TRF1 - 1003600-76.2022.4.01.4300
1ª instância - 4ª Palmas
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
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Polo Passivo
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Advogados
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Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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19/07/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO TOCANTINS QUARTA VARA FEDERAL AUTOS Nº: 1003600-76.2022.4.01.4300 CLASSE: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) REU: AMAURI MOURA SILVEIRA CLASSIFICAÇÃO: SENTENÇA TIPO D SENTENÇA RELATÓRIO Trata-se de ação penal pública incondicionada originada do desmembramento dos autos n. 0002982-56.2019.4.01.4300, que por sua vez diz respeito à ação penal pública incondicionada ajuizada pelo Ministério Público Federal em desfavor de WILLY NORMA SHAFFER BUITRAGO, DIONATHAN DIOGO MARQUES DO COUTO, LUCAS DE OLIVEIRA PENHA, MURILLO RIBEIRO DE SOUSA COSTA, VILTON BORGES PEREIRA DE CARVALHO, NIVALDO DA CONCEIÇÃO LEVEL, GEVERSON BUENO LAGARES, RICARDO DE MIRANDA FRIAS, SERGIO MAIA FLORES, EDUARDO ANDRE MELO, DIEGO MAURÍCIO BLANCO BLANCO, ANDRES FELIPE CORREA BLANCO, FRANCISCO BRAGA MARTINS JUNIOR, RAIMUNDO ALMEIDA DA SILVA, JOÃO DOS REMÉDIOS AZEVEDO, EDINALDO SOUZA SANTOS, RICARDO BRITTES FERREIRA, AMAURI MOURA SILVEIRA e GIOVANE ROSA DOS SANTOS, todos devidamente qualificados, imputando-lhes a prática das infrações penais tipificadas no artigo 2º da Lei n. 12.850/13 e no artigo 35 da Lei n. 11.343/06.
Com efeito, a cópia dos autos n. 0002982-56.2019.4.01.4300, desde o momento de sua autuação até a decisão que determinou o desmembramento, segue no ID 1053213768 e ss., que passo a relatar.
A peça inicial acusatória narra, em síntese, o seguinte (ID 1053213768 - Págs. 11/69): I.
DA INVESTIGAÇÃO E DO OBJETO DA DENÚNCIA A presente denúncia é oferecida a partir das investigações realizadas no contexto da "Operação FLAK'', inquérito policial n° 069/2017-4 DRE/DRCOR/SR/PF/TO (autos n° 1274-39.2017.4.01.4300), o qual revelou complexa Organização Criminosa - ORCRIM voltada para o tráfico internacional de drogas, especificamente cocaína, no Estado do Tocantins, sobretudo nas cidades de Porto Nacional e Palmas, de onde eram preparadas, de forma reiterada, aeronaves para carregamentos da referida substância ilícita, oriunda de países vizinhos, notadamente Bolívia e Colômbia, utilizando-se como entrepostos Venezuela.
Honduras e Suriname, com destino a outros estados da federação brasileira.
Estados Unidos. África, bem como Europa, especialmente Reino Unido e Bélgica.
Após o decurso de mais de um ano de investigações, baseadas em interceptações telefônicas (autos n° 1275-24.2017.4.01.4300), quebra de sigilo bancário (autos n° 4902-02.20184.014300), buscas exploratórias (autos n° 4531-38.2018.4.01.4300 e 791-72.2018.4.01.4300) e quebra de sigilo de dados (autos n° 7566706.2018.4.01.4300), foi elaborado pela Polícia Federal o Relatório de Análise de Polícia Judiciária n° 19/2018 (Volumes II e III do 1PL 0069/2017-4-SR/PF/TO — autos n° 1274-39.2017.4.01.4300), o qual, resumiu os fatos apurados até aquele momento, relacionando-os na forma de "eventos importantes, ou seja. episódios delitivos distintos concatenados entre si pela identidade de agentes “modus operandi” unidade de objetivos e outras características que definem o grupo como ORCRIM.
Com a indicação de diversas medidas cautelares notadamente prisões, buscas e apreensões e sequestro de bens.
A operação foi deflagrada em 21/02/2019, com a decretação de prisões preventivas e temporárias (autos n° 38-81.2019.4.01.4300), de buscas c apreensões (autos n° 41-36.2019.4.01.4300) e de medidas de sequestro (autos n° 42-21.2019.4.0.1.4300).
Os elementos trazidos aos autos do inquérito indicam, até o momento, a prática de, pelo menos, os seguintes delitos: tráfico internacional de drogas (Art. 33 c/c Art. 40, incisos I e V, ambos da Lei n. 11.343/2002), associação para o tráfico (Art. 35 da Lei 11.343/2006), financiamento ao tráfico de drogas (Art. 36 da Lei n. 11.343/20064), organização criminosa (Art. 2° da Lei n. 12.850/2013), lavagem de ativos (Art. 1° da Lei 9.613/1998) e atentado contra a segurança do transporte aéreo (art. 261 do Código Penal).
De forma a melhor sistematizar a persecução criminal, os crimes investigados foram divididos em dois grupos de denúncias.
Em um primeiro grupo, serão denunciados os crimes de associação para o tráfico e de organização criminosa, sendo os investigados civilizados por núcleos da ORCRIM, que são: "núcleo operacional", "núcleo dos pilotos", “núcleo dos mecânicos" e "núcleo dos produtores e compradores".
Ainda, em um segundo grupo de denúncias, serão imputados os crimes individualmente praticados, por evento criminoso identificado nas investigações.
Esta denúncia se refere aos crimes de associação para o tráfico (Art. 35 o da Lei 11.343/2006) e de organização criminosa (Art. 2° da Lei 12.850/2013) praticados pelos integrantes do chamado "NÚCLEO DOS PILOTOS [...] II.
DO MODUS OPERANDI DA ORCRIM A ORCRIM é especializada em realizar o transporte de drogas, notadamente cocaína. utilizando-se sobretudo do modal aéreo, para aproximar centros produtores e compradores. [...] A cocaína era buscada na Bolívia e na Colômbia, sendo utilizados como entrepostos a Venezuela, Honduras e o Suriname, e tinha como destino final não apenas o Brasil, mas também os Estados Unidos, a Europa e a África. Ás aeronaves utilizadas estão registradas aqui no país e eram preparadas em diversos Estados, notadamente o Tocantins, nas cidades de Porto Nacional e Palmas.
As investigações apontam para uma frota de aproximadamente 47 (quarenta e sete) aeronaves que estariam à disposição da ORCRIM para a realização desse tipo de serviço.
No intuito de aumentar a autonomia das aeronaves, elas eram modificadas por mecânicos específicos de confiança da ORCRIM.
Dessa forma, eram utilizados galões com combustível, os quais iam a bordo da aeronave, para a prática de reabastecimento durante o voo, por meio de um sistema rudimentar de distribuição. [...] Na tentativa de dificultar a fiscalização por parte das forças policiais dos diversos países, a ORCRIM adulterava ou adaptava aeronaves para posterior emprego na logística do narcotráfico.
Nesse sentido, eram reaproveitadas a documentação de aeronaves inutilizadas no intuito de "esquentar" alguma outra aeronave em condição irregular.
A Polícia Federal chama atenção também para as frequentes omissões e ou falsificações nos planos de voos realizados pela ORCRIM. [...] Para tentar dimensionar o poder econômico da ORCRIM, identificou-se que, apenas no período entre março de 2017 a outubro de 2018, foram realizados pelo menos 23 voos, os quais transportaram, em média, numa estimativa conservadora', 400 quilos de cocaína cada, totalizando 08 (oito toneladas) da droga.
