TRF1 - 1028886-06.2023.4.01.3400
1ª instância - 17ª Brasilia
Polo Ativo
Polo Passivo
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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12/04/2023 00:00
Intimação
Seção Judiciária do Distrito Federal 17ª Vara Federal Cível da SJDF SENTENÇA: TIPO C PROCESSO: 1028886-06.2023.4.01.3400 CLASSE: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) IMPETRANTE: RECOFARMA INDÚSTRIA DO AMAZONAS LTDA.
IMPETRADO: PRESIDENTE DA 2.ª TURMA ORDINÁRIA DA 4.ª CÂMARA DA 1.ª SEÇÃO DO CONSELHO ADMINISTRATIVO DE RECURSOS FISCAIS – CARF Vistos, etc.
I – Relatório Trata-se de mandado de segurança, com pedido de medida liminar, impetrado por Recofarma Indústria do Amazonas Ltda., contra ato alegadamente ilegal imputado ao Presidente da 2.ª Turma da 4.ª Câmara da 1.ª Seção do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – Carf, consubstanciado, supostamente, na inclusão dos Processos Administrativos 10283.722413/2019-91 e 10980.725685/2017-14 na pauta das sessões de julgamento previstas para as datas de 11/04/2023 e 12/04/2023, assim como no subsequente indeferimento do seu pleito de retirada, a despeito da pendência de apreciação definitiva da Medida Provisória 1.160/2023 pelo Congresso Nacional.
Na petição de ingresso (fls. 3/18), alega a parte impetrante que, em 12/01/2023, foi publicada a Medida Provisória 1.160/2023, por meio da qual revogado o disposto no art. 19-E da Lei 10.522/2002, que vedava a aplicação do voto de qualidade previsto no art. 25, § 9.º, do Decreto 70.235/72 àqueles casos em que o empate no julgamento recaísse sobre processo administrativo voltado à determinação e exigência de crédito tributário, solvendo-se a discussão em favor do contribuinte.
Sustenta, assim, que a inclusão e manutenção em pauta, pela autoridade impetrada, dos Processos Administrativos 10283.722413/2019-91 e 10980.725685/2017-14, em trâmite no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – Carf, com previsão de realização das respectivas sessões de julgamento em momento anterior à submissão daquela Medida Provisória ao crivo do Congresso Nacional, implica violação ao princípio da segurança jurídica.
Prossegue a parte acionante para arguir a ausência dos pressupostos constitucionais capazes de justificar a edição de medida provisória.
Argumenta, para justificar a concessão de medida liminar em seu favor, que a apreciação dos processos administrativos aludidos, no atual momento, poderia resultar na prolação de decisão a partir da aplicação do voto de qualidade, reinstituído de forma ainda precária.
Donde pugna pela concessão da segurança, a fim de que seja suspenso o julgamento de tais expedientes até a conclusão do trâmite legislativo da MP 1.160/2023 ou, subsidiariamente, até a homologação definitiva pelo Supremo Tribunal Federal do acordo firmado entre o Ministério da Fazenda e a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB no bojo da ADI 7.347/DF. É o breve relatório.
II – Fundamentação É caso de indeferimento da peça vestibular por inadequação da via eleita.
Como se sabe, a teor do que dispõe o texto constitucional, “conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do poder público” (Constituição Federal, art. 5.º, inciso LXIX).
Nessa seara, o mandado de segurança de caráter preventivo exige a comprovação de plano da efetiva ameaça de lesão ao direito líquido e certo do impetrante.
De modo que se mostra necessária a demonstração objetiva do risco de lesão, por meio de atos concretos ou preparatórios da autoridade impetrada.
Desta forma, a invocação de uma remota possibilidade da prática de um ato administrativo não caracteriza o “justo receio” necessário à sua impetração. (Cf.
