TJRN - 0803156-73.2023.8.20.5126
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Berenice Capuxu
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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19/06/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE SEGUNDA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0803156-73.2023.8.20.5126 Polo ativo JOSEFA MARIA DE OLIVEIRA Advogado(s): GUSTAVO DO NASCIMENTO LEITE, MATHEUS ELPIDIO SALES DE ALMEIDA Polo passivo BANCO BRADESCO S/A Advogado(s): JOSE ALMIR DA ROCHA MENDES JUNIOR EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DE INDÉBITO.
CONTRATAÇÃO DE SERVIÇO BANCÁRIO POR PESSOA ANALFABETA.
AUSÊNCIA DE ASSINATURA A ROGO E DE TESTEMUNHAS.
CONTRATAÇÃO NÃO COMPROVADA.
DESCONTOS INDEVIDOS.
FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO.
DANO MORAL CONFIGURADO.
FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
I.
CASO EM EXAME 1.
Apelação interposta contra sentença que julgou improcedente ação proposta por pessoa analfabeta visando à declaração de inexistência de débito e ressarcimento de valores descontados indevidamente de benefício previdenciário, sob a rubrica “Cesta B.
Expresso2”, além de indenização por danos morais.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.
A controvérsia consiste em determinar: (i) a validade da contratação do serviço bancário diante da condição de analfabeta da parte autora; (ii) a legitimidade dos descontos realizados; (iii) a possibilidade de restituição em dobro do indébito; e (iv) a caracterização de danos morais indenizáveis.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 3.
Aplicáveis as normas do Código de Defesa do Consumidor à relação jurídica em questão, impondo-se a inversão do ônus da prova e a responsabilidade objetiva do fornecedor. 4.
A autora comprovou sua condição de analfabeta e os descontos questionados, cabendo à instituição bancária demonstrar a validade da contratação, o que não foi feito. 5.
O contrato apresentado não observou os requisitos do art. 595 do Código Civil, por não conter assinatura a rogo e assinatura de duas testemunhas, o que o torna inválido. 6.
Diante da ausência de comprovação da contratação válida, os descontos realizados são indevidos, configurando falha na prestação do serviço. 7.
Configurado o desconto indevido sem engano justificável, é devida a restituição em dobro, com base no art. 42, parágrafo único, do CDC. 8.
A indevida retenção de valores de benefício previdenciário de pessoa idosa, analfabeta e hipossuficiente configura abalo moral indenizável, sendo razoável a fixação do quantum em R$ 4.000,00 (quatro mil reais), observados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
IV.
DISPOSITIVO E TESE 9.
Conhecido e provido o recurso para declarar ilegítimos os descontos efetuados sob a rubrica “Cesta B.
Expresso2”, condenar a instituição bancária à restituição em dobro dos valores indevidamente descontados, com correção pela Taxa Selic, e ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais).
Invertida a condenação em custas e honorários sucumbenciais, fixados em 10% sobre o valor da condenação.
Dispositivos relevantes citados: CC, art. 595; CDC, arts. 6º, VIII, 14 e 42, parágrafo único; CPC, arts. 373, II, e 85, § 11.
Jurisprudência relevante citada: TJRN, AC 0800452-56.2021.8.20.5159, Rel.
Des.
Cornélio Alves, Primeira Câmara Cível, julgado em 27/09/2024; TJRN, AC 0802991-17.2022.8.20.5108, Rel.
Desª.
Lourdes de Azevedo, Segunda Câmara Cível, julgado em 27/10/2023; STJ, REsp 1.954.424/PE, Rel.
Min.
Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 07/12/2021.
ACÓRDÃO Acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte em Turma, à unanimidade de votos, conhecer e prover o recurso, nos termos do voto da Relatora.
RELATÓRIO Apelação Cível (Id. 31061194) interposta por JOSEFA MARIA DE OLIVEIRA contra sentença (Id. 31061192) proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Comarca de Santa Cruz/RN que, nos autos da ação em epígrafe, movida em desfavor do BANCO BRADESCO S/A, julgou improcedente o pleito autoral, nos seguintes termos: “Pois bem.
