TJSC - 5043078-07.2024.8.24.0023
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Sexta C Mara de Direito Civil - Gabinetes
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Passivo
Partes
Advogados
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Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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11/09/2025 00:00
Intimação
Apelação Nº 5043078-07.2024.8.24.0023/SC APELANTE: JOSE ARMELINDO SOLFOROSO (AUTOR)ADVOGADO(A): FABIO JOEL COVOLAN DAUM (OAB SC034979)APELANTE: BANCO ITAU CONSIGNADO S.A. (RÉU)ADVOGADO(A): OSVALDO GUERRA ZOLET (OAB SC034641) DESPACHO/DECISÃO 1.
Trata-se de apelações cíveis interpostas por ambas as partes contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Seara, Dr.
Pedro Antonio Panerai, que, na "ação declaratória de nulidade de contrato bancário, repetição do indébito e indenização por danos morais", movida por JOSE ARMELINDO SOLFOROSO em face de BANCO ITAU CONSIGNADO S.A., julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados inicialmente, nos termos do dispositivo a seguir transcrito: Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos contidos na inicial, extinguindo o feito com resolução do mérito (art. 487, I, do CPC), para: a) DECLARAR a inexistência de relação jurídica entre as partes quanto ao contrato 563537971; b) DETERMINAR, em decorrência do decidido na alínea anterior, a suspensão definitiva dos descontos efetuados no benefício previdenciário da parte autora; c) CONDENAR a parte ré a restituir, de forma simples, os valores descontados do benefício previdenciário da autora relativos às parcelas anteriores a 30/03/2021, e, em dobro, eventuais valores descontados posteriormente à referida data, nos termos da fundamentação, corrigidos monetariamente pelo INPC e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, ambos a partir do evento danoso (cada desconto indevido - art. 398 do CC e Súmula 54 do STJ), até 29/08/2024, indexadores que, a partir do início da vigência da Lei n.º 14.905/24 (30/08/2024), passarão a incidir unicamente pela taxa referencial SELIC, deduzido o IPCA (art. 389, parágrafo único, e art. 406, § 1º, ambos do CC); d) AUTORIZAR a compensação com as quantias recebidas pela parte autora, as quais deverão ser corrigidas pela mesma forma, observando-se, porém, quanto aos termos iniciais, que a correção monetária inicia-se da data do recebimento dos valores e os juros de mora a partir do trânsito em julgado desta decisão.
Em razão da sucumbência recíproca, condeno a parte ré ao pagamento de 30% (trinta por cento) das custas processuais, além de honorários advocatícios de sucumbência em favor do procurador da parte autora, os quais arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (arts. 85, §§2º e 8º, e 86, ambos do CPC). De outro lado, também condeno a parte autora ao pagamento de 70% (setenta por cento) das custas processuais, além de honorários advocatícios de sucumbência em favor do procurador do réu, os quais arbitro em 10% (dez por cento) sobre a sua sucumbência - diferença entre o que foi pleiteado e o que foi concedido (arts. 85, §§2º e 8º, e 86, ambos do CPC).
A exigibilidade das verbas de sucumbência fica suspensa em relação à parte autora, porque beneficiária da gratuidade judiciária.
Publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.
Sobrevindo recurso voluntário, intime-se a parte adversa para, querendo, apresentar contrarrazões, no prazo de 15 (quinze) dias (CPC, art. 1.003, § 5º), e, na sequência, remetam-se os autos à Superior Instância. Com o trânsito em julgado, baixe-se. (evento 43, DOC1) Em suas razões recursais, a parte ré arguiu, preliminarmente, a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, ante o indeferimento das provas requeridas.
No mérito, sustentou que: a) desincumbiu-se de seu ônus probatório e comprovou a validade do negócio jurídico por meio de provas diversas da perícia, tais como o contrato assinado, os documentos apresentados na contratação e comprovante de transferência bancária; b) o comportamento da parte autora em aceitar o valor creditado na conta dela comprova a legitimidade do negócio, mormente diante o silêncio prolongado dela, que faz incidir o instituto da supressio; c) incabível a repetição do indébito, principalmente na forma dobrada, porquanto não comprovada a má-fé da instituição financeira (evento 53, DOC1).
