TRF1 - 1002369-65.2022.4.01.3507
1ª instância - Jatai
Processos Relacionados - Outras Instâncias
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Assistente Desinteressado Amicus Curiae
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Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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02/02/2024 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Jataí-GO Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Jataí-GO PROCESSO: 1002369-65.2022.4.01.3507 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: VALDIVINO FERREIRA DE SOUZA REPRESENTANTES POLO ATIVO: ANTONIO FRANCISCO PEREIRA ASSIS - GO12581 POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA DESPACHO Considerando o recurso de apelação interposto pelo INCRA, intime-se o requerente para que, no prazo de 15 (quinze) dias, apresente suas contrarrazões.
Decorrido o prazo, com ou sem recurso, remetam-se os autos ao egrégio Tribunal Regional Federal da 1ª Região.
Jataí, data da assinatura eletrônica. (assinado digitalmente) RAFAEL BRANQUINHO Juiz Federal – SSJ/JTI -
21/09/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Jataí-GO Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Jataí-GO SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1002369-65.2022.4.01.3507 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: VALDIVINO FERREIRA DE SOUZA REPRESENTANTES POLO ATIVO: ANTONIO FRANCISCO PEREIRA ASSIS - GO12581 POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA SENTENÇA RELATÓRIO 1.
Trata-se de Embargos de Declaração opostos pelo INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA, tendo como parte adversa VALDIVINO FERREIRA DE SOUZA E OUTROS, visando sanar supostas omissões e contradição na sentença proferida nos autos (Id 1570941368). 2.
Alegou, em síntese, que a sentença embargada padeceu de omissão nos seguintes pontos: a) na necessidade de remessa necessária; b) na ausência de pronunciamento expresso quanto à confirmação da tutela de urgência deferida; e c) quanto ao mérito, não houve pronunciamento acerca da ausência de direito adquirido a regime jurídico, bem como pelo fato de que boa parte dos autores não residirem na parcela, frequentando-a somente nos finais de semana.
Acrescentou, ainda, que houve contradição no que diz respeito à existência de conflito entre as famílias assentadas, pois houve ajuizamento de ação de Obrigação de Fazer c/c Indenização por Danos Morais, proposta por Joaquim Cândido Silva em face do INCRA, em que pretende a retirada dos supostos invasores do seu lote (62) no P.A.
Rômulo Souza Pereira. 3.
Decido.
FUNDAMENTAÇÃO 4.
Conforme disposto no art. 1022 do CPC, são cabíveis embargos de declaração contra qualquer decisão judicial, com o fito de esclarecer obscuridade, eliminar contradição, suprir omissão de ponto ou questão sobre a qual deva se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento, bem como para corrigir erro material. 5.
No caso dos autos, o embargante alega que houve omissão e contradição em alguns pontos da sentença embargada: 6.
Da remessa necessária 7.
Nos termos do artigo 496 do Código de Processo Civil, está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público (I). 8.
Contudo, não se sujeitam à remessa necessária, as hipóteses em que a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior, no caso da União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público, a 1000 (mil) salários-mínimos (§ 3º, I). 9.
No caso em tela, embora a sentença seja ilíquida, verifica-se do pedido formulado a impossibilidade de que seja alcançado o limite estabelecido no artigo 496, § 3º, I, do Código de Processo Civil. 10.
Com efeito, a sentença julgou procedente o pedido inicial, reconhecendo o direito dos autores de permanecerem assentados na parcela n. 62 do PA Rômulo Pereira, Município de Jataí/GO, até que o INCRA procedesse ao assentamento regular dessas pessoas, seja nessa parcela ou em outra gleba de terra na região. 11.
Conclui-se, sem maiores dificuldades, que o custo da condenação, com os reflexos, acréscimos de juros, correção monetária e ônus sucumbenciais não alcançará o limite de 1.000 (mil) salários-mínimos. 12.
Embora na vigência do Código de Processo Civil de 1973 tenha o Superior Tribunal de Justiça fixado orientação no sentido de que a remessa necessária somente seria dispensável em se tratando de sentenças líquidas, referido entendimento passou a ser relativizado, após a vigência do atual CPC, nos casos em que, apesar da aparente iliquidez da sentença, o conteúdo econômico da condenação é aferível mediante a realização de simples cálculos. 13.
Nesse sentido, cito os seguintes julgados do Superior Tribunal de Justiça: PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO.
NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL.
INEXISTÊNCIA.
SENTENÇA ILÍQUIDA.
CPC/2015.
NOVOS PARÂMETROS.
CONDENAÇÃO OU PROVEITO ECONÔMICO INFERIOR A MIL SALÁRIOS MÍNIMOS.
REMESSA NECESSÁRIA.
DISPENSA. 1.
Conforme estabelecido pelo Plenário do STJ, "aos recursos interpostos com fundamento no CPC de 2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC" (Enunciado Administrativo n. 3). 2.
Não merece acolhimento a pretensão de reforma do julgado por negativa de prestação jurisdicional, porquanto, no acórdão impugnado, o Tribunal a quo apreciou fundamentadamente a controvérsia, apontando as razões de seu convencimento, em sentido contrário à postulação recursal, o que não se confunde com o vício apontado. 3.
A controvérsia cinge-se ao cabimento da remessa necessária nas sentenças ilíquidas proferidas em desfavor da Autarquia Previdenciária após a entrada em vigor do Código de Processo Civil/2015. 4.
A orientação da Súmula 490 do STJ não se aplica às sentenças ilíquidas nos feitos de natureza previdenciária a partir dos novos parâmetros definidos no art. 496, § 3º, I, do CPC/2015, que dispensa do duplo grau obrigatório as sentenças contra a União e suas autarquias cujo valor da condenação ou do proveito econômico seja inferior a mil salários mínimos. 5.