STJ, RMS 29.895/RJ, Segunda Turma, da relatoria do ministro Humberto Martins, DJ 16/12/2013; RMS 19.318/RS, Quarta Turma, da relatoria do desembargador convocado Honildo Amaral de Mello Castro, DJ 29/03/2010; MS 13.717/DF, Terceira Seção, da relatoria do ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ 29/06/2009; RMS 19.217/PR, Primeira Turma, da relatoria do ministro Luiz Fux, DJ 26/03/2009; MS 10.821/DF, Primeira Seção, da relatoria do ministro Herman Benjamin, DJ 19/12/2007; AgRg no MS 9.738/DF, Terceira Seção, da relatoria do ministro Paulo Medida, DJ 02/08/2004; RMS 10.621/RJ, Quarta Turma, da relatoria do ministro Barros Monteiro, DJ 30/08/1999.) Nessa esteira, é de se registrar que o Superior Tribunal de Justiça possui a orientação jurisprudencial de que o mandado de segurança, em caráter preventivo, não pode ser utilizado com o intuito de obter provimento genérico aplicável a todos os casos futuros da mesma espécie.
De maneira que a simples preocupação com um remoto e etéreo ato administrativo futuro e incerto, não caracteriza o justo receio necessário à impetração preventiva. (Cf.
AgInt no RMS 58.652/SP, Segunda Turma, da relatoria do ministro Francisco Falcão, DJ 19/12/2019; AREsp 1.562.579/MG, Segunda Turma, da relatoria do ministro Herman Benjamin, DJ 22/11/2019; REsp 1.594.374/GO, Segunda Turma, da relatoria do ministro Herman Benjamin, DJ 05/05/2017; AgInt no AREsp 902.897/RS, Segunda Turma, da relatoria do ministro Og Fernandes, DJ 03/04/2017; AgRg no RMS 36.971/MS, Segunda Turma, da relatoria do ministro Humberto Martins, DJ 28/08/2012; REsp 1.064.434/SP, Segunda Turma, da relatoria do ministro Mauro Campbell Marques, DJ 21/06/2011; MS 1.0821/DF, Primeira Seção, da relatoria do ministro Herman Benjamin, DJ 19/12/2007.) Feitas tais considerações, na concreta situação dos autos, pretende a parte impetrante impugnar a inclusão dos Processos Administrativos 10283.722413/2019-91 e 10980.725685/2017-14, nos quais figura como contribuinte, na pauta de sessões de julgamento da 2.ª Turma da 4.ª Câmara da 1.ª Seção do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – Carf, a se realizarem nas datas de 11/04/2023 e 12/04/2023.
Argumenta que pende de apreciação pelo Congresso Nacional a Medida Provisória 1.160/2023, que reinstituiu, de forma ainda precária, a possibilidade de aplicação de voto de qualidade aos julgamentos daquele órgão administrativo, mesmo no caso de feito voltado à determinação e exigência de crédito tributário.
Refere, ainda, que, mesmo diante da situação precária, não obteve deferimento em seu pedido de retirada dos processos da pauta de julgamento.
No tocante à evolução da disciplina normativa dispensada ao instituto do voto de qualidade no âmbito do Carf, revela-se pertinente o panorama cronológico traçado em recente artigo jurídico acerca do tema, litteris: Assim, considerando que o processo tributário no Carf é contencioso administrativo e que é reservada ao contribuinte a possibilidade de recurso ao Poder Judiciário, foi introduzido em norma de estatura legal, em 2008, no artigo 25, § 9º, do Decreto nº 70.235/1972, o voto de qualidade, segundo o qual incumbe aos presidentes das turmas (conselheiros fazendários) o voto decisivo em caso de empate nos julgamentos do Carf.
A Lei nº 13.988, de 14 de abril de 2020, no seu artigo 28, afastou a aplicação do voto de qualidade no caso de determinação e exigência do crédito tributário, prescrevendo nesses casos decisão favorável ao contribuinte.
No começo de 2023, em um cenário de calorosas discussões sobre a necessidade de recursos para gerir o país, sobre a justiça econômica e social, sobre a legítima representatividade e o afastamento do elitismo, o debate sobre o Carf emerge e ganha bastante relevância.
Assim, decidiu-se, por meio da Medida Provisória nº 1.160, de 12 de janeiro de 2023, artigo 1º, o restabelecimento do voto de qualidade.
Essa determinação, contudo, não encerra a contenda; ao contrário, acirra, pois estamos diante de uma medida provisória, submetida democraticamente ao Congresso Nacional. [Cf.
MEIRA, Liziane Angelotti.
Voto de qualidade e as decisões em matéria aduaneira no Carf sob escrutínio.
Revista Consultor Jurídico, 31 de janeiro de 2023.
