TJRJ - 0806674-82.2023.8.19.0055
1ª instância - Capital 6º Nucleo de Justica 4.0 - Saude Privada (Vara Civel)
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Partes
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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23/05/2025 22:26
Juntada de Petição de apelação
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21/05/2025 10:55
Juntada de Petição de ciência
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01/05/2025 19:23
Juntada de Petição de petição
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30/04/2025 01:24
Publicado Intimação em 30/04/2025.
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30/04/2025 01:24
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 29/04/2025
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28/04/2025 19:09
Expedição de Outros documentos.
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28/04/2025 19:09
Expedida/certificada a intimação eletrônica
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28/04/2025 19:09
Outras Decisões
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21/04/2025 19:20
Conclusos ao Juiz
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21/04/2025 19:20
Expedição de Certidão.
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07/02/2025 22:32
Juntada de Petição de contra-razões
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01/02/2025 18:37
Juntada de Petição de ciência
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31/01/2025 00:36
Publicado Intimação em 31/01/2025.
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31/01/2025 00:36
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 30/01/2025
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29/01/2025 15:28
Expedição de Outros documentos.
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29/01/2025 15:28
Proferido despacho de mero expediente
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28/01/2025 15:57
Conclusos para despacho
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28/01/2025 15:53
Expedição de Certidão.
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19/11/2024 21:09
Juntada de Petição de embargos de declaração
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14/11/2024 00:11
Publicado Intimação em 14/11/2024.
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14/11/2024 00:11
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 13/11/2024
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13/11/2024 00:00
Intimação
Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Justiça 4.0 6º Núcleo de Justiça 4.0 - Saúde Privada (Vara Cível) Palácio da Justiça - Avenida Erasmo Braga 115, Centro, RIO DE JANEIRO - RJ - CEP: 20020-903 SENTENÇA Processo: 0806674-82.2023.8.19.0055 Classe: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) AUTOR: MARIA ANITA DA COSTA GOMES RÉU: MEDISERVICE OPERADORA DE PLANOS DE SAUDE S A Maria Anita da Costa Gomes propôs a Ação de Obrigação de Fazer em face de Mediservice Operadora De Planos S/A, nos termos da petição inicial de Id. 94243083, que veio acompanhada dos documentos de Id. 94246063/94246092.
Através da decisão no Id 94255687, foi indeferida a tutela antecipada.
Citada, a parte ré apresentou sua contestação no Id. 102967322, instruída com os documentos de Id. 102967329.
Réplica apresentada no Id. 105908061.
RELATADOS.
DECIDO.
Através da presente ação pretende a parte autora alcançar a indenização pelos danos que lhe foram causados por força de comportamento indevido perpetrado pela parte ré.
Segundo exposto na inicial, a parte autora é usuária do plano de saúde administrado pela empresa ré e sempre honrou com o cumprimento de suas obrigações.
Destacou que foi diagnosticada com portadora de Teraparesia Grau III, possuindo, ainda, histórico de hipertensão, diabetes melitus e hiperlipidemia.
Diante de seu estado de saúde, recebeu alta hospitalar nos idos de 03/10/2022 mediante a condição de internação domiciliar que, por seu turno, exigiria uma série de cuidados e serviços em seu ambiente domiciliar, tais como fisioterapia motora, acompanhamentos médicos e psicológicos, bem como suporte com cuidados básicos, quais sejam, fraldas geriátricas, luvas, gazes, máscaras, pomadas, cadeira higiênica, colchão, cadeira de rodas e medicamentos de uso diário.
Contudo, para a sua surpresa, não obstante a solicitação médica, o plano de saíde réu somente lhe forneceu a cadeira higiência e autorizou apenas o tratamento fisioterápico 03 (três) vezes por semana, bem como a visita de um médico clínico e psicólogo.
Agravando-se ainda mais a situação, em novembro de 2023 a autora sofreu uma queda e necessitou ser internada.
Contudo, quando de seu retorno para casa, obteve a informação que o tratamento domiciliar havia sido suspenso pela parte ré e, apesar de nova solicitação, até o momento do ajuizamento da presente ação não lhe havia sido encaminhada qualquer resposta acerca do almejado restabelecimento.