Para tanto, o grupo criminoso recebeu algo em torno de US 3.400.000,00 (três milhões e quatrocentos mil dólares) ou RS 13.430.000,00 (treze milhões e quatrocentos mil reais).
Segue tabela elaborada pela Polícia Federal em relação aos fretes (Relatório de Análise n° 19/2018): [...] IV.
DAS ATIVIDADES CRIMINOSAS As investigações revelaram pelo menos 10 (dez) eventos criminosos, relacionados às atividades da ORCRIM, com a prática de crimes como tráfico internacional de drogas (Art. 33 c/c Art. 40, incisos I e V, ambos da Lei 11.343/2006), associação para o tráfico (Art. 35 da Lei 11.343/2006), financiamento ao tráfico de drogas (Art. 36 da Lei n° 11.343/2006), organização criminosa (Art. 2 da Lei 12.850/2013), lavagem de ativos (Art.
I° da Lei 9.613/1998) e atentado contra a segurança do transporte aéreo (art. 261 do Código Penal).
Os crimes a seguir narrados e não imputados nesta peça acusatória serão objeto de denúncias específicas, mas estão aqui relacionados, na forma de quadros-resumos, para melhor contextualizar as atividades da associação criminosa voltada para o tráfico de drogas e da ORCRIM. [...] V.
DA INDIVIDUALIZAÇÃO DAS CONDUTAS [...] V. 18.
AMAURI MOURA SILVEIRA O denunciado AMAURI MOURA SILVEIRA é piloto e auxilia a ORCRIM no preparo das aeronaves e na realização de fretes.
A Policia Federal registra que AMAURI MOURA SILVEIRA foi preso em flagrante, em 2013, na companhia de EVANDRO GERALDO ROCHA REIS, com 230 quilos de cocaína em Minas Gerais. É AMAURI MOURA SILVEIRA o responsável por auxiliar o mecânico HAMILTON GOUVEIA ALBERTO para o reparo de aeronaves utilizadas pela ORCRIM para o tráfico de drogas.
E, nesse sentido, importante o registro de conversas suspeitas que manteve com HAMILTON a respeito da preparação de uma aeronave, que não poderia "ter surpresa lá no mato'''.
Ainda, a Policia Federal aponta que AMAURI MOURA SILVEIRA pilotou, para fins de testes, a aeronave PP-IAP quando a mesma se encontrava no aeródromo Sitio Flyer na cidade de Palmas/TO em março de 2018, bem como esteve na "pista do Wisley" — Aeródromo Dona Iracema — e na Associação Tocantinense de Aviação — ATA — [...] A denúncia veio acompanhada de rol de testemunhas e foi instruída com mídias contendo as cópias dos autos do Inquérito Policial n. 069/2017 e das medidas cautelares correlatas (ID 1053213768 - Págs. 11/69, 84 e 359/360).
Em cota ministerial (ID 1053213768 - págs. 39/47), o Parquet Federal requereu a juntada posterior de material probatório, o arquivamento do inquérito policial em relação aos investigados JORGE ALBERTO MEJIA, WILLY NORMAN MEDRANO, MARIO GORETH PEDREIRA, FREDERICO SARDINHA DA CRUZ NETO, SAMUEL CAMARGO DOS SANTOS, JORGE SOLANO e MAURÍCIO VELEZ CAICEDO por falta de provas, bem como a revogação de eventuais medidas cautelares pessoais que tenham sido deferidas em face das pessoas aqui mencionadas.
Tais pleitos foram acolhidos por meio da decisão de ID 1053213768 - págs. 86/90, que também determinou que os acusados fossem notificados para apresentar defesa prévia antes de haver a deliberação do Juízo quanto ao recebimento da denúncia.
O denunciado AMAURI MOURA SILVEIRA foi notificado (ID 1053213768 - pág. 123) e constituiu defensores particulares nos autos (ID 1053213768 - pág. 128/129), porém, não apresentou a sua defesa prévia.
Por esta razão, foi determinada a vinculação dos advogados ao presente feito no sistema processual, bem como a sua intimação para a apresentação da defesa escrita no prazo legal (ID 1053213771 - pág. 09/21), o que foi realizado no evento de ID 1053213771 - pág. 166/167.
Nada obstante, a defesa do acusado requereu a dilação de prazo para apresentar defesa prévia (ID 1053213771 - pág. 170).
O prazo foi concedido, porém, novamente, transcorreu in albis (ID1053213771 - pág. 184).
Posteriormente foi determinado o desmembramento do feito em relação ao acusado AMAURI MOURA SILVEIRA, em razão do descompasso da marcha processual com a formação do atual processo (ID 1053213771 - pág. 308/333).
A ordem de desmembramento foi cumprida, conforme dito acima, gerando-se os presentes autos (ID 1053213768), cujos eventos passo a relatar.
Finalmente, o acusado apresentou defesa prévia (ID 1073729753) por intermédio de seu patrono devidamente constituído, ocasião em que arguiu, preliminarmente: a) ausência de justa causa, visto que não haveria referência à sua participação nos episódios descritos na denúncia; b) a ocorrência de Bis in Idem; c) a inexistência de associação para o tráfico; d) a inexistência de participação em Organização Criminosa, pois não teria ficado demonstrado o cumprimento dos requisitos para a sua configuração.
Por fim, requereu a oitiva da testemunha arrolada e a rejeição da denúncia.
Sobreveio decisão de ID 1125675766 que: a) recebeu parcialmente a denúncia apenas em relação ao delito tipificado no artigo 35 da Lei n. 11.343/06, rejeitando a denúncia no tocante à imputação do delito tipificado no artigo 2º da Lei n. 12.850/13, em razão da indevida ocorrência de dupla imputação (bis in idem) pelo mesmo fato; b) deferiu os pedidos de produção de prova testemunhal formulados pela acusação e pela defesa, e; c) determinou com esteio nas Resoluções CNJ n. 329 e 354/2020 que a acusação e as defesas, no prazo comum de 05 (cinco) dias, informassem nos autos os dados necessários para a realização de audiência telepresencial.
Por meio do despacho de ID 1246321270 foi designada audiência para o dia 05.09.2022.
Durante a audiência de instrução realizada, verificou-se a ocorrência dos seguintes fatos: a) a audiência foi gravada em meio audiovisual (art. 405, § 1º, CPP), ficando uma via nos autos e outra arquivada na Secretaria da Vara Federal; b) foram ouvidas as testemunhas de acusação TIAGO RAFAEL DA CONCEIÇÃO e RODRIGO CARVALHO, compromissadas na forma da Lei, c) o parquet desistiu da oitiva da testemunha LUIZ CARLOS COLUSSI DE OLIVEIRA; d) foi ouvida a testemunha de defesa MARIA ANTONIA JACARANDA, compromissada na forma da lei; e) o acusado AMAURI MOURA SILVEIRA foi interrogado.
As partes nada requereram na fase de diligências complementares.
Ao final este Juízo homologou a desistência de oitiva da testemunha LUIZ CARLOS COLUSSI DE OLIVEIRA e intimou as partes para que apresentassem alegações finais escritas no prazo legal, a começar pelo MPF (ID 1304163290).
Na sequência, o Ministério Público Federal foi intimado com vista dos autos e apresentou as suas alegações finais, ocasião em que sustentou a comprovação da materialidade e da autoria dolosa do crime de associação para o tráfico de drogas (artigo 35 da Lei n. 11.343/06), motivo pelo qual pugnou pela condenação do acusado AMAURI MOURA SILVEIRA (ID 1355034763).