A elevação do limite para conhecimento da remessa necessária significa uma opção pela preponderância dos princípios da eficiência e da celeridade na busca pela duração razoável do processo, pois, além dos critérios previstos no § 4º do art. 496 do CPC/15, o legislador elegeu também o do impacto econômico para impor a referida condição de eficácia de sentença proferida em desfavor da Fazenda Pública (§ 3º). 6.
A novel orientação legal atua positivamente tanto como meio de otimização da prestação jurisdicional - ao tempo em que desafoga as pautas dos Tribunais - quanto como de transferência aos entes públicos e suas respectivas autarquias e fundações da prerrogativa exclusiva sobre a rediscussão da causa, que se dará por meio da interposição de recurso voluntário. 7.
Não obstante a aparente iliquidez das condenações em causas de natureza previdenciária, a sentença que defere benefício previdenciário é espécie absolutamente mensurável, visto que pode ser aferível por simples cálculos aritméticos, os quais são expressamente previstos na lei de regência, e são realizados pelo próprio INSS. 8.
Na vigência do Código Processual anterior, a possibilidade de as causas de natureza previdenciária ultrapassarem o teto de sessenta salários mínimos era bem mais factível, considerado o valor da condenação atualizado monetariamente. 9.
Após o Código de Processo Civil/2015, ainda que o benefício previdenciário seja concedido com base no teto máximo, observada a prescrição quinquenal, com os acréscimos de juros, correção monetária e demais despesas de sucumbência, não se vislumbra, em regra, como uma condenação na esfera previdenciária venha a alcançar os mil salários mínimos, cifra que no ano de 2016, época da propositura da presente ação, superava R$ 880.000,00 (oitocentos e oitenta mil reais). 9.
Recurso especial a que se nega provimento. ( REsp 1735097/RS, Rel.
Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 08/10/2019, DJe 11/10/2019) PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO.
RECURSO ESPECIAL.
REMESSA NECESSÁRIA.
SENTENÇA ILÍQUIDA.
ART. 496, § 3º., I DO CÓDIGO FUX.
CONDENAÇÃO OU PROVEITO ECONÔMICO INFERIOR A MIL SALÁRIOS MÍNIMOS.
VALOR AFERÍVEL POR CÁLCULO ARITMÉTICO.
POSSIBILIDADE DE MENSURAÇÃO.
RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1.
Esta Corte, no julgamento do REsp. 1.101.727/PR, representativo de controvérsia, fixou a orientação de que, tratando-se de sentença ilíquida, deverá ser ela submetida ao reexame necessário, uma vez que não possui valor certo, estabelecendo que a dispensabilidade da remessa necessária pressupunha a certeza de que o valor da condenação não superaria o limite de 60 salários mínimos. 2.
Contudo, a nova legislação processual excluiu da remessa necessária a sentença proferida em desfavor da União e suas respectivas Autarquias cujo proveito econômico seja inferior a 1.000 salários-mínimos. 3.
As ações previdenciárias, mesmo nas hipóteses em que reconhecido o direito do Segurado à percepção de benefício no valor do teto máximo previdenciário, não alcançarão valor superior a 1.000 salários mínimos. 4.
Assim, não obstante a aparente iliquidez das condenações em causas de natureza previdenciária, a sentença que defere benefício previdenciário é espécie absolutamente mensurável, visto que pode ser aferível por simples cálculos aritméticos, os quais são expressamente previstos na lei de regência, e, invariavelmente, não alcançará valor superior a 1.000 salários mínimos. 5.
Recurso Especial do INSS a que se nega provimento. (REsp 1844937/PR, Rel.
Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/11/2019, DJe 22/11/2019). 14.
Desta forma, considerando que o valor da condenação imposta ao INCRA não ultrapassa o limite previsto no art. 496, § 3º, I, do CPC, não há que se falar em remessa necessária, de modo que não houve omissão nesse ponto. 15.
Da confirmação da tutela de urgência 16.
De igual forma, não houve omissão no tocante à confirmação da tutela de urgência.
Isso porque o art. 1.012, § 1º, V, do CPC, prevê expressamente que: Art. 1.012.
A apelação terá efeito suspensivo. § 1º.
Além de outras hipóteses previstas em lei, começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que: I - homologa divisão ou demarcação de terras; II - condena a pagar alimentos; III - extingue sem resolução do mérito ou julga improcedentes os embargos do executado; IV - julga procedente o pedido de instituição de arbitragem; V - confirma, concede ou revoga tutela provisória; VI - decreta a interdição. 17.
Sendo assim, a sentença que julga procedente a pretensão autoral, ainda que não mencione de forma expressa a confirmação dos efeitos da tutela provisória concedida anteriormente, implica em sua ratificação tácita, em razão da previsão legislativa nesse sentido. 18.
Da alegada omissão e contradição quanto à análise das questões levantada pelo embargante 19.
A esse respeito, o posicionamento dos nossos tribunais é firme no sentido de que “o julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão” (STJ – 1ª Seção - Edcl no Mandado de Segurança nº 21.315-DF – Relª.
Minª.
Diva Malerbi (Desembragadora Convocada do TRF 3ª Região) - julgado em 08/06/2016). 20.
No caso em apreço, as questões postas em juízo foram muito bem debatidas nos autos, uma vez que o próprio INCRA confirma que, em 2014, reconheceu a situação de conflito e autorizou provisoriamente a permanência dos acampados na parcela, que lá estão até o presente momento sem nenhuma definição da autarquia. 21.
Como bem opinou o Ministério Público Federal, em seu parecer do Id 1368578770: No caso concreto, verifica-se que a postulação da parte autora guarda íntima relação com o objetivo de corrigir as distorções decorrentes da ilegítima ordem de desocupação datada 14 de maio de 2022, uma vez que a própria autarquia foi quem autorizou a ocupação da parcela em testilha pelos acampados no dia 26 de novembro de 2014.
Ou seja, há quase dez anos os autores ocupam, mediante autorização formal, a área disputada, sem qualquer resistência da ré.
De idêntico modo, no decurso de todos estes anos, em que pese o cumprimento tácito dos requisitos estabelecidos pelo Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA), a ré sequer tomou qualquer providência no sentido de alocar os ocupantes em outra gleba de terra.