Disponível em https://www.conjur.com.br/2023-jan-31/artx-territorio-aduaneiro-voto-qualidade-decisoes-materia-aduaneira-carf#_ftn9.] Como bem se vê, portanto, em 12/01/2023, foi publicada a Medida Provisória 1.160/2023, por meio da qual revogado o disposto no art. 19-E da Lei 10.522/2002 – inserido pela Lei 13.988/2020, que vedava a aplicação do voto de qualidade previsto no art. 25, § 9.º, do Decreto 70.235/72 àqueles casos em que o empate no julgamento recaísse sobre processo de determinação e exigência de crédito tributário, de forma a assegurar a resolução da demanda em favor do contribuinte.
Pois bem, adentrando no exame da natureza jurídica do aludido voto de qualidade, exsurge que esse consiste em norma de deliberação de órgão administrativo ao qual se atribui o julgamento de recursos em matéria tributária, inserindo-se dentre as próprias normas de funcionamento desse órgão, na condição de técnica de julgamento a ser empregada em caso de empate na votação.
Sua origem reside em previsão contida no Decreto 70.235/72, que foi recepcionado pelo nosso ordenamento jurídico com status normativo de lei. (Cf.
STF, 5.282/DF, decisão monocrática do ministro Luiz Fux, DJ 14/06/2019.) Nessa concepção, o Superior Tribunal de Justiça, no que é acompanhando pelo Tribunal Regional da 1.ª Região, sedimentou o posicionamento jurisprudencial de que a “existência de voto desempate é comum no âmbito administrativo e judicial, já que assuntos e deliberações judiciais, de rotineiro, não podem ser postergados e devem ser tomados.
Se há previsão normativa, é legal e legitima a existência do voto desempate por Presidente de órgão deliberativo colegiado” (cf.
RMS 29.249/SP, Segunda Turma, da relatoria do ministro Humberto Martins, DJ 25/09/2012). (Cf. nesse mesmo sentido: STJ, AREsp 1.615.748/SP, decisão monocrática do ministro Sérgio Kukina, DJ 18/05/2020; REsp 966.930/DF, Segunda Turma, da relatoria da ministra Eliana Calmon, DJ 12/09/2007; TRF1, AC 1012542-57.2017.4.01.3400/DF, Sétima Turma, da relatoria da desembargadora federal Ângela Catão, DJ 02/03/2020; AI 1013985-87.2019.4.01.0000/DF, decisão monocrática do juiz federal convocado Henrique Gouveia da Cunha, DJ 17/12/2019; AI 1004151-94.2018.4.01.0000/DF, decisão monocrática do desembargador federal José Amilcar Machado, DJ 23/02/2018.) Dito isso, em que pese o presente writ indique como ato administrativo objurgado o indeferimento de seu pedido de retirada da pauta de processos administrativos em curso no Carf, pretende a parte impetrante combater, em verdade, a possibilidade de realização de julgamento por aquele órgão tributário com a aplicação do instituto do voto de qualidade durante o período de tramitação da Medida Provisória 1.160/2023 ou, minimamente, até a homologação definitiva pelo Supremo Tribunal Federal do acordo firmado entre o Ministério da Fazenda e a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB na ADI 7.347/DF.
No particular, tal conclusão vai evidenciada pela redação do pedido formulado, tendo em vista que a parte demandante requer a suspensão do julgamento dos expedientes fiscais em que figura como contribuinte, em vez de limitar o pleito à não aplicação daquela norma de deliberação.
Cumpre observar, assim, que o acolhimento da argumentação deduzida implicaria em reconhecer como devida a suspensão da realização de todo e qualquer julgamento pelo Carf até a conclusão do processo legislativo da medida provisória em comento ou ulterior apreciação da referida avença pelo STF, cessando por completo suas atividades.
Nessa ótica, o ato efetivamente tido como coator na ação constitucional em tela é a possibilidade de aplicação do voto de qualidade por ocasião da apreciação do expediente administrativo indicado, e não a negativa de retirada da pauta dos processos pendentes de julgamento.
De sorte que, tratando-se de processos pendentes de julgamento definitivo em solenidade que ainda está por ocorrer, está-se diante de mandado de segurança preventivo.
