instrumento recebido, deferindo-lhe liminarmente, nos termos do art. 995 e inciso I do artigo 1.019 do CPC, o pedido de antecipação da tutela recursal, para suspender os efeitos da Decisão Agravada até julgamento final, de modo a vedar seja o processo sentenciado sem que seja considerado o resultado da consulta do Povo Mura de Autazes; que o resultado seja acolhido e acatado, afastando a suspensão imposta pela decisão agravada, além de permitir o prosseguimento do licenciamento ambiental pelo órgão estadual – IPAAM; b) seja determinada a intimação das partes Agravadas, consoante determina o inciso II do artigo 1.019; c) ao final, seja PROVIDO o presente agravo de instrumento, confirmando-se a tutela de urgência, no sentido de que seja reformada a decisão proferida, a fim de: c.1) determinar o regular prosseguimento do processo de licenciamento perante o IPAAM para conduzir o licenciamento ambiental em questão e para determinar a exclusão do IBAMA da lide, além da desnecessidade de autorização do Congresso Nacional; c.2) determinar o recebimento do resultado da Consulta ao Povo Mura de Autazes, que APROVOU a implantação e execução do Projeto Potássio Autazes nos dias 21 e 22/09/2023, assegurando e preservando o direito dos indígenas e de acatamento de suas decisões, observando-se ainda o princípio da duração razoável do processo".
A medida cautelar foi deferida nos seguintes termos: "[a]nte o exposto, concedo parcialmente a liminar pleiteada para, consoante decidido no Pedido de Suspensão nº 1040729-80.2023.4.01.0000 pela Presidência do Tribunal, permitir o prosseguimento do licenciamento ambiental pelo órgão estadual - o INSTITUTO DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DO AMAZONAS - IPAAM, até ulterior decisão".
Apresentaram contrarrazões ao agravo de instrumento O MPF, a FUNAI (ID 417568983) e ORGANIZAÇÃO DE LIDERANÇAS INDÍGENAS MURA DE CAREIRO DA VÁRZEA - OLIMCV e COMUNIDADE INDÍGENA DO LAGO DO SOARES (ID 426894434).
Aderiam às razões da PDB o CIM (ID 422070853) e o IPAAM (ID 422540353) O MPF interpôs agravo interno (ID 415749789).
Apresentaram contrarrazões ao agravo interno do MPF a ANM (ID 418135769), o IBAMA (ID 418910544), a PDB (ID 420612895) e o IPAAM (ID 423537168).
O MPB opinou pelo desprovimento do agravo de instrumento (ID 423800881). É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PJe/TRF1ª – Processo Judicial Eletrônico AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 1039810-91.2023.4.01.0000 VOTO O EXMO.
SR.
DESEMBARGADOR FEDERAL FLÁVIO JARDIM - Relator: I.
Estão preenchidos os requisitos de admissibilidade.
II.
A decisão agravada, no que interessa: "1.
Em ID 1767795565 - Petição intercorrente , O Ministério Público Federal reitera pedido anterior formulado de suspensão de licenciamento do empreendimento, alegando e pleiteando que: i) Que, em consonância com recomendação da FUNAI seja suspenso todo e qualquer ato administrativo, licenciamento e, consequentemente, a respectiva consulta da Convenção 169 da OIT em relação a tais atos no âmbito do Projeto Potássio Autazes, que sejam sobrepostos ao território indígena Soares / Urucurituba, bem como que impactem potencialmente outros territórios indígenas e tradicionais, enquanto não finalizados os estudos e publicado o RCID referente ao território indígena Soares / Urucurituba (momento no qual haverá maior clareza sobre os locais de sobreposição e proibição de mineração, já que os elementos atuais demonstram sobreposição direta da pretensão de exploração com o território indígena); Tal suspensão, além do motivo territorial claro, da proibição constitucional, também se faz urgente considerando que as incertezas e pressões em relação ao empreendimento tem aumentado a insegurança, pressões e ameaças às lideranças Mura, cenário este que pode ser mitigado a partir da posição clara do Poder Judiciário sobre o tema. ii) Mesmo após tal suspensão judicial , em caso de eventual possibilidade de continuidade da consulta e do licenciamento do empreendimento sobre áreas não indígenas, que qualquer ato administrativo, licenciamento ou medida afim sobre o Projeto Potássio Autazes que impacte potencialmente território indígena ou tradicional seja licenciado pelo IBAMA e não pelo órgão estadual (IPAAM), conforme expressa disposição constitucional. 2.
Em petição de ID 1761459580 - Petição intercorrente (Petição valores depositados completa), a empresa requerida reitera levantamento de valores.
Defiro o pleito, devendo a secretaria adotar as providências. 3.
Em ID 1737496073 - Manifestação (manifestação consulta), as organizações de direito privado CONSELHO INDÍGENA MURA – CIM, e ORGANIZAÇÃO DE LIDERANÇAS INDÍGENAS MURA DE CAREIRO DA VÁRZEA – OLIMCV, apresentam novo advogado, pleiteiam adiamento da inspeção judicial pautada anteriormente. 4.
Passo a deliberar abaixo. 4.1.
A presente ação civil pública foi ajuizada em 2016, apontando como causa pedir, em síntese, a ilegalidade de exploração mineral em terra indígena, cometimento de dano oral coletivo, má fé na cooptação de lideranças, moradores e servidores públicos, expedição irregular de licença prévia sem o ECI - estudo de componente indígena, ausência de consulta às comunidades afetadas, incompetência do IPAAM para expedir a licença ambiental e violação ao direito constitucional de usufruto exclusivo das terras indígenas. 4.2.
Durante a tramitação do feito foram realizadas diversas audiências com tentativa de conciliação, tendo sido construído pelo Povo Mura o Protocolo de Consultas a ser aplicado em todos os casos de grandes empreendimentos que afetem seus direitos, suas terras, seu povo, sua cultura, tradição e ancestralidade. 4.3.
Durante a tramitação do feito ocorreu a pandemia por COVID 19 e seu consequente estado de calamidade pública, com despachos proferidos nos presentes autos de suspensão de atos e de deslocamentos para evitar contaminações. 4.4.
Foi realizada inspeção judicial em parte da área afetada, a Aldeia Soares e Urucurituba, que se encontra autodemarcada por seu Povo Mura mas até pouco tempo sem registro de atos procedimentais por parte da FUNAI para dar andamento ao procedimento formal de demarcação pelo poder público federal. 4.5.
Por decisão desse juízo federal da 1a.
Vara, foi determinada a constituição de Grupo de Trabalho para dar início aos procedimentos formais de demarcação da Aldeia Soares e Urucurituba, decisão essa cumprida recentemente e comunicada amplamente por parte da FUNAI, que em 3 de agosto de 2023 publicou a Portaria 741, assinada em 1.8.23, por meio da qual criou o grupo técnico para delimitar a terra Indígena Mura conhecida como Aldeia Soares e Urucurituba. 4.6.