A questão de mérito no presente feito consiste em perquirir se a parte autora formalizou contrato com a parte demandada que permitiria os descontos a título de “CESTA B.
EXPRESSO2”, tendo o réu alegado a validade na contratação do serviço.
Inicialmente, cabe ressaltar que, em que pese a autora alegue ser pessoa sem alfabetização, consta em seu documento de identificação (ID 111014868), a observação 'impossibilitada de assinar', documento este expedido em 20 de abril de 2017, em 2ª via.
Observa-se, ainda, que há assinatura no termo de adesão juntado (ID 113740045), datado de 28 de junho de 2013.
Com efeito, embora o ônus da prova tenha sido invertido, cabe à parte autora demonstrar os fatos constitutivos de seu direito, enquanto ao réu incumbe a prova de fatos extintivos, modificativos ou impeditivos, conforme disposto no artigo 373, I e II, do CPC. (…) Ante o exposto, acolho em parte a preliminar de prescrição suscitada pelo réu em sua contestação e JULGO IMPROCEDENTES os pleitos autorais, resolvendo no mérito o presente feito, com fulcro no art. 487, I, do CPC.
Em razão da sucumbência total, condeno a parte autora ao pagamento de custas processuais e honorários sucumbenciais, estes no patamar de 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, restando a exigibilidade suspensa pelo prazo de 05 (cinco) anos (art. 98, § 3º, CPC).” Em suas razões, alegou que moveu a presente ação visando a “anulação de cobranças sob a rubrica “Cesta b.
Expresso2” e, por consequência legal, o ressarcimento dos valores cobrados de forma indevida em seu benefício previdenciário, bem como condenação da Instituição Financeira promovida ao pagamento de indenização de cunho moral”.
Destacou que a parte adversa desconsiderou o fato da autora ser analfabeta e “anexou um suposto termo de adesão” e que apesar de não observados os requisitos do art. 595 do Código Civil, a sentença, equivocadamente, julgou improcedente o pleito autoral.
Portanto, requereu, o conhecimento e provimento do recurso para reformar a sentença, julgando totalmente procedente o pleito autoral.
Preparo dispensado em razão da gratuidade judiciária concedida no primeiro grau.
Sem contrarrazões conforme certidão de decurso de prazo (Id. 31061197).
O Ministério Público declinou apresentação de parecer no feito (Id. 31271172). É o relatório.
VOTO Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço dos recursos.
Cinge-se a demanda recursal em verificar a validade de contrato de Tarifa Bancária sob a rubrica de “CESTA B EXPRESSO”, que a parte autora, analfabeta, alegou, na exordial, não ter contratado com o banco réu.
Primeiramente, é de se esclarecer que, no caso dos autos, tem-se por aplicável os dispositivos emanados do Código de Defesa do Consumidor – CDC, haja vista tratar-se de relação jurídico-material em que de um lado a ré figura como fornecedora de serviços, e do outro a autora e se apresenta como sua destinatária.
Nessa toada, o Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 14, estabeleceu a responsabilidade civil objetiva dos fornecedores de serviços, na qual, uma vez ocorrido o dano, será investigado tão somente o nexo de causalidade, inexistindo, portanto, aferição de culpa.
Insta consignar, também, que se aplicam ao caso os dispositivos emanados do Código de Defesa do Consumidor, de modo que essa espécie de relação processual impõe, como regra, a inversão do ônus probatório, nos termos do artigo 6º, inciso VIII, do citado diploma legal.
Na espécie, a demandante negou veementemente que tenha contratado a produto “CESTA B EXPRESS02”, enquanto a instituição bancária, alegou o contrário e demonstrou a avença, com uma suposta assinatura da parte, sem a presença de qualquer documentação da parte ou presença de testemunhas (Id. 31061171).
Pois bem.
O Código de Processo Civil estabelece, no artigo 373, incisos I e II, o seguinte: “Art. 373.
