TJMA - 0801838-36.2022.8.10.0028
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gabinete Do(A) Desembargador(A) Raimundo Moraes Bogea
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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21/09/2023 08:51
Baixa Definitiva
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21/09/2023 08:51
Remetidos os Autos (por julgamento definitivo do recurso) para Instância de origem
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21/09/2023 08:51
Expedição de Certidão de trânsito em julgado.
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20/09/2023 00:04
Decorrido prazo de BANCO PAN S.A. em 19/09/2023 23:59.
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28/08/2023 17:57
Juntada de petição
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25/08/2023 10:57
Publicado Decisão em 25/08/2023.
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25/08/2023 10:57
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 24/08/2023
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24/08/2023 00:00
Intimação
Terceira Câmara de Direito Privado Processo n. 0801838-36.2022.8.10.0028 Embargos de Declaração em Decisão Monocrática Embargante: Banco Pan S.A.
Advogados(as): Gilvan Melo de Sousa (OAB/CE 16.383) Embargado(a): Raimunda Ribeiro de Sousa Castro Advogados(as): Ana Karolina Araújo Marques Relator: Desembargador Raimundo Moraes Bogéa DECISÃO Trata-se de embargos de declaração manejados pelo BANCO PAN S.A, em face da Decisão Monocrática de Id. 24526657, que anulando a sentença, deu provimento à apelação interposta por RAIMUNDA RIBEIRO DE SOUSA CASTRO.
Quanto à pertinência do recurso aqui ventilado, dispõe o art. 1.022 do Código de Processo Civil: Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; III - corrigir erro material.
Em suas razões, a parte embargante alegou que a decisão foi omissa em: 1) não indicar expressamente o índice a ser aplicado no que concerne à correção monetária; 2) deixar de apreciar requerimento de compensação/abatimento do valor da condenação com o montante disponibilizado em conta da parte apelante, em razão do mútuo financeiro entabulado entre as partes.
No que concerne ao contido no item ‘2’, acima mencionado, os embargos não merecem prosperar, pois a decisão atacada examinou e afastou expressamente essa matéria, como se constata do trecho a seguir transcrito: “C.3) Compensação.
Não é desconhecido por este julgador que, como consequência do reconhecimento da nulidade absoluta do contrato debatido nestes autos, por ter sido celebrado com pessoa analfabeta sem observância dos requisitos contidos no art. 595 do Código Civil, impõem-se o restabelecimento do estado em que as partes se encontravam anteriormente.
Trata-se, na realidade, de decorrência direta da norma legal insculpida no art. 182 da Lei Substantiva.
Fazê-lo de forma diversa implicaria, inclusive, o enriquecimento sem causa de uma das partes, prática expressamente vedada pelo ordenamento jurídico (art. 884, do CC).
Todavia, considero que a compensação somente poderia ser determinada se houvesse comprovação cabal de que o valor discutido foi creditado em favor do autor.
Não há nos autos documento que ateste ter isso ocorrido, notadamente por não ter o recorrido anexado ao feito cópia do TED e/ou documento eletrônico que possua elementos de certificação ou rastreabilidade.
O documento de id.23847477 não serve para tal desiderato, por ser uma tela de sistema, produzida unilateralmente, não sendo possível a este juízo atestar sua autenticidade por meio eletrônico.
Dessa forma, mostra-se incabível a compensação” Portanto, em relação a essa matéria, percebe-se que a oposição dos embargos declaratórios caracterizou, tão somente, a irresignação da parte embargante diante de decisão contrária a seus interesses.
No que respeita ao expresso no item ‘1’, os embargos merecem acolhimento, haja vista omissão da decisão no que se refere ao índice que deverá ser aplicado na correção monetária incidente sobre o valor da condenação.
Desse modo, acolho parcialmente os embargos, para, sanando a omissão apontada, indicar que o índice de correção a ser aplicado sobre a condenação será o INPC do IBGE.
