TRF1 - 1000623-78.2021.4.01.3902
1ª instância - 1ª Santarem
Processos Relacionados - Outras Instâncias
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Assistente Desinteressado Amicus Curiae
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Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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05/09/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Santarém-PA 1ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Santarém-PA PROCESSO: 1000623-78.2021.4.01.3902 CLASSE: AÇÃO CIVIL PÚBLICA (65) POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria) POLO PASSIVO:RUBENS ARAUJO GUIMARAES e outros DECISÃO Os embargos declaratórios não se prestam a imprimir, em regra, efeito infringente ao julgado e, por via de consequência, alterar o resultado da parte dispositiva, a não ser que a saneamento dos vícios (inclusive quanto à não apreciação do fato superveniente) somente se faça com a incidência desse efeito modificativo.
No caso, a sentença deve ser integrada para a correção do dispositivo que impôs ao INCRA, UNIÃO e Fundação Cultural dos Palmares o pagamento das custas processuais.
Nos termos do art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96, são isentos de pagamento de custas a União, os Estados, os Municípios, os Territórios Federais, o Distrito Federal e as respectivas autarquias e fundações, não eximindo tais pessoas jurídicas, contudo, da obrigação de reembolsar as despesas judiciais feitas pela parte vencedora.
Por sua vez, o art. 18, da Lei nº 7.347/85, dispõe que, nas ações civis públicas, não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas.
Verificando-se, na hipótese, não ter havido qualquer adiantamento de custas por parte do autor (MPF), incabível condenação das pessoas jurídicas a tal pagamento, máxime sendo isentas na forma da lei.
Assim, conheço e acolho os embargos de Id 1614374853 para, integrando a sentença, afastar a condenação do INCRA, estendendo seus efeitos à União e Fundação Cultural dos Palmares, do pagamento/reembolso de custas processuais, mantendo-se na íntegra o ato judicativo quanto ao mais.
Intimem-se.
SANTARÉM, data da assinatura eletrônica. (assinado eletronicamente) Juiz Federal -
21/04/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Santarém-PA 1ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Santarém-PA SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1000623-78.2021.4.01.3902 CLASSE: AÇÃO CIVIL PÚBLICA (65) POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria) POLO PASSIVO:RUBENS ARAUJO GUIMARAES e outros SENTENÇA 1.
RELATÓRIO O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL – MPF ajuizou esta Ação Civil Pública em face de UNIÃO FEDERAL, do INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA – INCRA, da FUNDAÇÃO CULTURAL PALMARES – FCP e do particular RUBENS ARAÚJO GUIMARÃES visando provimento jurisdicional de proteção possessória coletiva de território quilombola, c/c pedido de tutela de urgência.
No pedido inicial, alega-se, em síntese, que, após representação de parte interessada, foi constatado que a posse coletiva da área de coordenadas geográficas -1,824925º Lat.; -55,310255º Long. (Parecer Técnico n. 827/2020 - SPPEA), situada na Comunidade Silêncio, no interior do Território Quilombola Cabeceiras, no município de Óbidos/PA foi invadida por particulares estranhos à respectiva comunidade.
Requer, então, o autor: a) a reintegração da posse coletiva da área referida invadida por RUBENS ARAÚJO GUIMARÃES; b) a condenação em obrigação de fazer para que a União, o INCRA e a Fundação Cultural dos Palmares - FCP adotem providências cabíveis para coibir e evitar novas invasões por pessoas não quilombolas na área em questão, tais como a inserção de novos marcos de demarcação da área - especialmente nas áreas em que os marcos originais tenham sido retirados por possíveis invasores -, a realização de melhores e contínuas fiscalizações, a inserção de placas e/ou sinalizações que identifiquem que se trata de território quilombola nas principais vias de acesso da área; e a promoção de ações possessórias cabíveis em caso de novos casos de esbulho, turbação ou ameaça de esbulho/turbação; e c) a tutela do meio ambiente, garantindo que não sejam realizadas atividades nocivas em área federal - Território Quilombola Cabeceiras.
