TRF1 - 1007623-02.2020.4.01.3600
1ª instância - 3ª Cuiaba
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Polo Passivo
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Assistente Desinteressado Amicus Curiae
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Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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01/09/2022 00:00
Intimação
JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1007623-02.2020.4.01.3600 PROCESSO REFERÊNCIA: 1007623-02.2020.4.01.3600 CLASSE: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) POLO ATIVO: FUNDACAO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO POLO PASSIVO:ENDILLY KAENNA SANTOS MOITINHO e outros REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: INACIO DO NASCIMENTO DIAS - MT22533-A RELATOR(A):DANIELE MARANHAO COSTA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) 1007623-02.2020.4.01.3600 Processo na Origem: 1007623-02.2020.4.01.3600 RELATÓRIO A EXMA.
SRA.
DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO (Relatora): Esta Turma negou provimento à remessa necessária e à apelação interposta pela Fundação Universidade Federal de Mato Grosso – FUFMT, ora embargante, em acórdão assim sintetizado: ADMINISTRATIVO.
MANDADO DE SEGURANÇA.
INGRESSO NO ENSINO SUPERIOR PÚBLICO.
SISU 2020.
CURSO DE ENFERMAGEM.
SISTEMA DE COTAS RACIAIS.
COMISSÃO DE HETEROIDENTIFICAÇÃO.
NÃO HOMOLOGAÇÃO DA AUTODECLARAÇÃO DE PARDA.
MOTIVAÇÃO INSUFICIENTE.
COMPROVAÇÃO DA CONDIÇÃO POR FOTOGRAFIAS E DOCUMENTOS OFICIAIS.
INTERFERÊNCIA DO PODER JUDICIÁRIO.
POSSIBILIDADE EXCEPCIONAL.
DIREITO À MATRÍCULA.
SENTENÇA MANTIDA. 1.
Não obstante a legitimidade da adoção da heteroidentificação como critério supletivo à autodeclaração racial do candidato (ADC 41, Relator Ministro.
Roberto Barroso, Tribunal Pleno, julgado em 08/06/2017, DJe-180 17-08-2017), a atuação administrativa a ela referente deve estar pautada em critérios objetivos antecedentes à avaliação realizada, voltando-se ao impedimento de eventual tentativa de fraude ao sistema de cotas e valorizando, ainda, a relativa presunção de legitimidade da autodeclaração. 2.
A jurisprudência desta Corte Regional vem admitindo a possibilidade de afastamento das conclusões das comissões de heteroidentificação em processos seletivos públicos quando, dos documentos juntados aos autos, é possível verificar que as características e aspectos fenotípicos do candidato são evidentes, de acordo com o conceito de negro (que inclui pretos e pardos) utilizado pelo legislador, baseado nas definições do IBGE (AMS 1001174-98.2020.4.01.3803, Rel.
Desembargador Federal Souza Prudente, TRF1 – Quinta Turma, PJe 30/09/2021; AMS 1004678-42.2020.4.01.3600, Rel.
Desembargador Federal Souza Prudente, TRF1 – Quinta Turma, PJe 30/09/2021. 3.
Hipótese em que a Comissão de Heteroidentificação se negou a deferir e homologar a autodeclaração de parda prestada pela candidata, considerando-a inelegida e inapta a concorrer as vagas por não atender aos itens 1.6 e 2.5 do Anexo III do Edital, inclusive em sede de recurso administrativo, tendo sido, por sucedâneo, indeferida sua matrícula no curso de Graduação em Enfermagem (Bacharelado – Integral) da Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT, Campus Universitário de Cuiabá (Cuiabá/MT), em vaga reservada pelo SISU 2020/1 para o sistema de cotas-ações afirmativas para pretos, pardos e indígenas (Edital nº 001/2020, de 02/01/2020, Versão 2/STI – GSA/2020). 4.
Na espécie, dos elementos trazidos aos autos pelas partes, não se vislumbra, com a sentença de primeiro grau, qualquer indício de falsidade ou inconsistência contida na autodeclaração apresentada pela candidata, mesmo em face dos critérios referenciados, tendo o acervo documental apresentado nos autos (documentos oficiais com foto, dentre eles RG com indicação de etnia parda, fotografias da impetrante e outras imagens disponibilizadas) demonstrado de forma contundente o fenótipo pardo da impetrante, sem espaço para que se argumente por possíveis artifícios ou manipulações das imagens apresentadas.
Ademais, conforme demonstrado, a Impetrante, ainda em seu ensino médio, chegou a concorrer à outra vaga reservada para Pretos, Pardos e Indígenas em Instituto Federal, tendo sido aprovada e concluído o “Curso Técnico em Secretariado – Integrado ao Ensino Médio” ofertado pelo Instituto Federal do Mato Grosso - IFMT, conforme documento apresentado à fl. 361 dos autos digitais (diploma à fl. 35). 5.
Ausentes outros óbices, dotando-se de caráter vinculado o ato administrativo que decide sobre o enquadramento do candidato nos critérios utilizados para promoção das ações afirmativas, impõe-se a homologação da autodeclaração prestada pela candidataimpetrante, por ser fatídica a condição por ela declarada, assistindo-lhe ainda o direito à vaga reservada pelo sistema de cotas em razão de sua aprovação no certame quanto aos demais requisitos, com a consequente matrícula. 6.
Apelação e remessa necessária a que se nega provimento. 7.
Honorários advocatícios incabíveis na espécie (art. 25 da Lei 12.016/2009).
Vieram aos autos os embargos de declaração em apreço, opostos pela FUFMT à premissa de omissões e contradição no acórdão, que não teria apreciado argumentos capazes de, em tese, infirmar as conclusões do julgado, tais como: 1) a autonomia universitária para estabelecer critérios de seleção para seus cursos de Graduação, inclusive com a possibilidade de verificar as condições declaradas pelos candidatos aprovados para as vagas reservadas para as cotas da Lei n. 12.711/12; 2) a impossibilidade do Poder Judiciário reanalisar o fenótipo de candidato que não foi homologado por Universidade Federal em processo seletivo por ela instaurado.
