TJRN - 0817991-84.2024.8.20.0000
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Amilcar Maia
Polo Ativo
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Polo Passivo
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
-
11/04/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE TERCEIRA CÂMARA CÍVEL Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0817991-84.2024.8.20.0000 Polo ativo ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE Advogado(s): Polo passivo M.
L.
D.
Advogado(s): CARLOS EDUARDO CAMPELLO DA SILVA Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO.
AGRAVO DE INSTRUMENTO.
FORNECIMENTO DE HOME CARE PELO SUS.
PACIENTE INFANTIL PORTADOR DE MICROCEFALIA E ENCEFALOPATIA CRÔNICA.
NECESSIDADE DE INTERNAÇÃO DOMICILIAR CONSTATADA EM PERÍCIA JUDICIAL.
DIREITO CONSTITUCIONAL À SAÚDE E PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.
RECURSO DESPROVIDO.
I.
CASO EM EXAME 1.
Agravo de instrumento interposto pelo Estado do Rio Grande do Norte contra decisão que, em sede de tutela de urgência, determinou o fornecimento de tratamento domiciliar (home care) ao autor, menor de 8 anos, portador de microcefalia e encefalopatia crônica, dependente de traqueostomia e sonda nasoenteral.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.
Há três questões em discussão: (i) a existência de nulidade processual por cerceamento de defesa, em razão da desconsideração dos quesitos apresentados pelo ente público; (ii) a obrigação do Estado de fornecer tratamento domiciliar fora do rol de serviços obrigatórios do SUS, conforme regulamentos federais; e (iii) a possibilidade de controle jurisdicional sobre políticas públicas na área da saúde, diante de laudos periciais conflitantes.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 3.
O direito à saúde é dever do Estado e deve ser garantido de forma universal e igualitária, conforme disposto no art. 196 da Constituição Federal, podendo o Poder Judiciário determinar medidas para assegurar o tratamento adequado quando demonstrada a necessidade médica. 4.
O laudo pericial judicial concluiu pela imprescindibilidade da internação domiciliar, com suporte técnico contínuo, em razão da gravidade do quadro clínico do paciente, sendo insuficiente a atenção domiciliar (SAD-AD1) indicada pelo ente público. 5.
A concessão da tutela de urgência baseia-se na existência de risco iminente à saúde do paciente e na necessidade de viabilizar sua alta hospitalar, evitando danos irreparáveis decorrentes da internação prolongada. 6.
A alegação de nulidade processual por cerceamento de defesa não prospera, pois a decisão impugnada fundamenta-se na perícia médica determinada pelo Juízo, sendo possível a complementação da instrução probatória em momento posterior, sem prejuízo ao contraditório. 7.
A gestão administrativa e orçamentária do SUS não afasta a responsabilidade estatal na garantia de tratamentos essenciais à vida e à dignidade do paciente, cabendo a reavaliação periódica da necessidade da internação domiciliar. 8.
O controle judicial das políticas públicas de saúde deve ser exercido com cautela, observando-se os precedentes vinculantes do STF (Temas 793, 1.033 e 1.234), mas sem afastar a proteção imediata ao direito fundamental do paciente quando demonstrada a urgência da medida.
IV.
DISPOSITIVO E TESE 9.
Recurso desprovido.
Tese de julgamento: 1.
O Poder Judiciário pode determinar o fornecimento de tratamento domiciliar pelo SUS quando comprovada sua imprescindibilidade para a saúde do paciente, ainda que não esteja expressamente previsto nos regulamentos administrativos. 2.
A internação domiciliar deve ser garantida nos casos em que o quadro clínico do paciente inviabilize a alta hospitalar e exija suporte técnico contínuo, conforme perícia judicial. 3.
O controle judicial das políticas públicas de saúde deve respeitar a organização administrativa do SUS, mas não pode afastar o dever estatal de garantir o direito fundamental à saúde quando evidenciada a necessidade urgente do tratamento. 4.
A reavaliação periódica da necessidade do home care é cabível para evitar custos desproporcionais e assegurar a adequação do tratamento à condição clínica do paciente.