Cabe ao Congresso Nacional e não à Justiça Federal autorizar exploração mineral em Terra Indígena.
De acordo com a Constituição Federal, atividades mineradoras só podem ser autorizadas em solo indígena mediante prévia autorização do Congresso Nacional, por decreto legislativo.
Sem essa autorização, é nulo qualquer ato de licenciamento referente a exploração mineral que afete terras indígenas. 4.7.
Também é necessária a Consulta aos Povos Indígenas afetados e a devida participação.
Mas tudo somente a autorização do Congresso Nacional.
Não há validade de um requisito sem outro.
E por fim, o empreendimento autorizado pelo Congresso, consultado pelos povos afetados, necessita do licenciamento do órgão ambiental competente, que é o IBAMA. 4.8.
Com a constituição do grupo técnico responsável para levantar dados, documentos e atos tendentes a delimitar a TI Aldeia Soares e Urucurituba, fica clara e de forma contundente a necessidade de cumprimento dos requisitos legais, constitucionais e convencionais (Conv. 169), dando-se concretude ao bloco de constitucionalidade. 4.9. É imperioso destacar que o cumprimento dos requisitos constantes do bloco de constitucionalidade não é faculdade do juízo, mas obrigação de cumprir as normas. 5.
Os requisitos possuem om objetivo intrínseco, qual seja o de garantir os direitos constitucionais ambientais, dos povos indígenas e de todos os brasileiros. 6.
Exploração mineral sem cumprimento de requisitos é sinônimo de tragédia ambiental, de alterações climáticas, destruição de biomas, poluição de recursos hídricos. 7.
Esse entendimento acolhe os termos da Resolução 03/2021 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que dispõe sobre a Emergência Climática e o alcance das obrigações interamericanas em matéria de direitos humanos. 8.
Consoante expresso na Resolução 03/2021, o nexo entre mudanças climáticas e direitos humanos é cada vez mais evidente e o seu reconhecimento a nível internacional atingiu níveis significativos de consenso, não só no regime jurídico que diz respeito às mudanças climáticas, mas também no regime internacional de direitos humanos. 9.
Exatamente por meio da Resolução 03/21, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Relatoria Especial sobre Direitos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (REDESCA) assinalaram que as alterações climáticas afetam diretamente o direito a um meio ambiente saudável, direito que vem sendo reconhecido como um direito humano autônomo, previsto na jurisprudência dos órgãos do Sistema Interamericano de Direitos Humanos.
Ressalto o Parecer Consultivo 23/17 da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte I/A HR), que dispõe que a proteção deste direito não se destina apenas a proteger o interesse das pessoas na preservação dos ecossistemas, mas também visa a proteção da natureza e todos os seus componentes pelo seu valor intrínseco.
Da mesma forma, A Comissão e a Corte Interamericanas entendem que a "jurisdição" a que se refere o artigo 1.1 da Convenção Americana contempla circunstâncias em que a conduta extraterritorial dos Estados constitui um exercício da jurisdição desse Estado. 10.
Portanto, o licenciamento do Ibama e a autorização do Congresso Nacional se fazem essenciais para que toda a população brasileira tenha conhecimento de dados científicos referentes aos danos que por ventura venham a ser causados pelo grande empreendimento. 11. É preciso que o órgão ambiental competente, IBAMA, diga o estoque e densidade de carbono na área do empreendimento, o dano climático a curto, médio e longo prazo decorrente da exploração mineral que se pretende, a estimativa de quadro/ relatório/inventário de emissões de CO2 , a estimativa de degradação e consequentes emissões de gases com os rejeitos que devem parar no fundo da bacia amazônica, haja vista o ciclo das águas na região e a não construção de contenção de rejeitos, a estimativa de perda do estoque da fauna e da flora. 12.
Essas informações compõe direito de todos os brasileiros e não pode o juízo federal substituir o órgão ambiental competente - o IBAMA- e criar um modelo matemático e estatístico de danos e recomposições sem os dados específicos. 13.
Passados os anos de tramitação, os requisitos não foram preenchidos nem minimamente, de modo que não é do conhecimento do juízo o início do processo de licenciamento pelo IBAMA, o ECi - estudo de componente indígena, nem a autorização do congresso nacional. 14.
Dessa forma, não se pode falar em prospecção, pesquisa ou exploração mineral, licença de instalação ou exploração e oferecimento de royalties, sem que o IBAMA inicie e conclua o procedimento de licenciamento referente ao grande empreendimento da requerida, e tudo com a devida autorização do Congresso Nacional. 15.
Pelo exposto, reitero decisões anteriores de que o órgão ambiental competente para licenciamento do projeto Potássio é o IBAMA, reitero que exploração mineral em Terra Indígena depende de autorização do legislador constituinte (do Congresso Nacional) e que o IPAAM não é o órgão ambiental competente para o empreendimento que tem o poder de afetar o bioma, a biomassa, o estoque de carbono, a alteração de recursos hídricos da maior bacia nacional, e portanto tem o poder de gerar mudanças climáticas irreversíveis. 16.
A Consulta aos povos indígenas afetados depende da vontade do povo, decorrente da sua autonomia de deliberar seus interesses diante desse e de qualquer empreendimento.
Todavia, eventual resultado fica desde já suspenso enquanto não houver o cumprimento dos requisitos ambientais, legais e constitucionais tratados na presente decisão. 17.
Sem o mínimo início dos requisitos, não haverá inspeção judicial, a qual fica por ora suspensa, mas advirto que poderá ser remarcada em caso de violência ou indícios de violações que importem em ruptura da ordem. 18.
Todos os atos administrativos contrários ao bloco de constitucionalidade aqui tratado, conforme farta fundamentação da presente decisão e das anteriores, são nulos e não possuem qualquer valor jurídico, pelo grave risco ambiental de um empreendimento mineral de 23 anos com afetação em terras indígenas e sem a autorização do legislador e sem o licenciamento do órgão competente. 19.
Intimem-se a todos os interessados para manifestações em dez dias, após o que poderá ser proferida sentença parcial ou total de mérito.(...)" III.
Deferi parcialmente a medida cautelar com base nos seguintes fundamentos: "[d]a leitura da petição inicial da Ação Civil Pública (ID 296946097 - fls. 88-9 da rolagem única), constata-se que a reserva de Potássio em estudo, conforme afirmações em Reunião na Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle do Senado Federal, realizada em 2013, o Diretor de Geologia e Recursos Minerais da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais e Serviço Geológico do Brasil aponta que a região da Bacia do Solimões é o local onde estão concentradas significativas porções de terras raras no Brasil, estando à época, grande parte da área com indicativo de possibilidade de extração de potássio, bloqueadas ou com requerimento de pesquisas junto ao DNPM.
Na mesma reunião, o Secretário de Mineração, Geodiversidade e Recursos Hídricos do Estado do Amazonas informou que as reservas potenciais de potássio estendem-se do Estado do Amazonas ao Estado do Pará, envolvendo um total de 14 municípios interessados.