Inicialmente, o pedido de tutela de urgência fora postergado para após a manifestação da parte requerida (Id 431879868).
O INCRA contestou em Id 512618371.
Em preliminar alegou a sua ilegitimidade para figurar no polo passivo da demanda e pugnou pelo indeferimento do pedido de tutela provisória pela improcedência da ação.
Juntou documento.
A Fundação Cultural Palmares ofertou sua contestação em Id 512636865.
Alegou a preliminar de ausência de seu interesse de agir e pugnou pelo indeferimento do pedido de tutela provisória pela improcedência da ação.
Juntou documento.
A União e o requerido Rubens Araújo Guimarães, devidamente citados, não contestaram a ação.
Réplica em Id 700151955.
A tutela de urgência foi parcialmente deferida em Id 891706075.
O INCRA e a Fundação Cultural Palmares noticiaram a interposição de agravo de instrumento (Id’s 512367939 e 979547182).
No prazo assinalado para especificação de provas, a União arguiu sua ilegitimidade passiva e informou desinteresse em produzir provas (Id 980705153).
O MPF também se manifestou pela desnecessidade de novas provas (Id 1063742282). É o relatório. 2.
FUNDAMENTAÇÃO Questões Processuais As preliminares arguidas pelos requeridos INCRA e Fundação Cultural Palmares – FCP já foram apreciadas na decisão que deferiu parcialmente a tutela de urgência.
A União, por seu lado, disse ser parte passiva ilegítima uma vez que a Administração Indireta por meio do INCRA e da Fundação Cultural Palmares - FCP tratam especificamente dos temas relacionados à presente demanda.
De fato, os pedidos direcionados às entidades requeridas dizem respeito às atribuições de cada uma delas, o que constitui, portanto, o requerimento de fundo da demanda.
Assim, a discussão acerca da legitimidade da União será apreciada no tópico seguinte.
Exame do Mérito Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir os títulos respectivos (CF/88, ADCT, art. 68).
Como se vê no documento colacionado às págs. 55-57 do Id 424993356, já há reconhecimento da titularidade de domínio, desde o ano 2000, aos remanescentes das Comunidades de São José, Silêncio, Matá, Cuecé, Apuí e Castanhanduba.
A área litigiosa se encontra encravada no Quilombo Cabeceiras, integrante da Gleba Mamiá, Município de Óbidos/PA.
Com efeito, os integrantes da Comunidade Silêncio ocupam área, reitera-se, já titulada, destinada à ocupação pelos remanescentes de comunidades de quilombos.
Nos autos tem-se que os próprios comunitários tem noticiado invasões do referido território e requerido providências em sua defesa.
De acordo com a inicial, os fatos que motivaram o ajuizamento desta ação e que justificariam os pedidos formulados, seriam os seguintes: a) representantes da Associação das Comunidades Remanescentes de Negros da Área das Cabeceiras - ACORNECAB e moradores da comunidade noticiaram a invasão de suas terras; b) em diligências empreendidas pelo MPF, tomou-se conhecimento que a área ocupada pelo requerido Rubens Araújo Guimarães fora vendida a ele por um associado sem o conhecimento da Associação; c) além de ocupar terra ilegalmente, o requerido Rubens promoveu desmatamentos e ameaças aos comunitários, o que gerou investigação no bojo do Inquérito Policial n.
DPF/SNM/PA-00097/2018; e d) o INCRA e Fundação Cultural Palmares teriam se omitido quanto a atos de sua atribuição na defesa da proteção área quilombola.