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 6º, 196 e 198; Lei nº 8.080/1990, arts. 2º e 19-I, §§ 1º, 2º e 3º; CPC, art. 183.
Jurisprudência relevante citada: STF, Tema 793, RE 855.178/SE, Rel.
Min.
Luiz Fux, j. 23.05.2019; STF, Tema 1.033, RE 666.094/SC, Rel.
Min.
Dias Toffoli, j. 27.10.2021; STF, Tema 1.234, RE 1.361.021/SP, Rel.
Min.
Edson Fachin, j. 02.06.2023.
ACÓRDÃO ACORDAM os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade votos, em harmonia com o opinamento do Ministério Público, em conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator.
RELATÓRIO Trata-se de agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo, interposto pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE em face da decisão interlocutória proferida nos autos da Ação Ordinária n.º 0800211-61.2024.8.20.5132, originária da Vara Única da Comarca de São Paulo do Potengi, que estabeleceu o seguinte (parte dispositiva): (...) Sob tais considerações, defiro a pretensão posta em sede de tutela de urgência para determinar que a parte demandada, por intermédio do Sistema Único de Saúde (SUS), proceda, no prazo de 5 (cinco) dias, com o fornecimento do home care, descrito em perícia médica de ID 128082601.
Caso não haja condição para a realização do tratamento na rede pública, que se faça, no mesmo prazo, através da rede privada conveniada e, em último caso, na rede privada não-conveniada, às expensas do Estado. (…) Nas razões do seu recurso, o ente público agravante aduziu, em resumo, que: a) Está equivocada a certidão que declarou intempestiva a apresentação de quesitos por parte do Estado ao laudo do perito judicial, pois não observou a regra do prazo em dobro aplicável ao ente público, bem como o marco inicial correto (nomeação do perito), daí exsurgindo o evidente cerceamento de defesa; b) Não possui competência administrativa para fornecer o tratamento de home care pleiteado, pois este não integra o rol de serviços obrigatórios do SUS sob gestão estadual, conforme regulamentações federais (Leis 8.080/1990 e 8.124/1990); c) O SAD do SUS já oferece modalidades de atenção domiciliar (AD1, AD2 e AD3), sendo o paciente elegível apenas para SAD-AD1, conforme relatórios técnicos da SESAP; d) A decisão judicial deferiu tratamento não incorporado ao SUS e incompatível com a classificação do caso, violando a eficiência administrativa e gerando custos elevados ao erário; e) O alto custo do tratamento domiciliar requerido e a ausência de previsão orçamentária para o seu custeio reforçam a necessidade de suspensão da medida impugnada, existindo risco de formação de precedentes judiciais que impliquem em ativismo judicial e multiplicação de demandas similares; f) Devem ser observadas na espécie as teses fixadas no Tema 793 do STF, que envolve a repartição de competências no SUS; no Tema 1.033 da mesma Corte, referente ao ressarcimento de despesas com serviços prestados pela rede privada; além da tutela vinculante do Tema 1.234, que trata da legitimidade passiva em demandas envolvendo tratamentos não padronizados pelo SUS; g) Caso mantida a decisão agravada, devem ser impostas contracautelas, como reavaliações periódicas do paciente e comprovação semestral da necessidade do tratamento.
Ao final, requereu a concessão de efeito suspensivo ao agravo para sobrestar a decisão de primeiro grau e, no mérito, que seja a mesma reformada no sentido de indeferir o pleito de home care, com a remessa dos autos ao NAT-JUS para avaliação técnica, análise de quesitos não respondidos e designação de audiência para coleta de provas.
Na decisão de Pág.
Total 30/34, a liminar pleiteada nas razões do recurso restou indeferida.
A parte recorrida não ofertou contrarrazões.
Com vista dos autos, a 15ª Procuradora de Justiça em substituição na 10ª Procuradoria opinou pelo conhecimento e desprovimento do agravo. É o relatório.
VOTO Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do agravo de instrumento.