Confira-se o trecho transcrito da manifestação (ID 296946097 - fls. 89 da RU): (...) ‘A realidade dessa reserva, que a gente coloca como a terceira, mas pode ser até a maior reserva de potássio do Planeta, é que se estende, Senadora Vanessa, desde Borba até o Estado do Pará, que pode seguir, se continuarmos o desenvolvimento, até Santarém.
Quer dizer, é uma grande bacia de sal, com um potencial enorme, que só no Estado do Amazonas envolve um consórcio da ordem de 14 Municípios Interessados - alguns prefeitos estão aqui: Nova Olinda do Norte, Itacoatiara, Borba, Autazes, Silves, São Sebastião do Uatumã, Maués, Urucurituba, Urucará, Itapiranga, Barreirinha, Parintins, Boa Vista do Ramos e Nhamundá. (...) É fundado em tais indicações que o Ministério Público Federal aponta ser necessário reconhecer que os pedidos isolados de exploração mineral do potássio, na realidade, buscam implantar de maneira sucessiva um grande projeto de exploração mineral na bacia do Solimões, com a realização de estudos de impactos ambientais em áreas reduzidas, excluindo a possibilidade de abrangência regional e tornando possível a ampla extração mineral sem a necessidade de licenciamento ambiental de grande porte e escapando da avaliação de possível produção de impactos ambientais e sociais diretos e indiretos sobre comunidades indígenas e tradicionais localizadas nos inúmeros municípios que podem ser beneficiários dos processos de exploração do potássio.
Nessa perspectiva é que se fundamenta o pedido de que o licenciamento ambiental seja realizado pelo IBAMA e que a FUNAI cumpra seu papel de diagnóstico e homologação de áreas indígenas que, segundo demonstram estudos da área técnica do MPF, estariam localizadas em áreas dos projetos de exploração.
Esclarece o MPF que a área de exploração, em que pese a indicação inicial do projeto, é passível de ampliação, casos em que poderá atingir o perímetro das áreas indígenas sem que exista autorização para tanto e possibilitando a produção de danos diretos às terras indígenas.
Na tramitação da ACP, é possível verificar a interposição de mais de 10 agravos de instrumento contra decisões interlocutórias por parte dos diversos participantes da ação.
Há impugnação à determinação de estudos do componente indígena e de rejeição do IBAMA em relação à sua legitimidade para a produção dos estudos de impacto ambiental para a produção do cabível relatório técnico; também há o interesse da titular do projeto de exploração no sentido de que seja validada a Licença Prévia n. 54/2015 do IPAAM, ao fundamento de que não se verifica sobreposição a área indígena nem impacto que ultrapasse o âmbito do Estado do Amazonas.
Por sua vez, a UNIÃO apresentou manifestação no sentido de que o Projeto Autazes, conduzido pela empresa Potássio do Brasil é de relevante importância estratégica para o Brasil, podendo atender cerca de 25% do consumo nacional de Potássio, insumo essencial na produção de fertilizantes necessários à agricultura nacional.
Reconhece,
por outro lado, ser necessária a observância à legislação aplicável, em especial, o respeito à legislação ambiental e aos povos indígenas que podem ser impactados pelo empreendimento, em especial, o povo indígena MURA.
Com respaldo em tais considerações, formulou ao juízo os seguintes requerimentos (ID 970676234 dos autos de origem): (...) (a) decidir, com a brevidade necessária, o órgão competente para o licenciamento ambiental do projeto, pugnando-se, desde logo, pelo reconhecimento da competência do IPAAM, tendo em vista se tratar de matéria de cunho exclusivamente jurídico; (b) dispensar a realização da inspeção judicial ou, caso entenda ser ela necessária, fixar data próxima para sua realização; (c) liberar, de imediato, os valores depositados pela PDB em favor dos legítimos representantes do povo indígena Mura; e (d) anuir com a retomada do processo de licenciamento ambiental, tendo em vista o transcurso do prazo de suspensão de 6 (seis) meses e a adoção de várias providências relativas ao procedimento de consulta prévia nos termos da Convenção OIT 169.(...) Após a referida manifestação e a regular tramitação processual, em janeiro de 2023, em razão da mudança de comando no Poder Executivo Federal, foram fixados pontos que o juízo reputou controvertidos, determinando a intimação das partes indicadas para apresentar manifestação.
A referida decisão, no que interessa, está assim redigida (ID 352851663 destes autos): (...) 6.
Em razão da mudança de titularidade do executivo federal, de seus Ministérios, Autarquias e Fundações públicas federais, há necessidade urgente do juízo federal identificar se permanecem ou não os pontos controvertidos para fins de saneamento do feito, razão pela qual determino sejam intimadas todas as partes a fim de que se manifestem a respeito do estado em que se encontram os autos, conforme as teses abaixo colhidas dos autos: a.
O juízo já manifestou entendimento segundo o qual grandes empreendimentos que afetem Terras Indígenas (demarcadas e em procedimento de demarcação) devem ser alvo de procedimento de licenciamento pelo IBAMA, conforme os precedentes do TRF1, STJ e STF, bem como devem ser consultados os povos indígenas afetados; b.
O protocolo de consulta referente ao Povo Indígena afetado (Povo Mura) já foi construído e elaborado a partir de audiência de conciliação nos autos, respeitando-se integralmente a Convenção 169 da OIT, bem como as normas inseridas na Constituição da República Federativa do Brasil; c.
A título de pontos controvertidos, houve, nos últimos cinco (05) anos, a negativa do IBAMA em licenciar o empreendimento.
Houve também a compra e venda de lotes em terra indígena Mura pela empresa Requerida, Potássio do Brasil.
Ainda, houve a negativa da FUNAI em dar continuidade ao procedimento de demarcação da Aldeia Soares, inclusive com recurso de Agravo perante o TRF1, que houve por bem suspender a decisão judicial nesse sentido, em processo conexo com o presente (PJe Proc.
No. 1015595-88.2022.4.01.3200). 7.
Dessa forma, para o saneamento do feito, intimem-se todas as partes para que informem ao juízo se persistem os mesmos pontos controvertidos. a.
Primeiramente devem ser intimados a União, o IBAMA e a FUNAI e a ANM.
Em seguida, a empresa ré e a parte autora (MPF). b.
Prazo para manifestação: 15 – quinze dias.(...) Oportuno anotar que ao examinar o Agravo de Instrumento n. 1011342-54.2022.4.01.0000, o Desembargador Jamil Rosa de Jesus deferiu parcialmente o pedido formulado pelo IBAMA, determinando ao juízo que examinasse, fundamentadamente, a legitimidade da autarquia para conduzir o licenciamento ambiental.
Em seu exame, a magistrada indica como respaldo à fixação da competência, os riscos do empreendimento para as comunidades indígenas vizinhas ao projeto, sem prejuízo dos significativos impactos que projetos de extração mineral como o discutido, podem ocasionar à fauna e à flora do local.