Argumenta que a declaração étnica feita por aluno, como qualquer documento por ele produzido, estaria sujeita a exame posterior pela Autarquia, nos termos da lei e do edital, podendo o candidato perder o direito à vaga caso não restasse comprovado seu enquadramento na cota étnica.
Acrescenta que o procedimento de verificação da autodeclaração étnico-racial visa assegurar a efetividade da ação afirmativa e que, no caso dos autos, após criterioso escrutínio por comissão plural, entendeu a autarquia que a parte embargada não contemplava os requisitos para se matricular em vaga destinada à cota étnica, de modo que o acórdão, ao atacar a decisão administrativa, estaria a negar a aplicabilidade da própria política pública já considerada constitucional pelo Poder Judiciário, eis que não haveria outra forma de classificar quais candidatos fariam jus ao acesso às vagas reservadas, a não ser pelo critério fenotípico.
Indaga, quanto ao ponto, qual critério deveria ser adotado na seleção dos candidatos que fazem jus às reservas de vagas, sob pena de concluir-se que todos os que vindicam as vagas fariam jus às mesmas ou mesmo que nenhum dos candidatos teria tal direito.
Defende também que não haveria que se falar em interferência do Poder Judiciário, em matéria que estaria inserida no âmbito da autonomia universitária, para que, analisando documentos e fotos juntados aos autos, numa análise substancialmente subjetiva, se conclua de forma diferente do parecer isonômico e fundamentado da Comissão e se defira a matrícula da candidata, sob pena de violação aos princípios da isonomia, da moralidade, da impessoalidade administrativa e do primado da segurança jurídica.
Aduz ainda que também não haveria que se falar em fato consumado com o deferimento da tutela provisória precária, uma vez que o Poder Judiciário poderia, a qualquer momento, reverter tal situação desfavorável à Universidade, diante da ilegalidade cometida e da possibilidade de reversão no plano fático.
Menciona jurisprudência do STF que entende pertinente à tese e ressalta, quanto ao ponto, que não haveria qualquer comprovação de que a autora teria concluído o curso, bem como que a decisão fora fundamentada em circunstância posterior à propositura da ação, que não constava da causa de pedir delimitada na petição inicial, motivo pelo qual deveria ter o Tribunal ouvido as partes, sob pena de omissão e de violação à norma insculpida no art. 10 do CPC.
Diante do que expõe, requer o conhecimento e acolhimento dos embargos de declaração, a fim de que sejam sanados os vícios apontados e que haja manifestação expressa da Turma quanto aos dispositivos normativos suscitados.
Sem contrarrazões, retornaram os autos conclusos. É o relatório.
VOTO - VENCEDOR PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) 1007623-02.2020.4.01.3600 Processo na Origem: 1007623-02.2020.4.01.3600 VOTO Nos termos do art. 1.022 do CPC, os embargos de declaração são cabíveis para se afastar omissão, obscuridade ou contradição e ainda para a correção de erro material.
Na espécie, o julgado embargado manifestou-se expressamente a respeito da matéria sob exame, com análise necessária e suficiente para o julgamento da causa, a ela conferindo o desfecho considerado pertinente.
Tal compreensão se aplica inclusive quanto a pontos abordados no recurso integrativo, tendo o acórdão, por ele censurado, asseverado que “dos elementos trazidos aos autos pelas partes, não se vislumbra, com a sentença de primeiro grau, qualquer indício de falsidade ou inconsistência contida na autodeclaração apresentada pela candidata, mesmo em face dos critérios fenotípicos referenciados, tendo o acervo documental apresentado nos autos (documentos oficiais com foto, dentre eles RG com indicação de etnia parda, fotografias da impetrante e outras imagens disponibilizadas) demonstrado de forma contundente o fenótipo pardo da impetrante, sem espaço para que se argumente por possíveis artifícios ou manipulações das imagens apresentadas.”.
Ressaltou-se ainda, no particular dos autos, que “a impetrante, ainda em seu ensino médio, chegou inclusive a concorrer à outra vaga reservada para Pretos, Pardos e Indígenas em Instituto Federal, tendo sido aprovada e concluído o “Curso Técnico em Secretariado – Integrado ao Ensino Médio” ofertado pelo Instituto Federal do Mato Grosso - IFMT, conforme documento apresentado à fl. 361 dos autos digitais (diploma à fl. 35).”.
Nesse contexto, fundamentou-se a determinação de homologação da autodeclaração de parda apresentada pela candidata, bem como a reserva da vaga destinada ao sistema de cotas e a respectiva matrícula, na compreensão já firmada por esta Corte no sentido da possibilidade de afastamento das conclusões das comissões de heteroidentificação de processos seletivos públicos quando, dos documentos juntados aos autos, é possível verificar que as características e aspectos fenotípicos do candidato são evidentes, de acordo com o conceito de negro (que inclui pretos e pardos) utilizado pelo legislador, baseado nas definições do IBGE (AMS 1001174-98.2020.4.01.3803, Rel.
Desembargador Federal Souza Prudente, TRF1 – Quinta Turma, PJe 30/09/2021), tendo-se ressaltado, por fim, que o caso dos autos não se trataria de uma interferência indevida do Poder Judiciário no mérito administrativo, mas de hipótese em que se faz necessário o resguardo dos direitos fundamentais envolvidos, notadamente o direito de acesso à educação.
Desse modo, ao que se verifica, ao passo que pretende repisar argumentos apresentados em sede de apelo e já apreciados por ocasião do acórdão embargado, a Universidade ora embargante não apresenta fundamentos específicos capazes de infirmar as conclusões do julgado, haja vista que a autonomia universitária não se sobrepõe, por si só, aos princípios que regem a Administração Pública, dentre eles os princípios da legalidade, da proporcionalidade, da razoabilidade e da motivação dos atos administrativos, os quais, numa interpretação mais circunspecta, vedam a prática de atos arbitrários e carentes de fundamentação idônea, tal qual o ato que afastou o enquadramento da candidata no fenótipo pardo.
