TJRN - 0101087-50.2017.8.20.0105
1ª instância - 2ª Vara da Comarca de Macau
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Polo Passivo
Partes
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
-
10/07/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE Gab.
Des.
Glauber Rêgo no Pleno Ação Penal nº 0101087-50.2017.8.20.0105 (mesmo nº de origem) Autor: Ministério Público Estadual Réus: Auricélio dos Santos Teixeira e outros Rel.
Desembargador Glauber Rêgo DECISÃO Cuida-se de Ação Penal ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte, por meio da 1ª Promotoria de Justiça da Comarca de Macau, em face de Auricélio dos Santos Teixeira e outros, imputando-lhes a prática de crimes relacionados à realização de serviços de decoração entre junho de 2009 e maio de 2012 (São João/2009, Dia das Crianças/2009, Natal/2009, Carnaval/2012, Carnaval/2012, Paixão de Cristo/2012 e Emancipação Política/2012), no Município de Guamaré/RN, fato integrante da denominada “Operação Máscara Negra” (Id. 31522032).
A denúncia foi autuadaa em 06/06/2017 e recebida em 26/05/2020 (Id. 31522275 - Pág. 1), tendo a ação penal tramitado em primeiro grau, sob a jurisdição da Vara competente da Comarca de Macau.
A etapa de resposta à acusação continua pendente Em 12/05/2025, foi expedido ato ordinatório (Id. 31522312) para manifestação do Ministério Público à luz do novo entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do HC nº 232.627/DF, concernente à subsistência da prerrogativa de foro mesmo após o término do mandato.
Em resposta, o parquet pugnou pelo reconhecimento da competência originária deste Tribunal, em razão dos fatos narrados terem sido praticados durante o mandato de Auricélio dos Santos (Id. 31522313 - 26/05/2025)).
O Magistrado da 2ª Vara da Comarca de Macau acolheu, prontamente, o pleito ministerial e, em 27/05/2025, determinou a remessa dos autos ao Tribunal de Justiça (Id. 31522314), promovendo a retirada do processo da instância de origem, autuado neste grau de jurisdição sob o nº 0101087-50.2017.8.20.0105 e distribuído por sorteio a esta Relatoria Pois bem.
Como se vê, a presente ação penal tem origem na apuração de fatos atribuídos a agentes público (á época) e particulares envolvidos na contratação de serviços de decoração no Município de Guamaré (periódo compreendido entre junho de 2009 e maio de 2012).
Importante registrar que o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte já havia declinado de sua competência originária para o primeiro grau de jurisdição, especificamente no bojo da Interceptação Telefônica nº 0000811-84.2012.8.20.0105 (antigo nº físico 2012.000999-5), em 04 de junho de 2012, no contexto da Operação Máscara Negra, reconhecendo que os atos investigatórios e processuais deveriam tramitar perante o juízo de primeira instância.
A denúncia foi manejada e recebida em momento em que vigorava a jurisprudência firmada no STF, a qual restringia o foro por prerrogativa de função aos casos em que o acusado se encontrava no exercício do cargo público ao tempo do processamento da ação penal. À luz desse entendimento, o trâmite da presente ação penal se deu, corretamente, na primeira instância, inclusive com atos processuais válidos praticados, como o recebimento da denúncia, citação dos acusados e apresentação de respostas à acusação.
Em março de 2025, o Supremo Tribunal Federal proferiu novo entendimento no julgamento do HC 232.627/DF e da Questão de Ordem no Inquérito 4787, reconhecendo que a prerrogativa de foro subsiste mesmo após o término do mandato, desde que o delito tenha sido praticado no exercício do cargo e em razão das funções.
Contudo, houve expressa modulação dos efeitos da nova interpretação, conferindo-lhe eficácia ex nunc, ou seja, aplicável apenas aos casos que ainda não tivessem a competência definitivamente definida, como se observa do julgado publicado em em 27 de maio de 2025.
Nessa ocasião, o Pleno do STF fixou o entendimento de que: Ementa: Direito Constitucional e Processual Penal.
Abrangência do foro por prerrogativa de função.
Revisitação do tema.
Fixação do entendimento de que a prerrogativa de foro para julgamento de crimes praticados durante o exercício do cargo e em razão das funções subsiste mesmo após o afastamento do cargo, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados depois de cessado seu exercício.
I.
Caso em exame 1.
Questão de ordem suscitada nos autos de inquérito instaurado sob supervisão desta Corte para apurar envolvimento de ex-parlamentar em supostos delitos funcionais. 2.