Ante ao exposto, conheço e acolho parcialmente os embargos, para suprir a omissão acima referida.
Desembargador Raimundo Moraes Bogéa Relator -
23/08/2023 08:37
Enviado ao Diário da Justiça Eletrônico
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22/08/2023 19:06
Embargos de Declaração Acolhidos em parte
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27/04/2023 00:09
Decorrido prazo de BANCO PAN S.A. em 26/04/2023 23:59.
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10/04/2023 07:35
Conclusos ao relator ou relator substituto
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06/04/2023 20:25
Juntada de petição
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30/03/2023 10:06
Juntada de petição
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30/03/2023 02:11
Publicado Decisão em 30/03/2023.
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30/03/2023 02:11
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 29/03/2023
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29/03/2023 00:00
Intimação
Terceira Câmara de Direito Privado Apelação Cível n° 0801838-36.2022.8.10.0028 Apelante: Raimunda Ribeiro de Sousa Castro Advogado (a): Ana Karolina Araújo Marques - OAB/MA 22283 Apelado (a): Banco Pan S.A.
Advogado (a): Gilvan Melo Sousa - OAB/CE 16383-A Relator: Desembargador Raimundo Moraes Bogéa DECISÃO MONOCRÁTICA Raimunda Ribeiro de Sousa Castro interpôs a presente Apelação Cível contra a sentença proferida pelo juízo da 2ª Vara da Comarca de Buriticupu, que julgou improcedentes os pedidos por ela formulados na inicial da demanda em epígrafe, movida em face do Banco Pan S/A.
Na origem, afirmou a parte autora, pessoa analfabeta, ter sofrido descontos indevidos em seu benefício previdenciário, referente ao contrato de empréstimo consignado nº 341678623-8, no valor de R$ 1.643,99 (um mil e seiscentos e quarenta e três reais e noventa e nove centavos), para pagamento em 84 parcelas de R$ 52,25 (cinquenta dois reais e vinte e cinco centavos), com início dos descontos em 11/2020.
Ao final, negou a contratação e pediu a desconstituição do contrato, com a condenação do banco requerido à devolução em dobro das parcelas indevidamente descontadas e ao pagamento de indenização por danos morais.
Em contestação, o réu suscitou em preliminar falta de interesse de agir e conexão.
Impugnou o benefício da gratuidade da justiça.
Pontuou que o autor é litigante contumaz.
No mérito, alegou que foram adotadas todas as normas atinentes à celebração válida do negócio, apontando como descabidos os pedidos autorais (id.23847476).
Com a peça de defesa, juntou o contrato assinado a rogo, com aposição de digital, todavia, uma das testemunhas coincide com a pessoa que assinou a rogo (id.23847479 - pág. 1/7).
Anexou, também, os documentos pessoais da parte contratante e tela representativa do TED.
Despacho oportunizando prazo para réplica.
Na ocasião, determinou-se a intimação das partes para indicarem as provas a produzir (id.23127216).
Em réplica, a parte autora aponta que o contrato anexado pelo demandado não observou os requisitos da contratação com pessoa analfabeta.
Roga pela procedência dos pleitos formulados na inicial (Id.23127221).
Sobreveio, então, a sentença, rejeitando as preliminares suscitadas e julgando improcedentes os pedidos autorais, sob o fundamento de que o demandado teria se desincumbido de demonstrar a validade da contratação, com a juntada do contrato com aposição de digital da parte autora, subscrito por duas testemunhas (id.23847487).
Irresignada, a parte autora interpôs o presente recurso, pugnando pela reforma da sentença, aduzindo que o contrato é nulo, por não preencher os requisitos do art. 595, do CC.
Suscita o IRDR nº 053983/2016, com o fito de consubstanciar seus argumentos (id.23847491).
Contrarrazões apresentadas pelo apelado, defendendo a manutenção da sentença, por não existir ato ilícito por ele praticado.