Nessa direção de raciocínio, considerando que a prolação de voto de qualidade somente tem lugar na hipótese de empate na votação do feito administrativo – a qual, repisa-se, sequer teve início –, conclui-se que o ato efetivamente impugnado por meio da presente impetração consiste em situação potencial, inexistindo qualquer elemento objetivo a indicar que tal técnica de julgamento virá, de fato, a ser utilizada ao longo da apreciação dos expedientes ora citados pela parte acionante.
Ausente, portanto, contexto fático concreto capaz de dar sustentação ao argumento de lesão a direito líquido e certo, ainda que em perspectiva.
A propósito da temática, merece reprodução trecho da decisão monocrática proferida pelo desembargador federal Hercules Fajoses no AI 1001635-28.2023.4.01.0000/DF, in verbis: De todo o quanto presente no mandado de segurança, tenho que os argumentos trazidos pela agravante estão fulcrados em um possível desfecho desfavorável às suas pretensões, haja vista a modificação legislativa ocorrida recentemente, em especial com relação ao retorno do voto de qualidade.
Decerto que a tese argumentativa não é de todo descabida, mas esbarra em impossibilidade material, vez que trata de prognósticos que, muito embora sejam qualificados por certo grau de possibilidade, ainda assim são prognósticos e como tais, ainda não estão materializados no mundo dos fenômenos a encontrar adequação ao caso concreto, pois, de fato, caso concreto não há.
De outro modo, não vislumbro afronta aos princípios do devido processo legal e da segurança jurídica, vez que atrelar tal afronta a possibilidade de uma decisão futura e incerta, ao menos em análise perfunctória, não me parece a melhor exegese.
Demais, o voto de qualidade nos julgamentos do CARF já foi objeto de inúmeros julgados deste tribunal federal de apelação nas suas duas turmas, cujo entendimento se deu pela sua legalidade.
Assim, sem adentrar no veículo utilizado para seu retorno ao direito, no caso, por medida provisória, pois entendo se tratar de julgamento mais amplo do que se pretende em sede liminar, a questão também se coloca da seguinte forma: A posterior declaração de legalidade/constitucionalidade do voto de qualidade nos julgados do CARF e, a considerar a densa jurisprudência a respeito, poderia ser tomado como fundamento para suspender todos os julgamentos que ainda estariam por ocorrer e que, por motivos diversos poderiam ter, inclusive, desfechos diferentes? Ou seja, os prognósticos – ainda que qualificados – têm o condão de suspender a atividade judicante ao fundamento de que haveria uma possível tendência legislativa de se retornar ao status quo ante (Lei nº 13.988/2022) de inaplicabilidade do voto de qualidade nas hipóteses previstas? Entendo que a resposta há de ser negativa às duas questões.
Por derradeiro, também não vislumbro a prevenção de uma provável afronta a direito líquido e certo, pois a sua concretização depende de atividades de natureza subjetiva por parte dos julgadores do CARF. [Cf.
DJ 30/01/2023; sem grifos no original.] Esse o cenário, denota-se que a pretensão subjacente ao contexto fático submetido a exame é a de discutir o próprio ato normativo em tese, restando evidente a ausência de efeitos concretos da reinstituição do voto de qualidade no âmbito do Carf para a parte impetrante, ao menos até o momento.
Nessa contextura, cediço que, a teor da Súmula 266 do Supremo Tribunal Federal, não cabe mandado de segurança contra lei em tese.
Por este modo de ver, a jurisprudência dos Tribunais Superiores é uníssona no sentido de que é possível a alegação de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, em sede de ação de conhecimento ou mandamental, desde que o ato impugnado tenha efeitos concretos e/ou que tal pedido seja deduzido como causa de pedir.
Por sua vez, não são impugnáveis, nestas vias, as leis e atos normativos em tese, os quais se qualificam pela generalidade, impessoalidade e abstração. (Cf.
STF, MS 28.554-AgR/DF, Tribunal Pleno, da relatoria do ministro Celso de Mello, DJ 02/06/2014; STJ, AgRg no AREsp 420.984/PI, Primeira Turma, da relatoria do ministro Benedito Gonçalves, DJ 06/03/2014.) Adicionalmente, não se pode deixar de pontuar que a Corte Constitucional assentou a compreensão jurisprudencial de que é juridicamente impossível a concessão da segurança contra lei em tese, na medida em que o simples texto legal, como norma abstrata de conduta, não lesa diretamente qualquer direito individual.