O ônus da prova incumbe: I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito; II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.” Em atenção aos preceitos do art. supracitado, observo que a autora, pessoa idosa de 84 (oitenta e quatro) anos de idade, aposentada, pensionista de 1 (um) salário mínimo mensal e residente em área rural de pequeno município interiorano (Japi/RN), cumpriu em comprovar a sua condição de analfabeta (documento pessoal Id. 31057760) e a cobrança da Tarifa questionada (extrato bancário de Id. 31057759), cabendo ao réu, então, demonstrar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo de tal direito.
Analisando o caderno processual, na tentativa de desconstituir o direito da autora, o banco réu juntou cópia do contrato (Id. 31061171), com a suposta assinatura da parte autora, desacompanhado de qualquer documento pessoal desta, tampouco, considerando o alegado desde a exordial quanto a qualidade de analfabeta da autora, a assinatura a rogo na presença de duas testemunhas no termo apresentado, como preleciona o art. 595 do CC: “Art. 595.
No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas.” Dessa forma, ao examinar o caso, entendo que o contrato firmado não obedeceu às formalidades legais exigidas para uma pessoa analfabeta, configurando, assim, falha na prestação do serviço.
Por isso, mantenho a devolução dos valores em dobro e a condenação por danos morais. É como vem decidindo esta Corte de Justiça: “EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
AÇÃO ORDINÁRIA.
SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.
DESCONTOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
CONTRATAÇÃO REALIZADA POR PESSOAL ANALFABETA SEM ESCRITURA PÚBLICA.
DESNECESSIDADE.
AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL.
ASSINATURA A ROGO COMPROVADA E SUBSCRITA POR DUAS TESTEMUNHAS.
OBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS TRAZIDOS PELO ART. 595 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002.
AUSÊNCIA DE FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.
INEXISTENTE DEVER DE INDENIZAR.
PRECEDENTES DESTA CÂMARA CÍVEL E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
CONDENAÇÃO DA PROMOVENTE EM LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ.
ADEQUAÇÃO.
ELEMENTOS DOS AUTOS QUE DEMONSTRAM A ALTERAÇÃO DA VERDADE DOS FATOS PELA DEMANDANTE.
INTELIGÊNCIA DO ART. 80, INCISO II, DO CPC.
MULTA APLICADA EM OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE.
AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL PARA PARCELAMENTO DA PENALIDADE.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.” (APELAÇÃO CÍVEL, 0800452-56.2021.8.20.5159, Des.
Cornélio Alves, Primeira Câmara Cível, JULGADO em 27/09/2024, PUBLICADO em 30/09/2024) “CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
JULGAMENTO DE IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NÃO RECONHECIDO.
INSTRUMENTO NEGOCIAL APRESENTADO PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
AUTENTICIDADE DA ASSINATURA CONSTATADA ATRAVÉS DE PERÍCIA GRAFOTÉCNICA.
VALIDADE DA RELAÇÃO JURÍDICA.
AUSÊNCIA DE DEFEITO NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.
DESCONTOS LEGÍTIMOS.
EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO.
PLEITO DE EXCLUSÃO DA CONDENAÇÃO EM LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ.
REJEIÇÃO.
ELEMENTOS DOS AUTOS QUE DEMONSTRAM A ALTERAÇÃO DA VERDADE DOS FATOS PELA PARTE AUTORA.
INTELIGÊNCIA DO ART. 80, INCISO II, DO CPC.
REDUÇÃO DO PERCENTUAL APLICADO EM OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE.
REFORMA DA SENTENÇA NESSE PARTICULAR.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.” (APELAÇÃO CÍVEL, 0800305-14.2022.8.20.5153, Des.
Cornélio Alves, Primeira Câmara Cível, JULGADO em 02/03/2024, PUBLICADO em 04/03/2024) Assim sendo, competia à empresa apelada o ônus de comprovar suas alegações, trazendo aos autos elementos capazes de demonstrar que a dívida foi efetivamente originada pela parte adversa, o que não o fez com êxito.