Reanalisando a questão controvertida, agora de modo exauriente, chego à conclusão de que o presente recurso não merece ser provido.
Como se vê nos autos, a parte autora, ora recorrida, ajuizou ação ordinária visando a compelir o Estado do Rio Grande do Norte a fornecer tratamento de home care 24h, argumentando que possui condições clínicas graves, diagnosticadas como microcefalia (CID Q02) e encefalopatia crônica não progressiva (CID G93.4).
Após indeferimento inicial da tutela de urgência, foi realizada perícia médica que concluiu pela necessidade de internação domiciliar.
A perícia constatou que o paciente necessita de suporte técnico contínuo devido ao uso de traqueostomia e sonda nasoenteral, além de estar frequentemente acometido por pneumonias de repetição.
O perito indicou alta complexidade do caso, fundamentado em tabelas técnicas (ABEMID e NEAD), recomendando internação domiciliar para viabilizar alta hospitalar e continuidade do tratamento.
O Estado do Rio Grande do Norte apresentou relatório técnico (SESAP) indicando que o perfil do paciente é compatível com a modalidade SAD-AD1 (atenção domiciliar de baixa complexidade), e não com o home care requerido.
Além disso, alegou que houve nulidade processual, uma vez que seus quesitos periciais não foram considerados sob a justificativa de intempestividade, violando os prazos dobrados aplicáveis à Fazenda Pública (art. 183 do CPC).
Ora, é cediço que tem o Poder Público o dever constitucional de garantir a saúde de todos, "mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação" (art. 196, da CF), preceito também erigido no art. 6.º da Carta Magna como direito e garantia fundamentais do cidadão1.
A Constituição Estadual, de igual modo, tutela o direito à saúde nos seus artigos 8º2 e 1253, assim como a legislação infraconstitucional, através da Lei Federal n.º 8.080/1990, que dispõe sobre as condições para promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências, no seu art. 2º, caput4.
A Lei n.º 8.080/90, alterada pela Lei n.º 10.424/2002, teve acrescido o art. 19-1, §§ 1º, 2º e 3º, estabelecendo no âmbito do SUS o atendimento domiciliar e a internação domiciliar, nos termos a seguir transcritos: Art. 19-I.
São estabelecidos, no âmbito do Sistema Único de Saúde, o atendimento domiciliar e a internação domiciliar. §1º Na modalidade de assistência de atendimento e internação domiciliares incluem-se, principalmente, os procedimentos médicos, de enfermagem, fisioterapêuticos, psicológicos e de assistência social, entre outros necessários ao cuidado integral dos pacientes em seu domicílio. §2º O atendimento e a internação domiciliares serão realizados por equipes multidisciplinares que atuarão nos níveis da medicina preventiva, terapêutica e reabilitadora. §3º O atendimento e a internação domiciliares só poderão ser realizados por indicação médica, com expressa concordância do paciente e de sua família.
Como é cediço, a Atenção Domiciliar no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) se caracteriza como um conjunto de ações de prevenção e tratamento de doenças, reabilitação, paliação e promoção à saúde, prestadas em domicílio, garantindo continuidade de cuidados.
O programa estipula regras específicas de habilitação e normas rígidas de controle, tanto para o repasse de verbas quanto para a fiscalização.
Nesse panorama, a internação domiciliar disponibilizada pelo SUS vem sendo concedida aos usuários em situações excepcionais, quando a internação hospitalar não se mostra adequada ao tratamento, a exemplo dos casos em que há necessidade de ventilação respiratória mecânica, monitoração de cardioscopia, saturometria (oxigenação do sangue) ou PANI (Pressão Arterial Não Invasiva), sonda nasogástrica ou nasoenteral, acompanhamento contínuo (24 horas) por diversas especialidades, etc.