Inconformado, o IBAMA interpôs o Agravo de Instrumento n. 1012591-06.2023.4.01.0000, ainda pendente de exame, no qual é impugnada a fixação de competência da autarquia para o licenciamento ambiental do empreendimento, sustentando não ser possível enquadrar o projeto em nenhuma das hipóteses que fixam a competência federal para o licenciamento ambiental segundo a previsão da Lei Complementar n. 140/2011.
Posteriormente, foi protocolado o pedido de suspensão de todo e qualquer ato administrativo destinado ao licenciamento do empreendimento, assim como a consulta às populações previstas na Convenção 169 da OIT, pretensão que se funda na manifestação da FUNAI sobre os estudos de delimitação do território Indígena SOARES/URUCUTITUBA, a qual foi acolhida pelo juízo federal com o acréscimo de que em razão da efetiva possibilidade de sobreposição da área de extração do potássio com terras indígenas que estão em processo de delimitação, exige a expressa manifestação do Congresso Nacional em cumprimento ao art. 231 da Constituição.
Ressalta que sem tal providência e a efetiva consulta aos povos afetados, todo o processamento será nulo, sem prejuízo de todo o risco de dano ambiental, destruição de biomas e poluição de recurso hídricos, acrescentando ser essenciais o licenciamento ambiental pelo IBAMA e a autorização do Congresso Nacional para exploração de recursos minerais em terras indígenas.
Conclui afirmando que "Todos os atos administrativos contrários ao bloco de constitucionalidade aqui tratado, conforme farta fundamentação da presente decisão e das anteriores, são nulos e não possuem qualquer valor jurídico, pelo grave risco ambiental de um empreendimento mineral de 23 anos com afetação em terras indígenas e sem a autorização do legislador e sem o licenciamento do órgão competente".
Sobre a questão indígena, é relevante observar que as demarcações têm natureza declaratória, não havendo falar em superposição superveniente em relação à terra indígena que está em processo de demarcação e que enseja a sobreposição em relação a parte da área do projeto de exploração de potássio na região de Autazes.
Nesse sentido, a natureza declaratória da demarcação de terras indígenas, confira-se posicionamento do Superior Tribunal de Justiça: PROCESSUAL CIVIL.
ADMINISTRATIVO.
RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO BUSCANDO A DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE PORTARIA DE DEMARCAÇÃO DE TERRA INDÍGENA.
PRESCRIÇÃO QUINQUENAL.
DECRETO 20.910/32.
RECURSO PROVIDO. 1.
Hipótese na qual se busca, mediante ação ajuizada em 16 de setembro de 2004, a nulidade da Portaria Ministerial 793/94, publicada no DOU de 20 de outubro de 1994, expedida pelo Ministro de Estado da Justiça, pela qual declarou de posse permanente indígena, para efeito de demarcação, terras situadas no Estado de Santa Catarina (Área Indígena Pinhal), caracterizadas como de ocupação tradicional e permanente indígena, nos termos dos arts. 231, da CF/88, e 17 da Lei 6.001/73.
Importante registrar que, em consequência da referida demarcação, a parte autora recebeu a devida indenização pelas benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé (art. 231, § 6º, da CF/88). 2.
O Tribunal de origem afastou a prescrição da ação, decretada pelo magistrado de primeiro grau de jurisdição, sob o fundamento de que a criação da reserva indígena, por criar restrições ao uso da propriedade, deve ser comparada à desapropriação indireta, cuja ação, de natureza real, está sujeita ao prazo prescricional vintenário. 3.
O procedimento de demarcação de terras indígenas não pode ser comparado ao apossamento administrativo - também chamado de desapropriação indireta -, caracterizado como verdadeiro esbulho possessório, sem a necessária garantia do contraditório e do devido processo legal. 4.
A demarcação de terras indígenas é precedida de processo administrativo, por intermédio do qual são realizados diversos estudos de natureza etno-histórica, antropológica, sociológica, jurídica, cartográfica e ambiental, necessários à comprovação de que a área a ser demarcada constitui terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. 5.
Ademais, o particular que eventualmente esteja na posse da área a ser demarcada, segundo o disposto no § 8º do art. 2º do Decreto 1.775/96, tem a possibilidade de se manifestar, apresentando à FUNAI razões instruídas com todas as provas pertinentes, tais como títulos dominiais, laudos periciais, pareceres, declarações de testemunhas, fotografias e mapas, para o fim de pleitear indenização ou para demonstrar vícios, totais ou parciais, do relatório de identificação e delimitação da área a ser demarcada. 6.
As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios não perdem essa característica por ainda não terem sido demarcadas, na medida em que a demarcação tem efeito meramente declaratório.
Assim entendido, não se pode falar em perda ou restrição da propriedade por parte de quem nunca a teve. 7.
Não se tratando, portanto, de apossamento administrativo, incide, no caso, a norma contida no art. 1º do Decreto 20.910/32, a qual dispõe que "todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, seja qual for a sua natureza, prescreve em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem". 8.
Recurso especial provido, para extinguir o processo, com resolução de mérito, com fundamento no art. 269, IV, do Código de Processo Civil, por estar configurada a prescrição da ação. (REsp n. 1.097.980/SC, relatora Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, julgado em 3/3/2009, DJe de 1/4/2009.) Prestados os esclarecimentos acima, passa-se ao exame específico do exame dos pedidos liminares formulados neste curso.
Não há fundamento para que este Tribunal impeça o juízo de examinar o processo, inclusive, sentenciando o feito, pois o referido ato é privativo do magistrado que conduz o processo e, por previsão legal e constitucional, está afeto às regras vigentes e à sua consciência para solucionar a demanda que lhe é apresentada, constituindo direito das partes a interposição dos recursos previstos na legislação processual.
Da mesma forma, não se pode presumir que qualquer documento de prova será desconsiderado, tampouco é possível impor previamente ao Juízo de origem determinada valoração sobre elementos probatórios produzidos durante a instrução.
Mais uma vez, a magistrada que conduz o processo está afeta às regras legais para solucionar a lide e as partes poderão se insurgir contra a sentença por meio dos recursos legalmente estabelecidos.
Por fim, em relação à pretensão de que o prosseguimento do licenciamento ambiental seja feito pelo órgão estadual - o INSTITUTO DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DO AMAZONAS - IPAAM, observo que mediante decisão tomada nos autos do Pedido de Suspensão nº 1040729-80.2023.4.01.0000, o Desembargador Vice-Presidente do TRF da 1ª Região, Marcos Augusto de Sousa, no exercício da Presidência, deferiu pedido formulado pelo referido órgão para suspender a decisão agravada.
O referido magistrado entendeu não incidir à espécie o inciso XIV do art. 7º da Lei Complementar 140/2011 e sim o art. 8º da referida norma, uma vez que "não [houve] demonstração de que a área em que se situa o projeto Autazes esteja localizada em terras indígenas".