Para comprovar suas alegações, o MPF juntou aos autos cópia do IC n. 1.23.002.000437/2017-20, em que constam, entre outros, os seguintes documentos: - Ofício PRM/STM/GAB3/80/2018, de 26 de fevereiro de 2018, remetido ao Superintendente Regional do Incra no Oeste do Pará – Santarém/PA, solicitando esclarecimentos referente aos fatos (pág. 10, Id 424993356); - Ofício PRM/STM/GAB3/104/2018, de 13 de março de 2018, remetido à Procuradoria Federal Especializada – INCRA/Santarém/PA, informando e solicitando medidas judiciais e extrajudiciais de extrusão de invasores e proteção possessória dos quilombolas (pág. 26, Id 424993356); - Ofício PRM/STM/GAB3/105/2018, de 13 de março de 2018, remetido ao Superintendente Regional do Incra no Oeste do Pará – Santarém/PA, requisitando requisito informações sobre os fatos narrados na representação, bem como as providências tomadas. (pág. 28, Id 424993356); - Ofício n. 00036/2018/PFE/PFE-INCRA-STM/PGF/AGU, de 29/03/2018.
Resposta ao Ofício PRM/STM/GAB3/104/2018 (págs. 30-33, Id 424993356); - Relatório de diligência externa (págs. 46-52, Id 424993356); - Título de Reconhecimento de Domínio/FCP/n. 001/2000 (págs. 55-57 do Id 424993356); - Oficio n. 52337/2018/SR(30)STA-G/SR(30)STA/INCRA-INCRA (págs. 10-15, Id 424993360); - Parecer Técnico n. 827/2020-SPPEA-Extrajudicial (págs. 29-32, Id 424993360); - Ofício n. 00038/2018/PFE/PFE-INCRA-STM/PGF/AGU, de 29 de março de 2018 (págs. 69/70, Id 424993360); - Ofício n. 525/2020/GABPRM3-HESC, de 19 de junho de 2020, encaminhado à Procuradoria Federal Especializada do Incra em Santarém (págs. 71/72, Id 424993360); - Ofício n. 00020/2020/PFE/PFE-INCRA-STM/PGF/AGU, de 07 de agosto de 2020 (págs. 95-100, Id 424993360); - Ofício n. 00013/2020/PFE/PFE-INCRA-STM/PGF/AGU, de 17 de julho de 2020 (págs. 124-126, Id 424993360); entre outros.
Mediante a análise dos documentos referentes à apuração levada a efeito pelo MPF no procedimento acima referido, constata-se que a Comunidade Silêncio está inserida em área submetida juridicamente a regime especial de proteção.
Com efeito, a solução do litígio perpassa por constatar a turbação da referida área e as supostas omissões dos órgãos que têm a atribuição de promover a devida proteção.
Invasão da área sob especial proteção O MPF apurou no Inquérito Civil n. 1.23.002.000437/2017-20 que o requerido Rubens Araújo Guimarães alega ter comprado o imóvel que ocupa e desenvolve atividade agropecuária de um associado.
Como se pode ver no Título de Reconhecimento de Domínio/FCP/n. 001/2000, a Cláusula Segunda (págs. 55-57 do Id 424993356) reza que o “imóvel destina-se às atividades extrativistas, agropecuárias, agroindustriais, culturais e de preservação do meio ambiente de modo a garantirem a auto sustentabilidade das comunidades remanescentes beneficiárias, objetivando a sua preservação em seus aspectos social, cultural e histórico, segundo o disposto nos Arts. 215 e 216 da Constituição Federal, tornando-se, em conseqüência, inalienável, devendo permanecer sob o uso e posse dos OUTORGADOS” (SIC).
Ou seja, a suposta compra, por direito, é inexistente.
Porém, o requerido Rubens foi flagrado desmatando e explorando terras, ilegalmente, dentro da área quilombola, como faz prova o Parecer Técnico n. 827/2020 - SPPEA, desenvolvido pelo Setor Pericial do MPF, cujas conclusões exaradas confirmam, a partir de análise comparativa com bases oficiais de gerenciamento de estrutura fundiária e ambiental, que os polígonos de desmatamento identificados por meio da vistoria da área em 2018 estão totalmente inseridos no território quilombola e não coincidem com imóveis certificados pelo INCRA.
O Requerido Rubens, apesar de devidamente citado, declinou de produzir sua defesa, pelo que foi declarada sua revelia.