Por fim, a defesa do acusado AMAURI MOURA SILVEIRA apresentou suas alegações finais arguindo em síntese que inexiste prova apta a caracterizar o vínculo subjetivo de caráter estável e permanente para a prática do delito previsto no artigo 35 da Lei n. 11.343/06, devendo o acusado ser absolvido por falta de provas quanto a autoria delitiva por parte dele. (ID 1478082358).
Em seguida, os autos vieram conclusos para julgamento. É o relato do essencial.
FUNDAMENTAÇÃO QUESTÕES PRELIMINARES A defesa do acusado não suscitou novas preliminares, senão aquelas que já foram afastadas em decisões anteriores.
Nesse contexto, saliento que concorrem os pressupostos processuais objetivos e subjetivos.
O pedido é juridicamente possível, porque a conduta atribuída ao réu assume relevância no campo da tipicidade penal (formal e material).
A lide é subjetivamente pertinente.
O interesse processual decorre da adequação da via processual eleita e da imanente necessidade do processo para a aplicação de qualquer coerção de natureza penal.
Estão presentes, portanto, as condições da ação.
Observo que o feito seguiu seu curso regular, garantindo-se o contraditório às partes, com o livre exercício de todas as faculdades processuais asseguradas pelo ordenamento jurídico.
Ademais, a peça inicial acusatória atende a todos os requisitos expostos no artigo 41 do Código de Processo Penal.
Deveras, há a descrição clara do fato supostamente criminoso, com todas as suas circunstâncias, e o acusado está devidamente qualificado.
Os fatos imputados ao réu estão descritos com clareza na petição inicial, tendo o órgão acusador se utilizado, inclusive, de tópicos e subtópicos para a individualização da conduta, permitindo, assim, o exercício adequado dos direitos ao contraditório e à ampla defesa.
Ainda, a acusação apresentou a classificação jurídica preliminar da conduta narrada.
Logo, não há que se falar em inépcia da denúncia.
EXAME DO MÉRITO No caso vertente, observa-se que pesa contra o réu AMAURI MOURA SILVEIRA a acusação pela prática do crime de associação para o tráfico de drogas, capitulado no artigo 35 da Lei n. 11.343/06, que descreve a seguinte conduta típica: Art. 35.
Associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e §1º, e 34 desta Lei: Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.200 (mil e duzentos) dias-multa.
O crime de associação para o tráfico de drogas, segundo a melhor doutrina, consubstancia forma especial do delito de associação criminosa (artigo 288 do Código Penal) e deste se distingue pela especialidade dos fins almejados pelos ofensores, isto é, a prática de crimes relacionados às drogas ilícitas, bem como pelo número de agentes necessários à sua consumação, fixado em apenas dois.
Trata-se de crime comum, em cujo polo ativo pode figurar qualquer pessoa.
O delito é formal, consumando-se no momento da constituição da associação para o tráfico de drogas, independentemente da prática efetiva de outros atos criminosos.
No tocante à tipicidade subjetiva, infere-se que a conduta perpetrada deverá ser dolosa, consistente na consciência e vontade de se reunir em sociedade, de forma estável ou permanente, com a finalidade de cometer os crimes descritos nos artigos 33, caput e §1º, e 34 da Lei de Drogas.
Consuma-se o delito em comento, portanto, quando for constatada a presença destes elementos típicos.
Decerto, a associação de agentes para a prática de atos de natureza criminosa, ainda que nenhum crime tenha sido efetivamente cometido, consubstancia um mal em si que precisa ser normativamente combatido, mediante a punição de forma autônoma.
Conforme dito, para a caracterização do crime em questão, exige-se a constatação de um vínculo associativo estável ou permanente para os fins criminosos delineados no tipo penal, sendo irrelevante, entretanto, o fato de os integrantes se conhecerem ou não, de existir ou não uma liderança comum e de ocorrer a atribuição de tarefas específicas para cada membro do grupo.
Essencial é a vinculação contínua e deliberada entre os associados para a prática dos delitos mencionados na estrutura típica do aludido ilícito penal.
Diversamente do que ocorre com o crime de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, expressamente abrangido pelo artigo 2º da Lei n. 8.072/90, o delito de associação para o tráfico não se equipara a hediondo.
Por se tratar de tipo penal autônomo e de natureza formal, pode-se concluir que não há a necessidade de que sejam efetivamente praticados os crimes almejados pelos agentes associados, podendo o agente, assim, responder somente pelo delito de associação para o tráfico.
Sobre o ponto, José Paulo Baltazar Júnior leciona o seguinte (BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo.
Crimes Federais. 10. ed.
São Paulo: Saraiva, 2015, p. 1188): “Um agente pode integrar a associação, sem ser condenado pelos crimes autônomos, sendo também possível o inverso [...].
Exemplifica-se com a hipótese em que é sabida a existência de uma associação criminosa formada por três agentes em razão de uma interceptação telefônica por meio da qual se apurou tráfico de drogas de modo habitual.
Em uma determinada operação de compra e venda, um deles vendeu, outro transportou, um terceiro comprou e um “mula” entregou a mercadoria.
Se não foram colhidas provas sobre a participação de um dos integrantes no fato específico, esse agente responde somente pelo delito do art. 35 em razão da existência de provas sobre a associação.
O “mula” responde apenas pelo crime do art. 33 porque não integra a associação; e os outros dois, cuja participação no fato restou provada, respondem pelos arts. 33 e 35, em concurso material”.
Por fim, saliento que, no caso do delito de associação para o tráfico, mostra-se primordial que as provas reunidas sejam examinadas no seu conjunto, dentro do contexto em que ocorreram os fatos, valorizando-se, inclusive, os elementos indiciários (artigo 239 do CPP), que são reconhecidos como elementos de convicção, tendo em vista que crimes deste jaez geralmente são cometidos às escondidas, tornando-se muito difícil ou quase impossível a obtenção de prova direta.
Também por este motivo, não se exige a realização de exame de corpo de delito (prova material) para a condenação por associação para o tráfico, pois esta infração penal não deixa vestígios no mundo naturalístico (Nesse sentido, cf.
STJ, 5ª Turma, HC 1194/RO, Rel.
Min.
Cid Flaquer Scartezzini, DJ 22.06.1992, p. 9767).
Constato que a presente ação penal integra um grupo de processos criminais propostos pelo Ministério Público Federal a partir de investigação policial altamente complexa batizada de “OPERAÇÃO FLAK” (Inquérito Policial n. 069/2017-4/SR/PF/TO - autos judiciais n. 0001274-39.2017.4.01.4300), conduzida pelo Departamento de Polícia Federal no Tocantins e instaurada após a identificação, em um aeródromo situado em Porto Nacional/TO, de um suposto grupo criminoso voltado à adulteração de aeronaves para a sua possível utilização em atos de transporte aéreo de entorpecentes.
De acordo com os elementos informativos angariados, os investigados negociavam e compravam a cocaína com fornecedores radicados em países como Venezuela, Colômbia e Bolívia, visando o envio dos entorpecentes para países diversos, situados, principalmente, na América e na Europa.
Além de destino da droga, o Brasil também servia de importante entreposto para as atividades do grupo criminoso.
O transporte do material ilícito se dava, notadamente, pela via aérea.
Igualmente, foi possível concluir que a atividade da possível organização dependia do bom funcionamento dos pontos de apoio situados em Ourilândia do Norte/PA, São Félix do Xingu/PA, Porto Nacional/TO, Palmas/TO e Goiânia/GO, conforme consta do RELATÓRIO DE POLÍCIA JUDICIÁRIA n. 01/2016 (cf.