Destarte, não há, portanto, qualquer omissão, contradição, erro material ou vício no acórdão a justificar o acolhimento dos embargos de declaração, evidenciando-se das razões dos embargos o mero inconformismo com a diretriz estabelecida no julgado.
Bem sabido, eventual impertinência do entendimento expresso não se mostra passível de correção por meio dos embargos de declaração, já que incabível a rediscussão da matéria em sede de cognição limitada da presente via recursal.
Insta registrar, ademais, ser firme a jurisprudência no sentido de que o juízo não é obrigado “a examinar, um a um, os pretensos fundamentos das partes, nem todas as alegações que produzem: o importante é que indique o fundamento suficiente de sua conclusão, que lhe apoiou a convicção no decidir” (STF, RE nº 97.558-6/GO, Relator Ministro Oscar Correa, DJ de 25/5/1984).
Além disso, devem ser analisados os argumentos previamente apresentados que se mostrem aptos a infirmar as conclusões externadas pelo julgador, mas sem que isso signifique, por si só, a obrigação de examinar todas as questões trazidas pelas partes.
Nesse sentido: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS.
VÍCIOS NÃO CONFIGURADOS.
SUPOSTA AFRONTA AO ART. 489, § 1º, CPC.
NÃO OCORRÊNCIA.
ARGUMENTOS ANALISADOS.
PREQUESTIONAMENTO.
INVIABILIDADE.
EMBARGOS REJEITADOS.
I - Nos termos do art. 619 do CPP, serão cabíveis embargos declaratórios quando houver ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão no julgado.
Não constituem, portanto, recurso de revisão.
II - Não há que se falar em afronta ao art. 489, § 1º, IV, do CPC, quando a decisão examinou adequadamente todos os argumentos deduzidos no processo que seriam capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador.
III - "O julgador não é obrigado a rebater todos os argumentos aventados pelas partes quando o acórdão recorrido analisar, com clareza, as questões essenciais ao deslinde da controvérsia, havendo, ainda, razões suficientes para sua manutenção" (EDcl no AgRg nos EDcl no AREsp 534.318/PB, Rel.
Quinta Turma, Rel.
Min.Reynaldo Soares da Fonseca, DJe 17/6/2015).
IV - A jurisprudência desta Corte sedimentou o entendimento de que a sentença condenatória não configura, por si só, prejuízo indispensável para o reconhecimento da nulidade.
V - Mesmo para fins de prequestionamento, os embargos de declaração somente serão cabíveis quando houver vício na decisão impugnada, o que não se observa no caso dos autos.
Embargos rejeitados. (EDcl no AgRg no RHC 96.462/RJ, Rel.
Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 20/09/2018, DJe 28/09/2018) Ante o exposto, rejeito os embargos de declaração. É como voto.
Desembargadora Federal Daniele Maranhão Relatora DEMAIS VOTOS PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO Gab. 15 - Desembargadora Federal Daniele Maranhão EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) 1007623-02.2020.4.01.3600 Processo na Origem: 1007623-02.2020.4.01.3600 RELATORA : DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO APELANTE: FUNDACAO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO APELADO: ENDILLY KAENNA SANTOS MOITINHO ASSISTENTE: MARIA APARECIDA SANTOS MOITINHO, BENIVALDO RIBEIRO MOITINHO Advogado do(a) APELADO: INACIO DO NASCIMENTO DIAS - MT22533-A Advogado do(a) ASSISTENTE: INACIO DO NASCIMENTO DIAS - MT22533-A EMBARGANTE: FUNDACAO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO E M E N T A PROCESSUAL CIVIL.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
OMISSÃO/CONTRADIÇÃO.
ANÁLISE DAS QUESTÕES DEVOLVIDAS AO EXAME DESTA CORTE.
FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE.
INEXISTÊNCIA DE ARGUMENTOS APTOS A INFIRMAR AS CONCLUSÕES EXTERNADAS NO ACÓRDÃO.
VÍCIO INEXISTENTE.
REDISCUSSÃO DO JULGADO.
IMPOSSIBILIDADE.
EMBARGOS REJEITADOS. 1.
Nos termos do art. 1.022 do CPC, os embargos de declaração são cabíveis para se afastar omissão, obscuridade ou contradição e ainda para a correção de erro material. 2.
Analisadas no comando recorrido as questões devolvidas ao exame da Corte, e não havendo incongruência entre as premissas fixadas no acórdão com a conclusão do julgado, descabe falar-se em necessidade de sua integração, afeiçoando a insurgência como pretensão de rediscussão da causa. 3.
O julgador não está obrigado a analisar pormenorizadamente todos os argumentos apresentados pelas partes, tendo por obrigação apresentar os fundamentos que motivaram a sua conclusão, entre os quais se incluem aqueles aptos a infirmar as conclusões externadas na decisão proferida, mas sem que isso signifique, por si só, a obrigação de examinar todas as questões trazidas pelas partes (STJ, EDcl no AgRg no RHC 96.462/RJ, Rel.
Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, DJe 28/09/2018). 4.
Embargos de declaração rejeitados.
A C Ó R D Ã O Decide a Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª.
Região, por unanimidade, rejeitar os embargos de declaração, nos termos do voto da Relatora.
Brasília - DF, 17 de agosto de 2022.
Desembargadora Federal Daniele Maranhão Relatora -
19/05/2022 00:00
Intimação
JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1007623-02.2020.4.01.3600 PROCESSO REFERÊNCIA: 1007623-02.2020.4.01.3600 CLASSE: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) POLO ATIVO: FUNDACAO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO POLO PASSIVO:ENDILLY KAENNA SANTOS MOITINHO e outros REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: INACIO DO NASCIMENTO DIAS - MT22533-A RELATOR(A):DANIELE MARANHAO COSTA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) 1007623-02.2020.4.01.3600 Processo na Origem: 1007623-02.2020.4.01.3600 R E L A T Ó R I O O EXMO.