Fato relevante.
Segundo a autoridade policial, os fatos investigados teriam ocorrido durante o exercício do cargo e em razão dele.
Porém, diante do encerramento do mandato, o eminente Ministro Relator decidiu encaminhar os autos para o juízo de primeiro grau.
II.
Questão em discussão 3.
A questão em discussão consiste em saber se a competência dos Tribunais para julgamento de crimes cometidos no cargo e em razão das funções prevalece mesmo depois de cessado seu exercício.
III.
Razões de decidir 4.
Oportunidade para que a Corte aprimore a orientação em vigor, a partir do raciocínio e dos critérios utilizados pela corrente vencedora na AP 937-QO: a interpretação de que o foro especial deve ser concebido e aplicado em vista da natureza do crime praticado pelo agente, e não de critérios temporais relacionados ao exercício atual do mandato. 5.
A doutrina aponta para o duplo escopo do foro especial: de um lado, evitar pressões externas sobre o órgão julgador e, de outro, proteger a dignidade de determinados cargos públicos, garantindo tranquilidade e autonomia ao seu titular.
São duas perspectivas que, reunidas, servem de justificação para a prerrogativa de foro.
Uma é a contraface da outra.
Por isso, Victor Nunes Leal falava em “uma garantia bilateral, garantia contra e a favor do acusado”. 6.
Esses fundamentos mostram que o foro especial serve a propósitos virtuosos: manter a estabilidade das instituições democráticas e preservar o funcionamento do Estado.
Tal justificação contribui, ainda, para rechaçar aleivosias semeadas contra a sua manutenção pela Constituição de 1988.
Desmente a falsa crença de que o foro especial constitui privilégio incompatível com o regime republicano e que serviria apenas para blindar a classe política.
Como prerrogativa do cargo, o foro especial contribui para o equilíbrio e a harmonia entre os Poderes e para a eficiente condução dos negócios públicos. 7.
Até por se tratar de prerrogativa do cargo, e não de privilégio pessoal, o foro privativo para atos cometidos no exercício das funções deve subsistir mesmo após a cessão do exercício funcional.
Afinal, a saída do cargo não ofusca as razões que fomentam a outorga de competência originária aos Tribunais.
O que ocorre é justamente o contrário. É nesse instante que adversários do ex-titular da posição política possuem mais condições de exercer influências em seu desfavor, e a prerrogativa de foro se torna mais necessária para evitar perseguições e maledicências. 8.
Há mais.
A subsistência do foro especial, após a cessação das funções, também se justifica pelo enfoque da preservação da capacidade de decisão do titular das funções públicas.
Se o propósito da prerrogativa é garantir a tranquilidade necessária para que o agente possa agir com brio e destemor, e tomar decisões, por vezes, impopulares, não convém que, ao se desligar do cargo, as ações penais contra ele passem a tramitar no órgão singular da justiça local, e não mais no colegiado que, segundo o legislador, reúne mais condições de resistir a pressões indevidas. 9.
O entendimento atual também causa flutuações de competência no decorrer de causas criminais e traz instabilidade para o sistema de Justiça.
Ele abre uma brecha que permite a alteração da competência pela vontade do acusado.
O parlamentar pode, por exemplo, renunciar antes da fase de alegações finais, para forçar a remessa dos autos a um juiz que, aos seus olhos, é mais simpático aos interesses da defesa. 10.
Afora o declínio de competência por ato voluntário do agente, as vicissitudes da vida política podem acarretar abrupta cessação do foro privativo.
Tome-se como exemplo o Senador que, ao fim do mandato, é eleito para o cargo de Deputado Federal, ou vice-versa.
Ou, ainda, do Vice-Presidente que assume o cargo de Presidente da República, depois da renúncia do titular.
A aplicação da tese firmada na AP 937-QO, sem qualquer temperamento, importaria a remessa dos inquéritos e ações para a primeira instância, e o acusado ficaria exposto aos riscos que a lei quis conter ao estabelecer o foro especial.
O equívoco é tão grande que o Plenário foi obrigado a relativizar a regra geral para estabelecer que a prerrogativa de foro subsiste quando o parlamentar federal é eleito, sem interrupção do mandato, para a outra Casa Legislativa (Inq. 4342-Q O, Rel.
Min.
Edson Fachin, DJe 13.6.2022). 11. É necessário avançar no tema, para estabelecer um critério geral mais abrangente, focado na natureza do fato criminoso, e não em elementos que podem ser manobrados pelo acusado (permanência no cargo).
