TJRN - 0802346-61.2023.8.20.5106
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Lourdes de Azevedo
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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22/05/2024 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE SEGUNDA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0802346-61.2023.8.20.5106 Polo ativo ANA BEATRIZ DA SILVA Advogado(s): MATHEUS MORAIS REGINALDO Polo passivo BANCO ITAUCARD S.A.
Advogado(s): WILSON SALES BELCHIOR EMENTA: CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
RELAÇÃO CONTRATUAL QUE NÃO RESTOU DEMONSTRADA PELO APELANTE.
INVERSÃO DO ONUS PROBANDI.
INCLUSÃO INDEVIDA DO NOME DA APELADA NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO.
AUSÊNCIA DE CONTRATO CELEBRADO ENTRE AS PARTES.
DANO MORAL CONFIGURADO.
MANUTENÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO, OBSERVADOS OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE, BEM COMO OS PRECEDENTES DESTA CORTE.
APELO CONHECIDO E DESPROVIDO.
A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima identificadas, acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, em Turma e a unanimidade de votos, conhecer e negar provimento ao recurso, tudo nos termos do voto da Relatora, que integra o Acórdão.
R E L A T Ó R I O Apelação Cível interposta pelo Banco Itaucard S/A em face de sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara da Comarca de Mossoró, que nos autos da Ação Declaratória de Cobrança Indevida julgou procedente o pedido inicial nos seguintes termos: “(…) Isto posto, julgo, totalmente, PROCEDENTE o pedido deduzido na inicial para DECLARAR inexistente o débito sub judice, além de condenar o réu, a título de danos morais, ao pagamento à parte autora da quantia de R$ 5.000,00, com incidência de juros de mora de 1% ao mês a partir da data da negativação (data do evento danoso, ex vi da Súmula 54 do STJ e o art. 398 do CC, expressamente ressalvado pelo art. 240 do CPC) até a data da presente sentença, instante em que este índice será substituído pela taxa selic (em cuja composição incidem não apenas os juros moratórios, mas igualmente a rubrica da correção monetária), por força do art. 406 do CC e em obediência à Súmula 362 do STJ.
Condeno, por fim, a parte ré ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais, atendidos os parâmetros do art. 85, § 2º, do CPC, arbitro em 10% sobre o valor da condenação. (...)”.
Em suas razões recursais sustentou que “(...) a parte autora apelada matinha relação contratual com o banco apelante.
A parte apelante aponta que não se trata de proposta fraudulenta, pois demonstra à evolução do relacionamento contratual da parte apelada com a parte apelante, especialmente o pagamento das faturas mensais, a emissão de cartões adicionais, bem como o endereço para qual as faturas foram enviadas é o mesmo indicado na inicial.
Fato é que a parte apelada possui vínculos contratuais com a parte apelante e o cartão que originou o débito objeto da lide foi regularmente contratado e utilizado por ela.” Relata que “(...) demais, as evidências de pagamentos devem sim ser novamente sopesadas, de modo a confirmar a contratação do cartão de crédito.
O pagamento das faturas denota a regularidade da contratação inequivocamente existente entre as partes. É certo que na fraude busca-se obter a maior vantagem financeira no menor período possível.
Assim, o fraudador não costuma quitar débitos, especialmente quando contraídos em nome de terceiros.
Em regra utilizam todo o limite de crédito disponível pelo banco, sem se preocupar com o respectivo adimplemento das obrigações.” Assevera que agiu no exercício regular de direito e de boa-fé, ao enviar cobranças referente a dívida na medida que se trata de débito legitimamente contraída pela parte Recorrida.
Aduz a inexistência dos danos morais e caso não seja acolhido, a minoração da sua condenação.
Ao final, requereu a reforma da sentença para que a demanda seja julgada improcedente.
A parte ré apresentou contrarrazões no Id. 23213145.
Sem parecer ministerial, ante a ausência de interesse público. É o relatório.
V O T O Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.