Nessa esteira, em razão dos compromissos que a autarquia assumiu no ano de 2014 perante os acampados, sempre em observância aos princípios da boa-fé objetiva e da vedação ao comportamento contraditório, a mesma deverá, após o trâmite do devido processo administrativo, assentar os autores, conforme seu poder discricionário, na parcela em questão ou em outra gleba da região, independentemente de que os mesmos se submetam à chamada pública estabelecida na Instrução Normativa nº. 98/2019, garantindo, até a decisão final, a permanência dos demandantes em seus respectivos acampamentos na parcela nº. 62 do PA Rômulo Sousa Ferreira de Jataí/GO. 22.
Seguindo esse mesmo raciocínio, a sentença embargada julgou procedente a pretensão autoral para determinar que os autores permanecessem na parcela nº 62 do PA Rômulo Pereira, Município de Jataí/GO, até que o INCRA, dentro do seu poder discricionário, resolvesse a questão desses assentados, seja regularizando o direto de permanecerem na aludida parcela, seja alocando-os em outra gleba de terra na região. 23.
No tocante à contradição apontada, o INCRA, em sua contestação (Id 1400102252), esclareceu o seguinte: Das informações prestadas pela área técnica, ora ratificadas a fim de evitar repetições desnecessárias, verifica-se, claramente, a improcedência dos pedidos contidos na exordial.
Conforme relato dos técnicos do INCRA, acima reproduzido, ficam integralmente rechaçadas as alegações da parte autora.
Consoante se verifica do anexo processo administrativo nº 54000.012307/2018-10 o Ministério Público Federal/MPF em Rio Verde/GO através do Ofício nº 40/MPF/RVD/GO/JLRM solicitou do Superintendente Regional do INCRA em Goiás informações a respeito de uma denúncia feita em 19.12.2017 junto à Procuradoria da República em Goiás pelo senhor Joaquim Cândido da Silva, que tinha sido agraciado pelo INCRA com uma parcela do Assentamento PA-Romulo Pereira de Souza.
A princípio como se considerava líder de acampados deixou que os mesmos ficassem na beira da estrada da parcela e que posteriormente foi invadida por elementos do dito acampamento.
Através do Ofício nº 17708/2018 o Superintendente Regional do INCRA em Goiás /SR(GO) informa ao MPF/GO que em abril de 2012 o senhor Joaquim Cândido recebeu autorização provisória para ocupar a parcela 62 do Projeto de Assentamento/PA-Rômulo Pereira, localizado no Município de Jataí/GO, mas que o mesmo somente seria homologado na parcela se preenchesse os requisitos de elegibilidade ao PNRA.
Que o INCRA não autorizou que famílias acampadas próximas ao PA-Rômulo Pereira montassem acampamento na parcela que foi destinada provisoriamente ao senhor João Cândido, e que este por conta própria autorizou o ingresso dessas famílias na parcela.
Que o senhor João Cândido da Silva não estava explorando a parcela de forma satisfatória e se tornou objeto de muita perturbação no Projeto de Assentamento/PA lá Rômulo Pereira, motivo que levou a Superintendência Regional em Goiás a revogar a autorização provisória concedida ao mesmo.
A parcela rural nº 62, do Projeto de Assentamento/PA-Rômulo Souza Pereira, localizada no Município de Jataí/GO, tem a área demarcada com 21,3166 ha (vinte e um hectares, trinta e um are e sessenta e seis centiares) conforme planta e memorial descritivo contido nos processos administrativos ora juntados. 24.
Nota-se que, em nenhum momento, na sua peça de defesa, a autarquia mencionou que o conflito entre os embargados e o antigo assentado Joaquim Cândido da Silva ainda persistia.
Aliás, o próprio INCRA noticiou que o sr.
Joaquim teve sua autorização provisória revogada pela Superintendência Regional em Goiás. 25.
Desse modo, a sentença embargada não padeceu de contradição nesse aspecto. 26.
Não vislumbro, portanto, a existência de nenhum vício a ser sanado por meio dos presentes embargos declaratórios, sendo visível a intenção do embargante em rediscutir a juridicidade do provimento vergastado, o que não se pode admitir em sede de embargos de declaração, os quais são inadequados à modificação do pronunciamento judicial quando não presentes omissão, obscuridade ou contradição.
Devem, portanto, om embargantes valerem-se do recurso cabível para lograr seu intento.
DISPOSITIVO 27.
Ante o exposto, conheço dos embargos de declaração interpostos, mas lhes nego provimento.
Intimem-se.
Jataí (GO), (data da assinatura eletrônica). (assinado eletronicamente) Rafael Branquinho Juiz Federal -
14/04/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Jataí-GO Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Jataí-GO SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1002369-65.2022.4.01.3507 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: VALDIVINO FERREIRA DE SOUZA REPRESENTANTES POLO ATIVO: ANTONIO FRANCISCO PEREIRA ASSIS - GO12581 POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA SENTENÇA RELATÓRIO 1.
AMANDA FLORES MOURA ROCHA, ANITA ROSA DA TRINDADE, CLÁUDIA MOREIRA DA SILVA, DOMÍCIA TEODORO DE SOUZA, DIÓGENES LOPES DE ARAÚJO, EDSON LOURENÇO SILVA BARBOSA, ÉRIKA SILVA TELES, FÁBIO THIAGO, JORCELINO FERREIRA DA SILVA, JOSÉ ROSA DA SILVA, JOELMA FERREIRA CARDOSO, KATIANE FERREIRA GUIMARÃES, LUCIENE DE SOUZA, MANOEL JOAQUIM DE LIMA NETO, MARIA AMÉLIA BORGES, NOÊMIA MARIA DE JESUS VICENTE, SILVIA APARECIDA SOATES, VALDIVINO FERREIRA DE SOUZA, WEILA OLIVEIRA LIMA, WELTON JORGE DA SILVA, WALESKA DE JESUS VICENTE, ZÉLIA MARTINS COSTA SILVA E EVA DE ALMEIDA LOPES ajuizaram a presente ação possessória, com pedido de tutela de urgência, em desfavor do INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA, objetivando, liminarmente, provimento jurisdicional que determinasse ao réu que se abstivesse de toda e qualquer medida expropriatória sobre a parcela nº 62 do Projeto de Assentamento Rômulo Souza Pereira, bem como, que cumprisse a obrigação de fazer no sentido de promover o assentamento dos acampados na referida parcela. 2.