Portanto, o Banco não demonstrou que os ajustes tenham sido celebrados de forma válida, não se desincumbindo do ônus que lhe cabia conforme o art. 373, II, CPC, corroborando a tese de que os descontos efetuados se deram de forma indevida.
Dessa forma, restando comprovado que os descontos realizados na conta bancária da autora foram indevidos, sem a devida comprovação da contratação válida do serviço, a sentença deve ser reformada para determinar a restituição em dobro dos valores descontados, nos termos do artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor.
Nesse sentido: “EMENTA: CONSUMIDOR.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS.
SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA.
APELAÇÃO CÍVEL.
CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO.
DESCONTOS INDEVIDOS.
JUNTADA DOS INSTRUMENTOS CONTRATUAIS.
RELAÇÃO NEGOCIAL NÃO COMPROVADA PELA PARTE RÉ.
RESPONSABILIDADE DA FINANCEIRA.
FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.
CONSUMIDOR ANALFABETO.
AUSÊNCIA DE ASSINATURA A ROGO, NA PRESENÇA DE DUAS TESTEMUNHAS.
NULIDADE.
DESCUMPRIMENTO DA FORMA PREVISTA NO ARTIGO 595 DO CÓDIGO CIVIL.
DESCONSTITUIÇÃO DOS DÉBITOS.
INOBSERVÂNCIA À NORMA DE REGÊNCIA.
DEVOLUÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO.
INCIDÊNCIA DO ARTIGO 42 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
DANO MORAL CONFIGURADO.
QUANTUM INDENIZATÓRIO QUE DEVE SER FIXADO EM OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE.
EXISTÊNCIA DE OUTRAS DEMANDAS SEMELHANTES OBJETIVANDO DANOS MORAIS CONTRA A MESMA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
VALOR DA INDENIZAÇÃO QUE DEVE SER COMPATÍVEL COM AS PROVAS DOS AUTOS.
REDUÇÃO DO QUANTUM.
SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.
APELO DO RÉU CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE.
RECURSO ADESIVO CONHECIDO E DESPROVIDO.
I - "Os analfabetos podem contratar, porquanto plenamente capazes para exercer os atos da vida civil, mas expressam sua vontade de forma distinta. 3.
A validade do contrato firmado por pessoa que não saiba ler ou escrever não depende de instrumento público, salvo previsão legal nesse sentido. 4.
O contrato escrito firmado pela pessoa analfabeta observa a formalidade prevista no art. 595 do CC/02, que prevê a assinatura do instrumento contratual a rogo por terceiro, com a firma de duas testemunhas.” (REsp n. 1.954.424/PE, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 7/12/2021, DJe de 14/12/2021.) (APELAÇÃO CÍVEL, 0801236-65.2021.8.20.5116, Des.
Amaury Moura Sobrinho, Terceira Câmara Cível, JULGADO em 19/07/2024, PUBLICADO em 19/07/2024) “EMENTA: CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS.
SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTE A PRETENSÃO AUTORAL.
DESCONTOS INDEVIDOS NOS PROVENTOS DA AUTORA/APELANTE.
ELEMENTOS DOS AUTOS QUE EVIDENCIAM A EXISTÊNCIA DE FRAUDE.
CONSUMIDORA ANALFABETA.
CONTRATO DE ABERTURA DE CONTA CELEBRADO ATRAVÉS DE INSTRUMENTO PARTICULAR, SEM A SUBSCRIÇÃO VÁLIDA DE TESTEMUNHAS.
NULIDADE RECONHECIDA.
DESCONSTITUIÇÃO DA DÍVIDA QUE SE MOSTRA DEVIDA.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO.
CABIMENTO.
APLICAÇÃO DO ARTIGO 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
DANO MORAL CONFIGURADO.
FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO.
CABIMENTO, OBSERVADOS OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE, BEM COMO OS PRECEDENTES DESTA CORTE.
APELO CONHECIDO E PROVIDO PARCIALMENTE.” (APELAÇÃO CÍVEL, 0802991-17.2022.8.20.5108, Desª.