A proposta apresentada atende a essa finalidade.
Preservados os aspectos centrais do entendimento firmado na AP 937-QO, ela estabiliza o foro para julgamento de crimes praticados no exercício do cargo e em razão dele, ao mesmo tempo que depura a instabilidade do sistema e inibe deslocamentos que produzem atrasos, ineficiência e, no limite, prescrição.
IV.
Dispositivo e tese 12.
Questão de ordem resolvida para alterar o entendimento em vigor sobre o foro privativo.
Aplicação imediata aos processos e inquéritos em curso, com a ressalva dos atos praticados pelo STF e pelos demais Juízos com base na jurisprudência anterior.
Tese de julgamento: a prerrogativa de foro para julgamento de crimes praticados no cargo e em razão das funções subsiste mesmo após o afastamento do cargo, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados depois de cessado seu exercício. _________ Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 53, §1º.
Jurisprudência relevante citada: Súmula 394; Inq. 687-QO, Rel.
Min.
Sydney Sanches; AP 937-QO, Rel.
Min.
Roberto Barroso. (STF - Inq 4787 AgR-QO, Relator(a): GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 12-03-2025, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 26-05-2025 PUBLIC 27-05-2025) Como se vê, apesar da modificação interpretativa, a Suprema Corte determinou que os efeitos da nova orientação são ex nunc, ou seja, prospectivos, com aplicação imediata somente aos feitos em curso nos quais ainda não tenha havido deliberação consolidada sobre a competência.
Ou seja, a modulação constou expressamente do voto do relator, Min.
Gilmar Mendes, como forma de assegurar estabilidade processual e evitar modificações de competência que possam comprometer a efetividade da jurisdição penal.
Aliás, essa diretriz foi observada com deslevo pelo eminente Min.
Og Fernandes no julgamento da Ação Penal nº 1086, em decisão publicada aos 14/04/2025, a qual reproduz a lógica e os efeitos da modulação.
Senão vejamos: “O Juízo da 3ª Vara Criminal de Palmas/TO determinou a remessa da presente ação penal ao Superior Tribunal de Justiça, fundamentando-se na seguinte tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do HC 232.627: "a prerrogativa de foro para julgamento de crimes praticados no cargo e em razão das funções subsiste mesmo após o afastamento do cargo, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados depois de cessado seu exercício" (fls. 1.606-1.607).
Ocorre que o voto do relator Ministro Gilmar Mendes, acolhido por maioria, propôs a seguinte modulação: Proponho a aplicação imediata da nova interpretação aos processos em curso, com a ressalva de todos os atos praticados pelo STF e pelos demais Juízos com base na jurisprudência anterior.
A ressalva segue a mesma fórmula utilizada nas questões de ordem suscitadas no Inq. 687, Rel.
Min.
Sydney Sanches, e na AP 937, Rel.
Min.
Roberto Barroso.
A ressalva apontada pelo Ministro relator do HC 232.627 busca preservar os atos jurisdicionais já praticados, evitando sucessivas modificações de competência, que causam desordem e instabilidade no sistema de Justiça, consequências indesejadas expressamente mencionadas no voto vencedor.
Não é por outra razão que o Ministro Gilmar Mendes destaca que a "ressalva segue mesma fórmula utilizada nas questões de ordem suscitadas no Inq. 687, Rel.
Min.
Sydney Sanches, e na AP 937, Rel.
Min.
Roberto Barroso".
Com efeito, na Questão de Ordem no Inq 687, relatoria do Ministro Sydney Sanches, o acórdão do julgamento registra: Decidiu-se, ainda, por unanimidade, que continuam válidos todos os atos praticados e decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, com base na Súmula n. 394, enquanto vigorou. É dizer, a presente decisão tem efeito "ex nunc" Em outras palavras, ao produzir apenas efeitos prospectivos (ex nunc), o novo entendimento se aplica às novas hipóteses de cessação do exercício do cargo - ainda que observadas em processos já em curso -, mas não nos casos em que já houve a consolidação da modificação da competência jurisdicional.
Ante o exposto, em cumprimento à decisão do Supremo Tribunal Federal no HC 232.627, determino o retorno dos autos ao Juízo da 3ª Vara Criminal de Palmas/TO para regular processamento.
Ciência ao Ministério Público Federal.