Por sua vez, a parte autora pugnou pela: a) condenação da parte ré ao pagamento de indenização por dano moral; b) restituição em dobro de todos os valores indevidamente descontados, com a incidência de juros e correção monetária desde o evento danoso (evento 56, DOC1).
Contrarrazões apresentadas (evento 62, DOC1 e evento 63, DOC1).
Este é o relatório. 2.
O Regimento Interno deste Tribunal atribui, no art. 132, XV e XVI, ao relator o poder de negar ou dar provimento ao recurso nos casos previstos no art. 932, IV e V, do Código de Processo Civil, "ou quando a decisão for contrária a enunciado ou jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça".
Assim, preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço os recursos e passo ao julgamento monocrático. 2.1 Caso em exame A demanda em tela envolve o desconto no benefício previdenciário da parte autora de parcelas de empréstimo consignado cuja nulidade da contratação é perseguida.
O objeto da presente ação recai sobre o contrato nº 563537971, no importe total de R$ 748,80, com parcelas mensais de R$ 10,40, tendo os descontos iniciados em julho de 2016 (evento 1, DOC5).
A tese central da parte autora é de nulidade do negócio jurídico, impugnando a autenticidade do contrato juntado aos autos.
A instituição financeira, a seu turno, defende a legitimidade do negócio jurídico, destacando que a parte autora recebeu os valores e apôs a assinatura no instrumento contratual.
Para melhor compreensão, a análise dos recursos ocorrerá em tópicos temáticos específicos. 2.2 Cerceamento de defesa Em sede de preliminar, a parte ré aduziu o cerceamento de seu direito de defesa, uma vez que o feito foi julgamento antecipadamente sem que lhe fosse oportunizada a produção probatória.
O exame da preliminar se confunde com o mérito, de modo que ambos serão apreciados conjuntamente na sequência. 2.3 (In)aplicabilidade da supressio A parte ré alega que o transcurso de tempo considerável desde o início dos descontos no benefício previdenciário sem insurgência do consumidor, o qual inclusive usufruiu dos valores depositados em sua conta bancária, implica na anuência tácita com o negócio jurídico, de modo aplicável o instituto da supressio.
Sobre a supressio, Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald lecionam que: A supressio é a situação do direito que deixou de ser exercitado em determinada circunstância e não mais possa sê-lo por, de outra forma, contrariar a boa-fé.
Seria um retardamento desleal no exercício do direito, que, caso exercitado, geraria uma situação de desequilíbrio inadmissível entre as partes, pois a abstenção na realização do negócio cria na contraparte a representação de que esse direito não mais será atuado.
Em suma, a chave da supressio está na tutela da confiança da contraparte e na situação de aparência que a iludiu perante o não exercício do direito.
A configuração da supressio exige 3 (três) requisitos: a) a inércia do titular do direito subjetivo, b) decurso de tempo capaz de gerar a expectativa de que esse direito não mais seria exercido e c) deslealdade em decorrência de seu exercício posterior, com reflexos no equilíbrio da relação contratual. (Curso de Direito Civil: contratos, teoria geral e contratos em espécie. 12. ed. rev. e atual..
Salvador: Ed.
JusPodivm, 2022, p. 242) A partir do exposto, tenho como inarredável a conclusão de que a aplicação da supressio dá-se no âmbito de um negócio jurídico, cuja existência depende da configuração dos seguintes pressupostos: partes, vontade, objeto e forma.
Em se tratando, porém, de ausência de vontade, é certo que inexiste o negócio jurídico, de modo que compreendo ser inaplicável no caso o instituto da supressio haja vista que consumidor alega não ter anuído com o contrato.
Afinal, segundo o art. 169 do Código Civil, "o negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo", com mais razão o inexistente desmerece convalidação.