Sendo assim, concluiu ser a competência para a emissão de licenciamento ambiental a prevista no art. 8º da referida norma legal, inserida no poder administrativo dos estados.
Essa decisão produz efeitos até o trânsito em julgado da decisão de mérito da ação principal, por força de previsão legal e por assim constar da decisão, salvo se for reformada pela Corte Especial do Tribunal.
Logo, num juízo de cognição sumária, merece ser suspenso, no ponto, também por meio da presente via recursal, esse trecho da decisão, assegurando o regular exercício dos poderes do órgão administrativo estadual, sobretudo porque o próprio IBAMA reconhece expressamente ser hipótese de competência do órgão ambiental estadual para o licenciamento".
III.
Este agravo foi protocolado pela Potássio do Brasil LTDA. e visa a suspender os efeitos da decisão agravada de id. 1769860076, proferida nos autos da Ação Civil Pública nº 0019192- 92.2016.4.01.3200, movida pelo MPF.
Contra essa decisão, também foram interpostos os seguintes recursos: (i) AI nº 1037175-40.2023.4.01.0000, protocolado pelo Conselho Indígena Mura – CIM. (ii) AI nº 1042776-27.2023.4.01.0000, protocolado pelo Ibama; (iii) Ai nº 1043035-22.2023.4.01.0000, protocolado pela União.
No agravo, é postulado que a decisão agravada seja reformada, a fim de "determinar o regular prosseguimento do processo de licenciamento perante o IPAAM para conduzir o licenciamento ambiental em questão e para determinar a exclusão do IBAMA da lide, além da desnecessidade de autorização do Congresso Nacional" e determinar o "o recebimento do resultado da Consulta ao Povo Mura de Autazes, que APROVOU a implantação e execução do Projeto Potássio Autazes nos dias 21 e 22/09/2023, assegurando e preservando o direito dos indígenas e de acatamento de suas decisões, observando-se ainda o princípio da duração razoável do processo".
III.a.
A relevância do Projeto Potássio-Autazes Consoante destacou a União em petição protocolizada nestes autos, "o Projeto Autazes foi habilitado, na forma do Decreto nº 10.657/2021, pelo Comitê Interministerial de Análise de Projetos de Minerais Estratégicos – CTAPME, para integrar a política de apoio ao licenciamento ambiental de projetos de investimento para a produção de Minerais Estratégicos – Pró Minerais Estratégicos, em 28 de setembro de 2021." [1] Segundo o que assevera a União, "[d]e acordo o que dispõe o Decreto nº 10.657/2021, os projetos minerários habilitados na Política de Pró-Minerais Estratégicos são considerados prioritários ao país em razão dos seguintes critérios (art. 2º): i) alto percentual de importação para suprimento de setores vitais da economia; ii) aplicação em produtos e processos de alta tecnologia e iii) vantagens comparativas e essencial para a geração de superavit da balança comercial do país." [id.] A União complementa que o projeto "visa a exploração de minério cloreto de potássio, fertilizante fundamental para a agricultura nacional." [id.] Pelas informações prestadas, "o Brasil importa 95% do cloreto de potássio que utiliza para fertilização do solo, ostentado o título de maior importador mundial de potássio, com 10,45 milhões de toneladas adquiridas em 2019, de acordo com dados do Ministério da Economia." [id.] A previsão da empresa é de "atender cerca de 25% do consumo nacional do minério, reduzindo a dependência interna do produto por mais de 30 anos." [id.] A União ainda aponta que a relevância do projeto foi exacerbada com o recente cenário de guerra entre Ucrânia-Rússia: "Ocorre que as recentes sanções econômicas impostas à Bielorrússia, responsável por ¼ de toda produção mundial de cloreto de potássio, gerou enorme preocupação no setor agroindustrial brasileiro em razão da possível escassez do minério, o que poderá impactar o custo de produção e, consequentemente, o aumento do preço dos alimentos.
Observa-se, assim, que o desenvolvimento de projetos minerários com capacidade de aumentar significativamente a oferta de fertilizantes ao mercado interno, reduzindo a dependência estrangeira, é essencial para a proteção dos pequenos produtores de alimentos e da população mais vulnerável à variação de preço dos alimentos. [...] Além disso, há apenas três grandes players produtores no mundo, sendo que em dois deles, Rússia e Bielorrússia, há interferência dos governos na atuação internacional das empresas.
As duas últimas crises mundiais de fertilizantes, em que os preços ao produtor rural aumentaram mais de 150% em menos de seis meses, ocorreram por ocasião da atuação das empresas de fertilizantes potássicos.
Na atual crise de fertilizantes, o primeiro nutriente a faltar para o Brasil foi o potássio." [id.] Segundo o ente público, há altíssima dependência nacional de fertilizantes estrangeiros, o que torna o país ainda mais vulnerável, pois os grandes produtores agrícolas mundiais possuem autonomia no fornecimento de fertilizantes: "O Brasil vem presenciando, nos últimos anos, um forte aumento nas importações de fertilizantes.
Estima-se que, em 2020, mais de 80% dos que foram consumidos no Brasil são de origem estrangeira, respondendo a produção nacional por menos de 20% da demanda do país.
Estrategicamente, todos os países que são grandes produtores agrícolas no mundo, têm autonomia no fornecimento de fertilizantes, uma vez que produzem, no mínimo, 50% da sua demanda anual, exceto o Brasil.
A dependência se agrava quando se verifica que o Brasil deverá responder por quase metade da produção mundial de alimentos nos próximos anos, aumentando proporcionalmente a demanda por fertilizantes.
Atualmente, o Brasil é o quarto consumidor global de fertilizantes, responsável por cerca de 8% desse volume e é o maior importador mundial, ou seja, é o país com a maior dependência externa por fertilizantes." [id.] A variação de preços da commodity é também apontada como fator de preocupação, tendo em vista que há ciclos de crises mundiais que elevam os preços a níveis acima do padrão: "Aumentos nos preços desses insumos acontecem em ciclos de crises mundiais, como em 2008 e 2021, períodos em que foram registrados os maiores preços da história.
Esse cenário impacta negativamente na competividade dos produtos agrícolas brasileiros, pois os fertilizantes já ocupam mais de 40% do custo de produção de culturas importantes como soja, milho e algodão, que compõem as principais exportações do agronegócio brasileiro, tornando o produto nacional menos competitivo." [id.] Assim, a conclusão da União é a de que "o Projeto Autazes pode proporcionar ao Brasil uma arrancada em direção à segurança do fornecimento de fertilizante potássicos para o país." [id.] Abaixo, as características físicas do projeto: Vale ressaltar que se cuida de empreendimento significativamente menor do que, por exemplo, a UHE Belo Monte, que possui dois reservatórios de regularização, com área total de 478 km², sendo 274 km² do leito original do Rio Xingu.
Os dois reservatórios são o Reservatório Xingu, com 359 km², e o Reservatório Intermediário, com 119 km. É, desde já, importante destacar que no caso Comunidade Indígena Yakye vs.