Na situação em apreço, verifica-se pelos documentos acostados, bem como pela fundamentação da decisão recorrida, que o autor, ora recorrido, é uma criança de apenas 8 anos de idade, portadora de microcefalia (CID Q02) e encefalopatia crônica não progressiva (CID G93.4), com uso de sonda nasoenteral para alimentação e traqueostomia, sendo acometido comumente por pneumonia de repetição, o que o leva a recorrentes internações hospitalares.
O caso demanda análise cautelosa por envolver o direito fundamental à saúde, garantido pelo art. 196 da Constituição Federal, e a gestão orçamentária e administrativa do Sistema Único de Saúde (SUS).
A parte agravada, em condição de vulnerabilidade clínica extrema, encontra-se internada em hospital público e não pode receber alta sem o tratamento requerido, conforme atestado por laudo pericial judicial que considerou imprescindível a internação domiciliar com suporte técnico de enfermagem 24 horas.
Embora existam laudos divergentes da SESAP, que recomendam atendimento em nível SAD AD1, a análise do caso exige primazia da necessidade clínica imediata, dado o estado de saúde do infante, a proteção integral que a Constituição Federal lhe assegura e a potencial irreversibilidade de eventual omissão.
Por essa razão, ao mesmo tempo em que é preciso submeter o caso à análise do NAT-JUS para a elaboração de nota técnica específica, com a possibilidade de, no decorrer da instrução, serem solicitados esclarecimentos adicionais ao perito judicial, não vejo, ao menos na fase atual do processo, como revogar a decisão ora impugnada, que se encontra amparada no conteúdo da perícia elaborada por expert nomeado pelo Juízo, cuja imparcialidade não parece ser questionada.
Portanto, do atual contexto dos autos, é possível inferir que o paciente não pode permanecer hospitalizado por tempo indefinido, dado o seu delicado quadro de saúde, sendo imperiosa, ao menos até eventual conclusão em sentido diverso, a sua manutenção na modalidade de internação domiciliar.
Essa medida parece ser a mais pertinente nesta fase processual diante do atual contexto probatório, mas nada impede que, a qualquer momento, se constatada a suficiência do serviço disponibilizado pelo ente público na modalidade SAD ou a alteração do estado de saúde do paciente, seja o provimento judicial modificado para contemplar o atendimento menos complexo, a depender eventualmente de novas circunstâncias a serem apreciadas nesta instância ou no primeiro grau de jurisdição.
Diante do exposto, em consonância com o opinamento ministerial, conheço e nego provimento ao agravo de instrumento, mantendo incólume a decisão vergastada. É como voto.
Natal/RN, 31 de Março de 2025. -
19/03/2025 00:00
Intimação
Poder Judiciário do Rio Grande do Norte Terceira Câmara Cível Por ordem do Relator/Revisor, este processo, de número 0817991-84.2024.8.20.0000, foi pautado para a Sessão VIRTUAL (Votação Exclusivamente PJe) do dia 31-03-2025 às 08:00, a ser realizada no Terceira Câmara Cível.
Caso o processo elencado para a presente pauta não seja julgado na data aprazada acima, fica automaticamente reaprazado para a sessão ulterior.
No caso de se tratar de sessão por videoconferência, verificar o link de ingresso no endereço http://plenariovirtual.tjrn.jus.br/ e consultar o respectivo órgão julgador colegiado.
Natal, 18 de março de 2025. -
08/03/2025 17:36
Conclusos para decisão
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08/03/2025 01:23
Decorrido prazo de ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE em 07/03/2025 23:59.
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08/03/2025 00:34
Decorrido prazo de ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE em 07/03/2025 23:59.
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06/03/2025 18:55
Juntada de Petição de outros documentos
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18/02/2025 10:29
Expedição de Outros documentos.
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18/02/2025 10:28
Decorrido prazo de M. L. D. em 11/02/2025.
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12/02/2025 00:41
Decorrido prazo de MYCARLOS LOPES DINIZ em 11/02/2025 23:59.
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12/02/2025 00:12
Decorrido prazo de MYCARLOS LOPES DINIZ em 11/02/2025 23:59.
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22/01/2025 05:58
Publicado Intimação em 21/01/2025.