ID 178530445 - Pág. 60/72 dos autos do IPL n. 0001274-39.2017.4.01.4300, convertido em ação penal em razão do oferecimento de denúncia pelo MPF contra os integrantes do chamado “núcleo operacional” da associação criminosa).
Após mais de dois anos de investigações, com a adoção de diferentes meios de obtenção de provas permitidos em lei, tais como: (a) interceptação telefônica; (b) apreensões em flagrante de drogas, aeronaves, celulares, documentos, dinheiro e aparelhos GPS; (c) captações fotográficas ambientais; (d) vigilância aberta e buscas exploratórias; (e) obtenção de fontes humanas; e (f) cooperação entre instituições e órgãos governamentais, nacionais e internacionais, com destaque para a agência americana Drug Enforcement Administration (DEA) e a agência surinamesa Counter Terrorism Intelligence Unit (CTIU), as autoridades policiais lograram êxito em identificar e delimitar o envolvimento dos investigados no grupo criminoso, estruturalmente ordenado mediante nítida hierarquia e divisão de tarefas, sendo especializado na aquisição e transporte transnacional de entorpecentes para ulterior distribuição a comerciantes varejistas.
Durante a fase de investigação criminal, após a autorização de ação controlada por parte deste Juízo Federal, a autoridade policial acompanhou, no período compreendido entre março de 2017 a outubro de 2018, a realização de, no mínimo, vinte voos para transporte das drogas, perfazendo, em média, 400 a 500 quilogramas de cocaína cada, o que totalizou quase nove toneladas da substância ilícita, gerando renda bruta ilícita ao grupo criminoso de cerca de U$ 3.500.000,00 (cf.
ID 178564887 - Pág. 96 dos autos do referido IPL).
Em apertada síntese, o modus operandi do grupo desmantelado consistiu na formação de associação criminosa, organizada por meio de divisão de tarefas e especializada no transporte e distribuição dos entorpecentes (cocaína), a fim de aproximar centros produtores e compradores, sendo essenciais, para tanto, os serviços de manutenção, preparo e pilotagem de aeronaves agrícolas de pequeno porte, com a finalidade de operacionalizar logisticamente a entrada das drogas ilícitas oriundas de países como a Colômbia e a Bolívia no território nacional, sobretudo nos municípios de Tucumã/PA, Ourilândia do Norte/PA, São Félix do Xingu/PA e Porto Nacional/TO, para que então fossem encaminhadas para outras regiões do Brasil, bem como para os Estados Unidos da América, Europa e alguns países do continente africano, sendo utilizados como entrepostos países como Suriname, Honduras e Venezuela.
Para a consecução do transporte das cargas de cocaína, as aeronaves recebiam adaptações nos seus tanques de combustível, através da inserção de um sistema adicional de abastecimento que funcionava em pleno voo, com o objetivo de potencializar a sua autonomia, o que permitia que os aviões realizassem viagens de longas distâncias em regiões de mata.
Em razão da natureza ilícita da atividade desenvolvida pelo grupo, os voos eram executados em baixa altitude e as decolagens e aterrissagens ocorriam em pistas clandestinas, para inviabilizar a percepção das aeronaves pelos radares do sistema de controle aéreo.
A cada viagem, era possível transportar entre 400 a 500 quilogramas de pasta base de cocaína, sendo que, durante todo o período de investigações, a autoridade policial acompanhou o efetivo ingresso de cerca de 09 toneladas de entorpecentes no território nacional.
Para melhor sistematizar a persecução criminal em juízo, o Ministério Público Federal fracionou os crimes investigados em dois grupos de denúncias.
Em um primeiro grupo, foram imputados os crimes de associação para o tráfico e de organização criminosa, sendo que os investigados também foram separados por núcleos, a saber: “núcleo operacional”, “núcleo dos pilotos”, “núcleo dos mecânicos” e “núcleo dos produtores e compradores”.
Ademais, em um segundo grupo de denúncias, foram imputados os crimes individualmente praticados, de acordo com os diversos eventos criminosos isolados identificados nas investigações.
Especificamente quanto aos sujeitos denunciados no bojo dos presentes autos, verifica-se que o órgão ministerial apresentou anotações gerais na denúncia que refletiram as conclusões geradas a partir dos atos de investigação que perduraram por quase dois anos, nos seguintes termos (ID 1053213768– pág. 24 e 41): “[...] Por fim, existe um grupo de investigados que está diretamente relacionado aos compradores e/ou produtores de drogas, responsáveis por demandar os serviços prestados por JOÃO SOARES ROCHA para o tráfico internacional, com destaque para LUIZ CARLOS DA ROCHA, vulgo ‘CABEÇA BRANCA’.
Foram denominados de ‘NÚCLEO DOS PRODUTORES/COMPRADORES’. [...] É possível, portanto, verificar que as investigações conseguiram reunir vasto acervo probatório a demonstrar que os eventos supracitados estão relacionados às atividades da ORCRIM voltadas para o tráfico internacional de entorpecentes.
Mesmo naqueles eventos para os quais não houve, propriamente, apreensão de drogas, observam-se indícios fortes da prática desse tipo de crime, uma vez que estão presentes: (i) Rotas tradicionais de tráfico de drogas utilizadas pelo grupo criminoso; (ii) conversas cifradas por meio de aplicativos de mensagens e com a utilização de codinomes e/ou códigos; (iii) utilização de aeronaves adulteradas (tanto quanto aos dados de identificação, quanto à capacidade de armazenamento de combustíveis); (iv) utilização de pistas de pouso clandestinas; (v) constante preocupação dos interlocutores com a presença das autoridades policiais; (vi) utilização de planos de voos falsos; e (vii) participação de diversos membros com envolvimento no narcotráfico Destarte, feitos estes esclarecimentos iniciais, deve-se salientar que nos presentes autos foram denunciados os indivíduos integrantes do chamado “núcleo dos produtores e compradores”, os quais teriam se associado a outras pessoas com a finalidade de praticar, de forma reiterada, o crime previsto no artigo 33 da Lei n. 11.343/06, fatos estes que serão abordados de maneira pormenorizada adiante.
Materialidade e autoria do delito de associação para o tráfico de drogas com relação ao acusado AMAURI MOURA SILVEIRA – Analisando o acervo probatório coligido nos autos, em cotejo com os argumentos apresentados pelas partes, estou convencido de que a pretensão punitiva deverá ser julgada procedente com relação ao acusado AMAURI MOURA SILVEIRA, diante da presença dos seguintes elementos que comprovaram a materialidade e a autoria dolosa do fato criminoso: (a) informações de polícia judiciária e relatórios contendo registros ambientais e análises das comunicações telefônicas interceptadas, que foram objetos dos seguintes expedientes: (a.1) RELATÓRIO DE ANÁLISE DE POLÍCIA JUDICIÁRIA N. 16/2018, 18/2018, 19/2018; (a.2) INFORMAÇÃO DE POLÍCIA JUDICIÁRIA – RELATÓRIO DE DILIGÊNCIA COMPLEMENTAR N. 51.1/2019; (a.3) INFORMAÇÕES DE POLÍCIA JUDICIÁRIA N. 14/2018, 31/2018; (b) Termo de Qualificação e Interrogatório extrajudicial de HAMILTON GOUVEIA ALBERTO; (c) oitivas em juízo das testemunhas de acusação TIAGO RAFAEL DA CONCEIÇÃO (ID 1304312766) e RODRIGO CARVALHO (ID 1304312767), oitiva em juízo da testemunha de defesa MARIA ANTONIA JACARANDA (ID 1304312768) e; (d) interrogatório judicial do acusado AMAURI MOURA SILVEIRA (ID 1304312772 e 1304312773).