A parte ré, por sua vez, aduziu a ausência de qualquer falha na prestação de seus serviços tendo, na realidade, agido pautada no regular exercício de seu direito, notadamente diante da ausência de previsão contratual acerca da cobertura de internação domiciliar e a expressa exclusão de despesas decorrentes de enfermagem de caráter particular e utilização de materiais médicos em domicílio.
Neste momento, urge analisar a questão referente à responsabilidade civil.
Analisando minuciosamente a delicada situação trazida à baila, verifica-se que a mesma representa uma nítida relação de consumo, eis que tanto a parte autora, como a parte ré se caracterizam, respectivamente, como consumidora e fornecedora de serviços, nos termos dos artigos 2º e 3º, parágrafos 1º e 2º, do Código de Defesa do Consumidor, in verbis: “Art. 2º: Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”. “Art. 3º: (...) Parágrafo primeiro–Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.
Parágrafo segundo- Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista”.
Assim, diante da relação jurídica firmada entre as partes, pode-se afirmar que o réu colocou os seus serviços à disposição da Sociedade, razão pelo qual não pode se colocar à margem do Direito do Consumidor, aplicando-se, em sua plenitude, os ditames de ordem pública consagrados no referido diploma legal.
Igualmente importante destacar o teor da Súmula 608, do Colendo Superior Tribunal de Justiça, que assim dispõe: “Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão”.
Daí se sobressai o fato de que os serviços da empresa ré estão no mercado de consumo, encontrando-se regido pelo Código de Defesa do Consumidor, respondendo pelos danos que tais serviços possam ter causado, nos termos do artigo 6º, VI, do referido diploma legal, in verbis: “Art. 6º.
São direitos básicos do consumidor: (...) VI- a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos”.
Também não se pode deixar de mencionar que se aplica à empresa ré a Teoria do Risco do Empreendimento.
Assim, todo aquele que se dispõe a exercer alguma atividade no campo de fornecimento de bens e serviços tem o dever de responder pelos fatos e vícios resultantes do empreendimento, independentemente da existência da culpa.
Segundo expõe o ilustre Desembargador Sérgio Cavalieri Filho, em sua obra “Programa de Responsabilidade Civil”, 1aEdição – 2aTiragem, Malheiros Editores, “(...) este dever é imanente ao dever de obediência às normas técnicas e de segurança, bem como aos critérios de lealdade, quer perante os bens e serviços ofertados, quer perante os destinatários dessas ofertas.
A responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar a atividade de (...) executar determinados serviços” (p. 318).
Por derradeiro, a parte ré, na qualidade de prestadora de serviços, se obriga a prestá-los de forma adequada e eficiente, de sorte a não causar nenhum tipo de dano ao consumidor, sob pena de ser responsabilizada por eventuais prejuízos causados ao mesmo.
Ainda incidem no vertente caso os ditames do artigo 14, do Código de Defesa do Consumidor, impondo à parte ré a responsabilidade de natureza objetiva, onde não se discute a culpa.
Por via de consequência, a sua responsabilidade somente pode ser afastada diante de hipóteses que excluam o nexo causal, hipóteses estas que se encontram disciplinadas no parágrafo terceiro do mesmo dispositivo legal citado.
Desta forma, para que surja tal responsabilidade da parte ré, basta que se demonstre, de forma cabal e induvidosa, a existência do dano, bem como o nexo causal.
O primeiro elemento acima identificado, qual seja, o dano, pode ser conceituado como sendo a subtração ou diminuição de um bem jurídico tutelado, qualquer que seja a sua natureza, quer se trate de um bem patrimonial ou integrante da própria personalidade da vítima.
Sem tal elemento não há de se falar em indenização ou ressarcimento.
Daí se conclui que o dano é o elemento preponderante da responsabilidade civil.
O último elemento, também importante para gerar a responsabilidade civil, é o nexo causal, vale dizer, a relação de causa e efeito entre o comportamento culposo e o dano.
Assim, chega-se à inarredável conclusão de que o dano deve ser consequência direta e imediata do ato culposo que lhe deu causa.
O intuito do legislador, ao consagrar a responsabilidade objetiva de toda e qualquer instituição financeira ou de operação de crédito, se deu diante da notória hipossuficiência do consumidor, parte mais fraca na relação de consumo, e diante do fato de que, dentre seus direitos fundamentais, consagrados no Código Protetivo, se encontra o de facilitar o seu acesso aos meios de defesa.