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22/01/2025 05:58
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 20/12/2024
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21/01/2025 22:01
Publicado Intimação em 21/01/2025.
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21/01/2025 22:01
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 20/12/2024
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28/12/2024 12:26
Juntada de documento de comprovação
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21/12/2024 20:36
Expedição de Ofício.
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20/12/2024 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE Gab.
Des.
Amilcar Maia na Câmara Cível - Juíza Convocada Dra.
Martha Danyelle Barbosa Agravo de Instrumento n.° 0817991-84.2024.8.20.0000 Origem: Vara Única da Comarca de São Paulo do Potengi/RN Agravante: ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE Procurador: Gabriel Kubrusly Gonçalves Agravado: M.
L.
D., rep. p/ A.
L.
Advogado: Carlos Eduardo Campello da Silva (OAB/RN 13.877) Relatora: Juíza Convocada Martha Danyelle DECISÃO Trata-se de agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo, interposto pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE em face da decisão interlocutória proferida nos autos da Ação Ordinária n.º 0800211-61.2024.8.20.5132, originária da Vara Única da Comarca de São Paulo do Potengi, que estabeleceu o seguinte (parte dispositiva): (...) Sob tais considerações, defiro a pretensão posta em sede de tutela de urgência para determinar que a parte demandada, por intermédio do Sistema Único de Saúde (SUS), proceda, no prazo de 5 (cinco) dias, com o fornecimento do home care, descrito em perícia médica de ID 128082601.
Caso não haja condição para a realização do tratamento na rede pública, que se faça, no mesmo prazo, através da rede privada conveniada e, em último caso, na rede privada não-conveniada, às expensas do Estado. (…) Nas razões do seu recurso, o ente público agravante aduziu, em resumo, que: a) Está equivocada a certidão que declarou intempestiva a apresentação de quesitos por parte do Estado ao laudo do perito judicial, pois não observou a regra do prazo em dobro aplicável ao ente público, bem como o marco inicial correto (nomeação do perito), daí exsurgindo o evidente cerceamento de defesa; b) Não possui competência administrativa para fornecer o tratamento de home care pleiteado, pois este não integra o rol de serviços obrigatórios do SUS sob gestão estadual, conforme regulamentações federais (Leis 8.080/1990 e 8.124/1990); c) O SAD do SUS já oferece modalidades de atenção domiciliar (AD1, AD2 e AD3), sendo o paciente elegível apenas para SAD-AD1, conforme relatórios técnicos da SESAP; d) A decisão judicial deferiu tratamento não incorporado ao SUS e incompatível com a classificação do caso, violando a eficiência administrativa e gerando custos elevados ao erário; e) O alto custo do tratamento domiciliar requerido e a ausência de previsão orçamentária para o seu custeio reforçam a necessidade de suspensão da medida impugnada, existindo risco de formação de precedentes judiciais que impliquem em ativismo judicial e multiplicação de demandas similares; f) Devem ser observadas na espécie as teses fixadas no Tema 793 do STF, que envolve a repartição de competências no SUS; no Tema 1.033 da mesma Corte, referente ao ressarcimento de despesas com serviços prestados pela rede privada; além da tutela vinculante do Tema 1.234, que trata da legitimidade passiva em demandas envolvendo tratamentos não padronizados pelo SUS; g) Caso mantida a decisão agravada, devem ser impostas contracautelas, como reavaliações periódicas do paciente e comprovação semestral da necessidade do tratamento.
Ao final, requereu a concessão de efeito suspensivo ao agravo para sobrestar a decisão de primeiro grau e, no mérito, que seja a mesma reformada no sentido de indeferir o pleito de home care, com a remessa dos autos ao NAT-JUS para avaliação técnica, análise de quesitos não respondidos e designação de audiência para coleta de provas. É o que importa relatar.
Decido.
A princípio, observo estarem presentes os requisitos de admissibilidade recursal, de forma que conheço deste agravo.
De acordo com a regra inserta no art. 1.019, inciso I, do CPC, o relator do agravo de instrumento pode atribuir efeito suspensivo ao recurso ou lhe conceder efeito ativo, antecipando a própria tutela recursal.