Paraguai, decidido em 17.6.2005, a Corte Interamericana de Direitos Humanos assentou que a propriedade indígena pode sofrer restrições quando presente interesse social e um objetivo estatal legítimo.
Confira-se trecho do voto: Constam dos autos, ainda, diversas matérias jornalísticas de 2022 informando problemas de escassez do cloreto de potássio no mercado mundial, devido à guerra na Ucrânia (id. 970735666).
No volume 3, consta ainda a Nota n. 00144/2023/CONJUR-MAPA/CGU/AGU, a qual atesta que a demanda por fertilizantes potássicos aumentará bastante nos próximos anos e que a produção nacional está decaindo: O documento ainda atesta que o Projeto Autazes está intimamente ligado com caros direitos fundamentais de índole social e com os fundamentos da ordem econômica, os quais incumbe a Administração dar concretude: Por fim, requer-se a aplicação do art. 20 da LINDB no julgamento desta ACP n. 0019192-92.2016.4.01.3200: "Art. 20.
Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão.
Parágrafo único.
A motivação demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta ou da invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, inclusive em face das possíveis alternativas." Diante do quadro apresentado, sem resolver a questão sobre o local em que será instalado o projeto minerário é ou não terra indígena, há aparência de que o projeto possui interesse social, eis que visa a fornecer insumos para a agricultura -, e também persegue um objetivo estatal legítimo, podendo ser executado inclusive se estiver em terras indígenas, desde que obedecida a legislação brasileira.
IV.b.
O Conselho Indígena Mura - CIM e a Organização das Liderenças Mura do Careiro da Várzea - OLIMCV O Conselho Indígena Mura - CIM é inequivocamente a entidade representativa dos Mura que residem em Autazes.
Da mesma forma, a Organização das Liderenças Mura do Careiro da Várzea - OLIMCV é a organização que representa os Mura no município do Careiro da Várzea.
Essa circunstância é inequívoca dos autos e está consignada no Protocolo de Consulta e Consentimento do Povo Indígena Mura de Autazes e Careiro da Várzea, Amazonas.
Confira-se à fl. 30, no capítulo "Quem Fala Em Nome dos Mura?": "Apesar de a Constituição Federal garantir que nossas terras sejam demarcadas, o Estado ainda não demarcou todas.
A demarcação é nossa maior luta. "Mas nós sabemos que temos direito à nossa autodeterminação e ao autogoverno.
A Constituição Federal de 1988, a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, OIT, e a Declaração da ONU sobre os direitos dos povos indígenas, de 2007, assinadas pelo Brasil, garantem nosso direito ao autogoverno: somente nós, Mura, podemos decidir quem representa nossas aldeias e nosso povo.
Por isso criamos as nossas organizações.
As aldeias da região onde fica o município de Autazes se reúnem nas assembleias do Conselho Indígena Mura - CIM, e as aldeias que ficam na região onde está o município do Careiro da Várzea se reúnem nas assembleias da Organização das Liderenças Mura do Careiro da Várzea, OLIMCV.
Estas nossas organizações são um direito nosso, assegurado pela Constituição Federal (art. 5º): temos o direito de nos organizar livremente e de tomar nossas decisões de maneira soberana e autônoma nas assembleias das nossas organizações.
Quando os não-índios querem elaborar um projeto, medida ou lei, são obrigados a nos consultar antes, sem nos pressionar e nos informando sobre todos os detalhes da proposta.
Para começar esse diálogo, que é a consulta prévia, os não-índios".
IV.c.
As Entidades Representativas e o Poder de Fala dos Povos Originários Nos termos do art. 32 da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, são as instituições representativas dos povos originários que devem falar pelos indígenas em fases de consulta.
Confira-se: "1.
Os povos indígenas têm o direito de determinar e de elaborar as prioridades e estratégias para o desenvolvimento ou a utilização de suas terras ou territórios e outros recursos. 2.
Os Estados realizarão consultas e cooperarão de boa-fé com os povos indígenas interessados, por meio de suas próprias instituições representativas, a fim de obter seu consentimento livre e informado antes de aprovar qualquer projeto que afete suas terras ou territórios e outros recursos, particularmente em relação ao desenvolvimento, à utilização ou à exploração de recursos minerais, hídricos ou de outro tipo. 3.
Os Estados estabelecerão mecanismos eficazes para a reparação justa e equitativa dessas atividades, e serão adotadas medidas apropriadas para mitigar suas consequências nocivas nos planos ambiental, econômico, social, cultural ou espiritual." Também no caso do Povo Indígena Kichwa de Sarayaku Vs.
Equador, sentença de 27 de junho de 2012, julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, foi expressamente consignado que “os Estados devem incorporar essas normas aos processos de consulta prévia, de maneira a gerar canais de diálogos sustentados, efetivos e confiáveis com os povos indígenas nos procedimentos de consulta e participação por meio de suas instituições representativas." Sendo assim, como as consultas e cooperação entre indígenas devem ser verbalizadas por meio das suas instituições representativas, não há dúvidas de que, no caso em concreto, quem deve falar sobre os interesses dos Muras de Autazes é o CIM e pelos Mura de Careiro da Várzea é a OLIMCV.
A própria decisão de id. 925987687, do Juízo de origem, reconhece que o CIM é a instituição que representa parte do Povo Indígena Mura nestes autos: III.d.
As Entidades Representativas e o Poder de Fala dos Povos Originários Sobre a abrangência do dever de consulta, no document Handbook for ILO Triparte Constituents - Understanding the Indigenous and Tribal Peoples Convention, 1989 (No. 169), publicado pela OIT, com a finalidade de responder questões essenciais sobre a Convenção 169, é dito que um dos principais desafios da convenção é garantir que consultas apropriadas sejam realizadas antes da adoção de medidas legislativas ou administrativas que provavelmente afetarão diretamente os povos indígenas e tribais [2].
Segundo o que decidiu a Corte Interamericana de Direitos Humanos em Garífuna Triunfo de La Cruz e seus membros vs.
Honduras, os elementos essenciais do direito de consulta são “a) o caráter prévio da consulta; b) a boa-fé e a finalidade de chegar a um acordo; c) a consulta adequada e acessível; d) o estudo de impacto ambiental; e e) a consulta informada.” É incontroverso que, para ser considerada legítima, qualquer consulta deve ser capaz de verdadeiramente influenciar o poder de decisão da Administração Pública.
Essa ideia é pedagogicamente explicada na obra "The Oxford Handbook of International Enviromental Law", de Lavanya Rajamani e Jacqueline Peel, ao tratar da Convenção 169 da OIT (pág. 739): "Governments shall consult, 'in good faith...with the objective of achieving agreement or consent to the proposed measures' when considering legislative or administrative measures which may affect Indigenous peoples directly.