Assevera que o contrato não apresenta irregularidades e que houve a disponibilização do crédito (Id.23847495). É o relatório.
Decido.
Dispensado o preparo, por litigar a parte apelante sob o manto da gratuidade da justiça (id.23847487).
Presentes os demais requisitos intrínsecos e extrínsecos, conheço do recurso.
Entendo que o caso deve ser julgado de forma monocrática, em atendimento ao art. 932, IV, ‘c’ do CPC e Súmula 568 do STJ, porque já existente precedente qualificado firmado no âmbito desta Corte de Justiça no IRDR nº 53.983/2016.
Cinge-se a controvérsia em se aferir a regularidade da contratação, pela parte autora, pessoa idosa, analfabeta e economicamente hipossuficiente, do contrato de empréstimo consignado nº consignado nº 341678623-8, no valor de R$ 1.643,99 (um mil e seiscentos e quarenta e três reais e noventa e nove centavos), para pagamento em 84 parcelas de R$ 52,25 (cinquenta dois reais e vinte e cinco centavos), com início dos descontos em 11/2020.
Passo à análise do mérito recursal em tópicos, para melhor elucidação.
A) Da Nulidade do Negócio Jurídico A presente hipótese trata de desconstituição de contrato de empréstimo consignado em que figura como contratante pessoa analfabeta.
De acordo com o IRDR n° 53.983/2016, para a validade do contrato firmado por pessoa idosa e analfabeta é necessário que sejam observados os requisitos do art. 595 do CC – assinatura a rogo e de duas testemunhas.
Ocorre que, no caso em tela, a pessoa que assinou a rogo também assinou como testemunha (Evarista Ribeiro).
Logo, o contrato não está subscrito por duas testemunhas.
Com isso, o Juízo deixou de seguir a tese nº02, do IRDR 53.983/2016, assentada pelo Tribunal Pleno desta Corte de Justiça.
In verbis: "A pessoa analfabeta é plenamente capaz para os atos da vida civil (CC, art. 2º) e pode exarar sua manifestação de vontade por quaisquer meios admitidos em direito, não sendo necessária a utilização de procuração pública ou de escritura pública para a contratação de empréstimo consignado, de sorte que eventual vício existente na contratação do empréstimo deve ser discutido à luz das hipóteses que autorizam a anulação por defeito do negócio jurídico (CC, arts. 138, 145, 151, 156, 157 e 158)." Nesse sentido, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1.862.324 (julgado em 2020), da relatoria do Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZE. [...] Tratando-se de consumidor impossibilitado de ler e escrever, a vulnerabilidade própria do mercado de consumo é ainda mais agravada pela dificuldade de acesso às disposições contratuais expostas em vernáculo.
O ato contratual, nesses casos, é mais inseguro, e o desequilíbrio da relação obrigacional é potencializado.
Com vistas a reduzir o acentuado desequilíbrio que exsurge da dificuldade particular de acesso aos termos constantes de contrato é que se previu a possibilidade de formalização de contratos de prestação de serviço por meio de assinatura a rogo, nas hipóteses em que uma das partes não puder ler e escrever, conforme texto expresso do já mencionado art. 595 do CC/2002.
Nessas hipóteses, a participação do contratante, embora formalizada pela mera assinatura do terceiro indicado e identificado, assegura às partes que todos os contratantes têm o conhecimento exato das prestações e contraprestações, e que efetivamente anuíram à substância das cláusulas, minimizando a insegurança jurídica até mesmo quanto a eventuais questionamentos judiciais posteriores.
Nessa trilha, a redação do art. 595 do CC/2002 não deve ser lida de forma restritiva, mas sim interpretada teleologicamente de forma a viabilizar sua aplicação sempre que, não obstante a liberdade de forma, optar-se pela formalização escrita do contrato.