Cinge-se o mérito do apelo em perquirir sobre a legitimidade da inscrição do nome da autora nos órgãos de restrição ao crédito e a condenação do dano extrapatrimonial reconhecido na sentença.
No caso posto em discussão, observa-se que independe da existência de culpa a responsabilidade civil que recai sobre o prestador de serviços ante os riscos do seu lucrativo negócio, de acordo com a doutrina de Sergio Cavalieri Filho ao tratar da Teoria do Risco do Empreendimento, positivada no art. 927 do Código Civil in verbis: “Pela teoria do risco do empreendimento, todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no mercado de consumo, tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa. (...) A responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar atividade de produzir, estocar, distribuir e comercializar produtos ou executar determinados serviços que oferece no mercado de consumo, respondendo pela qualidade e segurança dos mesmos". (Op.
Cit., 497p).
Ora, desde a inicial, a parte apelada sustenta não ter celebrado o contrato de prestação de serviços com a apelante em discussão nesta lide, apontando a existência de fraude, com relação à cobrança discutida em juízo.
Diante de tais alegações autorais, de não ter celebrado contrato com a parte apelante, este não trouxe aos autos qualquer documento que demonstrasse a validade do negócio supostamente entabulado entre as partes, falhando, assim, no que tange ao exercício do seu ônus probatório (artigo 373, inciso II, do Código de Processo Civil), conforme restou bem destacado na sentença sob vergasta, em trecho abaixo transcrito, as quais adoto como razões de decidir: “No particular, a despeito da tese defensiva de ser a autora titular de cartão de crédito contratado junto a si, da documentação trazida pelo réu inferem-se vários dados cadastrais incorretos (endereço, telefone, email, CPF), totalmente dissonantes dos da autora, com assinatura visivelmente diferente.
Afora, se referirem a dados de outro contrato.
A parte ré também juntou gravação telefônica (Id. 96966312, fl. 4), sem número de protocolo, mediante o qual a autora supostamente teria solicitado informações sobre o cartão de crédito.
A despeito disto, na ligação, não há confirmação de dados pessoais correspondentes aos da autora.
Por sua vez, em sede de impugnação, a parte autora junta áudios (Id. 99093437, 99093439 e 99093442), a fim de comprovar que a voz presente na ligação não é sua.
Doravante, a parte ré se descurou de colacionar o contrato n°004705213200000, devidamente assinado pela parte autora, ou qualquer prova válida de contratação digital, do qual teria se originado o débito sub judice, fato que, iniludivelmente, induz à veracidade da ocorrência de ato fraudulento perpetrado por terceiro estelionatário que, utilizando-se dos dados do(a)(s) demandante(s), realizou a contratação indevida junto à instituição ré.
Especificamente sobre a responsabilidade do banco nos casos de estelionato, obtempera Sérgio Cavalieri Filho, in litteris: Forçoso é reconhecer, à luz desses princípios, que a falsificação ou adulteração de cheque do correntista, ou qualquer outra modalidade de estelionato que leve o banco a pagar indevidamente alguma quantia ao falsário, é perpetrada contra o banco, e não contra o correntista.
O dinheiro indevidamente entregue ao estelionatário é do banco, a ele cabendo, portanto, suportar o prejuízo, segundo o milenar princípio “res perit domino”.
Aqui não há, portanto, que se falar em culpa de qualquer das partes, sendo, também, indiferente ser ou não grosseira a falsificação.
O que importa é saber quem sofreu o dano, sendo indiscutível que, quer se trata de crime praticado mediante violência (roubo, latrocínio), quer de ilícito perpetrado através de fraude, a vítima é o banco, não podendo transferir o prejuízo para o cliente.
O dinheiro subtraído, repita-se, ou entregue por engano, é do banco, e “res perit domino”. (FILHO, Sérgio Cavalieri.
Programa de responsabilidade civil. 6ªed.
São Paulo: Malheiros, 421-422p).