Com efeito, observa-se que foram reunidos nesta ação penal elementos que comprovaram a materialidade do crime de associação para o tráfico, tipificado no artigo 35 da Lei n. 11.343/06, bem como o envolvimento do acusado AMAURI MOURA SILVEIRA na prática de atos que evidenciam o vínculo associativo estável entre o referido agente e os demais membros do grupo criminoso, com a finalidade de cometerem o crime descrito no artigo 33 da Lei de Drogas, fato este que se amolda ao tipo penal imputado ao réu na peça acusatória.
Destaca-se que a relação do acusado com a organização criminosa comandada por JOÃO SOARES ROCHA remonta há vários anos, o que é lembrado pelo Relatório de Análise de Polícia Judiciária n. 19/2018, inserido nos autos 0001274-39.2017.4.01.4300 – IPL 69/2019, ID 178564847 – pág. 131.
No mesmo sentido é a informação constante do Relatório de Análise de Polícia Judiciária n. 18/2018 (ID 178637378 – pág. 21 do IPL), em que a polícia judiciária lembra que o acusado já foi preso em 2013 ao ser flagrado com mais de 230 kg de cocaína em uma aeronave juntamente com EVANDRO ROCHA REIS, irmão de JOÃO SOARES ROCHA.
Em razão do evento criminoso que culminou em sua prisão em flagrante, foi ofertada denúncia em seu desfavor e proferida sentença condenatória, estando o processo atualmente aguardando julgamento pela instância superior.
Na página 186 do ID 178564847, referente ao mesmo documento, infere-se que o acusado prestava auxílio a JOÃO SOARES ROCHA (apontado como líder da organização investigada) por meio de tratativas com o mecânico HAMILTON, visando o reparo de aeronaves utilizadas para o tráfico, situação da qual o acusado tinha pleno conhecimento.
No mesmo documento a polícia judiciária se refere a conversas que o acusado estabeleceu com o mecânico HAMILTON sobre a preparação de uma aeronave, ocasião em que disse que “não poderia ter surpresa lá no mato”.
Consta ainda do mesmo Relatório de Análise de Polícia Judiciária n. 19/2018 que AMAURI MOURA SILVEIRA teria pilotado, para fins de testes, a aeronave PP-IAP quando a mesma se encontrava no aeródromo Sítio Flyer na cidade de Palmas/TO em março de 2018, aeronave esta que era usada pela associação para o transporte de entorpecentes, conforme se verá adiante.
Compulsando-se os autos n. 0001274-39.2017.4.01.4300, no ID 178564853 – págs. 123/127, a situação envolvendo o acusado e a aeronave de prefixo PP-IAP pode ser melhor compreendida.
A situação é descrita na Informação de Polícia Judiciária – Relatório de Diligência Complementar n. 51.1/2019, que se refere a diligências efetuadas no Aeroclube Sítio Flyer – Palmas/TO, por meio das quais se procedeu ao interrogatório de um caseiro chamado ELIAS GONÇALVES DA SILVA.
ELIAS atribuiu a propriedade de uma aeronave de prefixo PP-IAP que lá estava ao denunciado AMAURI MOURA SILVEIRA.
Na ocasião, ao ser indagado pela Polícia Federal, ELIAS informou também que o acusado eventualmente ia ao aeroclube para se encontrar com um indivíduo conhecido como “CHIQUINHO” de Porto Nacional/TO, que é mecânico de aeronaves.
Tendo em vista o contexto em que se insere o depoimento, possivelmente trata-se de FRANCISCO SILVA FERREIRA FILHO, outro investigado e já denunciado por fazer parte da organização, tendo inclusive sido proferida sentença condenatória em seu desfavor nos autos n. 0002981-71.2019.4.01.4300 pela prática do crime tipificado no artigo 35 da Lei n. 11.343/06.
Segundo a Informação de Polícia, ELIAS não soube dizer se AMAURI MOURA SILVEIRA era piloto, mas afirmou que AMAURI cuidava de aeronaves, notadamente de um avião que ficava na pista “Iracema”.
Disse ainda que a aeronave chegou ao aeroclube em dezembro de 2018, trazida pelo acusado e outro indivíduo que a pilotava.
Com relação à aeronave de prefixo PP-IAP, sabe-se que este juízo decretou no bojo dos autos 0000038-81.2019.4.01.4300 sua apreensão após o oferecimento da competente Representação pela polícia judiciária por entender que ela era utilizada pela organização criminosa para o transporte de cocaína.
Com efeito, assim como constatado com relação às outras dezenas de outras aeronaves utilizadas pela organização, há provas de que era utilizada para o transporte de entorpecentes, conforme se depreende das informações extraídas do Relatório de Análise de Polícia Judiciária n. 16/2018, constante dos autos n. 0001274-39.2017.4.01.4300 – IPL 69/2019 (ID 178637367 – págs. 31/70).
No mesmo sentido, verifica-se que no dia 25.02.2018 ela foi fotografada juntamente com outras aeronaves no hangar de JOÃO SOARES ROCHA (líder da ORCRIM) em Ourilândia do Norte/PA, conforme buscas exploratórias feitas pela polícia federal e relatadas na informação de polícia judiciária n. 14/2018 (ID 178686371 – págs. 42/49).
Assim, a informação de Polícia Judiciária – Relatório de Diligência Complementar n. 51.1/2019 que relaciona AMAURI MOURA SILVEIRA com a aeronave de prefixo PP-IAP, que com base nas informações extraídas dos documentos supramencionados é sabidamente utilizada pela organização para o cometimento do crime, o vincula como membro do grupo, principalmente porque o acusado mantém diálogos e relações com outros denunciados, corroborando com a hipótese criminal ventilada na denúncia de que o denunciado associou-se na forma do Art. 35 da Lei de Drogas.
Ainda corroborando com a participação do acusado nos eventos descritos na denúncia, notadamente de que era piloto e trabalhava no preparo das aeronaves, é o Termo de Qualificação e Interrogatório de HAMILTON GOUVEIA ALBERTO (autos n. 0001274-39.2017.4.01.4300 – IPL 69/2019, ID 178564854 – pág. 45/46), no qual este afirma que foi contratado pelo acusado para consertar uma aeronave em Anápolis/GO.
Seu depoimento vai ao encontro do Relatório de Análise de Polícia Judiciária n. 19/2018.
Além do mais, conforme Informação de Polícia Judiciária n. 31/2018 (ID 178564849 – págs. 92/98), inserido nos autos 0001274-39.2017.4.01.4300 – IPL 69/2019, o acusado esteve na "pista do Wisley" — Aeródromo Dona Iracema — e na Associação Tocantinense de Aviação — ATA — situadas em Porto Nacional/TO nos dias 14 e 15 de novembro de 2018, na companhia do piloto RICARDO BRITTES FERREIRA, que também figura como denunciado nos autos originários.
Os locais eram utilizados pela ORCRIM para realizar voos para o tráfico de drogas, dar manutenção nas aeronaves do grupo e armazená-las nos hangares existentes.
Na ocasião, conforme Informação de Polícia Judiciária n. 31/2018 (ID 178564849 – págs. 92/98), a polícia federal apurou que no dia 15 de Novembro de 2018 ambos trabalharam em uma aeronave utilizada pela organização criminosa para a prática da conduta descrita na denúncia, que estava no interior do hangar no aeródromo Dona Iracema.