Cumpra-se” (STJ - APn n. 1.086, Ministro Og Fernandes, J. 10/04/25 - DJEN de 14/04/2025.) A propósito, o caráter ex nunc da nova interpretação foi novamente reconhecido e reiterado expressamente e, de forma monocrática, pelo Min.
Gilmar Mendes no julgamento do HC 254.626/SE (j. 28/04/2025 - p. 30/04/2025), conforme excerto: “(...) No julgamento do HC 232.627/DF, do qual fui Relator, ponderei que a prerrogativa de foro assegura a certos agentes o direito de serem julgados por órgãos específicos do Poder Judiciário, afastando as regras comuns de competência em matéria penal, cujo objetivo é preservar o interesse da sociedade no sentido de que esses agentes possam exercer livremente suas funções, protegidos contra pressões indevidas, com ampla autonomia.
Destaquei as oscilações jurisprudenciais sobre a abrangência do instituto, definindo a extensão do foro especial ora pela natureza do delito (contemporaneidade e pertinência temática), ora pelo exercício atual de funções públicas (atualidade), que, a meu ver, traduz o propósito do art. 53, §1º, da Constituição de 1988 (“Os Deputados e Senadores, desde a expedição do diploma, serão submetidos a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal”).
Enfatizei que o entendimento até então prevalecente, firmado no julgamento da AP 937-QO, Rel.
Min.
Roberto Barroso, DJe 11.12.2018, no sentido de que a prerrogativa de foro deve ser limitada aos crimes praticados no cargo e em razão do cargo, reduz indevidamente o alcance da prerrogativa de foro, distorcendo seus fundamentos e frustrando o atendimento dos fins perseguidos pelo legislador.
Ele também é contraproducente, por causar flutuações de competência no decorrer das causas criminais e por trazer instabilidade para o sistema de Justiça.
Ora, a diplomação do parlamentar, sozinha, não justifica a remessa dos autos para os Tribunais.
O encerramento do mandato também não constitui razão para o movimento contrário – retorno dos autos para a primeira instância.
No voto por mim proferido, sustentei que a interpretação do foro especial deve ser concebida e aplicada em vista da natureza do crime praticado pelo agente, e não de critérios temporais relacionados ao exercício atual do mandato.
Daí a necessidade de estabelecer um critério geral mais abrangente, focado na natureza do fato criminoso, e não em elementos que podem ser manobrados pelo acusado (permanência no cargo), preservando os aspectos centrais do entendimento firmado na AP 937-QO.
Diante desse quadro, propus, no julgamento do HC 232.627/DF, a fixação da seguinte tese: a prerrogativa de foro para julgamento de crimes praticados no cargo e em razão das funções subsiste mesmo após o afastamento do cargo, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados depois de cessado seu exercício, no que fui acompanhado pela maioria dos Ministros desta Suprema Corte.
Feitas essas considerações e analisando o caso concreto, observa-se que as condutas imputadas ao reclamante teriam sido praticadas quando exercia o cargo Deputado Estadual na Assembleia Legislativa de Sergipe, tendo relação com suas funções públicas.
Ocorre que, compulsando os autos, verifico que não assiste razão à impetrante.
Isso porque, ainda que se considere a aplicação imediata da nova orientação jurisprudencial, delineada no HC 232.627/DF, tal aplicação não pode retroagir para invalidar atos processuais praticados sob a égide do entendimento anterior, sob pena de violação ao princípio da segurança jurídica.
Nesse sentido, no próprio julgamento do HC 232.627/DF, como já afirmado, consignei expressamente a necessidade de modulação dos efeitos da nova orientação, propondo "a aplicação imediata da nova interpretação aos processos em curso, com a ressalva de todos os atos praticados pelo STF e pelos demais Juízos com base na jurisprudência anterior.
A ressalva segue a mesma fórmula utilizada nas questões de ordem suscitadas no Inq. 687, Rel.
Min.
Sydney Sanches, e na AP 937, Rel.
Min.
Roberto Barroso". (...) (STF, HC 254.626/SE, Rel.
Min.
GILMAR MENDES, DJe 30/04/2025).
Essa reafirmação pelo mesmo relator da tese originária reforça a leitura de que a modulação dos efeitos foi essencial à estabilidade do sistema judicial e à preservação dos atos válidos praticados sob o entendimento anterior - o que inclui, por óbvio, o declínio de competência operado em 2019 no presente caso.