Isso porque a referida regra viabiliza o exercício pleno da liberdade contratual àqueles consumidores hipervulneráveis, que por razões sócio-culturais não tiveram acesso a educação básica e, no mais das vezes, acabam mantidos à margem da sociedade brasileira, além de contribuir para a segurança jurídica e para a confiança nos contratos firmados. […] Outrossim, optando as partes por exercer o livre direito de contratação pela forma escrita, a participação de analfabeto na formação do instrumento, por si só, é causa de desequilíbrio entre as partes contratantes, passando a se fazer necessária a participação de terceiro a rogo do contratante hipossuficiente como forma de se realinhar o balanço entre as partes.
Nos casos em que a indicação desse terceiro não se fizer perante autoridade notarial, ou seja, quando não for ele intitulado procurador público do analfabeto, o ato negocial assinado a rogo deverá ser ainda presenciado por duas testemunhas.
Desse modo, na hipótese legal específica e excepcional dos contratos de prestação de serviços, haverá a participação de outras três pessoas estranhas ao contrato - duas testemunhas e o assinante a rogo.
A Ministra NANCY ANDRIGHI acompanhou o relator, acrescentando essas razões: […] De proêmio, destaco que pedi vista dos autos ante a extrema complexidade da problemática posta em julgamento, haja vista as alarmantes taxas de analfabetismo no Brasil, sobretudo no âmbito da população idosa na região Nordeste do país, associadas ao já conhecido fenômeno de assédio aos aposentados e pensionistas do INSS para a contratação de serviços bancários. […] Como é possível apreender, esses dados indicam uma evidente correlação entre os índices de analfabetismo e as situações de pobreza, exclusão e baixo desenvolvimento econômico, fatores que redundam, no plano jurídico, no reconhecimento da hipervulnerabilidade das pessoas analfabetas, em especial os idosos.
Em primoroso artigo dedicado à delicada questão ora em exame, Cláudia Lima MARQUES ressalta que a alfabetização é uma habilidade social, correspondente à capacidade de “usar o texto escrito ou o 'alfabeto' para se comunicar e receber comunicação com outros na sociedade”, podendo incluir “a comunicação pela escrita (saber escrever ou usar afirmativamente o alfabeto daquela cultura) ou simplesmente a de 'ler' textos dos outros (saber ler ou entender passivamente o que está escrito)”. […] Como destaca a autora, a análise da vulnerabilidade do contratante pode ser um “bom caminho” para uma decisão mais justa nas demandas envolvendo os analfabetos, haja vista que, embora sejam plenamente capazes para exercer os atos da vida civil, necessitam, ao menos no que perquire à forma de declarar sua vontade, de serem protegidos de maneira especial. […] Nessa linha, se, de forma geral, sofrem os consumidores de um déficit informacional controlado e, tantas vezes, manipulado pelos fornecedores, essa vulnerabilidade é ainda mais potencializada em relação aos analfabetos, ante sua inaptidão para ler e compreender textos escritos, usualmente utilizados para a contratação de serviços em massa.
A propósito, embora o CDC não mencione expressamente os analfabetos em seu texto atual, inclui na política nacional a educação do consumidor (art. 4º, IV), prevendo ser direito básico deste “a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem” (art. 6º, III).
Ainda, dispõe o CDC que cabe ao fornecedor “assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa”, sendo as cláusulas contratuais redigidas de maneira clara e compreensível (arts. 46 e 54, § 3°).
II.
Da forma a ser observada nos contratos escritos firmados por analfabetos.
A par dessas considerações – e novamente voltando os olhos à controvérsia jurídica posta em análise –, mostra-se irrepreensível a conclusão do e.
Min.
Relator no sentido de que os analfabetos detêm plena capacidade civil, sendo que a validade dos negócios jurídicos por si firmados não depende, em regra, de forma especial.
Com efeito, nos termos do art. 104 do Código Civil, a validade dos negócios jurídicos em geral está condicionada, entre outros requisitos, à observância da “forma prescrita ou não defesa em lei”.