Na ocasião foram auxiliados por um indivíduo identificado como “MONTANHA”, que já trabalhou como mecânico para uma empresa denominada ÁGUIA AVIAÇÃO, de propriedade de IRON RIBEIRO FERREIRA, também denunciado.
Possivelmente a aeronave em questão era a de prefixo PR-LIT (ID 178564849 – pág. 96).
Já no Relatório de Análise de Polícia Judiciária n. 18/2018, produzido no bojo dos autos n. 0001275-24.2017.4.01.4300, cuja digitalização segue no ID 178637378 págs. 14/58 dos autos 0001274-39.2017.4.01.4300 – IPL 69/2019, seguem-se trechos de conversas interceptadas envolvendo o acusado AMAURI MOURA SILVEIRA e o líder da Organização Criminosa JOÃO SOARES ROCHA.
Nas conversas os interlocutores falam sobre o preparo de aeronaves para o transporte de cocaína.
No mesmo documento a polícia judiciária constata por meio das conversas interceptadas que o acusado tratou com o mecânico HAMILTON – também denunciado - sobre a preparação de uma aeronave, ocasião em que disse que “não poderia ter surpresa lá no mato”.
O teor das conversas em cotejo com o contexto em que era efetuado o transporte da droga e a trajetória percorrida pelas aeronaves denota que a aeronave foi utilizada em área de difícil acesso, tudo em consonância com os locais onde a quadrilha buscava e descarregava as cargas de entorpecentes, haja vista as coordenadas de pistas repassadas pelos investigados entre si por meio de mensagens de BBM descritas em relatórios anteriores produzidos pela polícia judiciária e constantes do IPL de autos n. 0001274-39.2017.4.01.4300.
Desta forma, infere-se do teor das informações e relatórios produzidos no interesse das investigações, muitas das quais produzidas no curso de interceptações telefônicas e buscas exploratórias, que AMAURI MOURA SILVEIRA interagia com integrantes da Organização Criminosa, sobretudo com o líder da ORCRIM, inclusive nos locais em que se situavam as aeronaves utilizadas para o transporte da droga.
Assim, infere-se do contexto e dos elementos de prova cotejados nos presentes autos, merecendo destaque ainda o evento referente à sua prisão em flagrante ocorrida em 2013 em Minas Gerais, ocasião em que AMAURI MOURA SILVEIRA estava na posse de 230Kg de cocaína a bordo de uma aeronave, que ele tinha ciência da prática delituosa por parte dos demais denunciados e agia no interesse da organização, sobretudo na qualidade de piloto e promovendo a manutenção das aeronaves pertencentes à quadrilha.
Chega-se a mesma conclusão quando analisamos os depoimentos prestados em juízo pelas testemunhas arroladas pela acusação.
Segue trecho do depoimento prestado pela testemunha de acusação, o Agente TIAGO RAFAEL DA CONCEIÇÃO, que indagado pelo parquet acerca dos fatos apontados na denúncia e da participação do acusado, aduziu em síntese (ID 1304312766): [...] Que o acusado AMAURI era um auxiliar de JOÃO SOARES ROCHA na preparação de aeronaves, de forma geral na manutenção, preparo e indicação de pilotos para elas. [...] Que de acordo com a informação de polícia judiciária foram encontradas notas fiscais de serviços vinculadas às aeronaves de João Soares rocha. [...] Que a preparação das aeronaves consistia em verificar o combustível e testes mecânicos; [...] que algumas aeronaves precisavam ser encaminhadas para oficinas a depender da circunstância, para serem preparadas [...] que o acusado também participava n a modificação estrutural das aeronaves; [...] que no passado o acusado já atuou como piloto nos interesses do grupo criminoso Indagado pela advogada da defesa, Dra.
Ana Paula, se em algum momento da investigação haveria provas de que AMAURI MOURA SILVEIRA participou das alterações feitas nas aeronaves, a testemunha TIAGO RAFAEL DA CONCEIÇÃO disse (ID 1304312766): [...] Que se recorda de algumas ligações telefônicas interceptadas que denotam a participação do acusado AMAURI nas adulterações das aeronaves, e de outras onde se constatou que o acusado tinha a responsabilidade de realizar o conserto das aeronaves, muitas das quais se apresentavam adulteradas; [...] No mesmo sentido é o depoimento prestado pela testemunha de acusação, o Agente RODRIGO CARVALHO, que ao ser indagado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO acerca da participação de AMAURI MOURA SILVEIRA arguiu: [...] Que o acusado AMAURI auxiliava JOAO SOARES ROCHA em demandas para o reparo de aeronaves; [...] que sua participação ficou mais evidente na prática envolvendo os crimes descritos na operação em uma conversa que ele manteve com um mecânico de Anápolis, Hamilton Gouveia, ocasião em que o acusado advertiu que o mecânico deveria ter cuidado especial com a aeronave para que ela não apresentasse problemas “lá no mato”; [...] que a aeronave saía do Brasil até a fronteira de Venezuela ou Colômbia, parando em são Felix do Xingu para abastecimento, e de lá iam até o Suriname ou América central e retornavam ao Brasil; [...] que com relação ao acusado, ele tinha a função de repassar aos mecânicos o que João soares rocha determinava; que após a deflagração da operação “FLAK”, e por meio da análise das conversas interceptadas, o acusado mantinha conversas com RICARDO BRITTES FERREIRA (também denunciado) nos interesses de JOÃO SOARES ROCHA (líder da ORCRIM); [...] Ao ser indagado por este juízo se conhecia JOÃO SOARES ROCHA, qual função exerce, se é piloto de aviões e sobre as manutenções que as aeronaves recebiam, dentre outras coisas relacionadas à denúncia, o acusado respondeu: [...] que o conheceu JOÃO SOARES ROCHA por volta dos anos de 2007/2008, tendo se afastado em 2013 por conta do episódio envolvendo sua prisão em flagrante; que voltou a falar com ele em 2018; [...] que é aviador de formação; [...] que conhece RICARDO BRITTES FERREIRA; que quando se encontrou com ele na “pista do Wisley”, o fez ao acaso, pois visava apenas estabelecer novos contatos com possíveis compradores já que comercializava peças aeronáuticas; [...] Portanto, infere-se de seu depoimento que o acusado AMAURI MOURA SILVEIRA conhece e se relaciona com o JOÃO SOARES ROCHA, bem como com o denunciado RICARDO BRITTES FERREIRA.
Mas ao contrário do que disse em seu depoimento, o encontro do acusado com RICARDO BRITTES FERREIRA não se deu de forma aleatória.
Em verdade, conforme relatado pela polícia judiciária na já mencionada Informação de Polícia Judiciária n. 31/2018, inclusive com registros fotográficos, AMAURI se encontrou com RICARDO tanto na “Pista do Wisley” quanto na ATA – Associação Tocantinense de Aviação -, ocasião em que ambos trabalharam em uma aeronave da ORCRIM que estava no interior de um HANGAR.
Frise-se que estes locais eram utilizados pela ORCRIM, não só para dar manutenção nas aeronaves e armazenamento das mesmas, mas também como base operacional a fim de realizar os voos para o tráfico de drogas.