Tal postura modulatória, por sua vez, revela-se acertada também sob a ótica da racionalidade institucional e da eficiência do sistema de justiça penal, pois evita,
por outro lado, o assoberbamento das instâncias superiores com feitos já regularmente declinados e que se encontram com a competência há muito definida e em plena tramitação na primeira instância.
Permitir a rediscussão da competência nesses casos, com o consequente retorno dos autos aos tribunais, implicaria retrocesso prático e, sobretudo, desnecessária sobrecarga de órgãos colegiados com processos que já não lhes dizem respeito à luz da própria jurisprudência anterior - o que contraria os princípios da duração razoável do processo e da segurança jurídica.
Frise-se que o Pleno de Tribunal, em acórdão proferido nos autos da Ação Penal nº 0101093-10.2019.8.20.0001 (Pleno, Rel.
Des.
Glauber Rêgo, j. 23/06/2025, Id. 31964457), efetuou idêntica interpretação teleológica do recente julgado vinculante do STF (no sentido de não ser possível rediscutir a competência já firmada sob a égide da jurisprudência anterior, sob pena de violação aos princípios da segurança jurídica, da duração razoável do processo e da racionalidade institucional), consoante se verifica do teor do seu ementário: EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL.
AGRAVO INTERNO.
PRERROGATIVA DE FORO.
QUESTÃO DE ORDEM NO INQUÉRITO 4787.
HC 232.627/DF.
MUDANÇA JURISPRUDENCIAL COM EFEITOS PROSPECTIVOS.
CONSOLIDAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO PRIMEIRO GRAU.
RACIONALIDADE INSTITUCIONAL.
EFICIÊNCIA DO SISTEMA PENAL.
DECISÃO MANTIDA.
RECURSO DESPROVIDO.
I.
CASO EM EXAME 1.
Agravo Interno interposto pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte contra decisão monocrática que determinou a devolução dos autos ao juízo da 5ª Vara Criminal da Comarca de Natal/RN, para o regular prosseguimento da ação penal e incidentes conexos.
O Ministério Público sustentou que a nova jurisprudência do STF enseja o retorno da competência ao TJRN.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.
Há duas questões em discussão: (i) verificar se a tese fixada pelo STF no HC nº 232.627/DF e na Questão de Ordem no Inquérito 4787 deve retroagir para atingir feito em que a competência já foi regularmente declinada à primeira instância com base na jurisprudência anterior; e (ii) estabelecer se há vínculo funcional entre os crimes imputados ao ex-parlamentar e o exercício de suas funções, condição necessária para o reconhecimento da prerrogativa de foro.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 3.
A tese fixada pelo STF na Questão de Ordem no Inquérito 4787 e no HC 232.627/DF (ambos os feitos julgados em 12/03/2025) estabelece que a prerrogativa de foro para julgamento de crimes praticados no cargo e em razão das funções subsiste mesmo após o afastamento do cargo, inclusive quando a ação penal ou inquérito se inicia após o término do mandato. 4.
A Corte Suprema modulou os efeitos dessa nova interpretação para aplicar-se ex nunc, ou seja, apenas aos processos em curso que ainda não tenham tido a competência definitivamente definida, ressalvando expressamente os atos praticados pelos juízos com base na jurisprudência anterior (AP 937-QO), o que impede a retroação da tese ao presente caso. 5.
A decisão de declínio de competência foi proferida em 2019, com base na jurisprudência então vigente (AP 937-QO/STF), encontrando-se consolidada há mais de seis anos, com atos processuais já formalizados e ausência de vício de origem. 6.
A tentativa de rediscussão da competência sob nova tese interpretativa encontra óbice na modulação determinada pelo STF, que visa garantir a estabilidade processual, a duração razoável do processo e a eficiência do sistema de justiça criminal. 7.
A modulação ex nunc também atende à racionalidade institucional e à eficiência do sistema de justiça penal, ao evitar o assoberbamento indevido dos tribunais com feitos regularmente declinados e em tramitação na instância de origem, prevenindo retrocessos práticos e sobrecarga desnecessária das cortes superiores, em descompasso com os princípios da segurança jurídica e da duração razoável do processo. 8.
A própria orientação posterior dos tribunais superiores, como nos casos da APn 1086 (STJ) e HC 254.626/SE (STF), confirma a validade dos atos praticados com base no entendimento anterior e reforça o caráter prospectivo da novel interpretação. 9.
Ademais, não se evidencia o nexo funcional exigido entre o cargo de deputado estadual e os crimes de peculato imputados, cuja prática, embora ocorrida durante o mandato, relaciona-se a desvios de recursos por meio de fraudes contratuais em órgãos administrativos, sem relação direta com as funções típicas do cargo parlamentar. 10.