A hipótese narrada pelo ilustre Desembargador é a de responsabilidade civil do banco em meio à adulteração praticada por outrem no campo da relação consumerista que mantém com o seu cliente (correntista, investidor, etc), por mim ora citada para efeito de ilustrar que a ação do fraudador não isenta o banco da sua responsabilidade, não tendo o condão de romper o nexo etiológico, já que se trata de risco imanente à atividade profissional da instituição financeira de quem se deve esperar o necessário aparato logístico a inibir ações criminosas deste jaez.
Em tais hipóteses, independe da existência de culpa a responsabilidade civil que recai sobre o prestador de serviços ante os riscos do seu lucrativo negócio, nos moldes do artigo suso transcrito, como bem sintetiza Sergio Cavalieri Filho ao tratar da Teoria do Risco do Empreendimento, positivada no art. 927 do Código Civil, in verbis: Pela teoria do risco do empreendimento, todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no mercado de consumo, tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa. (...) A responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar atividade de produzir, estocar, distribuir e comercializar produtos ou executar determinados serviços que oferece no mercado de consumo, respondendo pela qualidade e segurança dos mesmos". (Op.
Cit., 497p).
A propósito do tema, já constituiu objeto do REsp nº 1197929/PR, afetado pelo Regime de Recursos Repetitivos, assim, ementado, consagrando a Teoria do Risco do Empreendimento para o caso: EMENTA: RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA.
JULGAMENTO PELA SISTEMÁTICA DO ART. 543-C DO CPC.
RESPONSABILIDADE CIVIL.
INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS.
DANOS CAUSADOS POR FRAUDES E DELITOS PRATICADOS POR TERCEIROS.
RESPONSABILIDADE OBJETIVA.
FORTUITO INTERNO.
RISCO DO EMPREENDIMENTO. 1.
Para efeitos do art. 543-C do CPC: As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno. 2.
Recurso especial provido. (STJ - 2ª Seção.
Rel.
Min.
Luis Felipe Salomão.
Julgado em 24/08/2011) (grifo acrescido) Não bastasse isso, o entendimento foi também sumulado pelo STJ, através do verbete 479, in verbis: As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.
Diga-se, mais, ainda que não seja o(a) autor(a) cliente do banco, a ele(a) se aplica o regramento protetivo do Código de Defesa do Consumidor, ex vi do seu art. 17, que equipara a consumidor terceiro eventualmente atingido pelos efeitos de qualquer relação consumeirista, a despeito de celebrada por terceiro.
Quero com isto dizer que, neste campo, a responsabilidade do banco é objetivada seja pelo art. 14 do CDC, seja pelo art. 927 do CC.
Feitos os devidos contornos da disciplina legal pertinente ao caso em testilha, depreende-se que o nexo etiológico se afere a partir do cotejo entre a conduta do banco réu, que deve responder pelos riscos inerentes aos seus negócios diante de eventual incúria por parte de quaisquer de seus prepostos, ao ter negativado o nome do(a) autor(a) por dívida juridicamente inexistente.
In casu, a parte autora fez prova da negativação, à vista do respectivo extrato carreado ao ID. 95015840, concernente ao indigitado negócio.
Acerca dos danos suportados pela autora, o entendimento assente na jurisprudência do STJ, que consagra a inscrição indevida como causadora de um dano presumido, dano moral in re ipsa.
Senão vejamos: EMENTA: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
RESPONSABILIDADE CIVIL.
CONTRATAÇÃO FRAUDULENTA DE CARTÃO DE CRÉDITO.
NEGATIVAÇÃO INDEVIDA DO NOME NOS CADASTROS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO.
DEVER DE INDENIZAR.
VALOR.
REEXAME.
SÚMULA 7/STJ.
DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL.
INOVAÇÃO RECURSAL.
AGRAVO IMPROVIDO. 1.
A revisão das conclusões estaduais - acerca da inexistência de cerceamento de defesa por falta de perícia - demandaria, necessariamente, o revolvimento do acervo fático-probatório dos autos, providência vedada na via estreita do recurso especial, ante o óbice disposto na Súmula 7/STJ. 2.