Special measures to safeguard persons, institutions, property, labour, cultures, and environment of the Indigenous peoples shall not be contrary to the freelyexpressed wishes of the peoples concerned.
The Convention acknowleges Indigenous peoples to be distinct polities within states".
Em tradução livre: "Os governos deverão consultar, 'de boa fé... com o objetivo de chegar a acordo ou consentimento para as medidas propostas' ao considerar medidas legislativas ou administrativas que possam afetar diretamente os povos indígenas.
Medidas especiais para salvaguardar pessoas, instituições, propriedades, trabalho, culturas e meio ambiente dos povos indígenas não devem ser contrárias aos desejos livremente expressos dos povos envolvidos.
A Convenção reconhece os povos indígenas como entidades políticas distintas dentro dos Estados".
Portanto, devem os indígenas expressar livremente seus modos de criar, fazer e viver, nos termos do art. 216, II, da Constituição e devem ser ouvidos propriamente quando puderem ser afetados por medidas que os impactem.
Mas não basta. É indispensável que suas ideias, expressadas num ambiente livre e sem intimidações, sejam consideradas pelo órgão ambiental e pelo poder público, como um todo, ao analisar o licenciamento e/ou autorização para uma obra ou empreendimento que puderem afetar tais comunidades tradicionais.
Em outras palavras, esse poder de fala (livre) dos indígenas gera, em contrapartida, um dever de escuta das autoridades envolvidas. É importante esclarecer, porém, que isso não significa a existência de um poder de veto por parte da comunidade indígena.
Realizar a consulta é uma obrigação convencional, com força supra legal.
Acatar necessariamente a integralidade do que for demandado não parece ser, ao menos pelo que constatei da jurisprudência do STF e do que consta em documentos da própria OIT.
Confira-se, nesse sentido, o que já decidiu o STF, no julgamento da PET 3388 ED/RR: "70.
Por fim, conforme observado pelo Ministro Gilmar Mendes, a relevância da consulta às comunidades indígenas “não significa que as decisões dependam formalmente da aceitação das comunidades indígenas como requisito de validade” (fl. 799).
Os índios devem ser ouvidos e seus interesses devem ser honesta e seriamente considerados.
Disso não se extrai, porém, que a deliberação tomada, ao final, só possa valer se contar com a sua aquiescência .
Em uma democracia, as divergências são normais e esperadas.
Nenhum indivíduo ou grupo social tem o direito subjetivo de determinar sozinho a decisão do Estado.
Não é esse tipo de prerrogativa que a Constituição atribuiu aos índios. 71.
A mesma lógica se aplica em matéria ambiental, que também mereceu proteção diferenciada por parte do constituinte.
Por isso mesmo, e com a devida vênia em relação à posição da embargante (fl. 16.165), não há um problema a priori no fato de que “as tradições e costumes indígenas” sejam considerados como “apenas mais um fator, a ser sopesado pela autoridade ambiental”.
Em verdade, essa é uma circunstância inerente à unidade do sistema constitucional, que promove a tutela de um conjunto variado de interesses e direitos que, em diversas situações, podem entrar em rota de colisão.
Ao não instituir uma hierarquia rígida ou estática entre tais elementos, a Constituição impõe a necessidade de que a concordância entre eles seja produzida em cada contexto específico, à luz de suas peculiaridades. 72.
Assim, como responsável pela administração das áreas de preservação, o Instituto Chico Mendes não pode decidir apenas com base nos interesses dos indígenas, devendo levar em conta as exigências relacionadas à tutela do meio ambiente.
Nesse cenário, é de fato possível – como afirma a embargante – que “o administrador da unidade de conservação, até pela sua posição institucional, ponha em primeiro plano a tutela ambiental, em detrimento do direito das comunidades indígenas”.
Contudo, é igualmente possível que isso não ocorra, não cabendo a este Tribunal antecipar o erro, a negligência ou a má-fé.
Em qualquer caso, os índios, suas comunidades e o próprio Ministério Público poderão recorrer ao Poder Judiciário sempre que reputarem inválida uma decisão do Instituto (ou de qualquer outra autoridade)." (Emb.
Decl. na Petição 3.388/RR, Rel.
Min.
Roberto Barroso, j. 23.10.2013) No mesmo sentido, são os comentários feitos no documento editado em 2019, pela Organização Internacional do Trabalho - OIT, intitulado Excerpts from reports and comments of the ILO Supervisory Bodies - Applying the Indigenous and Tribal Peoples Convention, 1989 (No. 169), disponível no site da organização: Confira-se o que está dito nas fls. 48-49 do referido documento: "Concerning the nature of consultation, from the review of the preparatory work concerning Convention No. 169 and from the review of the wording of the two authoritative texts of the Convention, the Committee concludes that it was the intention of the drafters of the Convention that the obligation to consult under the Convention was intended to mean that: 1) consultations must be formal, full and exercised in good faith; 26 there must be a genuine dialogue between governments and indigenous and tribal peoples characterized by communication and understanding, mutual respect, good faith and the sincere wish to reach a common accord; 2) appropriate procedural mechanisms have to be put in place at the national level and they have to be in a form appropriate to the circumstances; 3) consultations have to be undertaken through indigenous and tribal peoples’ representative institutions as regards legislative and administrative measures; 4) consultations have to be undertaken with the objective of reaching agreement or consent to the proposed measures It is clear from the above that pro forma consultations or mere information would not meet the requirements of the Convention.
At the same time, such consultations do not imply a right to veto, nor is the result of such consultations necessarily the reaching of agreement or consent." [3] A tradução livre deste trecho é a seguinte: "Quanto à natureza da consulta, da revisão dos trabalhos preparatórios relativos à Convenção nº 169 e da análise dos textos das duas versões autorizadas da Convenção, o Comitê conclui que os redatores da Convenção tinham a intenção de que a obrigação de consultar sob a Convenção significasse o seguinte: as consultas devem ser formais, completas e exercidas de boa fé; deve haver um diálogo genuíno entre os governos e os povos indígenas e tribais caracterizado pela comunicação e entendimento mútuos, respeito mútuo, boa fé e o sincero desejo de alcançar um acordo comum; mecanismos procedimentais apropriados devem ser estabelecidos no nível nacional e devem estar em uma forma adequada às circunstâncias; as consultas devem ser realizadas por meio das instituições representativas dos povos indígenas e tribais no que se refere a medidas legislativas e administrativas; as consultas devem ser realizadas com o objetivo de alcançar acordo ou consentimento quanto às medidas propostas. É claro a partir do exposto que consultas meramente formais ou simples fornecimento de informações não satisfariam os requisitos da Convenção.
Ao mesmo tempo, tais consultas não implicam um direito de veto, nem o resultado dessas consultas necessariamente é o alcance de um acordo ou consentimento." É essencial, assim, deixar claro que a opção pelo empreendimento, ou não, é do Poder Público e a ele compete, respeitando os termos da Constituição e da legislação, licenciálo.