No entanto, a regra geral existente no ordenamento jurídico pátrio é a da liberdade das formas: salvo quando exigido por lei, a exteriorização da vontade dos contratantes pode ocorrer sem forma especial ou solene.
Dessa maneira, realmente não comporta acolhimento a argumentação deduzida pela parte recorrente, no sentido de que a validade do contrato firmado por pessoa analfabeta depende de instrumento público ou de outorga de procuração pública a terceiro para assinar a seu rogo, haja vista a inexistência de qualquer exigência legal ou regulamentar nesse sentido.
O que a lei exige é que, nos contratos de prestação de serviços firmados com quem não saiba ler ou escrever, seja o respectivo instrumento assinado a rogo por terceiro e subscrito por duas testemunhas, nos termos do art. 595 do CC/02: “Art. 595.
No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas”.
Embora o referido dispositivo legal se refira exclusivamente a contratos de prestação de serviços, é razoável que sua aplicação seja estendida a todos os contratos firmados por escrito com pessoas analfabetas, “na medida em que materializa o acesso à informação imprescindível ao exercício da liberdade de contratar por aqueles impossibilitados de ler e escrever”, como muito bem pontuado pelo i.
Min.
Relator. […] Não obstante, intervindo no negócio jurídico terceiro de confiança da pessoa analfabeta, capaz de lhe certificar acerca do conteúdo do contrato escrito e de assinar em seu nome, tudo isso testificado por duas testemunhas, compensa-se, em algum grau, o desequilíbrio inicial entre os contratantes, diminuindo a assimetria informacional existente entre eles.
Assim, entendo que, no tocante à forma, a validade do contrato escrito firmado por analfabeto está condicionada à observância da formalidade prevista no art. 595 do CC/02, ou seja, à assinatura do respectivo instrumento a rogo por terceiro, com a participação de mais duas testemunhas. […] Nesses termos, em suma, acompanho o voto do e.
Min.
Relator, concluindo que, no tocante à forma, é válido o contrato escrito celebrado por analfabeto, desde que: (i) assinado a rogo por terceiro, na presença de duas testemunhas ou, (ii) assinado por procurador da pessoa analfabeta constituído por meio de procuração pública, ou, ainda, (iii) firmado em instrumento público, por convenção das partes.” Dessa necessária exposição da jurisprudência do STJ, que, a propósito, foi observada pelo TJMA no IRDR estadual, conclui-se que a sentença possui grave vício de fundamentação, pois não identificou corretamente os fundamentos determinantes do acórdão proferido no IRDR estadual.
Segundo dispõe o art. 489, §1º, VI do CPC, não se considera fundamentada qualquer decisão judicial que “[…] deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento”.
Já o art. 927 do mesmo diploma legal impõe aos juízes a obrigação de observar “os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas […]” (inciso IV), bem como “a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados” (inciso V).
Dessa forma, o magistrado deixou de aplicar o precedente qualificado, posto que considerou válida a contratação que não observou a solenidade do artigo 595 do Código Civil.
B) Julgamento Imediato do Mérito.
Desse modo, reconhecendo a nulidade da sentença por ausência de fundamentação, e aplicando a teoria da “causa madura”, posto que o processo apresenta condições de imediato julgamento, conforme as disposições do art. 1.013, §3º, IV, do CPC, passo a decidir o mérito.
C.1) Nulidade/Desconstituição do Contrato.
Os fundamentos da invalidade do contrato de empréstimo consignado já foram expostos em tópico anterior.
Com efeito, sem atender à formalidade essencial prevista no art. 595 do CC, não é possível declarar válido o contrato de empréstimo celebrado.
Portanto, aplicando, aqui, os mesmos fundamentos contidos no capítulo anterior, entendo que o recurso deve ser provido para que o contrato seja declarado nulo e desconstituído, com fundamento no art. 166, IV e V do CC – não se revestir da forma prescrita em lei, bem assim desrespeitar solenidade que a lei considera essencial para a validade da avença.