Constatado que a agravante se utiliza do presente recurso para inaugurar o debate de questão não arguida por ocasião da interposição do recurso especial é caso de incidência do instituto da preclusão consumativa, ante a evidente inovação recursal. 3.
Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - 3ª Turma.
AgInt no AREsp 1327163/SP.
Rel.
Min.
Marco Aurélio Bellizze.
Julgado em 12/11/2018) Destarte, inegável é o dever de indenizar, a título de dano moral, pela lesão extrapatrimonial até aqui sofrida pela parte autora, decorrente in re ipsa da negativação da autora nos órgãos de restrição ao crédito pelo débito objeto da ação, exsurgindo-se daí, irrefutavelmente, o rompimento da paz de espírito, que acaba por ultrapassar os limites do mero dissabor.
No tocante ao "quantum" indenizatório, considerando-se o valor do desconto, aliado ao porte econômico do banco e à situação financeira da parte demandante, reputo a cifra de R$ 5.000,00, como consentâneo com os ideais de justiça retributiva, ao mesmo tempo em que se atenderá ao aspecto pedagógico da medida.” Assim, forçoso reconhecer a ilegalidade da conduta realizada pelo apelante, restando inegável o dever de indenizar, uma vez que, ainda que não tenha agido de má-fé, é sua a responsabilidade de verificar a legitimidade da documentação apresentada pela parte, antes de celebrar qualquer negócio jurídico, como também inscrever nos órgãos de restrição ao crédito.
Destarte, não havendo dúvida quanto à caracterização do dano moral na hipótese, passo à análise do quantum indenizatório.
Ora, é cediço que, no momento da fixação do dano moral deve o julgador, diante do caso concreto, utilizar-se do critério que melhor possa representar os princípios de equidade e de justiça, levando-se em conta as condições latu sensu do ofensor e ofendido, como também a potencialidade da ofensa, a sua permanência e seus reflexos no presente e no futuro. É certo, também, que o valor arbitrado, a título de indenização, deve compensar a dor sofrida pela vítima, punir o ofensor e desestimular a ocorrência de outros episódios dessa natureza e não pode gerar enriquecimento ilícito, mas também não pode ser ínfimo, ao ponto de não atender ao seu caráter preventivo.
Tudo isso considerando os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
In casu, entendo que o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) fixado na primeira instância para compensar o abalo moral experimentado pela apelada reputa-se dentro dos parâmetros, considerados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, bem como os precedentes desta Corte de Justiça que, em casos que se adequam ao dos autos, ainda que guardadas as peculiaridades de cada um, gravitam em torno de tal valor.
Ante o exposto, conheço e nego provimento ao apelo.
Por fim, tendo em vista o desprovimento do recurso da instituição financeira, majoro os honorários sucumbenciais, fixados naquele decisum em 2% (dois por cento), com fulcro no disposto no §11 do artigo 85 do Código de Processo Civil. É como voto.
Natal, data registrada no sistema.
Desembargadora Maria de Lourdes Azevêdo Relatora Natal/RN, 13 de Maio de 2024. -
22/04/2024 00:00
Intimação
Poder Judiciário do Rio Grande do Norte Segunda Câmara Cível Por ordem do Relator/Revisor, este processo, de número 0802346-61.2023.8.20.5106, foi pautado para a Sessão VIRTUAL (votação exclusivamente pelo PJe) do dia 13-05-2024 às 08:00, a ser realizada no 2ª CC Virtual (NÃO HÍBRIDA).
Caso o processo elencado para a presente pauta não seja julgado na data aprazada acima, fica automaticamente reaprazado para a sessão ulterior.
No caso de se tratar de sessão por videoconferência, verificar o link de ingresso no endereço http://plenariovirtual.tjrn.jus.br/ e consultar o respectivo órgão julgador colegiado.