Ademais, não se pode olvidar que incide no caso o Código de Defesa do Consumidor, que qualifica como prática abusiva, no art. 39, III e VI, "enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto ou fornecer qualquer serviço" e "executar serviços sem a prévia elaboração de orçamento e autorização expressa do consumidor, ressalvadas as decorrentes de práticas anteriores entre as partes".
E, nesses casos, o Superior Tribunal de Justiça tem compreendido que "em se tratando de práticas abusivas vedadas pelo código consumerista, não pode ser atribuído ao silêncio do consumidor (em um dado decurso de tempo), o mesmo efeito jurídico previsto no artigo 111 do Código Civil (anuência/aceitação tática), tendo em vista a exigência legal de declaração de vontade expressa para a prestação de serviços ou aquisição de produtos no mercado de consumo, ressalvada tão somente a hipótese de 'prática habitual' entre as partes" (STJ - Recurso Especial n. 1.326.592/GO, relator.
Min.
Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 07/05/2019).
Ainda, o relator afirma no mesmo voto que "o código consumerista tem aplicação prioritária nas relações entre consumidor e fornecedor, não se afigurando cabida a mitigação de suas normas - que partem da presunção legal absoluta da existência de desigualdade técnica e informacional entre os referidos agentes econômicos -, mediante a incidência de princípios do Código Civil que pressupõem a equidade (o equilíbrio) entre as partes".
Eis a íntegra da ementa do acórdão: RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO INDENIZATÓRIA.
DANOS MATERIAIS E MORAIS.
INVESTIMENTO DE RISCO REALIZADO PELO BANCO SEM AUTORIZAÇÃO EXPRESSA DOS CORRENTISTAS.
DEVER QUALIFICADO DO FORNECEDOR DE PRESTAR INFORMAÇÃO ADEQUADA E TRANSPARENTE.
INOBSERVÂNCIA.
CONSENTIMENTO TÁCITO PREVISTO NO CÓDIGO CIVIL.
INAPLICABILIDADE.1.
A Lei 8.078/90, cumprindo seu mister constitucional de defesa do consumidor, conferiu relevância significativa aos princípios da confiança, da boa-fé, da transparência e da equidade nas relações consumeristas, salvaguardando, assim, os direitos básicos de informação adequada e de livre escolha da parte vulnerável, o que, inclusive, ensejou a criminalização da "omissão de informação relevante sobre a natureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços" (caput do artigo 66 do CDC).2.
Sob tal ótica, a cautela deve nortear qualquer interpretação mitigadora do dever qualificado de informar atribuído, de forma intransferível, ao fornecedor de produtos ou de serviços, porquanto certo que uma "informação deficiente" - falha, incompleta, omissa quanto a um dado relevante - equivale à "ausência de informação", na medida em que não atenuada a desigualdade técnica e informacional entre as partes integrantes do mercado de consumo.3.
Nessa ordem de ideias, a jurisprudência desta Corte reconhece a responsabilidade das entidades bancárias por prejuízos advindos de investimentos malsucedidos quando houver defeito na prestação do serviço de conscientização dos riscos envolvidos na operação.Precedentes.4.
Ademais, a proteção contra práticas abusivas, assim como o direito à informação, é direito básico do consumidor, cuja manifesta vulnerabilidade (técnica e informacional) impõe a defesa da qualidade do seu consentimento, bem como a vedação da ofensa ao equilíbrio contratual.5.
Com esse nítido escopo protetivo, o artigo 39 do CDC traz rol exemplificativo das condutas dos fornecedores consideradas abusivas, tais como o fornecimento ou a execução de qualquer serviço sem "solicitação prévia" ou "autorização expressa" do consumidor (incisos III e VI), requisitos legais que ostentam relação direta com o direito à informação clara e adequada, viabilizadora do exercício de uma opção desprovida de vício de consentimento da parte cujo déficit informacional é evidente.6.