Isso na consideração de que a ação mandamental não pode ser utilizada como controle abstrato de validade constitucional de leis e atos normativos em geral, uma vez que não pode ser sucedâneo da ação direta de constitucionalidade. (Cf.
MS 34.432-AgR/DF, Tribunal Pleno, da relatoria do ministro Luiz Fux, DJ 23/03/2017; MS 32.012-AgR/DF, Primeira Turma, da relatoria do ministro Luiz Fux, DJ 31/06/2016; RMS 27.254-ED-segundos/DF, Segunda Turma, da relatoria do ministro Dias Toffoli, DJ 04/04/2016; ARE 895.678-AgR/CE, Primeira Turma, da relatoria do ministro Edson Fachin, DJ 20/10/2015; MS 29.126-AgR/DF, Segunda Turma, da relatoria do ministro Dias Toffoli, DJ 25/08/2015.) Noutro giro, encontrando-se adstrita a hipótese de utilização do voto de qualidade à formação de empate, sua incidência depende diretamente da conduta adotada pela íntegra do colegiado ao longo do julgamento.
Impende ressaltar, a esse respeito, que a responsabilidade do colegiado pela utilização ou não daquela norma de julgamento resulta não só da soma dos votos individuais prolatados quanto ao mérito do recurso apreciado, mas também de sua competência para deliberar acerca de eventual questão de ordem acerca da aplicabilidade de tal técnica, a ser suscitada pelos contribuintes interessados.
No ponto, para fins da ação constitucional, autoridade coatora é aquela competente para corrigir a ilegalidade impugnada, ou seja, a autoridade que dispõe de meios para executar a ordem emanada no caso da concessão da segurança.
De se ver que a precisa indicação da autoridade coatora é de fundamental importância, inclusive, para a fixação da competência do órgão judicante que irá processar e julgar a ação mandamental.
A competência no mandado de segurança é definida pela qualificação e pela hierarquia da autoridade apontada como coatora, e não pela natureza do ato impugnado. (Cf.
STF, MS 21.109/DF, Tribunal Pleno, da relatoria do ministro Sepúlveda Pertence, DJ 19/02/1993; RE 108.616/DF, Primeira Turma, da relatoria do ministro Sydney Sanches, DJ 16/06/1989; CJ 6.704/DF, Tribunal Pleno, da relatoria do ministro Octavio Gallotti, DJ 22/04/1988; RE 103.082/RO, Primeira Turma, da relatoria do ministro Rafael Mayer, DJ 30/08/1985; STJ, REsp 201.909/SP, Sexta Turma, da relatoria do ministro Vicente Leal, DJ 05/05/2003; CC 24.555/DF, Segunda Seção, da relatoria do ministro Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 05/08/2002; CC 18.123/DF, Segunda Seção, da relatoria do ministro Castro Filho, DJ 04/02/2002; CC 28.836/SC, Segunda Seção, da relatoria do ministro Barros Monteiro, DJ 04/06/2001.) Nesse rumo de ideias, consoante entendimento cimentado da Corte Infraconstitucional, “[o] presidente de órgão colegiado é parte ilegítima para figurar no polo passivo de mandado de segurança em que se ataca decisão proferida pela colegialidade” (cf.
RMS 37.267/SP, Segunda Turma, da relatoria do ministro Mauro Campbell Marques, DJ 30/06/2015).
Isso porque a legitimidade para figurar no polo passivo de demanda é do próprio órgão colegiado, e não do respectivo presidente, já que o ato impugnado é resultado do pronunciamento dos integrantes do colegiado. (Cf. nesse mesmo sentido: RMS 30.139/MG, Quinta Turma, da relatoria do ministro Felix Fischer, DJ 1.º/02/2010; AgRg no RMS 26.403/SE, Segunda Turma, da relatoria do ministro Herman Benjamin, DJ 30/09/2009; RMS 19.042/PA, Segunda Turma, da relatoria do ministro Francisco Peçanha Martins, DJ 31/05/2006; TRF1, AMS 2001.34.00.034485-0, Primeira Turma Suplementar, da relatoria do juiz federal convocado Francisco Hélio Camelo Ferreira, DJ 18/05/2011.) Nessa matéria, compete anotar que a Corte Superior de Justiça tem entendido que, “[e]m se tratando de órgãos colegiados, o seu Presidente, além de responder por atos de sua competência própria (oportunidade em que se manifestará, se for o caso, como agente individual), tem também a representação externa do próprio órgão que preside.