Natal, 19 de abril de 2024. -
21/03/2024 09:07
Conclusos para decisão
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20/03/2024 12:39
Juntada de Petição de petição
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19/03/2024 07:38
Expedição de Outros documentos.
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18/03/2024 15:53
Proferido despacho de mero expediente
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06/02/2024 08:13
Recebidos os autos
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06/02/2024 08:13
Conclusos para despacho
-
06/02/2024 08:13
Distribuído por sorteio
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19/09/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE 3ª Vara Cível da Comarca de Mossoró Processo nº 0802346-61.2023.8.20.5106 PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Autor: ANA BEATRIZ DA SILVA Advogado(s) do reclamante: MATHEUS MORAIS REGINALDO Réu: BANCO ITAUCARD S.A SENTENÇA Trata-se de Ação Ordinária ajuizada por ANA BEATRIZ DA SILVA em face de ITAU UNIBANCO HOLDING S/A, ambos devidamente qualificados e representados por advogados regularmente constituídos.
A parte autora, em seu escorço, alegou que, na ocasião de aquisição de uma casa por meio de financiamento bancário, constatou a negativação do seu nome no SERASA por dívida inexistente, na qual o réu figura como credor, decorrente de contrato cuja origem desconhece.
Pugnou pela antecipação de tutela para retirar o seu nome do referido cadastro e, no mérito: a) declaração de inexistência da dívida; b) condenação do réu ao pagamento de danos morais, no patamar de R$ 10.000,00.
Decisão concessiva de tutela antecipada e concessão da justiça gratuita (Id. 95030881).
Citada, a parte ré ofereceu contestação (Id. 96966312).
Intimada, a autora apresentou impugnação a contestação (Id. 99093435). É o que cumpre relatar.
Decido.
De início, cumpre asseverar que a presente hipótese autoriza o julgamento antecipado da lide, com esteio no art. 355, I, do CPC, sem a necessidade de produção de prova oral em audiência, em razão de versar a pretensão autoral sobre relação contratual alegadamente inexistente, cognoscível unicamente pela via documental.
Em sede de preliminar, a parte ré impugnou a ausência de pretensão resistida da parte autora.
Todavia, tal preliminar não merece acolhimento, uma vez que presente, in casu, o trinômio necessidade, utilidade e adequação.
Ora, versando a ação sobre a declaração de inexistência de débito, a utilidade do provimento judicial é patente, dado que só através de uma ação judicial é que o autor se eximiria do seu pagamento, como também possibilitaria, acaso procedente a sua pretensão, a reparação do prejuízo material e moral decorrente da declaração de inexistência da dívida.
Daí porque, rejeito a preliminar e passo ao exame de mérito.
No particular, a despeito da tese defensiva de ser a autora titular de cartão de crédito contratado junto a si, da documentação trazida pelo réu inferem-se vários dados cadastrais incorretos (endereço, telefone, email, CPF), totalmente dissonantes dos da autora, com assinatura visivelmente diferente.
Afora, se referirem a dados de outro contrato.
A parte ré também juntou gravação telefônica (Id. 96966312, fl. 4), sem número de protocolo, mediante o qual a autora supostamente teria solicitado informações sobre o cartão de crédito.
A despeito disto, na ligação, não há confirmação de dados pessoais correspondentes aos da autora.
Por sua vez, em sede de impugnação, a parte autora junta áudios (Id. 99093437, 99093439 e 99093442), a fim de comprovar que a voz presente na ligação não é sua.
Doravante, a parte ré se descurou de colacionar o contrato n°004705213200000, devidamente assinado pela parte autora, ou qualquer prova válida de contratação digital, do qual teria se originado o débito sub judice, fato que, iniludivelmente, induz à veracidade da ocorrência de ato fraudulento perpetrado por terceiro estelionatário que, utilizando-se dos dados do(a)(s) demandante(s), realizou a contratação indevida junto à instituição ré.