Neste particular, a notável Ada Pellegrini Grinover, em sua tal comentada obra, esclarece que “(...) dentre os direitos básicos do consumidor, está a facilitação de seu acesso aos instrumentos de defesa, notadamente no âmbito coletivo, com o estabelecimento da responsabilidade objetiva, aliada à inversão do ônus da prova (...)” (p. 55).
Insta, ainda, esclarecer que visando proteger o consumidor, parte mais fraca na relação de consumo, sendo, por conseguinte, mais vulnerável, o legislador ordinário estabeleceu, a seu favor, a inversão do ônus da prova, facilitando, assim, o seu acesso aos instrumentos de defesa.
Tal direito está previsto no artigo 6o, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor.
Sobre este tema, vale a pena citar certo trecho mencionado pela respeitável Ada Pellegrini Grinover, em seu livro intitulado “Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto”, 6aEdição, Editora Forense: “A prova destina-se a formar a convicção do julgador, que pode estabelecer com o objeto do conhecimento uma relação de certeza ou de dúvida.
Diante das dificuldades próprias da reconstrução histórica, contenta-se o magistrado em alcançar não a verdade absoluta, mas a probabilidade máxima (...).
Conceituado como risco que recai sobre a parte por não apresentar a prova que lhe favorece, as normas de distribuição do ônus da prova são regras de julgamento utilizadas para afastar a dúvida.
Neste enfoque, a Lei no8.078/90 prevê a facilitação da defesa do consumidor através da inversão do ônus da prova (...)” (p. 129).
Mais adiante, esclarece, em suas sábias lições, o seguinte: “Cada parte deverá nortear a sua atividade probatória de acordo com o interesse em fornecer as provas que embasam o seu direito.
Se não assim, assumirá o risco de sofrer a desvantagem de sua inércia, com a incidência das regras de experiência a favor do consumidor” (p. 130).
Também há de se destacar a aplicação, ao vertente caso, das normas contidas nos artigos 47 e 54, parágrafos terceiro e quarto, do diploma legal acima mencionado, in verbis: “Art. 47 – As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor”. “Art. 54(...).
Parágrafo 3o– Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, de modo a facilitar a sua compreensão pelo consumidor.
Parágrafo 4o– As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão”.
Justifica-se tal preocupação, pois, conforme é de sabença trivial, o contrato de adesão se caracteriza como sendo um contrato-padrão, já impresso, onde as suas cláusulas são estipuladas unilateralmente, vale dizer, por uma das partes contratantes, e submetidas à aceitação da outra parte que, tendo necessidade de contratar, firma o pacto sem dispensar maiores atenções para as disposições contratuais.
Ao mesmo tempo, o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 54, caput, definiu o contrato de adesão como sendo “(...) aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente o seu conteúdo”.
Comentando o dispositivo legal em foco, a respeitável Ada Pellegrini Grinover, em sua obra “Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto”, expõe a sua preocupação no que tange aos contratos de adesão, esclarecendo que “(...) o Código consagrou o princípio da legalidade das cláusulas contratuais.
O dispositivo visa a permitir que o consumidor possa tomar conhecimento do conteúdo do contrato pela simples leitura, sem prejuízo do dever de esclarecimento por parte do fornecedor. (...) A redação em caracteres legíveis possibilita diminuir o âmbito de controle das cláusulas contratuais gerais, qualitativa e quantitativamente, além de consistir em instrumento de segurança das seguranças jurídicas e de liberdade contratual (...)” (p. 553).
Ao citar comentários acerca do disposto no artigo 54, parágrafo quarto, a ilustre Ada Pellegrini Grinover expõe que “(...) toda estipulação que implicar qualquer limitação de direito do consumidor, bem como a que indicar desvantagem ao aderente, deverá vir simplesmente exposta, do ponto de vista físico, no contrato de adesão. (...) Deverá chamar a atenção do consumidor para as estipulações desvantajosas para ele, em nome da boa-fé que deve presidir as relações de consumo (...)” (p. 554).
Pode-se, portanto, afirmar que a empresa ré está obrigada ao cumprimento de uma boa-fé qualificada, ou seja, uma boa-fé que pressupõe os deveres de informação, cooperação e cuidado com o consumidor.