Lourdes de Azevedo, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 27/10/2023, PUBLICADO em 01/11/2023) Quanto à indenização por danos morais, considerando que o banco juntou um contrato com assinatura de pessoa analfabeta, há de ser reconhecida a conduta fraudulenta da instituição financeira ao falsificar assinatura de pessoa que sequer sabe assinar o próprio nome e os parâmetros jurisprudenciais para situações análogas, entendo razoável e proporcional fixar o valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) como suficiente e cumpre com a função punitivo pedagógica da sanção em desfavor do banco.
Nesse sentido, a jurisprudência desta Corte: “EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL.
DIREITO DO CONSUMIDOR.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS.
SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.
IRRESIGNAÇÃO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO.
AUTOR ANALFABETO.
ART. 595 DO CÓDIGO CIVIL.
AUSÊNCIA DE OBSERVÂNCIA.
FRAUDE COMPROVADA.
FALSIFICAÇÃO DE ASSINATURA DE UMA DAS TESTEMUNHAS E AUSÊNCIA DE CONFIRMAÇÃO DA BIOMETRIA DO AUTOR.
NULIDADE DO CONTRATO.
RESTITUIÇÃO EM DOBRO DOS VALORES DESCONTADOS.
DANOS MORAIS CONFIGURADOS.
QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO EM R$5.000,00 (CINCO MIL REAIS).
SENTENÇA MANTIDA.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.I.
Caso em exame1.
Trata-se de Apelação Cível interposta contra sentença que julgou procedente o pedido formulado na ação declaratória de inexistência de relação jurídica c/c repetição de indébito e indenização por danos morais.2.
O autor, pessoa analfabeta e idosa, alegou jamais ter contratado cartão de crédito consignado com o banco, embora fossem realizados descontos mensais em seu benefício previdenciário.3.
O Juízo de origem reconheceu a nulidade do contrato, determinou a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente e fixou indenização por dano moral em R$5.000,00 (cinco mil reais), além da cessação dos descontos.II.
Questão em discussão4.
A questão em discussão consiste em:(i) Saber se há relação jurídica válida entre o autor e o banco apelante, diante da alegada contratação de cartão de crédito consignado por pessoa analfabeta.(ii) Verificar a regularidade formal da contratação frente ao disposto no art. 595 do Código Civil, considerando-se a condição de analfabeto do autor.(iii) Avaliar a ocorrência de fraude na contratação, especialmente no tocante à falsificação de assinatura e ausência de comprovação da digital atribuída.(iv) Determinar se estão presentes os pressupostos para a repetição em dobro do indébito e a indenização por dano moral, bem como a adequação do valor fixado.III.
Razões de decidir5.
Laudo pericial grafotécnico comprovou a falsificação da assinatura de testemunha no contrato apresentado, comprometendo sua autenticidade.6.
Perícia datiloscópica atestou que a digital constante do contrato não corresponde ao autor, o que evidencia a fraude na contratação.7.
O autor, sendo analfabeto, carecia de assistência de duas testemunhas ou de procuração pública, nos termos do art. 595 do Código Civil, o que não foi observado.8.
Restando configurada a fraude e a ausência de relação jurídica válida, impõe-se a restituição em dobro dos valores descontados com base no art. 42, parágrafo único, do CDC.9.
A indevida redução de benefício previdenciário por longo período a pessoa idosa e vulnerável caracteriza dano moral indenizável, tendo o valor arbitrado se mostra razoável e proporcional.IV.
Dispositivo e tese10.
Recurso conhecido e desprovido.
Sentença mantida.Tese de julgamento:"1. É nulo o contrato bancário firmado por pessoa analfabeta sem o cumprimento das formalidades previstas no art. 595 do Código Civil.""2.
Configurada a fraude na contratação por falsificação de assinatura e ausência de identificação biométrica, impõe-se a declaração de inexistência de relação jurídica.""3.
A cobrança indevida de valores autoriza a restituição em dobro, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC.""4.