Especificamente sobre a responsabilidade do banco nos casos de estelionato, obtempera Sérgio Cavalieri Filho, in litteris: Forçoso é reconhecer, à luz desses princípios, que a falsificação ou adulteração de cheque do correntista, ou qualquer outra modalidade de estelionato que leve o banco a pagar indevidamente alguma quantia ao falsário, é perpetrada contra o banco, e não contra o correntista.
O dinheiro indevidamente entregue ao estelionatário é do banco, a ele cabendo, portanto, suportar o prejuízo, segundo o milenar princípio “res perit domino”.
Aqui não há, portanto, que se falar em culpa de qualquer das partes, sendo, também, indiferente ser ou não grosseira a falsificação.
O que importa é saber quem sofreu o dano, sendo indiscutível que, quer se trata de crime praticado mediante violência (roubo, latrocínio), quer de ilícito perpetrado através de fraude, a vítima é o banco, não podendo transferir o prejuízo para o cliente.
O dinheiro subtraído, repita-se, ou entregue por engano, é do banco, e “res perit domino”. (FILHO, Sérgio Cavalieri.
Programa de responsabilidade civil. 6ªed.
São Paulo: Malheiros, 421-422p).
A hipótese narrada pelo ilustre Desembargador é a de responsabilidade civil do banco em meio à adulteração praticada por outrem no campo da relação consumerista que mantém com o seu cliente (correntista, investidor, etc), por mim ora citada para efeito de ilustrar que a ação do fraudador não isenta o banco da sua responsabilidade, não tendo o condão de romper o nexo etiológico, já que se trata de risco imanente à atividade profissional da instituição financeira de quem se deve esperar o necessário aparato logístico a inibir ações criminosas deste jaez.
Em tais hipóteses, independe da existência de culpa a responsabilidade civil que recai sobre o prestador de serviços ante os riscos do seu lucrativo negócio, nos moldes do artigo suso transcrito, como bem sintetiza Sergio Cavalieri Filho ao tratar da Teoria do Risco do Empreendimento, positivada no art. 927 do Código Civil, in verbis: Pela teoria do risco do empreendimento, todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no mercado de consumo, tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa. (...) A responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar atividade de produzir, estocar, distribuir e comercializar produtos ou executar determinados serviços que oferece no mercado de consumo, respondendo pela qualidade e segurança dos mesmos". (Op.
Cit., 497p).
A propósito do tema, já constituiu objeto do REsp nº 1197929/PR, afetado pelo Regime de Recursos Repetitivos, assim, ementado, consagrando a Teoria do Risco do Empreendimento para o caso: EMENTA: RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA.
JULGAMENTO PELA SISTEMÁTICA DO ART. 543-C DO CPC.
RESPONSABILIDADE CIVIL.
INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS.
DANOS CAUSADOS POR FRAUDES E DELITOS PRATICADOS POR TERCEIROS.
RESPONSABILIDADE OBJETIVA.
FORTUITO INTERNO.
RISCO DO EMPREENDIMENTO. 1.
Para efeitos do art. 543-C do CPC: As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno. 2.
Recurso especial provido. (STJ - 2ª Seção.
Rel.
Min.
Luis Felipe Salomão.
Julgado em 24/08/2011) (grifo acrescido) Não bastasse isso, o entendimento foi também sumulado pelo STJ, através do verbete 479, in verbis: As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.
Diga-se, mais, ainda que não seja o(a) autor(a) cliente do banco, a ele(a) se aplica o regramento protetivo do Código de Defesa do Consumidor, ex vi do seu art. 17, que equipara a consumidor terceiro eventualmente atingido pelos efeitos de qualquer relação consumeirista, a despeito de celebrada por terceiro.
Quero com isto dizer que, neste campo, a responsabilidade do banco é objetivada seja pelo art. 14 do CDC, seja pelo art. 927 do CC.
Feitos os devidos contornos da disciplina legal pertinente ao caso em testilha, depreende-se que o nexo etiológico se afere a partir do cotejo entre a conduta do banco réu, que deve responder pelos riscos inerentes aos seus negócios diante de eventual incúria por parte de quaisquer de seus prepostos, ao ter negativado o nome do(a) autor(a) por dívida juridicamente inexistente.