Levando-se, ainda, em conta a finalidade do contrato em foco, que visa, precipuamente, assegurar ao consumidor e seus dependentes contra os riscos relacionados com a saúde e a manutenção da vida, conclui-se que a sua característica principal é o fato de envolver serviços (de prestação médica ou de seguro) de trato sucessivo, ou seja, contratos de fazer, de longa duração, e que possuem uma grande importância social e individual.
Trata-se, portanto, de serviços que prometem segurança e qualidade, serviços cuja prestação se protrai no tempo, de trato sucessivo, com uma fase de execução contratual longa e descontínua, de fazer e não fazer, de informar e não prejudicar, de prometer e cumprir, de manter sempre o vínculo contratual e o usuário cativo.
Voltando ao caso concreto, constata-se que a parte ré, quando de sua contestação, confessou a recusa no fornecimento do serviço de home caresob o fundamento de exclusão de sua cobertura pelo contrato firmado de forma livre e espontânea pela parte autora.
Entretanto, segundo convicção desta magistrada, não há qualquer justificativa para que o réu prestasse os serviços prescritos no hospital ou em clínica especializada e não os disponibilizasse no domicílio da parte autora.
Note-se, pelo teor do laudo médico (ID 94246089), que restou inquestionável a necessidade de que a autora fosse submetida às sessões domiciliares de fisioterapia (diárias), necessitando, por seu turno, de suporte de home care.
Igualmente destacado pelo médico responsável pelo tratamento da autora, Dr.
FLÁVIO ASSAD GARCIA (ID 97118807), que a mesma foi diagnosticada como portadora de Tetraparesia em grau III e que possui um histórico de diabetes mellitus, hipertensão e hiperlipidemia, apresentando, ainda, um quadro de infecção urinária recorrente.
Também foi enfatizado no aludido documento (ID 97118807) que se trata de “(...) paciente idosa, frágil, acamada e muito restrita ao leito e domicílio (...)”.
Trata-se de um laudo datado de janeiro de 2024, não tendo a empresa ré apresentado qualquer documento ou novo laudo capaz de demonstrar a desnecessidade dos serviços de home care ou a alteração da situação existente quando do ajuizamento da presente ação, ônus este que lhe competia, por força do disposto no artigo 373, inciso II, do Código de Processo Civil/2015.
Diante de tais considerações, afigura-se inadmissível a recusa do plano de saúde réu de autorização do serviçohome careconcernente às sessões diárias de fisioterapia, tal qual destacado no documento que instruiu a inicial (ID 94246089).
Ademais, tratando-se de relação de consumo – notadamente, de plano de saúde, que envolve a saúde e a vida do ser humano – não se pode olvidar que a boa-fé é objetiva e é conduta a ser seguida imperativamente pelos protagonistas da relação jurídica em apreço, sendo indubitável que as cláusulas contratuais devam ser interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor, a teor do artigo 47, do Código de Defesa do Consumidor.
Neste sentido, importante citar os enunciados sumulares nº 352, 338 e 340, do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, que assim dispõem: Enunciado sumular nº 352: “É abusiva a cláusula contratual que exclui internação domiciliar e sua recusa configura dano moral”.
Enunciado sumular nº 338: “É abusiva a cláusula contratual que exclui tratamento domiciliar quando essencial para garantir a saúde e a vida do segurado”.
Enunciado sumular nº 340: “Ainda que admitida a possibilidade de o contrato de plano de saúde conter cláusulas limitativas dos direitos do consumidor, revela-se abusiva a que exclui o custeio dos meios e materiais necessários ao melhor desempenho do tratamento da doença coberta pelo plano”.
Inclusive, o sistema home care equivale a uma internação, na qual se proporciona ao paciente tratamento semelhante ao que receberia se estivesse nas dependências do hospital, distinguindo-se quanto ao fato de que o paciente é removido para seu domicílio, no qual é mantido com cuidados médicos a um custo menor e sem riscos adicionais à saúde.
Desta feita, ainda que se admita a possibilidade de o contrato de plano de saúde conter cláusulas limitativas dos direitos do consumidor, revela-se abusiva a que exclui o custeio dos meios e materiais necessários ao melhor desempenho do tratamento da doença coberta pelo plano.
O segurado ostenta o statusde parte presumidamente vulnerável face ao fornecedor, que possui um maior e evidente poder na relação havida entre as partes (nos termos do artigo 4º, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor).