A indevida retenção de valores de benefício previdenciário justifica a condenação por danos morais."Dispositivos relevantes citados: Código Civil: art. 595, Código de Defesa do Consumidor: arts. 6º, 14, 42, parágrafo único e Código de Processo Civil: arts. 373, I e II; 85, § 11.Jurisprudência relevante citada: AC, 0800310-71.2023.8.20.5130, Desª.
Berenice Capuxú, Segunda Câmara Cível, j. em 21/02/2025, p. em 24/02/2025 e AC, 0801510-13.2022.8.20.5110, Desª.
Lourdes de Azevedo, Segunda Câmara Cível, j. em 07/02/2025, p. em 07/02/2025. (APELAÇÃO CÍVEL, 0803913-39.2023.8.20.5103, Des.
BERENICE CAPUXU DE ARAUJO ROQUE, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 25/04/2025, PUBLICADO em 28/04/2025)” “EMENTA: CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÕES CÍVEIS.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CONTRATAÇÃO DE RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) E INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, REPETIÇÃO DO INDÉBITO E PEDIDO DA TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA.
SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.
EXAME EM CONJUNTO DAS INSURGÊNCIAS.
PREJUDICIAIS DE MÉRITO SUSCITADAS PELO BANCO: PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA.
REJEIÇÃO.
RELAÇÃO DE TRATO SUCESSIVO.
MÉRITO: CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO.
DESCONTOS EM APOSENTADORIA DE IDOSO HIPOSSUFICIENTE.
RELAÇÃO CONSUMERISTA.
SÚMULA 297 DO STJ.
INSTRUMENTO CONTRATUAL APRESENTADO NOS AUTOS.
IMPUGNAÇÃO EXPRESSA DA ASSINATURA APOSTA NO NEGÓCIO JURÍDICO.
PERÍCIA GRAFOTÉCNICA ATESTANDO A INAUTENTICIDADE DA ASSINATURA.
FRAUDE CONSTATADA.
RELAÇÃO JURÍDICA NÃO COMPROVADA.
DESCONTOS ILEGÍTIMOS.
RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO.
VIABILIDADE.
ARTIGO 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC.
DANOS MORAIS CONFIGURADOS.
POSSIBILIDADE DE MAJORAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO EM SENTENÇA.
ENTENDIMENTO DESTE TJRN EM CASOS SIMILARES.
RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA CONHECIDO E DESPROVIDO.
APELO DA PARTE AUTORA CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE.
I.
CASO EM EXAME 1.
Apelações Cíveis interpostas pela autora e pela instituição financeira em face de sentença que julgou parcialmente procedente a ação, determinando: (i) declaração de inexistência da relação jurídica; (ii) devolução em dobro dos valores descontados indevidamente; e (iii) fixação de danos morais no valor de R$ 2.000,00.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.
A controvérsia recursal consiste em: (i) reconhecimento da prescrição ou decadência; (ii) exclusão da condenação em danos morais e repetição do indébito pela instituição financeira; e (iii) possibilidade de majoração ou redução do quantum indenizatório por danos morais.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 3.
Afasta-se a alegação de prescrição, aplicando-se o prazo quinquenal, conforme art. 27 do CDC, considerando prescritas apenas as parcelas anteriores a 03/11/2017. 4.
A decadência não se aplica ao caso, dado o caráter continuado da prestação de serviços, possibilitando a discussão enquanto o contrato estiver em vigor. 5.
Comprovada a fraude na assinatura do contrato por perícia grafotécnica, resta configurada a inexistência de relação jurídica entre as partes. 6.
A responsabilidade objetiva da instituição financeira, nos termos do art. 14 do CDC, impõe o dever de restituir em dobro os valores descontados indevidamente, conforme art. 42, parágrafo único, do CDC, além de responder pelos danos morais causados à autora. 7.
Majorado o quantum indenizatório para R$ 4.000,00 (quatro mil reais), observados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade e precedentes desta Corte.
IV.
DISPOSITIVO E TESE 8.