Diante desse quadro, tem-se devidamente caracterizada a invasão da área de proteção especial, pelo que a pretensão de manutenção de posse requerida na inicial deve ser mantida confirmando a medida liminar deferida no início do processo.
Além do esbulho, é deduzido contra este réu sua responsabilidade pela prática de ilícito ambiental, por ter praticado desmatamento.
Vejamos.
O dano ambiental está caracterizado nos autos.
O Parecer Técnico n. 827/2020-SPPEA-Extrajudicial (págs. 29-32, Id 424993360) corrobora o levantamento do desmatamento realizado pela equipe do MPF que efetuou a diligência em campo.
Portanto, está evidenciado a ocorrência de desmatamento em área situada na região amazônica.
Porém, a autoria não está devidamente comprovada.
Conforme exposto na petição inicial, imputa-se ao requerido Rubens a responsabilidade pelo dano ambiental em vista da constatação, em diligência in loco, de que seria o ocupante da área.
Embora plenamente louvável a iniciativa do autor da ação em adotar iniciativas para se combater o desmatamento ilegal na região amazônica, e, em especial, na área destinada aos remanescentes de quilombos, esta prova não permite que se chegue a tal conclusão.
Portanto, não é possível se chegar à conclusão de que o réu foi o responsável pelo desmate com base apenas no referido levantamento.
No caso dos autos, considerando que o relatório de diligência externa seria o único elemento indicativo da autoria do dano ambiental, não é possível, pelos argumentos expostos, de se considerar o réu como causador do ilícito ou como atual ocupante da área, para fins de responsabilização.
Não está evidenciado que foi realizada inspeção ou vistoria na área, por órgãos ambientais, para fins se colher maiores elementos de informação quanto à autoria.
Assim, não comprovada a autoria.
Por fim, é certo que, em ações de degradação ambiental, aplica-se a inversão do ônus da prova, conforme Súmula 618 do STJ.
Entretanto, para que este enunciado seja aplicável, imprescindível que o autor da ação ambiental apresente elementos idôneos indicativos do dano e da respectiva autoria, sendo que este último não se encontra presente, no caso.
Destarte, não demonstrada a responsabilidade pelo dano ambiental, o pleito inicial deve ser rejeitado nesse particular.
Responsabilidade das entidades públicas requeridas, União Federal, INCRA e Fundação Cultural Palmares Resta estabelecer a responsabilidade do Poder Público quanto a proteção da comunidade quilombola.
Quanto a este tópico, constam nos autos que o INCRA e a Fundação Cultural Palmares foram provocadas pelo MPF a se manifestar a respeito das turbações no território quilombola.
O INCRA, em sua contestação, alega que lhe “compete coordenar, supervisionar, normatizar e controlar as atividades de reconhecimento, identificação, delimitação, demarcação, titulação dos territórios quilombolas; de licenciamento ambiental em terras ocupadas pelos remanescentes de quilombos em articulação com o órgão ambiental responsável; promover a defesa dos interesses das comunidades remanescentes de quilombos nas questões relacionadas com a titulação de seus territórios; promover a articulação interinstitucional necessária à solução de conflitos ocorrentes nas áreas reclamadas pelas comunidades quilombolas; análise e encaminhamento de propostas de desapropriação e aquisição de áreas privadas incidentes nos territórios quilombolas; promover a articulação com os órgãos governamentais envolvidos na regularização dos territórios quilombolas; propor, supervisionar, controlar e acompanhar a implementação de convênios, ajustes, contratos e termos de cooperação técnica relativos à regularização de territórios quilombolas; propor critérios e metodologia visando o controle, uso, manutenção, segurança, atualização e disponibilização de dados para o sistema de informação, de modo a garantir que sejam contemplados as diretrizes e os procedimentos previstos nos atos normativos de sua competência; e propor indenização em decorrência da ação de desintrusão de área quilombola” (SIC).
Alude o INCRA que em seu regimento interno não consta a atribuição da proteção das terras ocupadas pelos remanescentes das comunidades de quilombos após a o exaurimento do procedimento de titulação.