Como se vê, a instituição financeira recorrida não demonstrou, na condição de fornecedor do serviço adquirido, a regular contratação do empréstimo, ônus que lhe competia, ou seja, não apresentou contrato assinado a rogo e assinado por duas testemunhas, requisito indispensável em razão da presença de pessoa analfabeta no negócio jurídico.
Nesse viés, o defeito na prestação dos serviços por parte do apelado caracterizou ato ilícito, sendo devida a restituição à parte apelante dos valores descontados de seu benefício previdenciário.
C.2) Da Repetição do Indébito.
Na Tese nº 03 do IRDR nº 53.983/2016, este Tribunal assentou o seguinte: Nos casos de empréstimos consignados, quando restar configurada a inexistência ou invalidade do contrato celebrado entre a instituição financeira e a parte autora, bem como, demonstrada a má-fé da instituição bancária, será cabível a repetição de indébito em dobro, resguardadas as hipóteses de enganos justificáveis.
Esse entendimento pende de confirmação pelo STJ, no Tema/Repetitivo 929, onde será decidido, com efeitos vinculantes, sobre os casos de repetição de indébito, fundados no art. 42, parágrafo único, do CDC (“O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável”).
Apesar de ainda não ter havido o julgamento do referido Tema, já existe tese firmada sobre a questão nos Embargos de Divergência no RESP nº 676.608, julgado em 21/10/2020.
Pondo fim à divergência entre a 1ª e a 2ª Turmas, a Corte Especial do STJ assentou a seguinte tese: [A] restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que realizou a cobrança indevida, revelando-se cabível quando a referida cobrança consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva.
A tese dispensa o consumidor da obrigação de provar o elemento volitivo (dolo/culpa) e, ao mesmo tempo, transfere ao banco (ônus da defesa) o dever de provar “engano justificável”.
O banco apelado não demonstrou nenhum dado capaz de justificar exceção ao dever anexo de cuidado, que decorre do princípio da boa-fé objetiva.
Na verdade, a desconsideração pela forma prevista em lei (CC, art. 595) revela a incúria do banco em revestir o ato negocial de procedimentos capazes de verdadeiramente dar transparência à contratação e reduzir o déficit informacional suportado pelas pessoas idosas e analfabetas.
Assim, a parte recorrente faz jus à devolução, em dobro, de todos os descontos indevidos realizados em seu benefício previdenciário, pois decorrentes de negócio jurídico nulo.
C.3) Compensação.
Não é desconhecido por este julgador que, como consequência do reconhecimento da nulidade absoluta do contrato debatido nestes autos, por ter sido celebrado com pessoa analfabeta sem observância dos requisitos contidos no art. 595 do Código Civil, impõem-se o restabelecimento do estado em que as partes se encontravam anteriormente.
Trata-se, na realidade, de decorrência direta da norma legal insculpida no art. 182 da Lei Substantiva.
Fazê-lo de forma diversa implicaria, inclusive, o enriquecimento sem causa de uma das partes, prática expressamente vedada pelo ordenamento jurídico (art. 884, do CC).
Todavia, considero que a compensação somente poderia ser determinada se houvesse comprovação cabal de que o valor discutido foi creditado em favor do autor.
Não há nos autos documento que ateste ter isso ocorrido, notadamente por não ter o recorrido anexado ao feito cópia do TED e/ou documento eletrônico que possua elementos de certificação ou rastreabilidade.
O documento de id.23847477 não serve para tal desiderato, por ser uma tela de sistema, produzida unilateralmente, não sendo possível a este juízo atestar sua autenticidade por meio eletrônico.
Dessa forma, mostra-se incabível a compensação C.4) Danos Morais.
Em casos de descontos indevidos em benefícios previdenciários, tenho adotado o entendimento de que existe sim o dever de reparar os danos morais sofridos, por atingir verba alimentar.