SR.
JUIZ FEDERAL PAULO RICARDO DE SOUZA CRUZ (Relator Convocado): Trata-se de remessa necessária e de apelação interposta Fundação Universidade Federal de Mato Grosso – FUFMT em face de sentença que, nos autos do Mandado de Segurança impetrado por Endilly Kaenna Santos Moitinho, confirmou a decisão que deferiu o pedido de liminar e concedeu a segurança para determinar que o impetrado proceda à matrícula da impetrante no curso de Graduação em Enfermagem (Bacharelado – Integral) da Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT, Campus Universitário de Cuiabá - MT.
O juízo de origem assim decidiu por entender que, no presente caso, a autodeclaração da candidata deveria prevalecer em detrimento da decisão administrativa que a indeferiu, haja vista que, nos termos proferidos, “(...) da análise dos documentos que lastreiam a inicial, é possível concluir que houve equívoco da Banca Examinadora, vez que pelas características pessoais da autora (tom de pele, textura dos cabelos e traços fisionômicos – fenótipo), se verifica, de fato, que possui traços de uma pessoa parda, constituindo prova robusta da condição alegada.”.
Consignou, em conclusão, que “os elementos coligidos aos autos demonstram que a Impetrante efetivamente é afrodescendente, de cor parda, assistindo-lhe o direito à vaga pelo sistema de cotas, em razão de aprovação no certame, salvo se houver motivo de indeferimento da matrícula diverso do que foi relatado nos autos.”.
Foram apreciados, ademais, aspectos que envolvem desde os critérios previstos para homologação da autodeclaração até a excepcional possibilidade de interferência do Poder Judiciário em decisões administrativas relacionadas aos respectivos procedimentos de verificação.
Em suas razões recursais, a Fundação Universidade Federal de Mato Grosso – FUFMT sustenta, inicialmente, a necessidade de atribuição de efeito suspensivo à apelação em função do risco de aplicação da teoria do fato consolidado ao feito em virtude do cumprimento da ordem judicial que determinou que a Universidade procedesse à matrícula da impetrante.
Quanto ao mérito, argumenta, em síntese, que, embora legítimo o critério da autoidentificação, a declaração étnica feita por aluno, como qualquer documento por ele produzido, poderia e deveria ser avaliada e sindicada à exaustão pela Universidade, exatamente para preservar a política pública que embasa a existência das cotas étnicas; além de que a recorrida estaria ciente, ao efetuar sua declaração, de que poderia ser instituída comissão especial para análise e averiguação dos fatos, podendo perder o direito à vaga caso não restasse comprovado seu enquadramento na política afirmativa.
Aduz que a Universidade agiu pautada pelo princípio da legalidade e que ao submeter a candidata à avaliação da Comissão designada apenas teria cumprido com a legislação que rege a matéria, ressaltando que a heteroidentificação foi declarada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião da ADC 41/DF, que declarou a constitucionalidade da Lei n. 12.990/2014, bem como que a possibilidade de verificação da autodeclaração, como mecanismo para coibir fraudes, já havia sido mencionada por ocasião do julgamento da ADPF 186, que reconheceu a constitucionalidade da reserva de cotas na UnB.
Menciona ainda que na ocasião do Recurso Extraordinário n. 597.285 o STF teria consignado ser desnecessária lei formal para disciplinar a matéria, que estaria inserida no âmbito da autonomia universitária (art. 51, da Lei nº 9.394/96).
Assevera também que o procedimento de verificação da autodeclaração prestada pela candidata se encontra em consonância com a Lei, com a jurisprudência, com a orientação do Ministério Público Federal (Ofício 5.560/2016) e com a Portaria Normativa 04/2018, do MPOG e que a hipótese dos autos não comportaria interferência do Poder Judiciário no mérito administrativo inserido no âmbito da autonomia universitária, analisando documentos e fotos e concluindo de forma diferente do parecer proferido pela comissão especializada.
Nessa toada, sustenta que os procedimentos da Comissão de Verificação estabelecidos pelo recorrente, reputados constitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, teriam sido seguidos regularmente no caso concreto, salientando que, após criterioso escrutínio por comissão plural mediante julgamento colegiado, a Universidade teria entendido corretamente que a candidata não contemplava os requisitos para se matricular na vaga destinada à cota étnica.
Defende, em conclusão, a legalidade e a suficiência da motivação do ato de indeferimento da matrícula e que a análise fenotípica realizada pela Comissão garantiria igualdade e isonomia aos candidatos, não sendo passível de intervenção pelo Poder Judiciário, eis que os mesmos critérios seriam utilizados para todos os candidatos, que seriam igualmente avaliados, de forma objetiva.
Pelo que expõe, requer seja atribuído efeito suspensivo ou deferida a antecipação da tutela recursal e, ao final, seja acolhido o recurso de apelação, reformando-se a sentença proferida.
Contrarrazões apresentadas pela parte impetrante.
O Ministério Público Federal, nesta instância, opinou pelo desprovimento do recurso de apelação e da remessa necessária, vindo os autos conclusos. É o relatório.
VOTO - VENCEDOR PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) 1007623-02.2020.4.01.3600 Processo na Origem: 1007623-02.2020.4.01.3600 V O T O A controvérsia submetida à análise desta Corte versa sobre a legalidade do ato proferido pela Comissão de Heteroidentificação que não reconheceu o enquadramento da impetrante no fenótipo pardo, impedindo-a de realizar sua matrícula no curso de Graduação em Enfermagem (Bacharelado – Integral) da Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT, Campus Universitário de Cuiabá - MT, em vaga reservada pelo SISU 2020/1 para o sistema de cotas-ações afirmativas para pretos, pardos e indígenas (Edital nº 001/2020, de 02/01/2020, Versão 2/STI – GSA/2020).