Assim, quando o mandado de segurança visa a atacar ato praticado pelo colegiado, o presidente é chamado a falar, não como agente individual, mas em nome e em representação da instituição” (cf.
RMS 32.880/SP, Primeira Turma, da relatoria do ministro Teori Albino Zavascki, DJ 06/09/2011).
Sobre a questão, cumpre apontar que, em conformidade com a orientação jurisprudencial adotada pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de mandado de segurança, é vedado ao juiz agir de ofício para apontar a autoridade coatora ou determinar, mediante emenda à inicial, a substituição no polo passivo da relação processual, mormente quando haja alteração da competência judiciária, pois sua correta indicação pela parte é requisito imprescindível até para fixar a competência do órgão julgador, razão por que, reconhecida a ilegitimidade passiva ad causam do impetrado, impõe-se a extinção do processo, sem julgamento de mérito, visto que ausente uma das condições da ação. (Cf.
MS 33.529/MS, decisão monocrática do ministro Marco Aurélio, DJ 13/02/2017; MS 33.645/MS, decisão monocrática do ministro Celso de Mello, DJ 07/08/2015; Rcl 14.984-AgR/PR, Primeira Turma, da relatoria do ministro Marco Aurélio, DJ 03/02/2014; RMS 26.211/DF, Primeira Turma, da relatoria do ministro Luiz Fux, DJ 11/10/2011; RMS 24.552/DF, Segunda Turma, da relatoria do ministro Gilmar Mendes, DJ 22/10/2004; MS 23.709-AgR/DF, Tribunal Pleno, da relatoria do ministro Maurício Corrêa, DJ 29/09/2000; RMS 22.780/DF, Primeira Turma, da relatoria do ministro Ilmar Galvão, DJ 04/12/1998; MS 22.970-QO/DF, Tribunal Pleno, da relatoria do ministro Moreira Alves, DJ 24/04/1998; MS 21.384/DF, Tribunal Pleno, da relatoria do ministro Marco Aurélio, DJ 26/05/1995; MS 21.382/DF, Tribunal Pleno, redator para o acórdão o ministro Celso de Mello, DJ 03/06/1994.) A propósito do tópico, ressaltando ser caso de extinção da ação mandamental quando ausente a pertinência subjetiva da lide quanto à autoridade apontada, merece transcrição trecho elucidativo da decisão monocrática proferida pelo ministro Celso de Mello no julgamento do MS 33.645/MS, já citado: Se o juiz entender ausente, no processo mandamental, a pertinência subjetiva da lide quanto à autoridade indicada como coatora, deverá julgar extinto o processo sem resolução de mérito por inocorrência de umas das condições da ação (CPC, art. 267, VI), que constitui matéria de direito passível de cognição de ofício pelo magistrado (CPC, art. 301, § 4.º).
Nessa vertente intelectiva, confiram-se os seguintes julgados do Superior Tribunal de Justiça: AgRg no RMS 59.605/RS, Quinta Turma, da relatoria do ministro Reynaldo Soares da Fonseca, DJ 02/06/2020; AgRg no AgRg no MS 13.512/DF, Terceira Seção, da relatoria do ministro Reynaldo Soares da Fonseca, DJ 14/06/2016; AgRg no REsp 1.162.688/MG, Segunda Turma, da relatoria do ministro Mauro Campbell, DJ 06/08/2010; RMS 31795/MT, Primeira Turma, da relatoria do ministro Teori Albino Zavascki, DJ 08/06/2010; RMS 19.151/SP, Segunda Turma, da relatoria do ministro João Otávio de Noronha, DJ 10/10/2005; AgRg no Ag 420.005/SP, Primeira Turma, da relatoria do ministro Garcia Vieira, DJ 28/10/2002; REsp 238.978/PA, Primeira Turma, da relatoria do ministro Garcia Vieira, DJ 27/03/2000; REsp 148.655/SP, Segunda Turma, da relatoria do ministro Francisco Peçanha Martins, DJ 13/03/2000; MS 6.053/DF, Primeira Seção, da relatoria do ministro Garcia Vieira, DJ 23/08/1999.