Portanto, “a partir da titulação mediante outorga de Título de Domínio/ FCP/nº 001/2000- documento anexo-, (em favor da comunidade Silêncio inserida no Território Quilombola Cabeceiras - comunidade certificada pela Fundação Cultural Palmares por meio da Portaria nº 28, de 12 de março de 2013), a desocupação de áreas ilegitimamente ocupadas é da competência da Fundação Cultural Palmares- FCP” (SIC).
A Fundação Cultural Palmares, por sua vez, citando o art. 16 do Decreto 4.887 de 20/11/2003 e o art. 28, VI, da Portaria n. 68 de 18/09/2009 (que aprova o Regimento Interno da Fundação Cultural Palmares – FCP), esclarece que é sua atribuição garantir a assistência jurídica, em todos os graus, aos remanescentes das comunidades dos quilombos para defesa da posse contra esbulhos e turbações, para a proteção da integridade territorial da área delimitada.
No entanto, não teria competência de fiscalizar o local a fim de evitar novas invasões.
A União, em cotejo com a legislação pertinente ao caso, assevera que o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - MAPA cabe apenas a formulação da política governamental em face do público quilombola.
Com efeito, a jurisprudência é unânime em conferir a legitimidade passiva da União e do INCRA nos casos em que se discute o processo de regularização fundiária de terras ocupadas por comunidade de remanescentes de quilombos.
Nesse sentido, por exemplo: CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA DE TERRAS OCUPADAS POR COMUNIDADE DE REMANESCENTES DE QUILOMBOLAS.
LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO E DO INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA (INCRA).
LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF).
IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS.
PRECEDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF).
DECLARAÇÃO DE CONSTITUCIONALIDADE MATERIAL DO DECRETO N. 4.887/2003.
DELIMITAÇÃO, DEMARCAÇÃO, DESINTRUSÃO, TITULAÇÃO E REGISTRO DA TERRA QUILOMBOLA.
IMPERATIVO DO ART. 68 DO ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS (ADCT).
PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES.
INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO.
MULTA DIÁRIA POR DESCUMPRIMENTO DO COMANDO DA SENTENÇA.
CABIMENTO.
PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
SENTENÇA CONFIRMADA. 1.
Por expressa disposição legal (artigos 4º e 5º do Decreto n. 4.887/2003), compete à União, por meio da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, da Presidência da República, e do Ministério da Cultura, acompanhar o Incra nas ações de regularização fundiária de demarcação e delimitação de áreas dos remanescentes de comunidade de quilombolas.
Preliminares de ilegitimidade passiva da União e de falta de interesse de agir, que se rejeita. 2.
Conforme já decidiu este Tribunal, não há que se falar em falta de interesse processual quanto aos pedidos de delimitação, demarcação, desintrusão, titulação e registro da terra quilombola em referência, na medida em que tais procedimentos tanto pressupõem a conclusão da fase de Relatório Técnico de Identificação e Demarcação RTID, como dele decorrem logicamente, sendo que o requerimento no sentido de compelir o INCRA a concluir a referida etapa inclui, em caso de reconhecimento da ancestralidade da ocupação das terras, as providências subsequentes mencionadas. (...) (APELAÇÃO CIVEL (AC) 0015812-06.2009.4.01.4300, DESEMBARGADOR FEDERAL DANIEL PAES RIBEIRO, TRF - PRIMEIRA REGIÃO, SEXTA TURMA, PJe 08/08/2022).
E M E N T A AGRAVO DE INSTRUMENTO.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
DEMARCAÇÃO DE TERRAS.
COMUNIDADE QUILOMBOLA.
MOROSIDADE NA CONCLUSÃO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO.
RESPONSABILIDADE DO PODER PÚBLICO.
LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO.
RECURSO DESPROVIDO.