Ou seja, há a necessidade de interpretar-se a situação existente privilegiando os princípios da função social e da boa-fé objetiva, da qual se extraem os chamados deveres anexos ou laterais de conduta, tais como os deveres de colaboração, fidúcia, respeito, honestidade e transparência, que devem estar presentes nas relações contratuais como a que ora se examina, com o intuito de reequilibrar-se a relação jurídica entre os ora litigantes.
E mais: os contratos de serviços de saúde não podem conter cláusulas limitativas que ponham em risco a vida e saúde dos pacientes e, portanto, as cláusulas que limitam os serviços home caresão consideradas pela jurisprudência como abusivas, pois tais serviços são uma decorrência lógica do tratamento de determinadas doenças, mostrando-se indispensáveis para o bem-estar e manutenção da saúde do paciente.
Importante destacar que o Colendo Superior Tribunal de Justiça já firmou posicionamento no sentido de que o plano de saúde pode estabelecer quais doenças serão cobertas, mas não que tipo de tratamento está alcançado para a respectiva cura.
Neste sentido, eis o seguinte julgado: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
PLANO DE SAÚDE.
SERVIÇO DE HOME CARE PRESCRITO PELO MÉDICO DA BENEFICIÁRIA. 1.
OMISSÃO QUANTO À ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA.
INOVAÇÃO RECURSAL.
PRECLUSÃO CONSUMATIVA. 2.
ABUSIVIDADE DA CLÁUSULA QUE RESTRINGE A COBERTURA.
PRECEDENTES DO STJ.
REVISÃO DO JULGADO.
IMPOSSIBILIDADE.
NECESSIDADE DE REEXAME DE FATOS E PROVAS.
SÚMULAS 5 E 7/STJ. 3.
AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1.
Constatado que a agravante se utiliza do presente recurso para inaugurar o debate de questão não arguida por ocasião da interposição do recurso especial, é caso de incidência do instituto da preclusão consumativa, ante a evidente inovação recursal. 2.
O Colegiado estadual julgou a lide em sintonia com a orientação desta Corte, segundo a qual "o serviço de 'home care' (tratamento domiciliar) constitui desdobramento do tratamento hospitalar contratualmente previsto, que não pode ser limitado pela operadora do plano de saúde", pois, "na dúvida, a interpretação das cláusulas dos contratos de adesão deve ser feita da forma mais favorável ao consumidor" (REsp 1.378.707/RJ, Rel.
Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 26/5/2015, DJe 15/6/2015). 3.
Ademais, a análise das razões apresentadas pela recorrente demandaria a interpretação de cláusulas contratuais, bem como o reexame das circunstâncias fáticas da causa, o que é vedado em recurso especial, ante o disposto nos enunciados n. 5 e 7 da Súmula do STJ. 4.
Agravo interno desprovido” (STJ, AgInt no AREsp 1277497/SP, Terceira Turma, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE).
Daí se poder afirmar que a conduta perpetrada pela parte ré ao não autorizar o serviço home care, desconsiderando a prescrição médica e o estado de saúde da autora (muito bem relatado quando do laudo médico que instruiu a inicial - ID 94246089), afronta a legislação que rege a matéria, bem como as normas consumeristas, sendo evidente a falha na prestação de seu serviço, nos termos do já mencionado artigo 14, do Código de Defesa do Consumidor.
Outra observação a ser efetuada é que se apresenta inconcebível que a parte ré assuma o risco pelo tratamento de determinada doença e restrinja ou exclua sua responsabilidade quanto a determinado procedimento ou atendimento que, pelas circunstâncias do quadro clínico do consumidor, se mostra mais adequado e indispensável para a manutenção de sua saúde, conforme expressa recomendação médica, sob pena de comprometer o objeto do contrato ou o equilíbrio das prestações ajustadas.
Igualmente indevida a recusa por parte da empresa ré em fornecer os insumos e medicamentos.
Conforme destacado ao longo deste trabalho, prever a cobertura de uma determinada moléstia e não garantir o tratamento indispensável ao seu controle ou à melhoria de vida do paciente significa, na verdade, não fornecê-lo.
Isto porque, todos os procedimentos, exames, terapias, materiais e medicamentos necessários ao êxito do tratamento devem ser disponibilizados ao contratante, sem qualquer restrição, sob pena de se frustrar o objeto do contrato.