Como bem se vê, ainda que a parte impetrante alegue o indeferimento da retirada de pauta dos processos pendentes de julgamento como o ato coator combatido, a questão posta na inicial está consubstanciada na potencial utilização do voto de qualidade no julgamento dos processos administrativos do Carf.
Tem-se assim que o objeto da ação está adstrito à hipótese de configuração de empate na votação, sendo o próprio Colegiado, e não o seu Presidente, a autoridade capaz de afastar a ocorrência de tal quadro fático ou mesmo de rechaçar sua utilização, em apreciação de questão de ordem eventualmente suscitada.
Por conseguinte, é o Colegiado a autoridade efetivamente responsável pela suposta coação apontada, revelando-se ilegítima para figurar no polo passivo desta impetração a autoridade indicada. À derradeira, ainda que fossem superadas as conclusões acima expostas, acerca da inadequação da via eleita e mesmo da ilegitimidade passiva da autoridade dita coatora, e incursionássemos no exame da legalidade da Medida Provisória 1.160/2023, melhor sorte não assiste à parte demandante.
Com efeito, impende anotar, no que diz respeito ao conceito de medida provisória, que essa deverá ser editada pelo Presidente da República em caso de relevância e urgência, possuindo força de lei e eficácia imediata a partir de sua publicação, devendo, todavia, ser imediatamente submetida ao Congresso Nacional.
De maneira que dotada de um efeito de ordem normativa, ao inovar a ordem jurídica, e outro de natureza ritual, provocando o Poder Legislativo a instaurar o adequado procedimento de conversão em lei. (Cf.
STF, ADI 293-MC/DF, Tribunal Pleno, da relatoria do ministro Celso de Mello, DJ 16/04/1993.) Nessa compreensão, o Supremo Tribunal Federal, conferindo exegese ao art. 62 da CF/88, firmou o entendimento de que a medida provisória não revoga lei anterior, mas apenas suspende seus efeitos no ordenamento jurídico, em face do seu caráter transitório e precário.
Assim, tem-se que apenas quando aprovada a medida provisória pela Câmara e pelo Senado é que surgirá nova lei, essa sim com o efeito de revogar lei antecedente.
Caso a medida provisória venha a ser expressa ou tacitamente rejeitada, contudo, voltará a ter eficácia a lei primeira vigente no ordenamento, até então suspensa. (Cf.
ADI 5.709/DF, Tribunal Pleno, da relatoria da ministra Rosa Weber, DJ 28/06/2019.) Nessa diretriz, no que diz respeito à atuação do Poder Judiciário para controle das medidas provisórias, tem-se que o exame do mérito dos requisitos constitucionais de relevância e urgência legitimadores da sua edição somente podem ser submetidos à sua apreciação em caráter excepcional, isto é, quando não dependa de uma avaliação subjetiva, mediante critérios de oportunidade e conveniência. (Cf.
STF, ADI 4.029/DF, Tribunal Pleno, da relatoria do ministro Luiz Fux, DJ 27/06/2012; ADI 2.527-MC/DF, Tribunal Pleno, da relatoria da ministra Ellen Gracie, DJ 23/11/2007; ADI 1.717-MC/DF, Tribunal Pleno, da relatoria do ministro Sydney Sanches, DJ 25/02/2000; ADI 11-MC/DF, Tribunal Pleno, da relatoria do ministro Néri da Silveira, DJ 03/03/1989.) Descabe ao Poder Judiciário, portanto, imiscuir-se na competência do Congresso Nacional para disciplinar, mediante decreto legislativo, os efeitos da medida provisória caso essa não venha a ser convertida em lei, consoante previsão contida no § 11 do art. 62 da CF/88. (Cf.
STF, ADPF 216/DF, Tribunal Pleno, da relatoria da ministra Carmen Lúcia, DJ 23/03/2020; ADI 2.984-MC/DF, Tribunal Pleno, da relatoria da ministra Ellen Gracie, DJ 15/05/2004.) Diante da orientação jurisprudencial aludida, ressai que o deferimento do pedido de suspensão do julgamento aqui examinado, com base em mera suposição, atentaria contra a autonomia do Carf, invadindo o Poder Judiciário a atuação de relevante órgão da estrutura do Poder Executivo e adicionalmente, a competência do Congresso Nacional, ao qual incumbe disciplinar os efeitos da Medida Provisória 1.160/2023 caso essa não venha a ser convertida em lei.