Nessa perspectiva, em se tratando de práticas abusivas vedadas pelo código consumerista, não pode ser atribuído ao silêncio do consumidor (em um dado decurso de tempo) o mesmo efeito jurídico previsto no artigo 111 do Código Civil (anuência/aceitação tácita), tendo em vista a exigência legal de declaração de vontade expressa para a prestação de serviços ou aquisição de produtos no mercado de consumo, ressalvada tão somente a hipótese de "prática habitual" entre as partes.7.
Ademais, é certo que o código consumerista tem aplicação prioritária nas relações entre consumidor e fornecedor, não se afigurando cabida a mitigação de suas normas - que partem da presunção legal absoluta da existência de desigualdade técnica e informacional entre os referidos agentes econômicos -, mediante a incidência de princípios do Código Civil que pressupõem a equidade (o equilíbrio) entre as partes.8.
Na espécie, conforme consta da moldura fática, se o correntista tem hábito de autorizar investimentos sem nenhum risco de perda (como é o caso do CDB - título de renda fixa com baixo grau de risco) e o banco, por iniciativa própria e sem respaldo em autorização expressa do consumidor, realiza aplicação em fundo de risco incompatível com o perfil conservador de seu cliente, a ocorrência de eventuais prejuízos deve, sim, ser suportada, exclusivamente, pela instituição financeira, que, notadamente, não se desincumbiu do seu dever de esclarecer de forma adequada e clara sobre os riscos da operação.9.
A manutenção da relação bancária entre a data da aplicação e a manifestação da insurgência do correntista não supre seu déficit informacional sobre os riscos da operação financeira realizada a sua revelia.
Ainda que indignado com a utilização indevida do seu patrimônio, o consumidor (mal informado) poderia confiar, durante anos, na expertise dos prepostos responsáveis pela administração de seus recursos, crendo que, assim como ocorria com o CDB, não teria nada a perder ou, até mesmo, que só teria a ganhar.10.
A aparente resignação do correntista com o investimento financeiro realizado a sua revelia não pode, assim, ser interpretada como ciência em relação aos riscos da operação.
Tal informação ostenta relevância fundamental, cuja incumbência cabia ao banco, que, no caso concreto, não demonstrou ter agido com a devida diligência.11.
Consequentemente, sobressai a ilicitude da conduta da casa bancária, que, aproveitando-se de sua posição fática privilegiada, transferiu, sem autorização expressa, recursos do correntista para modalidade de investimento incompatível com o perfil do investidor, motivo pelo qual deve ser condenada a indenizar os danos materiais e morais porventura causados com a operação.12.
Recurso especial dos correntistas provido.
Recurso especial da casa bancária prejudicado.(STJ - REsp n. 1.326.592/GO, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 7/5/2019, DJe de 6/8/2019) Não desconheço a existência de divergência entre os colegiados deste Tribunal a respeito da temática.
Porém, no âmbito desta Câmara firmou-se a compreensão da inaplicabilidade do instituto da supressio nos casos em que o consumidor refuta a anuência com o negócio jurídico.
Neste rumo, listo os seguintes julgados dos membros desta Sexta Câmara de Direito Civil: 1) Apelação n. 5001408-87.2023.8.24.0034, rel.
Marcos Fey Probst, julgada em 24/09/2024; 2) Apelação n. 5000450-34.2024.8.24.0045, rel.
Joao Eduardo de Nadal, julgada monocraticamente em 11/09/2024; 3) Apelação n. 5001262-97.2024.8.24.0135, rel.
Renato Luiz Carvalho Roberge, julgada monocraticamente em 30/09/2024; e, 4) Apelação n. 5000264-79.2023.8.24.0066, de minha relatoria, julgada em 27/08/2024.
Assim, dada a inaplicabilidade do instituto da supressio ao caso, cumpre analisar a validade do negócio jurídico em discussão. 2.4 Nulidade do negócio jurídico O Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que na hipótese de o consumidor impugnar a autenticidade da assinatura do contrato que a instituição financeira utiliza como fundamento para a cobrança, o ônus de prova da autenticidade é dela.
A tese foi fixada no Tema n. 1.061, por ocasião do julgamento do Recurso Especial n. 1.846.649/MA, rel.
Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, julgado em 24/11/2021, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, nestes termos: Na hipótese em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em contrato bancário juntado ao processo pela instituição financeira, caberá a esta o ônus de provar a autenticidade (CPC, arts. 6º, 369 e 429, II).
Na hipótese vertente, a parte autora impugnou a autenticidade da assinatura constante do contrato.
Intimada para especificação das provas a serem produzidas, a parte ré limitou-se a requerer o depoimento pessoal do autor e a expedição de ofício ao banco no qual foi creditado o valor contratado (evento 28, DOC1).
Ocorre que em se tratando de impugnação à autenticidade de documento, é cediço que, salvo circunstância excepcional, o único meio de prova capaz de comprovar a autenticidade de assinatura física ou eletrônica é a perícia.
Assim, considerando que a parte ré não demonstrou interesse na produção de prova pericial, inviável o reconhecimento do cerceamento do direito de defesa, uma vez que as provas requeridas revelam-se inócuas para o fim pretendido.
Neste sentido colho os seguintes julgados monocráticos dos membros desta Câmara: 1) Apelação n. 5000882-49.2022.8.24.0069, rel.
Marcos Fey Probst, julgada em 02/09/20204; 2) Apelação n. 5007566-40.2022.8.24.0020, rel.
João Eduardo de Nadal, julgada em 24/09/2024; 3) Apelação n. 5003094-72.2021.8.24.0006, rel.
Renato Luiz Carvalho Roberge, julgada em 23/09/2024; e, 4) Apelação n. 5014590-85.2023.8.24.0020, de minha relatoria, julgada em 04/09/2024.
Por conseguinte, inafastável a conclusão acerca da ilicitude dos descontos promovidos no benefício previdenciário diante do reconhecimento da ausência de relação jurídica entre as partes, sendo irrelevantes eventuais depósitos efetivados em favor da parte autora. 2.5 Indenização por danos morais - comprometimento da subsistência Para a configuração da responsabilidade civil, é indispensável a presença dos seguintes pressupostos: ato ilícito, culpa, dano e nexo de causalidade.
Em se tratando de dano ocasionado a consumidor, a responsabilidade é objetiva, prescindindo da existência de culpa, conforme previsto no art. 14 do CDC.
Diante do reconhecimento da nulidade do negócio jurídico, é inquestionável que os descontos efetuados indevidamente no benefício previdenciário da parte autora configuram ato ilícito.
Falta verificar, portanto, a presença do dano moral e do nexo de causalidade.
A propósito, o Grupo de Câmaras de Direito Civil deste Tribunal, no julgamento do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas n. 5011469-46.2022.8.24.0000, em 09/08/2023, sob a relatoria do Des.
Marcos Fey Probst, fixou a tese de que "Não é presumido o dano moral quando o desconto indevido em benefício previdenciário decorrer de contrato de empréstimo consignado declarado inexistente pelo Poder Judiciário".
No âmbito desta Câmara, compreende-se que em regra, ressalvadas circunstâncias excepcionais, o dano moral caracteriza-se quando o desconto efetivado pela instituição financeira ultrapassar o patamar de 10% do benefício previdenciário bruto da parte autora.
Isso porque, na concepção dos pares deste colegiado, a diminuição mensal da renda em mais de 10% prejudica a administração financeira do consumidor, que conta com aquela quantia para a sua subsistência e de seu núcleo familiar.
Em se tratando de descontos inferiores a 10% do benefício previdenciário, a configuração do dano moral depende da presença de provas robustas de que a privação de tal renda efetivamente ocasionou prejuízos extrapatrimoniais.
A propósito, elenco julgados sob a relatoria dos pares desta Sexta Câmara de Direito Civil nesta linha: 1) Apelação n. 5024593-76.2021.8.24.0018, rel.
Renato Luiz Carvalho Roberge, julgada em 30/04/2024; 2) Apelação n. 5002972-49.2021.8.24.0074, rel.
Joao de Nadal, julgada em 30/07/2024; e, 3) Apelação n. 5001225-89.2023.8.24.0043, rel.