Na continuação de seu depoimento, desta vez inquirido pelo membro do Ministério Público Federal, acerca das mensagens que trocou com JOÃO SOARES ROCHA, AMAURI MOURA SILVEIRA respondeu: [...] que JOÃO SOARES ROCHA disse que tinha um avião em palmas e estava interessado em comprar peças de avião com ele, que se recusou a fazer a venda para JOÃO SOARES; que não instruiu nenhum mecânico a fazer serviços para o João; [...] que em Minas Gerais foi condenado por tráfico de drogas; [...] Apesar de alegar em seu depoimento que não fez negócio com JOÃO SOARES ROCHA, as conversas interceptadas no curso das investigações mostram o oposto, ficando claro que AMAURI MOURA SILVEIRA conversava com HAMILTON GOUVEIA ALBERTO (já condenado em outros autos) nos interesses de JOÃO SOARES ROCHA, e que o acusado integrava a associação criminosa por ele chefiada.
Ainda, os diálogos interceptados, conforme o já mencionado Relatório de Análise de Polícia Judiciária – 18/2018, evidenciam o preparo de aeronaves e o dolo presente na conduta do denunciado, evidenciando ainda que detinha a plena confiança de JOÃO SOARES ROCHA.
Por oportuno, cumpre esclarecer que, os depoimentos de agentes policiais prestados em juízo constituem meio de prova válido e idôneo, podendo, inclusive, embasar a condenação do réu, sobretudo quando colhidos mediante observância ao devido processo legal e sob o crivo do contraditório, como ocorreu no caso vertente.
Em verdade, deve-se atribuir especial credibilidade às declarações fornecidas por agentes policiais envolvidos no caso concreto, notadamente quando estão em harmonia com os demais elementos de prova constantes dos autos, seja em razão da respeitabilidade conferida ao cargo público que ocupam, seja porque tiveram contato direto com os eventos apurados, possuindo, assim, amplo domínio quanto aos fatos objeto do feito criminal.
Ressalte-se que o entendimento ora manifestado se encontra em consonância com a jurisprudência predominante dos tribunais superiores (cf.
STF, 2ª Turma, HC 74438/SP, Rel.
Min.
Celso de Mello, j. 26.11.1996, DJ 09.12.1996, DJe 14.03.2011; STJ, 5ª Turma, HC 395325/SP, Rel.
Min.
Ribeiro Dantas, j. 18.05.2017, DJe 25.05.2017). É importante ponderar que, à luz do ordenamento jurídico pátrio, a defesa poderia demonstrar, no caso concreto, que as testemunhas com tal qualificação não gozariam de idoneidade, sendo, contudo, ônus da defesa a produção dessa prova, o que, a toda evidência, não se verificou no presente caso.
Portanto, pode-se concluir que os argumentos defensivos, consubstanciados nas teses levantadas pela defesa técnica e nas declarações apresentadas pelo acusado em seu interrogatório judicial, resumem-se a versões dos fatos que não são dignas de fé, mormente porque não estão amparadas em quaisquer elementos probatórios e completamente dissociadas do contexto em que se inserem os eventos criminosos e as provas coligidas nos autos, sendo incapazes de infirmar a narrativa da acusação e o teor dos elementos de convicção colacionados ao presente feito.
Nesse cenário, verifica-se ainda que a defesa do réu não se desincumbiu do ônus de comprovar a existência de eventuais fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do jus puniendi estatal, no curso desta ação penal.
Sem dúvida, a acusação logrou êxito em descrever e comprovar a ocorrência de uma série de atos praticados pelo acusado AMAURI MOURA SILVEIRA que, quando considerados em conjunto, revelam a sua efetiva participação no grupo criminoso, sendo certo que o tipo penal do artigo 35 da Lei de Drogas pune a conduta daquele que integra o aparato ilícito, motivo pelo qual é suficiente para a comprovação da prática delitiva a apresentação de elementos que evidenciem a ocorrência de eventos que vinculem o acusado à atividade criminosa, como aconteceu nos presentes autos.
Saliento que, no caso do delito de associação para o tráfico, mostra-se primordial que as provas reunidas sejam examinadas no seu conjunto, dentro do contexto em que ocorreram os fatos, valorizando-se, inclusive, os elementos indiciários (artigo 239 do CPP), que são reconhecidos como elementos de convicção, tendo em vista que crimes deste jaez geralmente são cometidos às escondidas, tornando-se muito difícil ou quase impossível a obtenção de prova direta.
Também por este motivo, não se exige a realização de exame de corpo de delito (prova material) para a condenação por associação para o tráfico, pois esta infração penal não deixa vestígios no mundo naturalístico ( Nesse sentido, cf.
STJ, 5ª Turma, HC 1194/RO, Rel.
Min.
Cid Flaquer Scartezzini, DJ 22.06.1992, p. 9767).
Em verdade, estou convencido de que os múltiplos e robustos elementos probatórios reunidos nesta ação penal evidenciaram a vontade e consciência do agente quanto à participação no ato ilícito descrito na denúncia, a demonstrar a presença do elemento anímico doloso na sua conduta.
Considerando-se, assim, que o acusado tinha pleno conhecimento de que, através de seus atos, integrava uma cadeia organizada em divisão de tarefas voltada para o tráfico transnacional de drogas, deverá ser responsabilizado na medida de sua culpabilidade, em consonância com os preceitos da ordem jurídica vigente.
Com efeito, no caso vertente, para além de todas as provas já valoradas no bojo desta sentença, verifica-se a presença de vários elementos probatórios que corroboraram a narrativa da acusação, a exemplo da relação de proximidade entre o acusado e o líder do grupo criminoso JOAO SOARES ROCHA, o qual já se encontrava em atividade no tráfico de drogas havia muitos anos.
No mesmo sentido, é o teor dos diversos diálogos suspeitos mantidos entre o acusado e outros integrantes do aparato criminoso, bem como os encontros que aconteciam entre o acusado e outros integrantes da organização criminosa nos aeródromos e pistas onde as aeronaves se encontravam, conforme já relatado acima, elementos estes que indicam a plena consciência do réu quanto à atividade ilícita desenvolvida pelo grupo do qual fazia parte.
Nesse sentido, diante da existência de uma pluralidade de elementos indiciários que, somados e justapostos, conduzem à conclusão de que houve a atuação dolosa do acusado na prática da mencionada infração penal, deve-se invocar a disposição do artigo 239 do Código de Processo Penal, que define o indício como sendo “a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se pela existência de outras ou mais circunstâncias”.
Como se sabe, a jurisprudência dos Tribunais Superiores e a doutrina predominante lecionam que um indício per se não sustenta um decreto condenatório.
No entanto, a pluralidade de indícios, entrelaçados e dotados de coerência lógica entre si, em posição de convergência e univocidade, impõem a inevitável conclusão pela participação do acusado no crime em apuração, sendo elemento de convicção suficiente para afiançar um juízo condenatório em desfavor do réu (STF, 2ª Turma, HC 70344/RJ, Rel.
Min.
Paulo Brossad, DJ 22.10.1993; STJ, Corte Especial, APn 224/SP, Rel.
Min.
Fernando Gonçalves, DJe 23.10.2008).
Por todo o exposto, pode-se concluir que os eventos narrados pela acusação, quando cotejados com os fartos elementos de convicção reunidos nestes autos, permitem inferir, para além de qualquer dúvida razoável, que o réu AMAURI MOURA SILVEIRA integrou a associação criminosa desarticulada no âmbito da “OPERAÇÃO FLAK”, que se destinava ao tráfico transnacional de drogas, conforme amplamente demonstrado nos autos, conduta esta descrita na norma penal incriminadora do artigo 35 da Lei n. 11.343/06.
Desse modo, presentes estão os elementos objetivos (descritivos e normativos) e subjetivos (dolo) do delito imputado ao réu.