Portanto, imprescindível que a parte ré forneça ampla cobertura ao tratamento da autora, incluindo não apenas o tratamento domiciliar recomendado pelo médico assistente e medicamentos prescritos, mas também os materiais igualmente solicitados, quais sejam, fraldas descartáveis (ID 94246089).
Inclusive, no entender desta magistrada, tal situação, por si só, é capaz de ensejar o surgimento dos danos morais, suscetíveis de compensação.
Valendo-se das sábias lições do ilustre e culto Desembargador Sérgio Cavalieri Filho, em sua obra “Programa de Responsabilidade Civil”, 1aEdição – 2aTiragem, Editora Malheiros, “(...) só pode ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar (...)” (p. 76).
Ora, de acordo com a narrativa da parte autora, somada à prova carreada aos autos, salta aos olhos o abalo psicológico ao qual o ilustre Desembargador fez menção em sua notável obra, abalo este, conforme já mencionado ao longo deste trabalho, se presume diante da própria situação descrita.
Os dissabores experimentados pela autora extrapolaram, sem sombra de dúvida, a seara do mero aborrecimento, vez que não é justo que o consumidor pague as mensalidades do plano de saúde com vistas a obter uma assistência efetiva, e quando dele necessita, tenha seu tratamento recusado.
Sem dúvida a recusa da empresa ré em autorizar o serviço home care- que era necessário ao restabelecimento da saúde da parte autora - causou para a mesma angústia que extrapola o mero descumprimento contratual.
No mesmo sentido versa a Súmula nº 209, do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro: “Súmula nº 209- Enseja dano moral a indevida recusa de internação ou serviços hospitalares, inclusive home care, por parte do seguro saúde somente obtidos mediante decisão judicial”.
Repita-se que, no caso em comento, a recusa injustificada de fornecimento do serviço dehome caresolicitado pela autora, nos moldes da prescrição médica, enquanto ela cumpridora de todas as suas obrigações contratuais, inclusive financeiras, inegavelmente, feriu a dignidade da pessoa humana na relação de consumo, com grave ofensa a direito da personalidade.
Desta sorte, o defeito na prestação do serviço feriu a integridade psíquica do usuário do serviço, colocando em risco sua a saúde e seu bem-estar, com violação do sossego e da paz de espírito.
Realmente, é desesperador quando, no momento em que mais se precisa de um plano de saúde, o qual se filiou depositando confiança e esperando segurança, seja, o consumidor, frustrado em tal expectativa por uma situação que lhe é estranha.
Torna-se imperioso ressaltar queo dano moral, em situações como a do caso em tela se presume, de modo que, à parte autora, basta a alegação, ficando à cargo da outra parte a produção de provas em contrário, o que, no vertente caso, não ocorreu.
Neste particular, o ilustre Rui Stoco, em sua obra “Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial”, 4aEdição – 2aTiragem, Editora Revista dos Tribunais, esclarece que “(...) a causação de dano moral independe de prova, ou melhor, comprovada a ofensa moral o direito à indenização desta decorre, sendo dela presumido. (...) Significa, em resumo, que o dever de reparar é corolário da verificação do evento danoso, dispensável ou mesmo incogitável, a prova do prejuízo (...)” (p. 722).
Também não se pode deixar de trazer à baila a lição esposada pela ilustre e respeitável Maria Helena Diniz, em sua obra intitulada “Curso de Direito Civil Brasileiro”, 7º volume, 9ª Edição, Editora Saraiva, ao tratar do dano moral, ressalva que a reparação tem sua dupla função, a penal “(...) constituindo uma sanção imposta ao ofensor, visando a diminuição de seu patrimônio, pela indenização paga ao ofendido, visto que o bem jurídico da pessoa (integridade física, moral e intelectual) não poderá ser violado impunemente (...)”, e a função satisfatória ou compensatória, pois “(...) como o dano moral constitui um menoscabo a interesses jurídicos extrapatrimoniais, provocando sentimentos que não têm preço, a reparação pecuniária visa a proporcionar ao prejudicado uma satisfação que atenue a ofensa causada (...)”.