Marcos Fey Probst, julgada em 18/06/2024.
E, de minha relatoria: AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DE DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA/NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA REVERTIDA MONOCRATICAMENTE.
RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.DEFENDIDA A VALIDADE JURÍDICA DA CONTRATAÇÃO.
ALEGAÇÃO DE QUE A AUTORA AUTORIZOU A PORTABILIDADE E OS DESCONTOS EM SEU BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
INSUBSISTÊNCIA.
IMPUGNAÇÃO À AUTENTICIDADE DA ASSINATURA CONSTANTE DO INSTRUMENTO.
AUSÊNCIA DE PEDIDO DE PERÍCIA ACERCA DA ORIGEM DA FIRMA.
AGRAVANTE QUE NÃO SE DESINCUMBIU DE SEU ÔNUS PROBATÓRIO.
TEMA N. 1.061 DO STJ.
RECONHECIMENTO DE FALTA DE ASSINATURA DA AUTORA QUE ENSEJA A DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DA AVENÇA.
DECISÃO MANTIDA NO PONTO.DANOS MORAIS.
TESE DE INOCORRÊNCIA DE PREJUÍZO MORAL.
RECHAÇO.
DESCONTOS INDEVIDOS QUE COMPROMETERAM MAIS DE 10% (DEZ POR CENTO) DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DA AUTORA.
COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA DEVIDA. QUANTUM INDENIZATÓRIO.
PLEITO DE MINORAÇÃO.
IMPOSSIBILIDADE.
MONTANTE FIXADO CONFORME PARÂMETRO ESTIPULADO NESTE COLEGIADO.
DECISÃO MANTIDA.RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.(Apelação n. 5001276-11.2022.8.24.0084, Sexta Câmara de Direito Civil, julgada em 06/08/2024).
No caso vertente, os descontos efetuados pela parte instituição financeira resultam no comprometimento de aproximadamente 0,73% do valor bruto do benefício previdenciário da parte autora.
Assim, considerando que os descontos por si só não são hábeis a demonstrar o prejuízo à organização financeira e a subsistência da parte autora, aliado ao fato de que esta não apresentou outras provas a respeito, concluo que não restou comprovado o dano moral, de modo que não configurada a responsabilidade civil. 2.6 Restituição do indébito em dobro Segundo o art. 927 do CC, aquele que por ato ilícito causar dano a outrem fica obrigado a repará-lo.
No caso, diante do reconhecimento da nulidade do negócio jurídico, resta evidenciada a ilicitude da conduta da instituição financeira, que deve reparar os danos ocasionados ao consumidor.
Assim, é devida a restituição de todos os valores indevidamente descontados do benefício previdenciário da parte autora.
Cumpre apurar, porém, a aplicabilidade da disposição prevista no art. 42, parágrafo único, do CDC, segundo o qual: "O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável".
A respeito, a Corte Especial do STJ, no julgamento dos Embargos de Divergência em Agravo em Recurso Especial n. 676.608/RS, sob a relatoria do Min.
Og Fernandes, em 21/10/2020, fixou a seguinte tese: A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que realizou a cobrança indevida, revelando-se cabível quando a referida cobrança consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva.
Na mesma decisão em que fixada a tese, todavia, houve modulação dos efeitos a fim de se determinar que o entendimento apenas seria aplicável para situações ocorridas após a data da publicação do acórdão, o que se implementou em 30/03/2021: EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
CIVIL.
PROCESSUAL CIVIL.
TELEFONIA FIXA.
COBRANÇA INDEVIDA.
AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO DE TARIFAS. 1) RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO (PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 42 DO CDC).
DESINFLUÊNCIA DA NATUREZA DO ELEMENTO VOLITIVO DO FORNECEDOR QUE REALIZOU A COBRANÇA INDEVIDA.
DOBRA CABÍVEL QUANDO A REFERIDA COBRANÇA CONSUBSTANCIAR CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA. 2) APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL DO CÓDIGO CIVIL (ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL).