Conforme se vem a fundamentar, a despeito da remessa necessária e das razões expressas no recurso de apelação da Universidade, a sentença merece ser integralmente mantida, porquanto em sintonia com a prova dos autos e com a necessidade de proteção do direito líquido e certo demonstrado pela parte impetrante, ora apelada.
A respeito da matéria de fundo, mostra-se incontroversa a possibilidade de utilização de critérios supletivos à autodeclaração prestada pelo candidato que se declara preto ou pardo, com o intuito de se evitarem fraudes que terminariam por sabotar a finalidade e eficiência do próprio sistema de cotas raciais.
Desse modo, em que pese a autodeclaração possua presunção de veracidade e legitimidade, tal critério não é, por si só, condição suficiente para que o candidato seja considerado pessoa negra ou parda, sendo possível a utilização de procedimentos como a exigência de fotos, heteroidentificação por meio de comissões plurais, dentre outros, desde que previstos em edital e respeitada a dignidade humana Nessa percepção, transcreve-se o seguinte excerto do voto proferido pelo Exmo.
Ministro Roberto Barroso por ocasião do julgamento da ADC 41/DF: “Atenta aos méritos e deficiências do sistema de autodeclaração, a Lei nº 12.990/2014 definiu-o como critério principal para a definição dos beneficiários da política.
Nos termos de seu artigo 2º, determinou que “[p]oderão concorrer às vagas reservadas a candidatos negros aqueles que se autodeclararem pretos ou pardos no ato da inscrição no concurso público, conforme o quesito cor ou raça utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE”.
Porém, instituiu norma capaz de desestimular fraudes e punir aqueles que fizerem declarações falsas a respeito de sua cor.
Nesse sentido, no parágrafo único do mesmo artigo 2º, estabeleceu que “[n]a hipótese de constatação de declaração falsa, o candidato será eliminado do concurso e, se houver sido nomeado, ficará sujeito à anulação da sua admissão ao serviço ou emprego público, após procedimento administrativo em que lhe sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa, sem prejuízo de outras sanções cabíveis.
Para dar concretude a esse dispositivo, entendo que é legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação para fins de concorrência pelas vagas reservadas, para combater condutas fraudulentas e garantir que os objetivos da política de cotas sejam efetivamente alcançados.
São exemplos desses mecanismos: a exigência de autodeclaração presencial, perante a comissão do concurso; a exigência de fotos; e a formação de comissões, com composição plural, para entrevista dos candidatos em momento posterior à autodeclaração.” Há que se ressaltar, contudo, que embora reconhecidamente legítima a adoção desse critério supletivo, deve estar claro que sua finalidade premente é a de evitar fraudes ou prejuízos ao sistema ao cotas, devendo a atuação administrativa, em casos que tais, se pautar pela observância dessa premissa para afastar a presunção de legitimidade da autodeclaração, observando critérios objetivos para aferição de eventual conduta dolosa.
Com efeito, a possibilidade da realização da heteroidentificação do candidato não significa que a Administração possa se valer desse critério indistintamente, deixando de observar outros princípios norteadores das relações que por ela são mantidas, tais como, no caso de concursos públicos, o princípio da vinculação ao edital, ou mesmo, num plano maior, a segurança jurídica.
Perfilhando essa orientação, este Tribunal firmou entendimento no sentido de que a possibilidade de realização de processo de heteroidentificação fenotípica em concursos vestibulares deve estar jungida à existência de prévia previsão editalícia, que, estabelecendo as condições de ingresso na instituição, também preveja a adoção do referido critério de avaliação, mostrando-se excepcionalmente possível apenas na hipótese em que, mediante processo administrativo timbrado pelo devido processo legal, vier a ser demonstrada e reconhecida, com base em critérios objetivos pré-fixados, a ocorrência da fraude imputada ao candidato (AC 1007571-06.2020.4.01.3600, Rel.
Desembargador Federal Jamil Rosa De Jesus Oliveira, TRF1 – Sexta Turma, PJe 19/10/2021).
Do mesmo modo, vem-se admitindo a possibilidade de afastamento das conclusões das comissões de heteroidentificação em processos seletivos públicos quando, dos documentos juntados aos autos, é possível verificar que as características e aspectos fenotípicos do candidato são evidentes, de acordo com o conceito de negro (que inclui pretos e pardos) utilizado pelo legislador, baseado nas definições do IBGE (AMS 1001174-98.2020.4.01.3803, Rel.
Desembargador Federal Souza Prudente, TRF1 – Quinta Turma, PJe 30/09/2021).
Atentando-se à hipótese dos autos, a submissão dos candidatos à Comissão de Heteroidentificação e os respectivos critérios de avaliação foram basicamente previstos nos seguintes itens do Edital e do respectivo anexo III: “1.8.
Os candidatos que concorrerem às vagas reservadas aos candidatos autodeclarados pretos, pardos e indígenas deverão comparecer presencialmente à Comissão de Heteroidentificação desta Instituição em data a ser divulgada no cronograma do Processo Seletivo. 6.6.
Os candidatos que optarem por concorrer às vagas reservadas para autodeclarados pretos, pardos ou indígenas, deverão comparecer presencialmente à Comissão de Heteroidentificação, em data e horário definidos no Cronograma deste Processo Seletivo.
Anexo III 1.5.
A Autodeclaração de candidato Indígena será aferida por meio da conferência dos documentos acerca de sua condição étnica e de seu pertencimento étnico. 1.6.
A Comissão de Heteroidentificação utilizará de procedimento com base em critério de verificação da veracidade da autodeclaração de pessoa negra (preta ou parda) considerando, tão somente, os aspectos fenotípicos do candidato. 2.5.
As formas e critérios de aferição da veracidade da autodeclaração de pessoa negra (preta ou parda) considerarão presencialmente apenas os aspectos fenotípicos dos candidatos. 4.6.