Impõe-se, por conseguinte, o reconhecimento do dano moral, decorrente da própria situação descrita na inicial, surgindo, portanto, para o réu, a obrigação de compensar, a parte autora, pelo inegável abalo sofrido.
Neste diapasão, impõe-se o acolhimento da pretensão autoral por ser a expressão da mais límpida e cristalina justiça.
Isto posto,JULGO PROCEDENTE O PEDIDO, determinando que a parte ré, caso já não o tenha feito, promova o serviço de home care consistente em sessões diárias de fisioterapia, tal qual especificado no laudo médico (ID 94246089), fixando-se para tal o prazo razoável de 05 (cinco) dias, sob pena de multa diária no valor de R$ 300,00 (trezentos reais), cujo patamar máximo há de ser fixado no montante de R$ 30.000,00 (trinta mil reais).
Determino que a parte ré forneça os medicamentos prescritos e os materiais igualmente solicitados, quais sejam, fraldas descartáveis.
Condeno a parte ré, ao pagamento, em favor da parte autora, da indenização a título de danos morais, na importância de R$ 10.000,00 (dez mil reais), acrescida dos juros legais desde a efetiva citação e monetariamente corrigida a partir da presente data.
Condeno a parte ré, como decorrência da sucumbência, ao pagamento das custas processuais, devidas por força de lei, bem como dos honorários advocatícios, aos quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.
P.R.I.
RIO DE JANEIRO, 12 de novembro de 2024.
FLAVIA GONCALVES MORAES BRUNO Juiz Titular -
12/11/2024 14:41
Expedição de Outros documentos.
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12/11/2024 14:41
Julgado procedente o pedido
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28/10/2024 23:10
Conclusos para julgamento
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28/10/2024 23:10
Expedição de Certidão.
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20/08/2024 20:08
Juntada de Petição de petição
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09/08/2024 11:34
Juntada de Petição de petição
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02/08/2024 00:02
Publicado Intimação em 02/08/2024.
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02/08/2024 00:02
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 01/08/2024
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31/07/2024 18:02
Expedição de Outros documentos.
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31/07/2024 18:02
Proferido despacho de mero expediente
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23/07/2024 17:01
Conclusos ao Juiz
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23/07/2024 13:05
Redistribuído por sorteio em razão de incompetência
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23/07/2024 11:23
Expedição de Certidão.
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23/07/2024 11:22
Expedição de Certidão.
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21/07/2024 00:27
Decorrido prazo de RAIMUNDO NONATO ROCHA SILVA em 19/07/2024 23:59.
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19/07/2024 18:00
Juntada de Petição de petição
-
08/07/2024 19:12
Juntada de Petição de petição
-
05/07/2024 22:12
Juntada de Petição de petição
-
02/07/2024 11:42
Expedição de Outros documentos.
-
01/07/2024 17:52
Proferido despacho de mero expediente
-
01/07/2024 17:52
em cooperação judiciária
-
12/06/2024 13:04
Conclusos ao Juiz
-
12/06/2024 13:01
Expedição de Certidão.
-
04/04/2024 01:01
Decorrido prazo de RAIMUNDO NONATO ROCHA SILVA em 02/04/2024 23:59.
-
09/03/2024 12:04
Juntada de Petição de petição
-
26/02/2024 16:13
Expedição de Outros documentos.
-
26/02/2024 16:12
Expedição de Certidão.
-
23/02/2024 15:44
Juntada de Petição de petição
-
06/02/2024 00:50
Decorrido prazo de RAIMUNDO NONATO ROCHA SILVA em 05/02/2024 23:59.
-
18/01/2024 18:17
Juntada de Petição de petição
-
18/01/2024 11:00
Juntada de Petição de petição
-
18/01/2024 10:43
Expedição de Outros documentos.
-
18/01/2024 10:43
Expedição de Outros documentos.
-
18/01/2024 10:43
Expedição de Outros documentos.
-
19/12/2023 18:09
Não Concedida a Antecipação de tutela
-
19/12/2023 17:38
Conclusos ao Juiz
-
19/12/2023 17:38
Expedição de Certidão.
-
19/12/2023 17:28
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
23/07/2024
Ultima Atualização
23/05/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Detalhes
Documentos
Decisão • Arquivo
Despacho • Arquivo
Sentença • Arquivo
Despacho • Arquivo
Despacho • Arquivo
Decisão • Arquivo
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