De pronto, ressalto que, para concessão da tutela de urgência de natureza antecipada, deve o postulante demonstrar: (i) a probabilidade do direito; (ii) o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo; e (iii) ausência de perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão, pressupostos esses elencados no art. 300, caput e § 3º, do CPC: Art. 300.
A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. (...) § 3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.
In casu, da leitura dos fundamentos da decisão e dos argumentos do agravo, numa análise perfunctória, não vislumbro, de plano, o preenchimento dos requisitos indispensáveis para a concessão da medida de urgência postulada.
Como se vê nos autos, a parte autora, ora recorrida, ajuizou ação ordinária visando a compelir o Estado do Rio Grande do Norte a fornecer tratamento de home care 24h, argumentando que possui condições clínicas graves, diagnosticadas como microcefalia (CID Q02) e encefalopatia crônica não progressiva (CID G93.4).
Após indeferimento inicial da tutela de urgência, foi realizada perícia médica que concluiu pela necessidade de internação domiciliar.
A perícia constatou que o paciente necessita de suporte técnico contínuo devido ao uso de traqueostomia e sonda nasoenteral, além de estar frequentemente acometido por pneumonias de repetição.
O perito indicou alta complexidade do caso, fundamentado em tabelas técnicas (ABEMID e NEAD), recomendando internação domiciliar para viabilizar alta hospitalar e continuidade do tratamento.
O Estado do Rio Grande do Norte apresentou relatório técnico (SESAP) indicando que o perfil do paciente é compatível com a modalidade SAD-AD1 (atenção domiciliar de baixa complexidade), e não com o home care requerido.
Além disso, alegou que houve nulidade processual, uma vez que seus quesitos periciais não foram considerados sob a justificativa de intempestividade, violando os prazos dobrados aplicáveis à Fazenda Pública (art. 183 do CPC).
Ora, é cediço que tem o Poder Público o dever constitucional de garantir a saúde de todos, "mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação" (art. 196, da CF), preceito também erigido no art. 6.º da Carta Magna como direito e garantia fundamentais do cidadão1.
A Constituição Estadual, de igual modo, tutela o direito à saúde nos seus artigos 8º2 e 1253, assim como a legislação infraconstitucional, através da Lei Federal n.º 8.080/1990, que dispõe sobre as condições para promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências, no seu art. 2º, caput4.
A Lei n.º 8.080/90, alterada pela Lei n.º 10.424/2002, teve acrescido o art. 19-1, §§ 1º, 2º e 3º, estabelecendo no âmbito do SUS o atendimento domiciliar e a internação domiciliar, nos termos a seguir transcritos: Art. 19-I.
São estabelecidos, no âmbito do Sistema Único de Saúde, o atendimento domiciliar e a internação domiciliar. §1º Na modalidade de assistência de atendimento e internação domiciliares incluem-se, principalmente, os procedimentos médicos, de enfermagem, fisioterapêuticos, psicológicos e de assistência social, entre outros necessários ao cuidado integral dos pacientes em seu domicílio. §2º O atendimento e a internação domiciliares serão realizados por equipes multidisciplinares que atuarão nos níveis da medicina preventiva, terapêutica e reabilitadora. §3º O atendimento e a internação domiciliares só poderão ser realizados por indicação médica, com expressa concordância do paciente e de sua família.
Como é cediço, a Atenção Domiciliar no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) se caracteriza como um conjunto de ações de prevenção e tratamento de doenças, reabilitação, paliação e promoção à saúde, prestadas em domicílio, garantindo continuidade de cuidados.
O programa estipula regras específicas de habilitação e normas rígidas de controle, tanto para o repasse de verbas quanto para a fiscalização.