Os recursos interpostos serão avaliados por meio de análise documental das informações condas no processo de recurso, acrescido do parecer e registro fotográfico do candidato no processo de aferição realizado pela Comissão de Heteroidenficação. (...)” No caso em análise, a Comissão de Heteroidentificação se negou a deferir e homologar a autodeclaração de parda prestada pela candidata, considerando-a inelegida e inapta a concorrer as vagas por não atender aos itens 1.6 e 2.5 do Anexo III do Edital, inclusive em sede de recurso administrativo, tendo sido, por sucedâneo, indeferida sua matrícula no curso para o qual havia logrado aprovação.
Sucede que, conforme relatado, nada obstante a conclusão da comissão avaliadora, na origem foram apreciados aspectos que envolvem desde os critérios adotados para homologação da autodeclaração até a excepcional possibilidade de interferência do Poder Judiciário para fins de controle da legitimidade das decisões administrativas em casos que tais, tendo o r. juízo a quo concedido a segurança ao argumento de que a autodeclaração da candidata deveria prevalecer no presente caso, haja vista que, nos termos proferidos, “(...) da análise dos documentos que lastreiam a inicial, é possível concluir que houve equívoco da Banca Examinadora, vez que pelas características pessoais da autora (tom de pele, textura dos cabelos e traços fisionômicos – fenótipo), se verifica, de fato, que possui traços de uma pessoa parda, constituindo prova robusta da condição alegada.”.
Com efeito, dos elementos trazidos aos autos pelas partes, não se vislumbra, com a sentença de primeiro grau, qualquer indício de falsidade ou inconsistência contida na autodeclaração apresentada pela candidata, mesmo em face dos critérios fenotípicos referenciados, tendo o acervo documental apresentado nos autos (documentos oficiais com foto, dentre eles RG com indicação de etnia parda, fotografias da impetrante e outras imagens disponibilizadas) demonstrado de forma contundente o fenótipo pardo da impetrante, sem espaço para que se argumente por possíveis artifícios ou manipulações das imagens apresentadas.
Ademais, conforme demonstrado, a impetrante, ainda em seu ensino médio, chegou inclusive a concorrer à outra vaga reservada para Pretos, Pardos e Indígenas em Instituto Federal, tendo sido aprovada e concluído o “Curso Técnico em Secretariado – Integrado ao Ensino Médio” ofertado pelo Instituto Federal do Mato Grosso - IFMT, conforme documento apresentado à fl. 361 dos autos digitais (diploma à fl. 35).
No sentido da possibilidade de afastamento das conclusões da comissão de heteroidentificação em função da suficiência das provas documentais apresentadas, são, dentre outros, os vários precedentes deste TRF1 que se colaciona: CONSTITUCIONAL.
ADMINISTRATIVO.
MANDADO DE SEGURANÇA.
ENSINO.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA UFU.
SISTEMA DE COTAS.
AUTODECLARAÇÃO.
INGRESSO.
POSSIBILIDADE.
CANDIDATO PARDO.
COMPROVAÇÃO ATRAVÉS DE FOTOGRAFIAS.
SENTENÇA MANTIDA.
I - A jurisprudência desta Corte Regional vem admitindo a possibilidade de afastamento das conclusões das comissões de heteroidentificação de processos seletivos públicos, quando, dos documentos juntados aos autos, é possível verificar que as características e aspectos fenotípicos do candidato são evidentes, de acordo com o conceito de negro (que inclui pretos e pardos) utilizado pelo legislador, baseado nas definições do IBGE.
II - Na hipótese dos autos, as fotografias acostadas à inicial, não impugnadas pela promovida, demonstram, à saciedade, a veracidade da autodeclaração de cor levada a efeito pela candidata, enquadrando-a na condição de cor parda, a autorizar a concessão da medida postulada.
III - A orientação jurisprudencial já consolidada no âmbito de nossos tribunais é no sentido de que, em casos como tais, deve-se preservar a situação de fato consolidada com a concessão da antecipação de tutela em 20/02/2020, garantindo à impetrante direito à matrícula no curso de Bacharelado em Biotecnologia, na modalidade de vagas voltadas aos candidatos oriundos de escola pública que se autodeclaram pardos, sendo, portanto, desaconselhável a desconstituição da referida situação fática, nesse momento processual.
IV Apelação e remessa necessária desprovidas.
Sentença confirmada. (AMS 1001174-98.2020.4.01.3803, Rel.
Desembargador Federal Souza Prudente, TRF1 – Quinta Turma, PJe 30/09/2021) CONSTITUCIONAL.
ADMINISTRATIVO.
MANDADO DE SEGURANÇA.
ENSINO.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO.
SISTEMA DE COTAS.
AUTODECLARAÇÃO.
INGRESSO.
POSSIBILIDADE.
CANDIDATO PARDO.
COMPROVAÇÃO ATRAVÉS DE FOTOGRAFIAS E DOCUMENTOS OFICIAIS.
SENTENÇA MANTIDA.
I - A jurisprudência desta Corte Regional vem admitindo a possibilidade de afastamento das conclusões das comissões de heteroidentificação de processos seletivos públicos, quando, dos documentos juntados aos autos, é possível verificar que as características e aspectos fenotípicos do candidato são evidentes, de acordo com o conceito de negro (que inclui pretos e pardos) utilizado pelo legislador, baseado nas definições do IBGE.
II - Na hipótese dos autos, as fotografias acostadas à inicial, assim como documentos oficiais e atestado emitido por um médico dermatologista, demonstram, à saciedade, a veracidade da autodeclaração de cor levada a efeito pelo impetrante, enquadrando-o na condição de cor parda, a autorizar a concessão da medida postulada.