I- Cinge-se a controvérsia acerca da legitimidade passiva da União, em "ação civil Pública proposta pelo MPF contra o INCRA e a União, cujo objetivo é obrigá-los a concluírem Relatório Técnico de identificação e Delimitação (RTID) em 180 dias e em até 18 (dezoito) meses, todo o processo de identificação, reconhecimento, delimitação, marcação e titulação das terras ocupadas e vindicadas pela Comunidade Quilombola Família Quintino, localizada no Município de Pedro Gomes-MS".
II.
De acordo com o artigo 68 do ADCT, é reconhecida a propriedade definitiva aos remanescentes das comunidades quilombolas que estejam ocupando suas terras, devendo o Estado emitir-lhes os respectivos títulos.
Da leitura do referido dispositivo, tem-se que o componente étnico-cultural é determinante ao reconhecimento desse direito.
Nessa senda, dispõe o artigo 2º do Decreto nº 4.887/2003, in verbis: "Art. 2o Consideram-se remanescentes das comunidades dos quilombos, para os fins deste Decreto, os grupos étnico-raciais, segundo critérios de auto-atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida." III.
Ademais, nos termos dos §§ 1º e 2º do mesmo artigo, a caracterização dos remanescentes das comunidades dos quilombos será atestada mediante autodefinição da própria comunidade, considerando-se como suas terras aquelas utilizadas para a garantia de sua reprodução física, social, econômica e cultural.
Por força do artigo 3º do mencionado Decreto, compete ao INCRA a responsabilidade de identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das referidas terras.
Cumpre ressaltar, ainda, que, para a medição e demarcação das terras, devem ser levados em conta os critérios de territorialidade indicados pelos remanescentes das comunidades, sendo-lhes facultada a apresentação de peças técnicas para a instrução do procedimento (§3º do artigo 2º do mesmo Decreto).
IV.
A titulação se dará por meio de outorga de título coletivo e pró-indiviso à comunidade, sendo a terra inalienável, imprescritível e impenhorável (artigo 17).
Com efeito, cabe ao Poder Público adotar as medidas necessárias para assegurar aos remanescentes de comunidades de quilombos o direito às suas terras, direito este resguardado pela Convenção nº 169 sobre Povos Indígenas e Tribais da Organização Internacional do Trabalho - OIT, promulgada no Brasil pelo Decreto presidencial nº 5.051/2004.
Nesse sentir, dispõem os artigos 13 e 14 da referida Convenção: "Artigo 13 1.
Ao aplicarem as disposições desta parte da Convenção, os governos deverão respeitar a importância especial que para as culturas e valores espirituais dos povos interessados possui a sua relação com as terras ou territórios, ou com ambos, segundo os casos, que eles ocupam ou utilizam de alguma maneira e, particularmente, os aspectos coletivos dessa relação. 2.
A utilização do termo "terras" nos Artigos 15 e 16 deverá incluir o conceito de territórios, o que abrange a totalidade do habitat das regiões que os povos interessados ocupam ou utilizam de alguma outra forma.
Artigo 14 1.
Dever-se-á reconhecer aos povos interessados os direitos de propriedade e de posse sobre as terras que tradicionalmente ocupam.
Além disso, nos casos apropriados, deverão ser adotadas medidas para salvaguardar o direito dos povos interessados de utilizar terras que não estejam exclusivamente ocupadas por eles, mas às quais, tradicionalmente, tenham tido acesso para suas atividades tradicionais e de subsistência.
Nesse particular, deverá ser dada especial atenção à situação dos povos nômades e dos agricultores itinerantes. 2.
Os governos deverão adotar as medidas que sejam necessárias para determinar as terras que os povos interessados ocupam tradicionalmente e garantir a proteção efetiva dos seus direitos de propriedade e posse. 3.
Deverão ser instituídos procedimentos adequados no âmbito do sistema jurídico nacional para solucionar as reivindicações de terras formuladas pelos povos interessados." V- Dessa feita, de acordo com o Decreto nº 4.887/2003, o procedimento em questão reclama atuação integrada dentre os diversos órgãos da Administração Direta e Indireta.