Por fim, sobre o momento da consulta, no caso Povo Indígena Kichwa de Sarayaku vs.
Ecuador, decidido em 27.12.2012, pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, foi também referido que o “requisito de consulta prévia implica que essa consulta deva ser realizada antes de tomar-se a medida, ou executar o projeto suscetível de afetar as comunidades [...] e que as comunidades sejam envolvidas o quanto antes no processo”.
III.e.
Análise das alegações do agravo de instrumento Pois bem, apresentados estes esclarecimentos introdutórios, passa-se ao exame do agravo.
Como dito, no recurso, é postulada a reforma da decisão agravada, "excluindo-se a suspensão quanto a apresentação do resultado da Consulta do Povo Mura que, sendo juntado aos autos, deverá ser considerado válido e ser respeitado, devendo ainda ser excluída da decisão questões que não são objeto da ação, como a necessidade de autorização do Congresso Nacional para mineração em terras indígenas e as questões climáticas que não são objeto de discussão na ação".
Ou seja, o que se deseja é que seja reconhecida como válida da consulta efetivada, bem como que seja definido que a área do projeto não é terra indígena, consequência lógica para se afastar a necessidade de autorização do Congresso Nacional (art. 231, § 3º, CF).
III.e.1.
Processo de consulta no Caso Concreto O processo de consulta, no caso em questão, demandou anos para ser realizado.
Pela análise dos autos, é possível perceber que o anúncio da descoberta das minas se deu 2010 e 2013 e o Estudo de Impacto Ambiental foi concluído em 2015 (id. 296953002), assim como a emissão da licença prévia pelo IPAAM, cuja validade é questionada na origem.
Como a Ação Civil Pública nº 0019192-92.2016.4.01.3200 foi ajuizada em 2016, todo o processo de consulta foi acompanhado pelo Juízo.
Antes de iniciar a fase de consulta, em 7.5.2018, foi determinada a suspensão de qualquer atividade de prospecção por parte da Potássio do Brasil Ltda., para que fosse iniciada a construção de um protocolo de consulta.
O Juízo inclusive homologou a designação um antropólogo, o Dr.
Bruno Walter Caporrino, para mediar, facilitar e presidir os trabalhos de construção do protocolo de consulta, tendo este sido remunerado pela Potássio do Brasil Ltda.
Tanto a FUNAI, como o DNPM foram devidamente cientificados do procedimento definido.
Confira-se o inteiro teor da decisão (id. 297015035): Ou seja, o presesente caso apresenta uma particularidade em relação aos que normalmente são judicializados: toda a fase de consulta foi acompanhada pelo Juízo. É interessante verificar também o inteiro teor dos relatórios das oficinas realizadas nas aldeias, cuja elaboração coube ao Dr.
Bruno Walter Caporrino.
São trabalhos bastante extensos e ricos em em destacar o procedimento que estava sendo levado a efeito pelo perito.
Por exemplo, o relatório constante do id. 297015043, protocolado nos autos em 2018, contém 169 páginas e é encaminhado por meio do ofício abaixo, com os seguintes termos: As seguintes aldeias foram visitadas: Ao todo, foram 19 atividades: Posteriormente, ainda houve a protocolização de relatórios complementares em 2019 (fls. 1255 - 1719 - id. 297031909).
Após, houve uma Assembleia de Aprovação do Protocolo de Consulta e Consentimento Mura em 18.6.2019.
A Lista de presença está à fl. 1.780-1.810 e a ata ás fls. 1.758-1779 - id. 297031909.
Há juntada de DVDs com a audiência gravada e também de cópia impressa do protocolo (fls. 1.825-1.880 - id. 297047874).
O procedimento foi plentamente aceito por todas as partes envolvidas, chegando o MPF , na petição de 11.9.2019 (fl. 1.906-1.909) a afirmar que se cuida de relevante momento para o Estado democrático de direito.
Ficou também expresso que o princípio da vinculação ao aos termos do referido instrumento deveria reger a relação e que estava sendo inaugurado um interesse diálogo das fontes: Posteriormente, foi realizada audiência judicial na qual foi acordado que a Potássio do Brasil Ltda. entregaria até o dia 18.11.2019 a proposta do empreendimento oficialmente ao CIM e à OLIMCV.
Confira-se a parte final da ata: Ato contínuo, em 18.11.2019, foi protocolada petição pela Potássio do Brasil Ltda. comunicando a entrega do material ao CIM e ao OLIMCV, as quais responderam confirmando o recebimento da documentação e dando o aciete no início do processo de consulta (fls. 1.993-2000 -id. 297047889).
O protocolo também foi feito perante a Justiça Federal, o MPF e o perito do juízo foi copiado nos emails.
Em relação às características do empreendimento, foi informado o seguinte em documentos acostados aos autos: Após, com o início da pandemia da COVID-19, o processo sofreu atrasos e apenas foi retomado em 2021, depois da vacinação dos Mura.
Foi apresentado orçamento da consulta, equivalente a R$ 1.258.687,90 (id. 637592027).
Foi estabelecido um cronograma de reuniões com dos Povos Mura informado pelo CIM (id. 830734065), sendo que o plano era a conclusão até o final de maio de 2022: Após, foi realizada inspeção judicial em 29.3.2022 (Relatório - id. 1061672277) o que representou mais uma paralisação no processo.
O ponto mais relevante consignado foi o seguinte: Em seguida, houve notícia de que o MPF protocolou a ACP nº 1015595-88.2022.4.01.3200, mediante a qual pleiteia que seja concluída a demarcação da Terra Indígena Soares/Urucurituba.
Ato contínuo, petição de 20.9.2022, o MPF relatou a existência de pressões e coações por parte da empresa sobre os povos indígenas de Autazes e região e a sobreposição da exploração minerária pretendida pela Potássio do Brasil Ltda. ao referido território tradicional indígena.
Ademais, aduziu o MPF que as estruturas minerárias seriam construídas a aproximadamente dois quilômetros da área de moradia (casas da aldeia Soares), e dentro da área indígena reivindicada, território de uso tradicional do povo Mura.
Nesse contexto, requer a suspensão da licença expedida quanto ao Projeto Potássio Amazonas/Autazes, bem como a suspensão do procedimento de consulta prévia até finalização do procedimento de demarcação do território (ACP 1015595-88.2022.4.01.3200), no qual haveria liminar concedida.
Sobre esse pedido, a FUNAI se manifestou sobre a ausência de indícios de tradicionalidade (id. 1419622747): Após, em 16.2.2023, a FUNAI fez juntar aos autos documento intitulado Análise Cartográfica nº 138/2023, mediante a qual apresentou as seguintes conclusões (id. 1496199359): Veja-se, então, que se diz expressamente que há uma área de sobreposição, mas ao mesmo tempo afirma-se que há uma distância de 2,52 km da aldeia S -
29/09/2023 16:58
Recebido pelo Distribuidor
-
29/09/2023 16:58
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
02/10/2023
Ultima Atualização
26/06/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
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