A falha na prestação do serviço praticada pela instituição financeira é indiscutível, já que celebrou negócio jurídico com a parte apelante, pessoa analfabeta, sem obedecer a regra contida no art. 595 do Código Civil.
Registra-se que o valor do benefício previdenciário é irrisório (salário-mínimo) e os descontos no valor de R$ 52,25 equivalem a parte considerável da renda mínima auferida pela apelante (id.23847469).
Não é de bom senso cogitar constituir mero dissabor a privação indevida de qualquer valor abaixo do mínimo existencial.
Em casos análogos, o STJ tem entendido ser razoável a fixação dos danos morais na quantia certa de R$ 10.000,00 (dez mil reais).
Nesse sentido: No caso, o montante fixado em R$ 2.000,00 (dois mil reais) se mostra irrisório e desproporcional aos danos decorrentes de descontos indevidos em seu benefício previdenciário a título de empréstimo consignado, por falha na prestação do serviço bancário, bem como não reflete os parâmetros da jurisprudência desta Corte, motivo pelo qual se majora a indenização para R$ 10.000,00 (dez mil reais). (AgInt no AREsp 1539686, rel.
Ministro RAUL ARAÚJO, 4ª Turma, j. em 24/09/2019).
Com isso, tendo em vista as peculiaridades do caso em concreto; o porte e a conduta da instituição bancária apelada; os critérios de razoabilidade e o poder repressivo e educativo, sem configurar enriquecimento sem causa (art. 884, do CC) e firme nas jurisprudências acima colacionadas, compreendo que o valor da indenização por dano moral deve ser fixado em R$ 10.000,00 (dez mil reais), com correção monetária contada da data deste acórdão e juros de mora contados a partir da data do primeiro desconto efetuado na conta da apelante, que serve de base para fixar a gênese do ato ilícito praticado pela instituição financeira.
Reforço que a parte apelada é instituição financeira de porte nacional, logo, a quantia arbitrada não é excessiva e serve para repreender que atitudes como a presente se repitam.
D) DISPOSITIVO Ante o exposto, de ofício, anulo a sentença, por ausência de fundamentação, desde logo decidindo o mérito (art. 1.013, § 3º, IV, do CPC), dando provimento ao recurso para: 1) desconstituir o contrato de empréstimo consignado debatido nestes autos; 2) condenar o apelado: 2-a) a devolver à parte apelante, em dobro, todos os valores descontados do seu benefício previdenciário, acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, mais correção monetária, ambos incidindo da data de cada desconto indevido (Súmulas/STJ 43 e 54); 2-b) ao pagamento de indenização por danos morais, no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais), acrescida de correção monetária a contar da data deste acórdão, mais juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir do primeiro desconto indevido, que serve de base para fixar a gênese do ato ilícito praticado pela instituição financeira; 2-c) ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 15% sobre o valor global da condenação ora imposta, observando-se a sucumbência recursal, conforme previsão do artigo 85, § 11 do Código de Processo Civil.
Advirto, por fim, da possibilidade de aplicação da multa prevista no § 4º do art. 1.021 do CPC, a qual ficará condicionada ao depósito prévio que trata o § 5º do mesmo artigo, no caso de interposição de agravo interno considerado inadmissível ou improcedente.
Serve a presente de instrumento de intimação.
Com o trânsito em julgado, certifique-se e baixem os autos.
São Luís, data registrada no sistema.
Desembargador Raimundo Moraes Bogéa Relator -
28/03/2023 11:55
Enviado ao Diário da Justiça Eletrônico
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28/03/2023 11:40
Conhecido o recurso de RAIMUNDA RIBEIRO DE SOUSA CASTRO - CPF: *56.***.*29-53 (APELANTE) e provido
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28/02/2023 14:24
Conclusos para decisão
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28/02/2023 13:49
Recebidos os autos
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28/02/2023 13:49
Conclusos para decisão
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28/02/2023 13:49
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
28/02/2023
Ultima Atualização
23/08/2023
Valor da Causa
R$ 0,00
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