APLICAÇÃO ANALÓGICA DA SÚMULA 412/STJ. 3) MODULAÇÃO PARCIAL DOS EFEITOS DA DECISÃO. CONHECIMENTO E PROVIMENTO INTEGRAL DO RECURSO. 1.
Trata-se de embargos de divergência interpostos contra acórdão em que se discute o lapso prescricional cabível aos casos de repetição de indébito por cobrança indevida de valores referentes a serviços não contratados, promovida por empresa de telefonia.
Discute-se, ainda, acerca da necessidade de comprovação da má-fé pelo consumidor para aplicação do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor. (...) Modulam-se os efeitos da presente decisão - somente com relação à primeira tese - para que o entendimento aqui fixado quanto à restituição em dobro do indébito seja aplicado apenas a partir da publicação do presente acórdão.
A modulação incide unicamente em relação às cobranças indevidas em contratos de consumo que não envolvam prestação de serviços públicos pelo Estado ou por concessionárias, as quais apenas serão atingidas pelo novo entendimento quando pagas após a data da publicação do acórdão. (STJ - EAREsp n. 676.608/RS, relator Ministro Og Fernandes, Corte Especial, julgado em 21/10/2020, DJe de 30/3/2021 - grifei e suprimi) No caso, verifico que os descontos no benefício previdenciário da parte autora cessaram em momento anterior ao marco temporal estipulado pelo STJ, qual seja, 30/03/2021.
Assim, considerando a inaplicabilidade da tese e a ausência de demonstração do elemento volitivo da conduta da instituição financeira, a restituição deve se dar na forma simples. 2.7 Consectários legais A respeito dos consectários legais incidentes sobre a condenação, inicialmente registro que se trata de matéria de ordem pública; passível, portanto, de modificação de ofício.
Ainda, convém destacar que a responsabilidade na espécie é extracontratual.
Partido deste pressupostos, em relação aos danos morais o termo inicial para a fluência da correção monetária é a data do arbitramento da quantia reparatória, conforme a Súmula n. 362 do STJ.
Os juros de mora, por sua vez, devem incidir a contar do evento danoso, qual seja, a data do primeiro desconto indevido, nos termos da Súmula n. 54 do STJ.
Quanto à restituição do indébito, tanto os juros quanto a atualização monetária devem incidir a contar de cada desconto indevido efetuado no benefício previdenciário da parte autora, com amparo, respectivamente, nas Súmulas n. 54 e 43 do STJ.
E no tocante à compensação dos valores eventualmente recebidos pela parte autora, a atualização monetária deve ser computada desde o momento em que o dinheiro foi depositado na conta do consumidor, uma vez que consiste em mera recomposição monetária.
Os juros de mora,
por outro lado, são devidos a partir do trânsito em julgado do presente feito.
Sobre os índices a serem aplicados, anoto que o Código Civil foi alterado pela Lei nº 14.905/2024, que entrou em vigor em 30/08/2024.
A partir dessa data, os índices de correção monetária e juros de mora passaram a ser, respectivamente, o IPCA e a SELIC, sendo esta última deduzida do primeiro.
Eis o inteiro teor dos dispositivos a respeito da temática: Art. 389.
Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros, atualização monetária e honorários de advogado. Parágrafo único. Na hipótese de o índice de atualização monetária não ter sido convencionado ou não estar previsto em lei específica, será aplicada a variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apurado e divulgado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou do índice que vier a substituí-lo. [...] Art. 406. Quando não forem convencionados, ou quando o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, os juros serão fixados de acordo com a taxa legal. § 1º A taxa legal corresponderá à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), deduzido o índice de atualização monetária de que trata o parágrafo único do art. 389 deste Código. § 2º A metodologia de cálculo da taxa legal e sua forma de aplicação serão definidas pelo Conselho Monetário Nacional e divulgadas pelo Banco Central do Brasil. § 3º Caso a taxa legal apresente resultado negativo, este será considerado igual a 0 (zero) para efeito de cálculo dos juros no período de referência. Assim, nos casos envolvendo a declaração de nulidade de empréstimos consignados, os consectários legais devem ser fixados conforme a seguinte a tabela: Danos morais Termo inicialÍndiceCorreção monetáriaArbitramento do dano moralIPCAJurosData do primeiro desconto indevidoSELIC deduzida do IPCARestituição do indébitoCorreção monetáriaData de cada desconto indevidoIPCAJurosData de cada desconto indevidoSELIC deduzida do IPCACompensaçãoCorreção monetáriaData do recebimento dos valoresIPCAJurosTrânsito em julgadoSELIC deduzida do IPCA No caso concreto, o magistrado assim delimitou a incidência dos consectários legais: (i) na restituição do indébito, juros de mora e correção monetária incidentes, respectivamente, a contar do evento danoso, aplicando os índices de 1% ao mês e o INPC, até 29/08/2024, e a partir de então a SELIC deduzida do IPCA; e, (ii) na compensação, juros de mora e correção monetária incidentes, respectivamente, a contar do trânsito em julgado da decisão e da data de recebimento dos valores, aplicando os índices de 1% ao mês e o INPC, até 29/08/2024, e a partir de então a SELIC deduzida do IPCA.
Diante do exposto, de ofício, ajusto os consectários legais para alterar os índices da correção monetária e dos juros de mora, tanto da restituição do indébito quanto da compensação, para que seja aplicado durante todo o período de incidência o IPCA e a SELIC deduzida do IPCA, respectivamente. 2.8 Conclusão Em resumo, a sentença deve ser adequada para que a repetição do indébito ocorra apenas na forma simples, corrigido, de ofício, os consectários legais.
Logo, o recurso da parte ré comporta parcial provimento, ao passo que o recurso do autor não comporta provimento.
Tal modificação, contudo, não importa em redistribuição dos ônus sucumbenciais, os quais foram atribuídos na sentença de forma recíproca entre ambos os litigantes.
Por fim, quanto aos honorários recursais, o STJ assentou no tema n. 1.059 que: A majoração dos honorários de sucumbência prevista no art. 85, § 11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente.
Não se aplica o art. 85, § 11, do CPC em caso de provimento total ou parcial do recurso, ainda que mínima a alteração do resultado do julgamento ou limitada a consectários da condenação.
No caso, ante a rejeição da totalidade dos pedidos recursais do autor, é devido o arbitramento de remuneração recursal ao patrono da parte ré.
Para tanto, majoro o estipêndio que lhe foi fixado na origem, isso é 10% da sucumbência (diferença entre o que foi pleiteado e o que foi concedido) - cujo critério não foi impugnado pelas partes - em 5%, totalizando o importe de 15%.
A exigibilidade da verba, porém, fica suspensa na forma e prazo do § 3º do art. 98 do Código de Processo Civil, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita (evento 4, DOC1). 3.
Pelo exposto, com amparo no art. 932, V, "b", e VIII, do Código de Processo Civil, c/c o art. 132, XVI, do Regimento Interno deste Tribunal, (i) conheço e dou parcial provimento ao recurso da parte ré, (ii) conheço e nego provimento ao recurso da parte autora, e (iii) de ofício, corrijo os consectários legais, nos termos da fundamentação.
Intimem-se.
Após, promova-se a devida baixa. -
16/04/2025 13:33
Conclusos para decisão/despacho - DCDP -> GCIV0602
-
16/04/2025 13:33
Juntada de Certidão
-
15/04/2025 14:59
Remessa Interna para Revisão - GCIV0602 -> DCDP
-
15/04/2025 14:28
Expedida/certificada a comunicação eletrônica - Parte: JOSE ARMELINDO SOLFOROSO. Justiça gratuita: Deferida.
-
15/04/2025 14:28
Expedida/certificada a comunicação eletrônica - Custas recolhidas previamente à interposição da Apelação lançada no evento 53 do processo originário (24/01/2025). Guia: 9588840 Situação: Baixado.
-
15/04/2025 14:28
Distribuído por prevenção - Autos com o Relator
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
15/04/2025
Ultima Atualização
11/09/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
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