Alegaram, em síntese, que: (i) desde o ano de 2014 estão acampados no acampamento denominado Guarita I; (ii) desde então reivindicam junto ao INCRA o assentamento das respectivas famílias; (iii) o referido acampamento iniciou-se às margens da BR 164, Km 173, no Município de Jataí/GO; (iv) posteriormente foram alocados pela ré em metade da parcela de nº 62 do PA Rômulo Sousa Pereira, com a anuência do detentor da posse da outra metade, Sr.
Joaquim; (v) após serem cadastrados pelo INCRA, receberam a promessa de que permaneceriam ali até serem assentados de maneira definitiva; (vi) contudo, em 05/05/2022, foram surpreendidos com uma notificação coletiva do INCRA para que desocupassem imediatamente a referida parcela; (vii) a desocupação só seria viável se fosse para uma área em definitivo, visto que uma mudança apenas provisória acarretaria grande sofrimento, uma vez que teriam que arrancar suas respectivas casas e plantações; (viii) apesar do cadastramento feito ainda em 2012, foram informados que deveriam participar de chamada pública, nos termos da Instrução Normativa nº 98/2019; (ix) ocorre que tais regras não deveriam se aplicar a eles, pois prejudicariam direitos adquiridos, porquanto, além de estarem cadastrados desde antes da vigência da referida norma, receberam várias promessas do INCRA; (x) estão sendo injustiçados, pois há mais de 10 anos aguardam serem assentados pela autarquia, bem como, não se trata de família invasoras, uma vez que receberam autorização do próprio réu para ocupar a parcela nº 62; (xi) tratam-se de pessoas ordeiras e trabalhadoras, que estão ali demonstrando o seu interesse e sua vocação para trabalharem na terra; (xii) diante do risco iminente de serem obrigados a abandonarem suas casas e criações, não veem alternativa senão socorrer-se ao Poder Judiciário.
Requereram os benefícios da Assistência Judiciária Gratuita. 3.
A inicial veio acompanhada com a procuração e documentos. 4.
O pedido de tutela de urgência foi parcialmente deferido, no sentido de determinar a permanência dos autores nos seus respectivos acampamentos na parcela nº 62 do PA Rômulo Sousa Ferreira, situado no município de Jataí/GO, até que o INCRA, dentro do seu poder discricionário, se posicione sobre a situação dos demandantes na via administrativa (Id 1321385270). 5.
Com vista, o MPF emitiu parecer (Id 1368578770), opinando pela procedência parcial do pedido, a fim de que o INCRA promova o assentamento dos autores, conforme seu poder discricionário, na parcela em questão ou em outra gleba da região, independentemente de terem que se submeter à chamada pública estabelecida na IN nº 98/2019. 6.
Em sua contestação (Id 1400102252), o INCRA alegou que não autorizou que famílias acampadas próximas ao PA Rômulo Pereira montassem acampamento na parcela nº 62, a qual foi destinada provisoriamente ao sr.
Joaquim Cândido da Silva, e este, por conta própria, autorizou o ingresso dessas famílias nas aludidas parcelas.
Acrescentou que a realização do processo de seleção dos beneficiários da reforma agrária é de competência administrativa exclusiva do INCRA, sendo vedado ao Poder Judiciário nele se imiscuir, sob pena de violação ao princípio da separação dos poderes.
Pugnou pela improcedência da pretensão autoral.
Anexou documentos. 7.
Em réplica (Id 1444222389), os autores reiteraram os termos da inicial e rogaram pelo julgamento antecipado da lide (Id 1475139376). 8.
O INCRA não apresentou outras provas, além das já constantes nos autos (Id 1476982864). 9. É o que tinha a relatar.
Decido.
FUNDAMENTAÇÃO 10.
Considerando que as partes não manifestaram interesse na especificação de provas, bem como inexistem preliminares pendentes de apreciação, passo ao julgamento do mérito da causa. 11.
DO MÉRITO 12.
Pretendem os autores, através da presente ação, o direito de serem mantidos na posse da parcela nº 62 do PA Rômulo Pereira, localizado no Município de Jataí/GO, até que o INCRA promova o assentamento das famílias no aludido lote ou em outras glebas de terras na região, independentemente de terem que se submeter à chamada pública estabelecida na IN nº 98/2019. 13.
Inicialmente, cumpre destacar que o Estatuto da Terra (Lei nº 4.504/64) define reforma agrária como "o conjunto de medidas que visem a promover melhor distribuição da terra, mediante modificações no regime de sua posse e uso, a fim de atender aos princípios de justiça social e ao aumento de produtividade". 14.
Com efeito, a sua implementação tem como objetivo precípuo promover a justiça social, o progresso e o bem-estar do trabalhador rural e o desenvolvimento econômico do país, com a gradual extinção do minifúndio e do latifúndio, através de um sistema de relações entre o homem, a propriedade rural e o uso da terra (artigo 16 da mesma lei). 15.
Para tal fim, a Constituição Federal, em seu artigo 184, autoriza a desapropriação por interesse social da propriedade rural que não esteja cumprindo a sua função social, ou seja, aquela que não atende aos requisitos dispostos no artigo 186, incisos I a IV, da Carta Magna: aproveitamento racional e adequado; utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; observância das disposições que regulam as relações de trabalho; e exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores. 16.
O procedimento desta modalidade de desapropriação é dividido em três fases.