A jurisprudência do STF permanece firme ao exigir, cumulativamente, que o crime tenha sido cometido no exercício do cargo e em razão das funções desempenhadas (Pet 13285 AgR, Inq 4859 AgR, Pet 8916/DF, entre outros), o que não se verifica no presente caso.
IV.
DISPOSITIVO E TESE 11.
Recurso desprovido.
Tese de julgamento: 1.
A tese firmada na Questão de Ordem no Inquérito 4787 e no HC 232.627/DF, que reconhece a subsistência da prerrogativa de foro mesmo após o término do mandato, aplica-se apenas prospectivamente, com ressalva expressa aos atos já praticados sob a égide da jurisprudência anterior. 2.
Não é possível rediscutir a competência jurisdicional já consolidada com base em entendimento superado, sob pena de violação à segurança jurídica e à duração razoável do processo. 3.
A modulação dos efeitos da nova tese visa assegurar racionalidade institucional e eficiência do sistema penal, evitando retrocessos e a sobrecarga de tribunais com processos cuja competência já foi legitimamente fixada na primeira instância. 4.
O foro por prerrogativa de função exige nexo funcional entre o crime imputado e as atribuições típicas do cargo, o que não se verifica quando os atos delituosos decorrem de influência política junto a órgãos administrativos, alheia às funções parlamentares.
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 53, §1º; CPP, arts. 396-A e 396-A, §2º.
Jurisprudência relevante citada: STF, HC nº 232.627/DF, Rel.
Min.
Gilmar Mendes, j. 12.03.2025; STF, Inq 4787 AgR-QO, Rel.
Min.
Gilmar Mendes, j. 12.03.2025, DJe 27.05.2025; STF, AP 937-QO, Rel.
Min.
Roberto Barroso, j. 03.05.2018, DJe 11.12.2018; STJ, APn 1086, Rel.
Min.
Og Fernandes, j. 10.04.2025, DJe 14.04.2025; STF, HC 254.626/SE, Rel.
Min.
Gilmar Mendes, DJe 30.04.2025; STF, Pet 13285 AgR, Rel.
Min.
Cristiano Zanin, j. 24.03.2025; STF, Inq 4859 AgR, Rel.
Min.
Luiz Fux, j. 07.10.2024. (TJRN - Agravo Interno em Ação Penal 0101093-10.2019.8.20.0001 - Pleno - Rel.
Des.
Glauber Rêgo - j. unânime em 23/06/25).
No caso em análise, a decisão de recebimento da denúncia e todos os atos subsequentes decorreram de competência legitimamente firmada na primeira instância, com base na jurisprudência então vigente, e o encaminhamentos dos autos a este Tribunal ocorreu de forma indevida.
De mais a mais, cumpre registrar que a remessa dos autos a este Tribunal se deu de modo inadequado, mediante simples migração no PJe-1G para o PJe-2G, sem a observância do procedimento apropriado, mantendo-se a numeração e a classe processual do primeiro grau (Ação Penal – Procedimento Ordinário, nº 0101087-50.2017.8.20.0105), o que comprometeria a regularidade administrativa e estatística, além de provocar distorções nos indicadores institucionais.
Diante do exposto, com fulcro na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e na orientação consolidada por esta Corte de Justiça, determino: i) a devolução dos autos ao juízo de origem para o prosseguimento e julgamento do feito (inclusive com a devolução dos incidentes processuais dele decorrentes), recomendando que, ante o elástico lapso temporal, seja empregada a devida celeridade na marcha processual; ii) a baixa da presente ação no sistema do 2º grau de jurisdição Publique-se.
Intimem-se.
Cumpra-se.
Natal/RN, data da assinatura no sistema.
Desembargador Glauber Rêgo Relator -
01/07/2024 09:53
Juntada de Certidão
-
20/01/2024 16:34
Juntada de Certidão
-
11/12/2023 12:53
Juntada de Certidão
-
11/12/2023 12:50
Juntada de Certidão
-
11/12/2023 12:36
Juntada de Certidão
-
11/12/2023 12:25
Juntada de Certidão
-
04/10/2023 13:55
Recebidos os autos
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
09/05/2023
Ultima Atualização
21/08/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Documento de Comprovação • Arquivo
Despacho • Arquivo
Decisão • Arquivo
Despacho • Arquivo
Decisão • Arquivo
Despacho • Arquivo
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