Ademais, as lides dessa espécie têm "nítido componente político-ideológico 'que ultrapassa os limites da ação autárquica', o que justifica a presença da União no pólo passivo da presente demanda" (AgRg no REsp 1525797/ES, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/12/2015, DJe 05/02/2016).
Precedentes.
VI- Agravo de instrumento a que se nega provimento. (AGRAVO DE INSTRUMENTO 5025600-78.2021.4.03.0000, Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS, TRF - TERCEIRA REGIÃO, 1ª Turma, 08/06/2022, publicado em 10/06/2022) No presente caso, os pedidos veiculados contra a UNIÃO e contra o INCRA não estão relacionados ao processo de regularização fundiária, não se requer qualquer ato que seja atribuição da Administração Direta ou especificamente da Autarquia Fundiária.
Não se vislumbra responsabilidade da União e do INCRA, portanto, quanto aos fatos aqui tratados.
Assim, analisando o presente feito, resta inconteste que a proteção especial às comunidades quilombolas está claramente definida no art. 16 do Decreto 4.887 de 20/11/2003, verbis: Art. 16.
Após a expedição do título de reconhecimento de domínio, a Fundação Cultural Palmares garantirá assistência jurídica, em todos os graus, aos remanescentes das comunidades dos quilombos para defesa da posse contra esbulhos e turbações, para a proteção da integridade territorial da área delimitada e sua utilização por terceiros, podendo firmar convênios com outras entidades ou órgãos que prestem esta assistência.
Parágrafo único.
A Fundação Cultural Palmares prestará assessoramento aos órgãos da Defensoria Pública quando estes órgãos representarem em juízo os interesses dos remanescentes das comunidades dos quilombos, nos termos do art. 134 da Constituição.
Diante do exposto, fica latente que a responsabilidade pela garantia da proteção da integridade territorial da área delimitada dos remanescentes das comunidades dos quilombos é da Fundação Cultural Palmares.
Na efetivação do seu mister, ela poderá “firmar convênios com outras entidades ou órgãos que prestem esta assistência”. 3.
DISPOSITIVO Ante o exposto, resolvo o mérito (CPC, art. 487, I) das questões submetidas da seguinte forma: a) rejeito os pedidos do autor deduzidos contra a União Federal e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária-INCRA, revogando, portanto, a liminar que concedeu a tutela de urgência quanto às imposições de fazer em relação a elas; b) confirmando parcialmente a liminar concedida, acolho o pedido do autor de impor à Fundação Cultural Palmares - FCP a adoção de providências cabíveis para coibir e evitar novas invasões por pessoas não quilombolas na área em questão, tais como a inserção de novos marcos de demarcação da área - especialmente nas áreas em que os marcos originais tenham sido retirados por possíveis invasores -, a realização de melhores e contínuas fiscalizações, a inserção de placas e/ou sinalizações que identifiquem que se trata de território quilombola nas principais vias de acesso da área, e a promoção de ações possessórias cabíveis em caso de novos casos de esbulho, turbação ou ameaça de esbulho/turbação, bem como seja determinada a reintegração da posse coletiva da área de coordenadas geográficas 55º 19' 00.8" W e 1º 49' 42.6" S, situada na Comunidade Silêncio, no interior do Território Quilombola Cabeceiras, no município de Óbidos/PA; c) acolho o pedido do autor de manutenção da comunidade quilombola Silêncio na posse da área invadida pelo requerido RUBENS ARAÚJO GUIMARÃES, confirmando a liminar concedida, sob pena de multa de R$ 15.000,00 para o caso de nova turbação da posse de qualquer de seus integrantes quilombolas; d) rejeito o pedido do autor de pagamento de indenização a título de dano moral coletivo.
Custas pelas rés.
Deixo de condená-las em honorários advocatícios, na forma do art. 18, Lei n. 7.347/1985 (EAREsp 962.250/SP, Rel.
Ministro OG FERNANDES, CORTE ESPECIAL, julgado em 15/08/2018, DJe 21/08/2018).
Comunique-se a prolação desta sentença ao relator dos Agravos de Instrumento n. 1007854-91.2022.4.01.0000 e 1008018-56.2022.4.01.0000.