Negado provimento ao recurso da instituição financeira e dado parcial provimento ao recurso da autora, reformando a sentença apenas para majorar o valor da indenização por danos morais para R$ 4.000,00 (quatro mil reais).
Tese de julgamento: "1.
A prescrição quinquenal do art. 27 do CDC se aplica às relações de consumo, não havendo decadência para serviços continuados." "2.
Comprovada a fraude em contrato de cartão de crédito consignado, é devida a restituição em dobro dos valores indevidamente descontados, nos termos do art. 42 do CDC." "3.
A indenização por danos morais deve observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando as peculiaridades do caso concreto." Dispositivos relevantes citados: Código de Defesa do Consumidor, arts. 6º, VIII, 14, 27 e 42; Código Civil, art. 178, II; Código de Processo Civil, art. 85, §11º.
Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula 479.
TJRN, Apelação Cível, 0801157-68.2022.8.20.5143, Rel.
Desª.
Lourdes de Azevedo, julgado em 28/07/2023.
TJRN, Apelação Cível, 0800509-90.2022.8.20.5110, Rel.
Desª.
Maria Zeneide, julgado em 28/06/2023. (APELAÇÃO CÍVEL, 0801510-13.2022.8.20.5110, Desª.
Lourdes de Azevedo, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 07/02/2025, PUBLICADO em 07/02/2025)” - grifei Quanto à restituição, entendo que deve ser aplicada a modalidade dobrada, posto que o art. 42, parágrafo único da Lei nº 8.079/1990 (Código de Defesa do Consumidor) é claro ao estabelecer que o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito por valor igual ao dobro que pagou em excesso acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável, e, no presente, diante de tudo que foi narrado, caso não há que se falar em equívoco passível de justificativa, restando configurada, ainda, o ato contrário à boa-fé objetiva do banco, na medida que se aproveitou da ignorância da vítima para cobrar produtos em desacordo à legislação consumerista e forjou uma assinatura de uma pessoa analfabeta.
Quanto à incidência da correção monetária e juros do dano material entendo inviável a reforma do decisum para aplicação do artigo 405 do Código Civil: “contam-se os juros de mora desde a citação inicial”; súmula 43 STJ: “Incide correção monetária sobre dívida por ato ilícito a partir da data do efetivo prejuízo.” Por todo o exposto, conheço e dou provimento ao apelo para reconhecer ilegítimos os descontos da tarifa bancária com a condenação da parte ré em providenciar a exclusão da cobrança, a restituição em dobro do indébito e a indenização por danos morais no valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), atualizados pela Taxa Selic.
Em virtude do pleito da autora julgado procedente nessa via recursal, inverto a condenação das custas processuais e honorários advocatícios no patamar de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação a ser suportado pelo banco. É como voto.
Desembargadora BERENICE CAPUXÚ RELATORA Natal/RN, 9 de Junho de 2025. -
28/05/2025 00:00
Intimação
Poder Judiciário do Rio Grande do Norte Por ordem do Relator/Revisor, este processo, de número 0803156-73.2023.8.20.5126, foi pautado para a Sessão VIRTUAL (Votação Exclusivamente PJe) do dia 09-06-2025 às 08:00, a ser realizada no 2ª CC Virtual (Votação Exclusivamente PJE).
Caso o processo elencado para a presente pauta não seja julgado na data aprazada acima, fica automaticamente reaprazado para a sessão ulterior.
No caso de se tratar de sessão por videoconferência, verificar o link de ingresso no endereço http://plenariovirtual.tjrn.jus.br/ e consultar o respectivo órgão julgador colegiado.
Natal, 27 de maio de 2025. -
21/05/2025 12:57
Conclusos para decisão
-
21/05/2025 12:06
Juntada de Petição de outros documentos
-
20/05/2025 09:38
Expedição de Outros documentos.
-
20/05/2025 09:00
Proferido despacho de mero expediente
-
12/05/2025 11:41
Recebidos os autos
-
12/05/2025 11:41
Conclusos para despacho
-
12/05/2025 11:41
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
12/05/2025
Ultima Atualização
16/06/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
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