Vale anotar, ad argumentandum tantum, que a vedação à edição de medidas provisórias imposta pelo § 1.º do art. 62 da CF/88 recai, dentre outras, sobre matéria relativa a “direito penal, processual penal e processual civil” (inciso I, alínea b, daquele dispositivo) e matéria “já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto do Presidente da República” (inciso IV, idem).
Nesse domínio, nossa Suprema Corte, por ocasião do julgamento da ADI 1.571/UF, entendeu que questões relativas a processo administrativo não restam abarcadas pela vedação constitucional de edição de medida provisória acerca de matéria relativa a processo civil (cf.
Tribunal Pleno, da relatoria do ministro Gilmar Mendes, DJ 30/04/2004).
Demais disso, no bojo de decisões proferidas nas ADIs 6.399/DF, 6.403/DF e 6.415/DF (todas da relatoria do ministro Marco Aurélio), ainda em trâmite e nas quais apreciada, precisamente, a constitucionalidade do voto de qualidade no âmbito do Carf, o tema vem sendo reconhecido como matéria relacionada ao processo tributário.
Assim, o panorama jurisprudencial traçado sinaliza, primo icto oculi, a inexistência de vedação ao regramento do voto de qualidade no âmbito do processo administrativo fiscal por intermédio da edição de medida provisória.
Noutra vertente, no concernente à alegação de violação ao princípio da segurança jurídica, imperativo acrescentar que, constatada a natureza jurídica do voto de qualidade como norma de funcionamento e deliberação de um determinado julgamento, não prosperaria, de qualquer forma, o argumento pela impossibilidade de sua pronta aplicação a processos em tramitação.
Nessa senda, a jurisprudência iterativa do Supremo Tribunal Federal, conformada por diversos julgamentos proferidos sob o rito da repercussão geral, pacificou a inexistência de direito adquirido a regime jurídico. (Cf.
RE 642.890/DF – Tema 465, Tribunal Pleno, da relatoria do ministro Nunes Marques, DJ 26/10/2022; ARE 1.288.550/PR – Tema 1.112, Tribunal Pleno, da relatoria do ministro Alexandre de Moraes, DJ 10/01/2022; RE 563.965/RN – Tema 41, Tribunal Pleno, da relatoria da ministra Cármen Lúcia, DJ 18/04/2008.) Na espécie, como visto, a apreciação dos recursos administrativos elencados na presente impetração ainda não teve início.
Desse modo, o reconhecimento do seu direito à não aplicação de determinada regra de julgamento, a despeito de sequer ter sido perfectibilizada a situação que ensejaria sua incidência, implicaria sustentar a existência de direito adquirido a regime jurídico, o que não se cogita, nos termos da orientação jurisprudencial citada.
Diante do contexto delineado, o indeferimento da petição inicial é medida que se impõe, seja pela inadequação da via eleita, pela ilegitimidade da autoridade apontada como coatora ou pela ausência de elemento concreto capaz de demonstrar a existência de direito líquido e certo a ser resguardado, ainda que em perspectiva.
III – Dispositivo À vista do exposto, diante do manifesto descabimento da impetração, indefiro a petição inicial do writ, julgando extinto o processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 10 da Lei 12.016/2009, c/c o art. 485, inciso I, CPC/2015.
Custas pela parte demandante.
Honorários advocatícios incabíveis (Lei 12.016/2009, art. 25).
Sem impugnação, e certificado o trânsito em julgado, intime-se a parte ré, nos termos do § 3.º do art. 331 do CPC/2015, e, em seguida, arquivem-se os autos, com baixa na distribuição.
Publique-se.
Intime-se, por ora, apenas a parte impetrante e o Ministério Público Federal.
Cumpram-se.
Brasília/DF, 11 de abril de 2023.
João Carlos Mayer Soares Juiz Federal -
06/04/2023 16:29
Recebido pelo Distribuidor
-
06/04/2023 16:29
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
06/04/2023
Ultima Atualização
12/04/2023
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Sentença Tipo C • Arquivo
Sentença Tipo C • Arquivo
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