Caso interposto recurso de apelação, oportunize-se o contraditório.
Após, remetam-se os autos ao egrégio Tribunal Regional Federal da 1ª Região.
Transitada em julgado, intime-se a parte autora para requerer o que entender de direito.
Nada sendo requerido, arquivem-se os autos, com baixa na distribuição.
Registro eletrônico.
Publique-se.
Intimem-se.
Santarém, [data da assinatura eletrônica] Juiz Federal da 1ª Vara -
07/07/2022 16:37
Conclusos para julgamento
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07/07/2022 16:36
Juntada de Certidão
-
07/07/2022 13:42
Decorrido prazo de FUNDAÇÃO CULTURAL PALMARES em 04/07/2022 23:59.
-
07/07/2022 13:38
Decorrido prazo de INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA em 04/07/2022 23:59.
-
11/05/2022 13:06
Juntada de petição intercorrente
-
06/05/2022 15:18
Juntada de manifestação
-
03/05/2022 15:01
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
03/05/2022 15:01
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
03/05/2022 15:01
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
03/05/2022 14:58
Expedida/certificada a intimação eletrônica
-
03/05/2022 14:58
Expedição de Outros documentos.
-
02/05/2022 14:45
Juntada de Certidão
-
30/04/2022 15:34
Processo devolvido à Secretaria
-
30/04/2022 15:34
Outras Decisões
-
17/03/2022 12:40
Conclusos para decisão
-
17/03/2022 12:39
Juntada de Certidão
-
16/03/2022 18:08
Juntada de petição intercorrente
-
16/03/2022 12:34
Juntada de petição intercorrente
-
15/03/2022 16:29
Juntada de petição intercorrente
-
31/01/2022 09:34
Juntada de Certidão
-
28/01/2022 11:30
Expedição de Carta precatória.
-
27/01/2022 19:41
Juntada de petição intercorrente
-
27/01/2022 15:38
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
27/01/2022 15:38
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
27/01/2022 15:38
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
27/01/2022 15:33
Expedida/certificada a intimação eletrônica
-
27/01/2022 15:33
Expedição de Outros documentos.
-
26/01/2022 14:51
Processo devolvido à Secretaria
-
26/01/2022 14:51
Concedida em parte a Antecipação de Tutela
-
24/08/2021 12:02
Conclusos para julgamento
-
24/08/2021 12:01
Juntada de Certidão
-
24/08/2021 10:43
Juntada de petição intercorrente
-
16/08/2021 14:00
Expedição de Outros documentos.
-
16/08/2021 13:55
Ato ordinatório praticado
-
22/06/2021 15:15
Juntada de Certidão
-
28/04/2021 05:01
Decorrido prazo de UNIÃO FEDERAL em 20/04/2021 23:59.
-
22/04/2021 13:42
Juntada de contestação
-
22/04/2021 13:33
Juntada de contestação
-
26/03/2021 16:23
Juntada de Certidão
-
24/02/2021 23:41
Expedição de Carta precatória.
-
22/02/2021 15:40
Expedição de Comunicação via sistema.
-
22/02/2021 15:40
Expedição de Comunicação via sistema.
-
22/02/2021 15:40
Expedição de Comunicação via sistema.
-
19/02/2021 09:55
Proferido despacho de mero expediente
-
01/02/2021 15:27
Conclusos para despacho
-
01/02/2021 13:35
Remetidos os Autos da Distribuição a 1ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Santarém-PA
-
01/02/2021 13:35
Juntada de Informação de Prevenção
-
29/01/2021 18:24
Recebido pelo Distribuidor
-
29/01/2021 18:24
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
29/01/2021
Ultima Atualização
15/02/2024
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Sentença (anexo) • Arquivo
Sentença (anexo) • Arquivo
Sentença (anexo) • Arquivo
Sentença (anexo) • Arquivo
Despacho • Arquivo
Despacho • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
Sentença Tipo A • Arquivo
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Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
Despacho • Arquivo
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