A primeira se dá por meio de decreto expropriatório do Presidente da República, após a identificação do imóvel como improdutivo pelo INCRA; a segunda ocorre na esfera judicial, quando a autarquia agrária, com fundamento no decreto expropriatório e no prazo de até dois anos a partir de sua publicação, propõe ação de desapropriação em face do proprietário do imóvel em questão; e a terceira se refere à distribuição pelo INCRA das parcelas da propriedade expropriada aos pretensos beneficiários da reforma agrária, previamente cadastrados na autarquia. 17.
Nessa senda, a Lei nº 8.629/93, em consonância com o que prevê a Constituição Federal (artigo 189), dispõe, em seu artigo 18, que a distribuição das parcelas do imóvel rural pode se dar por meio de títulos de domínio, de concessão de uso ou de concessão de direito real de uso – CDRU (esta última modalidade foi incluída pela Lei nº 13.001/2014), inegociáveis pelo prazo de dez anos, sendo assegurado ao beneficiário do contrato de concessão de uso o direito de adquirir, em definitivo, o título de domínio da propriedade. 18.
No tocante à qualidade de beneficiário da reforma agrária, o artigo 20 da Lei nº 8.629/93, com redação dada pela Lei nº 13.465, de 2017, dispõe que não pode ser selecionado como beneficiário dos projetos de assentamento quem: I – for ocupante de cargo, emprego ou função pública remunerada; II – tiver sido excluído ou se afastado do programa de reforma agrária, de regularização fundiária ou de crédito fundiário sem consentimento de seu órgão executor; III – for proprietário rural, exceto o desapropriado do imóvel e o agricultor cuja propriedade seja insuficiente par ao sustento próprio e o de sua família; IV – for proprietário, cotista ou acionista de sociedade empresária em atividade; V – for menor de dezoito anos não emancipado na forma da lei civil; ou VI – auferir renda familiar proveniente de atividade não agrária superior a três salários mínimos mensais ou superior a um salário mínimo per capita. 19.
Nos termos do art. 21 da supracitada lei, com redação dada pela Lei nº 13.001, de 2014, os beneficiários têm a obrigação de cultivar a sua parcela direta e pessoalmente, ou através de seu núcleo familiar, e de não ceder o seu uso a terceiros, a qualquer título, pelo prazo de 10 (dez) anos, sob pena de rescisão do contrato e o retorno do imóvel ao INCRA (art. 22). 20.
No caso em apreço, observa-se, através do documento do Id 1400102261, que o INCRA concedeu autorização provisória de permanência das famílias na parcela 62 do PA Rômulo Pereira, em caráter provisório, até a solução do empasse que existia para alocação dessas famílias em outro local.
Contudo, não houve nenhum posicionamento posterior da autarquia a esse respeito e as famílias lá permanecem até os dias atuais, ou seja, há quase 10 (dez) anos. 21.
Conforme Processo Administrativo n. 54000.098068.2020.00.251.402, juntado aos autos pelo INCRA (Id 1400102261), as famílias estão divididas em dois grupos, sendo parte da parcela ocupada pelas famílias do acampamento União e Trabalho e a outra parte ocupada pelas famílias do acampamento Guarita I. 22.
De acordo com as fotografias e descrição do local (Id 1400102261 - fls. 25/89, rolagem digital), se pode verificar que a área ocupada por cada família está devidamente delimitada, com construção de moradia, plantação (mandioca, limão, mexerica, banana, abacate, abobrinha, etc) e criação de animais (porcos, galinhas, etc). 23.
Não há notícia nos autos de existência de conflito entre essas famílias.
Ao invés disso, percebe-se que os ocupantes da parcela 62 vivem em harmonia, cada um com seu pedaço de terra delimitado. 24.
Assim, há de se reconhecer que, ainda que de modo irregular, os autores, desde 2014, mantêm-se no lote, dando-lhe a devida função social, inclusive com a anuência do próprio INCRA. 25.
Em situação similar a desses autos, o TRF da 4ª Região assim decidiu: ADMINISTRATIVO.
PROCESSUAL CIVIL.
AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE.
AQUISIÇÃO DE LOTE DE EX-ASSENTADO DO PROGRAMA DE REFORMA AGRÁRIA.
VIOLAÇÃO AO ART. 21 DA LEI 8.629/93.
FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE. - Ainda que tenha havido a negociação não permitida pelo art. 21 da Lei 8.629/93, o réu encontra-se na posse do lote há mais de 10 (dez) anos, o INCRA tinha pleno conhecimento da permanência e posse do réu no local e nada fez. - A terra está sendo cultivada pelo réu e sua família, portanto, cumpre com sua função social. (TRF4, REO 2001.04.01.082443-5, Terceira Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, DJ 03/08/2005) 26.
Deve-se, portanto, prestigiar, no caso em tela, o cumprimento da finalidade precípua da reforma agrária traçada no art. 1º do referido diploma legal, qual seja, promover a melhor distribuição da terra, a fim de atender aos princípios da justiça social e ao aumento da produtividade, com plena isonomia entre os cidadãos brasileiros, sob os contornos previstos em Lei, numa leitura constitucional mínima da atividade interventora do Estado na propriedade rural. 27.
Sob esse prisma, importante observar que, se por um lado pode haver irregularidade na ocupação de bem público, por outro não se deve olvidar que um dos fundamentos da Constituição Federal é a proteção da dignidade da pessoa humana (art. 1º, caput e inciso III, da CF/88). 28.
Visando à concretização desse valor supremo, o Poder Constituinte consagrou, como direitos sociais fundamentais, a moradia e o trabalho (art. 6º, caput, da CF/88).
Além disso, exigiu que toda a propriedade imóvel atenda à sua função social (art. 5º, inciso XXIII, art. 182, § 2º, e art. 183 da CF/88). 29.
Sendo assim, de forma excepcional, pode ser possível a regularização da ocupação dos lotes destinados à reforma agrária, desde que os beneficiários atendam às exigências legais em cada caso concreto. 30.