III - A orientação jurisprudencial já consolidada no âmbito de nossos tribunais é no sentido de que, em casos como tais, deve-se preservar a situação de fato consolidada com a concessão da antecipação de tutela em 27/03/2020, garantindo ao impetrante direito à matrícula no curso de Medicina da Universidade Federal de Mato Grosso UFMT, na modalidade de vagas voltadas aos candidatos que se autodeclaram pardos, sendo, portanto, desaconselhável a desconstituição da referida situação fática, nesse momento processual.
IV Apelação e remessa necessária desprovidas.
Sentença confirmada. (AMS 1004678-42.2020.4.01.3600, Rel.
Desembargador Federal Souza Prudente, TRF1 – Quinta Turma, PJe 30/09/2021) ADMINISTRATIVO.
ENSINO SUPERIOR.
EXAME VESTIBULAR.
INGRESSO NO SISTEMA DE COTAS RACIAIS.
EXCLUSÃO.
AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO.
INTERFERÊNCIA DO PODER JUDICIÁRIO.
POSSIBILIDADE EXCEPCIONAL.
DIREITO À MATRÍCULA.
SUBSTITUIÇÃO À BANCA EXAMINADORA.
POSSIBILIDADE.
SENTENÇA MANTIDA. 1.
Controvérsia relativa à decisão proferida pela banca responsável pela entrevista a candidato a vaga de cotas raciais que não o considerou como apto a se beneficiar pelo sistema de cotas. 2.
Hipótese em que a decisão administrativa que indeferiu o recurso do candidato está desprovida de fundamentação, aliado ao fato de que o acervo documental presente no processo demonstra de forma contundente o fenótipo negro do impetrante, sendo este, inclusive, o fundamento utilizado nesta Corte para atribuição de efeito ativo ao agravo de instrumento anteriormente interposto pelo candidato. 3.
A obtenção de provimento judicial para que fosse garantida a participação do impetrante no exame vestibular em 2013 que enseja a aplicação da teoria do fato consumado, uma vez que o decurso do tempo desde então decorrido. 4.
Apelação e remessa oficial tida como interposta a que se nega provimento. (AC 0040219-21.2013.4.01.3400, Rel.
Desembargadora Federal Daniele Maranhão Costa, TRF1 – Quinta Turma, e-DJF1 06/08/2019) Desse modo, ausentes outros óbices, dotando-se de caráter vinculado o ato administrativo que decide sobre o enquadramento do candidato nos critérios utilizados para promoção das ações afirmativas, impõe-se a homologação da autodeclaração prestada pela candidata-impetrante, por ser fatídica a condição por ela declarada, assistindo-lhe ainda o direito à vaga reservada pelo sistema de cotas em razão de sua aprovação no certame quanto aos demais requisitos, com a consequente matrícula.
Há que se ressaltar, por derradeiro, que a obstaculização do acesso às vagas reservadas às ações sociais, sem fundamentação idônea, de candidato que não aparenta cor branca ou fenótipo incompatível com o referido benefício viola o princípio constitucional da isonomia e da dignidade da pessoa humana, reforçando a discriminação que se visa combater com a implementação da ação afirmativa em comento.
Não se trata o caso dos autos, portanto, de uma interferência indevida no mérito administrativo, mas de notável hipótese em que se faz necessário o resguardo dos direitos fundamentais envolvidos.
Ante o exposto, nego provimento à remessa necessária e à apelação interposta pela Fundação Universidade Federal de Mato Grosso - FUFMT, mantendo a sentença e tornando definitiva a matrícula da parte impetrante no curso de Enfermagem (Bacharelado – Integral) da UFMT no Campus Universitário de Cuiabá (Cuiabá/MT), salvo existente outro motivo impeditivo que não o discutido nos autos do mandado de segurança.
Honorários advocatícios recursais incabíveis na espécie (Lei nº 12.016/09, art. 25). É como voto.
Juiz Federal PAULO RICARDO DE SOUZA CRUZ Relator Convocado DEMAIS VOTOS PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) 1007623-02.2020.4.01.3600 Processo na Origem: 1007623-02.2020.4.01.3600 RELATORA : DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO APELANTE: FUNDACAO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO APELADO: ENDILLY KAENNA SANTOS MOITINHO ASSISTENTE: MARIA APARECIDA SANTOS MOITINHO, BENIVALDO RIBEIRO MOITINHO Advogado do(a) APELADO: INACIO DO NASCIMENTO DIAS - MT22533-A Advogado do(a) ASSISTENTE: INACIO DO NASCIMENTO DIAS - MT22533-A E M E N T A ADMINISTRATIVO.
MANDADO DE SEGURANÇA.
INGRESSO NO ENSINO SUPERIOR PÚBLICO.
SISU 2020.
CURSO DE ENFERMAGEM.
SISTEMA DE COTAS RACIAIS.
COMISSÃO DE HETEROIDENTIFICAÇÃO.
NÃO HOMOLOGAÇÃO DA AUTODECLARAÇÃO DE PARDA.
MOTIVAÇÃO INSUFICIENTE.
COMPROVAÇÃO DA CONDIÇÃO POR FOTOGRAFIAS E DOCUMENTOS OFICIAIS.
INTERFERÊNCIA DO PODER JUDICIÁRIO.
POSSIBILIDADE EXCEPCIONAL.
DIREITO À MATRÍCULA.
SENTENÇA MANTIDA. 1.
Não obstante a legitimidade da adoção da heteroidentificação como critério supletivo à autodeclaração racial do candidato (ADC 41, Relator Ministro.
Roberto Barroso, Tribunal Pleno, julgado em 08/06/2017, DJe-180 17-08-2017), a atuação administrativa a ela referente deve estar pautada em critérios objetivos antecedentes à avaliação realizada, voltando-se ao impedimento de eventual tentativa de fraude ao sistema de cotas e valorizando, ainda, a relativa presunção de legitimidade da autodeclaração. 2.