In casu, a parte autora fez prova da negativação, à vista do respectivo extrato carreado ao ID. 95015840, concernente ao indigitado negócio.
Acerca dos danos suportados pela autora, o entendimento assente na jurisprudência do STJ, que consagra a inscrição indevida como causadora de um dano presumido, dano moral in re ipsa.
Senão vejamos: EMENTA: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
RESPONSABILIDADE CIVIL.
CONTRATAÇÃO FRAUDULENTA DE CARTÃO DE CRÉDITO.
NEGATIVAÇÃO INDEVIDA DO NOME NOS CADASTROS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO.
DEVER DE INDENIZAR.
VALOR.
REEXAME.
SÚMULA 7/STJ.
DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL.
INOVAÇÃO RECURSAL.
AGRAVO IMPROVIDO. 1.
A revisão das conclusões estaduais - acerca da inexistência de cerceamento de defesa por falta de perícia - demandaria, necessariamente, o revolvimento do acervo fático-probatório dos autos, providência vedada na via estreita do recurso especial, ante o óbice disposto na Súmula 7/STJ. 2.
Constatado que a agravante se utiliza do presente recurso para inaugurar o debate de questão não arguida por ocasião da interposição do recurso especial é caso de incidência do instituto da preclusão consumativa, ante a evidente inovação recursal. 3.
Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - 3ª Turma.
AgInt no AREsp 1327163/SP.
Rel.
Min.
Marco Aurélio Bellizze.
Julgado em 12/11/2018) Destarte, inegável é o dever de indenizar, a título de dano moral, pela lesão extrapatrimonial até aqui sofrida pela parte autora, decorrente in re ipsa da negativação da autora nos órgãos de restrição ao crédito pelo débito objeto da ação, exsurgindo-se daí, irrefutavelmente, o rompimento da paz de espírito, que acaba por ultrapassar os limites do mero dissabor.
No tocante ao "quantum" indenizatório, considerando-se o valor do desconto, aliado ao porte econômico do banco e à situação financeira da parte demandante, reputo a cifra de R$ 5.000,00, como consentâneo com os ideais de justiça retributiva, ao mesmo tempo em que se atenderá ao aspecto pedagógico da medida.
Releva notar que, a despeito da quantificação do dano moral não ter sido acolhida por este Juízo tal como postulada pela parte autora, a lesão imaterial, afinal, foi por mim reconhecida, o que impede a sua sucumbência recíproca, forte na Súmula 326, segundo a qual, “na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca”, ainda aplicável pelo Colendo STJ, mesmo após o advento do novo CPC, como se infere do AgInt no AREsp 1644368/SC.
Isto posto, julgo, totalmente, PROCEDENTE o pedido deduzido na inicial para DECLARAR inexistente o débito sub judice, além de condenar o réu, a título de danos morais, ao pagamento à parte autora da quantia de R$ 5.000,00, com incidência de juros de mora de 1% ao mês a partir da data da negativação (data do evento danoso, ex vi da Súmula 54 do STJ e o art. 398 do CC, expressamente ressalvado pelo art. 240 do CPC) até a data da presente sentença, instante em que este índice será substituído pela taxa selic (em cuja composição incidem não apenas os juros moratórios, mas igualmente a rubrica da correção monetária), por força do art. 406 do CC e em obediência à Súmula 362 do STJ.
Condeno, por fim, a parte ré ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais, atendidos os parâmetros do art. 85, § 2º, do CPC, arbitro em 10% sobre o valor da condenação.
P.R.I.
Mossoró/RN, data registrada no sistema.
FLÁVIO CÉSAR BARBALHO DE MELLO Juiz de Direito
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
06/02/2024
Ultima Atualização
20/05/2024
Valor da Causa
R$ 0,00
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ACÓRDÃO • Arquivo
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