De outra banda, a decisão judicial, qualquer que seja ela, não poderá definir especificamente as pessoas que serão assentadas, já que esta é uma missão institucional do INCRA, com caráter discricionário, desde que observados critérios técnicos para escolha dos beneficiários, obviamente com necessidade de sujeição à vontade da lei, sob pena de invalidade da decisão. 31.
Isso quer dizer que a possibilidade jurídica de intervenção do Poder Público, em política pública de Reforma Agrária, não permitirá que este juízo intervenha em atividade administrativa típica para dizer quem será assentado, posto que essa tarefa cabe ao INCRA, que é quem tem competência legal para realizá-la. 32.
Nesse ponto, importa lembrar que o poder discricionário impõe que, confrontado com a situação fática, adote o administrador a decisão que melhor atenda à vontade da lei.
Adotada decisão que se desvie da finalidade pública, e, portanto, da legalidade, ter-se-á arbitrariedade, e não discricionariedade.
Tal ato, por vício de ilegalidade, será inválido (assim, Celso Antônio Bandeira de Mello, Curso de Direito Administrativo, 22ª edição, 2006, página 414). 33.
Porém, eventual intervenção judicial nesse sentido, dar-se-ia apenas de forma excepcional, em caso de descumprimento das formalidades legais que evidenciassem preterimento indevido de beneficiário de lote no assentamento. 34.
Conforme bem pontuou o Ministério Público Federal, em seu parecer do Id 1368578770, cujo posicionamento adoto como razão de decidir: No caso concreto, verifica-se que a postulação da parte autora guarda íntima relação com o objetivo de corrigir as distorções decorrentes da ilegítima ordem de desocupação datada 14 de maio de 2022, uma vez que a própria autarquia foi quem autorizou a ocupação da parcela em testilha pelos acampados no dia 26 de novembro de 2014.
Ou seja, há quase dez anos os autores ocupam, mediante autorização formal, a área disputada, sem qualquer resistência da ré.
De idêntico modo, no decurso de todos estes anos, em que pese o cumprimento tácito dos requisitos estabelecidos pelo Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA), a ré sequer tomou qualquer providência no sentido de alocar os ocupantes em outra gleba de terra.
Nessa esteira, em razão dos compromissos que a autarquia assumiu no ano de 2014 perante os acampados, sempre em observância aos princípios da boa-fé objetiva e da vedação ao comportamento contraditório, a mesma deverá, após o trâmite do devido processo administrativo, assentar os autores, conforme seu poder discricionário, na parcela em questão ou em outra gleba da região, independentemente de que os mesmos se submetam à chamada pública estabelecida na Instrução Normativa nº. 98/2019, garantindo, até a decisão final, a permanência dos demandantes em seus respectivos acampamentos na parcela nº. 62 do PA Rômulo Sousa Ferreira de Jataí/GO. 35.
Nesse contexto, entendo que, em razão da natureza e das peculiaridades do direito social à moradia, ao trabalho, bem como da dignidade da pessoa humana, o INCRA, dentro do seu poder discricionário, deverá, mediante procedimento administrativo, resolver a questão dos assentados da parcela 62 do PA Rômulo Pereira, seja regularizando o direito de permanecerem na aludida parcela seja alocando-os em outra gleba de terra na região.
DISPOSITIVO 36.
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão autoral para determinar que o INCRA se abstenha de realizar atos expropriatórios sobre a parcela nº 62 do PA Rômulo Pereira, Município de Jataí/GO, procedendo, após o trâmite do devido processo administrativo, ao assentamento regular dos autores, em conformidade com o seu poder discricionário, seja na parcela em questão, seja em outra gleba de terra na região, isentando-os de se submeterem à chamada pública estabelecida na Instrução Normativa nº 98/2019. 37.
Condeno o INCRA ao pagamento dos honorários advocatícios, que, nos termos do art. 85, § 3º, I, do CPC, fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa.
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.
Jataí (GO), (data da assinatura eletrônica). (assinado eletronicamente) Rafael Branquinho Juiz Federal -
21/11/2022 09:04
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
17/11/2022 22:30
Juntada de contestação
-
22/10/2022 01:00
Decorrido prazo de VALDIVINO FERREIRA DE SOUZA em 21/10/2022 23:59.
-
21/10/2022 18:12
Juntada de parecer
-
28/09/2022 10:24
Juntada de resposta
-
21/09/2022 02:41
Publicado Decisão em 21/09/2022.
-
21/09/2022 02:41
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 21/09/2022
-
20/09/2022 13:58
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
20/09/2022 13:54
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
20/09/2022 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Jataí-GO Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Jataí-GO PROCESSO: 1002369-65.2022.4.01.3507 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: VALDIVINO FERREIRA DE SOUZA REPRESENTANTES POLO ATIVO: ANTONIO FRANCISCO PEREIRA ASSIS - GO12581 POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA DECISÃO
I- RELATÓRIO Trata-se de Ação Possessória, com pedido de tutela antecipada de urgência, proposta por VALDIVINO FERREIRA DE SOUZA e OUTROS em desfavor do INSTITUTO NACIONAL DA COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA – INCRA, objetivando, liminarmente, provimento jurisdicional que determine ao réu que se abstenha de toda e qualquer medida expropriatória sobre a parcela nº 62 do Projeto de Assentamento Rômulo Souza Pereira, bem como, que cumpra a obrigação de fazer no sentido de promover o assentamento dos acampados na referida parcela.
Alegam, em síntese, que: I- desde o ano de 2014 estão acampados no acampamento denominado Guarita I; II- desde então reivindicam junto ao INCRA o assentamento das respectivas famílias; III- o referido acampamento iniciou-se às margens da BR 164, Km 173, no Município de Jataí/GO; IV- posteriormente foram alocados pela ré em metade da parcela de nº 62 do PA Rômulo Sousa Pereira, com a anuência do detentor da posse da outra metade, Sr.