A jurisprudência desta Corte Regional vem admitindo a possibilidade de afastamento das conclusões das comissões de heteroidentificação em processos seletivos públicos quando, dos documentos juntados aos autos, é possível verificar que as características e aspectos fenotípicos do candidato são evidentes, de acordo com o conceito de negro (que inclui pretos e pardos) utilizado pelo legislador, baseado nas definições do IBGE (AMS 1001174-98.2020.4.01.3803, Rel.
Desembargador Federal Souza Prudente, TRF1 – Quinta Turma, PJe 30/09/2021; AMS 1004678-42.2020.4.01.3600, Rel.
Desembargador Federal Souza Prudente, TRF1 – Quinta Turma, PJe 30/09/2021; 3.
Hipótese em que a Comissão de Heteroidentificação se negou a deferir e homologar a autodeclaração de parda prestada pela candidata, considerando-a inelegida e inapta a concorrer as vagas por não atender aos itens 1.6 e 2.5 do Anexo III do Edital, inclusive em sede de recurso administrativo, tendo sido, por sucedâneo, indeferida sua matrícula no curso de Graduação em Enfermagem (Bacharelado – Integral) da Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT, Campus Universitário de Cuiabá (Cuiabá/MT), em vaga reservada pelo SISU 2020/1 para o sistema de cotas-ações afirmativas para pretos, pardos e indígenas (Edital nº 001/2020, de 02/01/2020, Versão 2/STI – GSA/2020). 4.
Na espécie, dos elementos trazidos aos autos pelas partes, não se vislumbra, com a sentença de primeiro grau, qualquer indício de falsidade ou inconsistência contida na autodeclaração apresentada pela candidata, mesmo em face dos critérios referenciados, tendo o acervo documental apresentado nos autos (documentos oficiais com foto, dentre eles RG com indicação de etnia parda, fotografias da impetrante e outras imagens disponibilizadas) demonstrado de forma contundente o fenótipo pardo da impetrante, sem espaço para que se argumente por possíveis artifícios ou manipulações das imagens apresentadas.
Ademais, conforme demonstrado, a Impetrante, ainda em seu ensino médio, chegou a concorrer à outra vaga reservada para Pretos, Pardos e Indígenas em Instituto Federal, tendo sido aprovada e concluído o “Curso Técnico em Secretariado – Integrado ao Ensino Médio” ofertado pelo Instituto Federal do Mato Grosso - IFMT, conforme documento apresentado à fl. 361 dos autos digitais (diploma à fl. 35). 5.
Ausentes outros óbices, dotando-se de caráter vinculado o ato administrativo que decide sobre o enquadramento do candidato nos critérios utilizados para promoção das ações afirmativas, impõe-se a homologação da autodeclaração prestada pela candidata-impetrante, por ser fatídica a condição por ela declarada, assistindo-lhe ainda o direito à vaga reservada pelo sistema de cotas em razão de sua aprovação no certame quanto aos demais requisitos, com a consequente matrícula. 6.
Apelação e remessa necessária a que se nega provimento. 7.
Honorários advocatícios incabíveis na espécie (art. 25 da Lei 12.016/2009).
A C Ó R D Ã O Decide a Quinta Turma, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa necessária, nos termos do voto do Relator.
Brasília-DF, 11 de maio de 2022.
Juiz Federal PAULO RICARDO DE SOUZA CRUZ Relator Convocado -
01/09/2020 18:54
Remetidos os Autos (em grau de recurso) de 3ª Vara Federal Cível da SJMT para Tribunal
-
01/09/2020 18:52
Juntada de Informação.
-
31/08/2020 22:12
Juntada de contrarrazões
-
04/08/2020 18:05
Decorrido prazo de ENDILLY KAENNA SANTOS MOITINHO em 03/08/2020 23:59:59.
-
31/07/2020 12:19
Decorrido prazo de REITOR DA FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO em 30/07/2020 23:59:59.
-
29/07/2020 18:31
Expedição de Comunicação via sistema.
-
29/07/2020 18:28
Juntada de ato ordinatório
-
29/07/2020 18:26
Juntada de Certidão
-
22/07/2020 15:29
Juntada de Apelação
-
06/07/2020 19:03
Mandado devolvido cumprido
-
06/07/2020 19:03
Juntada de diligência
-
04/07/2020 09:33
Juntada de Petição intercorrente
-
03/07/2020 15:54
Recebido o Mandado para Cumprimento pelo Oficial de Justiça
-
02/07/2020 22:14
Expedição de Mandado.
-
02/07/2020 22:14
Expedição de Comunicação via sistema.
-
01/07/2020 17:57
Concedida a Segurança
-
21/06/2020 12:28
Decorrido prazo de REITOR DA FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO em 09/06/2020 23:59:59.
-
08/06/2020 02:43
Conclusos para julgamento
-
04/06/2020 17:02
Juntada de Parecer
-
04/06/2020 12:06
Juntada de petição intercorrente
-
04/06/2020 03:14
Expedição de Comunicação via sistema.
-
27/05/2020 00:40
Juntada de Petição intercorrente
-
26/05/2020 14:05
Mandado devolvido cumprido
-
26/05/2020 14:05
Juntada de Certidão de devolução de mandado
-
25/05/2020 15:07
Recebido o Mandado para Cumprimento pelo Oficial de Justiça
-
22/05/2020 15:43
Expedição de Mandado.
-
22/05/2020 15:43
Expedição de Comunicação via sistema.
-
22/05/2020 13:55
Concedida a Medida Liminar
-
21/05/2020 16:34
Conclusos para decisão
-
21/05/2020 16:10
Remetidos os Autos da Distribuição a 3ª Vara Federal Cível da SJMT
-
21/05/2020 16:10
Juntada de Informação de Prevenção.
-
21/05/2020 14:34
Recebido pelo Distribuidor
-
21/05/2020 14:34
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
21/05/2020
Ultima Atualização
01/09/2022
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Ato ordinatório • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
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Ato ordinatório • Arquivo
Sentença Tipo A • Arquivo
Sentença Tipo A • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
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