Nesse panorama, a internação domiciliar disponibilizada pelo SUS vem sendo concedida aos usuários em situações excepcionais, quando a internação hospitalar não se mostra adequada ao tratamento, a exemplo dos casos em que há necessidade de ventilação respiratória mecânica, monitoração de cardioscopia, saturometria (oxigenação do sangue) ou PANI (Pressão Arterial Não Invasiva), sonda nasogástrica ou nasoenteral, acompanhamento contínuo (24 horas) por diversas especialidades, etc.
Na situação em apreço, verifica-se pelos documentos acostados, bem como pela fundamentação da decisão recorrida, que o autor, ora recorrido, é uma criança de apenas 8 anos de idade, portadora de microcefalia (CID Q02) e encefalopatia crônica não progressiva (CID G93.4), com uso de sonda nasoenteral para alimentação e traqueostomia, sendo acometido comumente por pneumonia de repetição, o que o leva a recorrentes internações hospitalares.
O caso demanda análise cautelosa por envolver o direito fundamental à saúde, garantido pelo art. 196 da Constituição Federal, e a gestão orçamentária e administrativa do Sistema Único de Saúde (SUS).
A parte agravada, em condição de vulnerabilidade clínica extrema, encontra-se internada em hospital público e não pode receber alta sem o tratamento requerido, conforme atestado por laudo pericial judicial que considerou imprescindível a internação domiciliar com suporte técnico de enfermagem 24 horas.
Embora existam laudos divergentes da SESAP, que recomendam atendimento em nível SAD AD1, a análise do caso exige primazia da necessidade clínica imediata, dado o estado de saúde do infante, a proteção integral que a Constituição Federal lhe assegura e a potencial irreversibilidade de eventual omissão.
Por essa razão, ao mesmo tempo em que é preciso submeter o caso à análise do NAT-JUS para a elaboração de nota técnica específica, com a possibilidade de, no decorrer da instrução, serem solicitados esclarecimentos adicionais ao perito judicial, não vejo, ao menos nesta análise superficial, como suspender os efeitos da decisão ora impugnada, que se encontra amparada no conteúdo da perícia elaborada por expert nomeado pelo Juízo, cuja imparcialidade não parece ser questionada.
Portanto, do atual contexto dos autos, é possível inferir que o paciente não pode permanecer hospitalizado por tempo indefinido, dado o seu delicado quadro de saúde, sendo imperiosa, ao menos até eventual conclusão em sentido diverso, a sua manutenção na modalidade de internação domiciliar.
Essa medida parece ser a mais pertinente nesta fase processual diante do atual contexto probatório, mas nada impede que, a qualquer momento, se constatada a suficiência do serviço disponibilizado pelo ente público na modalidade SAD ou a alteração do estado de saúde do paciente, seja o provimento judicial modificado para contemplar o atendimento menos complexo, a depender eventualmente de novas circunstâncias a serem apreciadas nesta instância ou no primeiro grau de jurisdição.
Ante o exposto, indefiro a medida liminar postulada.
Comunique-se esta decisão ao Juízo a quo.
Intime-se a parte agravada para, querendo, responder aos termos deste recurso, no prazo de 15 (quinze) dias (art. 1.019, II, do CPC).
Preclusa a presente decisão, abra-se vista dos autos à Procuradoria Geral de Justiça para que esta, entendendo pertinente, emita parecer no prazo de 15 (quinze) dias (art. 1.019, III, do CPC).
Após, à conclusão.
Publique-se.
Intime-se.
Cumpra-se.
Natal/RN, data registrada no sistema.
Juíza Convocada MARTHA DANYELLE Relatora -
19/12/2024 10:11
Expedição de Outros documentos.
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19/12/2024 10:10
Expedição de Outros documentos.
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19/12/2024 10:09
Não Concedida a Medida Liminar
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18/12/2024 09:30
Conclusos para decisão
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18/12/2024 09:30
Redistribuído por prevenção em razão de modificação da competência
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17/12/2024 23:20
Determinação de redistribuição por prevenção
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16/12/2024 18:03
Conclusos para decisão
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16/12/2024 18:03
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
18/12/2024
Ultima Atualização
04/04/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Acórdão • Arquivo
Acórdão • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
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