Joaquim; V- após serem cadastrados pelo INCRA, receberam a promessa de permaneceriam ali até serem assentados de maneira definitiva; VI- no dia 05/05/2022 foram surpreendidos com uma notificação do INCRA para que desocupassem imediatamente a referida parcela; VII- a desocupação só seria viável se fosse para uma área em definitivo, visto que uma mudança apenas provisória acarretaria grande sofrimento, uma vez que teriam que arrancar suas respectivas casas e plantações; VIII- apesar do cadastramento feito ainda em 2012, foram informados que deverão participar de chamada pública, nos termos da Instrução Normativa nº 98/2019; IX- tais regras não se aplicam a eles, pois prejudicariam direitos adquiridos, porquanto, além de estarem cadastrados desde antes da vigência da referida norma, receberam várias promessas do INCRA,; X- estão sendo injustiçados, pois há mais de 10 anos aguardam serem assentados pela autarquia, bem como, não se trata de família invasoras, uma vez receberam autorização do próprio réu para ocupar a parcela nº 62; XI- tratam-se de pessoas ordeiras e trabalhadoras, que estão ali demonstrando o seu interesse e sua vocação para trabalharem na terra; XII- diante do risco iminente de serem obrigados a abandonarem suas casas e criações, não veem alternativa senão socorrer-se ao poder judiciário.
A inicial veio acompanhada com a procuração e documentos.
Requereram os benefícios da Assistência Judiciária Gratuita. É o relato do necessário, passo a decidir.
II- DA TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA – FUNDAMENTAÇÃO Inicialmente, cumpre esclarece que, a concessão liminar da tutela de urgência, na dicção do art. 300 do CPC, é medida excepcional, a qual se justifica apenas na presença de elementos que evidenciem a probabilidade do direito (fumus boni iuris) e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (periculum in mora).
A probabilidade do direito deflui da presença de elementos que demonstrem que a pretensão da parte autora possui, sob a perspectiva fática e sob a perspectiva jurídica, aptidão para obter o resultado pretendido ao final da demanda.
O periculum in mora ocorre quando se constate a impossibilidade de espera da concessão da tutela definitiva sob pena de grave prejuízo ao direito a ser tutelado e de tornar-se o resultado final inútil. É dizer: tanto na tutela cautelar quanto na tutela antecipada de urgência caberá à parte convencer o juiz de que, não sendo protegida imediatamente, de nada adiantará uma proteção futura, em razão do perecimento de seu direito (Daniel Amorim Assumpção Neves, Manual de Direito Processual Civil, 10ª edição, pag. 503).
Pois bem.
A presente demanda tem por finalidade a permanência dos autores na posse da parcela nº 26 do Projeto de Assentamento Rômulo Sousa Ferreira, no Município de Jataí/GO, bem como o assentamento definitivo das respectivas famílias.
Sobre os instrumentos jurídicos capazes de habilitar os beneficiários dos programas de reforma agrária como efetivos possuidores das terras destinadas a assentamento, a Constituição Federal, em seu art. 189, prevê que “os beneficiários da distribuição de imóveis rurais pela reforma agrária receberão títulos de domínio ou de concessão de uso, inegociáveis pelo prazo de dez anos”.
Por sua vez, o parágrafo único do aludido dispositivo estabelece que “o título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil, nos termos e condições previstos em lei”.
Extrai-se do texto normativo que é essencial, para habilitar os beneficiários, o título de domínio e a concessão de uso.
Por esse instrumento, o Poder Público transfere a posse direta de imóvel rural ao particular, previamente habilitado em processo de seleção de trabalhadores rurais para fins de Assentamento, para que explore o bem segundo a destinação específica.
As formas trazidas pela CF/88 e pela Lei nº 8.629/93 são os únicos meios hábeis para viabilizar o acesso regular de particulares às terras públicas da União destinadas aos programas de reforma agrária.
Analisando os documentos que instruem a inicial, constata-se, a priori, que os autores e suas respectivas famílias, de fato, ocupam a parcela 26 do Projeto de Assentamento Rômulo Sousa Ferreira, conforme demonstram as fotografias que instruem a inicial (Id. 1292080283 e seguintes).
Consta, ainda, dos autos, que os demandantes foram notificados, em 17/05/2022, acerca da revogação da autorização provisória de permanência coletiva na aludida parcela, bem como do prazo de 15 (quinze) dias para desocupação do lote, além de promoverem a retirada de moradias, construções, víveres, benfeitorias edificadas, pertences, materiais de construção, veículos que estejam no local.
O que se percebe, ao menos neste juízo de cognição sumária, é que os autores residem na parcela há mais ou menos 6 (seis) anos, nos termos da ata de nº 17 (Id. 1292112750, p. 2), de onde provém os meios de subsistência das famílias ali acampadas, conforme se verifica nas fotos da produção inseridas nos autos (Id. 1292080283 e seguintes).
Por esse ângulo, é importante observar que, se por um lado, pode haver irregularidade na ocupação de bem público, por outro não se deve olvidar que um dos fundamentos, previstos da Constituição Federal, é a proteção da dignidade da pessoa humana (art. 1º, caput e inciso III, da CF).
A Carta Magna consagrou, ainda, como direitos sociais fundamentais, a moradia e o trabalho (art. 6º, caput, CF).
Além disso, exigiu que toda a propriedade imóvel atenda à sua função social (art. 5º, inciso XXIII, art. 182, § 2º, e art. 183, CF/88).
Ressalta-se que a habitação e o trabalho figuram no rol das necessidades mais básicas do ser humano.
Para o indivíduo desenvolver suas capacidades de se integrar socialmente, é fundamental que possua moradia e ocupação, tratando-se, inclusive de questão relacionada à própria sobrevivência.
Na hipótese dos autos, está comprovada a exploração do imóvel, com o cumprimento da função social da propriedade, inclusive estimulada pelo próprio INCRA, presente, portanto, a probabilidade do direito.
Assim, é de se reconhecer, ab initio, o direito dos autores de permanecerem acampados no lote em questão, até que o INCRA resolva, administrativamente, a situação posta em juízo.
No que diz respeito ao direito de serem assentados, mesmo diante de supostas promessas do INCRA, não há que se falar em direito adquirido, mas sim mera expectativa de direito.
Isso porque, conforme dito anteriormente, somente o título de domínio confere ao particular a posse direta de imóvel rural, previamente habilitado em processo de seleção de trabalhadores rurais para fins de Assentamento, para que explore o bem segundo a destinação específica.
Dessa maneira, tem-se que, excepcionalmente, pode ser possível a regularização da ocupação dos lotes destinados à reforma agrária, desde que os beneficiários atendam às exigências legais em cada caso concreto.
Consigno, ainda, que a relação jurídica dos autores com o INCRA é de pretensão de serem assentados de maneira definitiva, que não se modificará por eventual decisão proferida neste feito. É que a decisão judicial, qualquer que seja ela, não poderá definir especificamente as pessoas que serão assentadas, já que esta é uma missão institucional do INCRA, com caráter discricionário, desde que observados critérios técnicos para escolha dos beneficiários, obviamente com necessidade de sujeição à vontade da lei, sob pena de invalidade da decisão.
Isso quer dizer que a possibilidade jurídica de intervenção do Poder Público, em política pública de Reforma Agrária, não permitirá que este juízo intervenha em atividade administrativa típica para dizer quem será assentado, posto que essa tarefa cabe ao INCRA, que é quem tem competência legal para realizá-la.
Nesse ponto, importa lembrar que o poder discricionário impõe que, confrontado com a situação fática, adote o administrador a decisão que melhor atenda à vontade da lei.
Adotada decisão que se desvie da finalidade pública, e, portanto, da legalidade, ter-se-á arbitrariedade, e não discricionariedade.
Tal ato, por vício de ilegalidade, será inválido (assim, Celso Antônio Bandeira de Mello, Curso de Direito Administrativo, 22ª edição, 2006, página 414).
Porém, eventual intervenção judicial nesse sentido, dar-se-ia apenas de forma excepcional, em caso de descumprimento das formalidades legais que evidenciassem preterimento indevido de beneficiário de lote no assentamento.
De outro lado, o periculum in mora, neste momento, se mostra presente, uma vez que os atos expropriatórios iriam de encontro com o princípio da dignidade humana, com potencialidade de submeter os autores a situação degradante, sem moradia e sem os meios necessários para garantirem sua subsistência.
Portanto, preenchidos os requisitos previstos no artigo 300, do CPC, o deferimento da tutela de urgência é medida que se impõe.
III- DISPOSITIVO E PROVIDÊNCIAS FINAIS Com esses fundamentos, DEFIRO PARCIALMENTE o pedido de tutela antecipada de urgência, tão somente, no sentido de determinar a permanência dos autores em seus respectivos acampamentos na parcela nº 62 do PA Rômulo Sousa Ferreira de Jataí/GO, até que o INCRA, dentro do seu poder discricionário, se posicione sobre a situação dos demandantes na via administrativa.
CITE-SE e INTIME-SE o INCRA para imediato cumprimento desta decisão, bem como para, querendo, para apresentar contestação, no prazo legal.
Considerando que a presente ação envolve conflito relacionado ao direito social à moradia e à posse coletiva de área rural, é imprescindível a manifestação do Ministério Público Federal (MPF), nos termos do art. 178, I e III do CPC.
Dessa forma, INTIME-SE o parquet para emissão de parecer, no prazo de 30 dias.
Após, apresentada a contestação, INTIMEM-SE os autores para, no prazo de 15 (quinze) dias, impugnarem a contestação ou informarem se pretendem o julgamento antecipado da lide.
Caso intentem produzir provas, deverão especificá-las, demonstrando qual questão de fato trazida nos autos será dirimida, justificando a necessidade e pertinência, ficando advertidos de que o requerimento genérico ou sua ausência implicarão na preclusão do direito de produzir novas provas nestes autos.
Na sequência, do mesmo modo, INTIME-SE o réu para especificar as provas que pretende produzir, justificando a necessidade e pertinência.
Concluídas essas determinações, retornem-me os autos conclusos.
Deixo de designar, neste momento, audiência de conciliação, o que será feito somente caso haja manifestação de interesse de ambas as partes, nos termos do inciso I, do parágrafo 10º, do art. 2º da Resolução PRESI 11/2016.
Por fim, DEFIRO a gratuidade judiciária aos autores, tendo em vista que o fato de serem acampados em PA do INCRA corrobora a alegada hipossuficiência financeira.
Cite-se.
Intimem-se.
Cumpra-se.
Jataí/GO, data da assinatura eletrônica. (assinado eletronicamente) RAFAEL BRANQUINHO Juiz Federal – SSJ/JTI -
19/09/2022 14:37
Processo devolvido à Secretaria
-
19/09/2022 14:37
Juntada de Certidão
-
19/09/2022 14:37
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
19/09/2022 14:37
Expedição de Publicação ao Diário de Justiça Eletrônico Nacional.
-
19/09/2022 14:37
Expedição de Publicação ao Diário de Justiça Eletrônico Nacional.
-
19/09/2022 14:37
Concedida a gratuidade da justiça a VALDIVINO FERREIRA DE SOUZA - CPF: *18.***.*78-20 (AUTOR)
-
19/09/2022 14:37
Concedida em parte a Antecipação de Tutela
-
29/08/2022 13:34
Conclusos para decisão
-
29/08/2022 11:47
Remetidos os Autos (em diligência) da Distribuição ao Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Jataí-GO
-
29/08/2022 11:47
Juntada de Informação de Prevenção
-
29/08/2022 11:45
Redistribuído por sorteio em razão de incompetência
-
29/08/2022 11:45
Juntada de Certidão de Redistribuição
-
26/08/2022 16:20
Recebido pelo Distribuidor
-
26/08/2022 16:20
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
29/08/2022
Ultima Atualização
01/02/2024
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
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