Além disso, o acusado não agiu amparado por nenhuma excludente de ilicitude, sendo ainda culpável, já que era maior de idade à época dos fatos, com maturidade mental que lhe proporcionava a consciência da ilicitude da conduta. É também livre e moralmente responsável e reúne aptidão e capacidade de autodeterminação para se decidir pela prática da infração.
Em razão disso, a condenação do réu pela prática do crime previsto no artigo 35 da Lei n. 11.343/06 é medida imperativa.
DISPOSITIVO Ante todo o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na denúncia, para CONDENAR o acusado AMAURI MOURA SILVEIRA pela prática da infração penal tipificada no artigo 35 da Lei n. 11.343/06.
DOSIMETRIA Cumprindo a regra constitucional que determina a individualização da pena (artigo 5º, inciso XLVI, CRFB/88), passo à dosimetria das sanções, iniciando pela fixação da pena-base, em conformidade com os artigos 68 e 59 do Código Penal, passando pela análise das circunstâncias atenuantes e agravantes e, por fim, apreciando as causas de aumento e de diminuição das reprimendas.
No caso vertente, também deverão ser aplicadas as disposições constantes dos artigos 42 e 43 da Lei n. 11.343/06 para a dosagem das penas impostas ao sentenciado. - AMAURI MOURA SILVEIRA A culpabilidade do réu, consistente em elemento fundamentador e limitador da pena, ou seja, a reprovação social que o crime e o autor do fato merecem, extravasou o ordinário para o caso.
Como se sabe, o Supremo Tribunal Federal admite a elevação da pena-base nas situações em que ocorre a apreensão de “inúmeros objetos utilizados para o tráfico” de drogas, fato este que revela a sofisticação do grupo, como ocorreu no caso vertente.
Por esta razão, pode-se concluir que tal circunstância, por não constituir elementar do tipo, representa uma maior potencialidade lesiva ao bem jurídico tutelado pela norma penal violada, justificando uma reprovabilidade mais acentuada da conduta criminosa, de modo que a pena-base deverá ser fixada acima do mínimo legal (cf.
STF, 1ª Turma, RHC n. 101278/RJ, Rel.
Min.
Cármen Lúcia, j. 27.04.2010, DJe 21.05.2010).
O réu não possui maus antecedentes a serem valorados neste processo criminal, na forma do enunciado de súmula n. 444 do Superior Tribunal de Justiça, uma vez que não consta dos autos certidão de antecedentes criminais indicando o contrário.
A conduta social, compreendida como a interação do agente em seus vários setores de relacionamento, bem como no ambiente no qual está inserido, não deve ser pontuada desfavoravelmente, pois não há nos autos quaisquer informações que justifiquem esta medida.
A personalidade do agente, a meu ver, somente pode ser aferida mediante uma análise das condições em que ele se formou e vive.
Segundo moderna e mais abalizada doutrina penal, a personalidade só é determinável por critérios técnicos e científicos que escapam ao domínio cognoscível do juiz, de sorte que, por tal razão, não deve ser valorada.
Os motivos do crime, considerados como um plexo de situações psíquicas que fazem alguém a agir criminosamente, podendo representar tanto a causa do delito como a finalidade a ser atingida pelo agente, são normais à espécie.
As circunstâncias do delito, que são os elementos acidentais não participantes da estrutura do tipo, embora envolvendo a conduta criminosa, não foram normais à espécie, tendo em vista que houve a constituição de associação criminosa de ampla magnitude, organizada por distribuição de tarefas e que empregava astúcia e recursos materiais altamente valiosos, a exemplo de aeronaves, para a execução dos ilícitos praticados, sendo bem estruturada e contando com boa logística para lograrem êxito na consecução do intento delituoso, mediante a inviabilização da atuação do sistema de controle aéreo.
Portanto, diante da existência de grupo criminoso expressivo, que possuía um elevado grau de complexidade e abrangência muito ampla, com estabilidade de divisão de tarefas, entendo que este fato consubstancia justificativa idônea para o afastamento da pena do mínimo legal, nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (cf.
STJ, 6ª Turma, AgRg no HC 639005/SP, Rel.
Min.
Laurita Vaz, DJe 03.03.2022).
As consequências do delito, interpretadas como o mal adicional causado pelo crime, transcendente ao resultado típico, devem ser valoradas favoravelmente ao condenado, pois são comuns ao tipo.
O comportamento da vítima é um indiferente penal, tendo em vista a impossibilidade de influenciar na conduta perpetrada pelo agente.
No que se refere à natureza da substância ilícita (cocaína) que era traficada pelo grupo criminoso do qual fazia parte o sentenciado (artigo 42 da Lei n. 11.343/06), deve-se ter em conta que se trata de droga altamente adictiva (viciante), sendo certo que seu uso contínuo causa dependência e sérios danos de natureza crônica ao organismo, tais como distúrbios cardiovasculares, respiratórios, gastrointestinais e psiquiátricos, entre outros.
Por esta razão, entendo que tal circunstância judicial justifica a elevação da pena-base (Nesse sentido, cf.
STJ, 6ª Turma, HC 698362/RO, Rel.
Min.
Antonio Saldanha Palheiro, DJe 15.02.2022).
Por fim, a quantidade da substância ilícita manejada pelo grupo criminoso deverá ser considerada desfavoravelmente ao condenado (artigo 42 da Lei n. 11.343/06), na esteira da jurisprudência dos tribunais pátrios (TRF4, 8ª Turma, APCRIM n. 2000.71.04.004816-4/RS, Rel.
Des.
Fed. Élcio Pinheiro de Castro, pub. 13.05.09; STJ, 6ª Turma, HC 698362/RO, Rel.
Min.
Antonio Saldanha Palheiro, DJe 15.02.2022; STJ, 5ª Turma, AgRg no HC 701101/RS, Rel.
Jesuíno Rissato, DJe 16.12.2021), tendo em vista que houve a efetiva apreensão de grande quantidade de entorpecentes (toneladas de cocaína) que eram transportados por integrantes do grupo criminoso do qual o réu fazia parte, conforme relatado nos diversos eventos mencionados pela acusação na peça exordial (ID 227475877 - Pág. 3/38).
Considerando-se o conjunto das circunstâncias judiciais efetivamente valoradas, bem como os limites das sanções cominadas, fixo as penas-base nos patamares de 06 anos e 06 meses de reclusão e 950 dias-multa.
Não há circunstâncias atenuantes ou agravantes a serem consideradas.
Na terceira fase da dosimetria, não se observam causas de diminuição de pena.
A este despeito sabe-se que, de acordo com a jurisprudência consolidada do STJ, não se aplica a causa especial de diminuição de pena prevista no artigo 33, §4º, da Lei n. 11.343/06 ao crime de associação para o tráfico de drogas, tipificado no artigo 35 da mesma lei, pois a simples existência da associação indica que o agente se dedica a atividades criminosas (cf.
STJ, 6ª Turma, HC 342317/SP, Rel.
Min.
Maria Thereza de Assis Moura, j. 17.12.2015, DJe 02.02.2016; STJ, 6ª Turma, REsp 1199671/MG, Rel.
Min.
Maria Thereza de Assis Moura, j. 26.02.2013, DJe 06.03.2013).
Considerando-se,
por outro lado, o caráter transnacional do grupo criminoso, uma vez que este era composto por sujeitos radicados em outros países, havendo agentes brasileiros e estrangeiros (Nesse sentido, cf.
STF, 1ª Turma, HC 97979/SP, Rel.
Min.
Cármen Lúcia, j. 03.11.2009, DJe 04.12.2009) que realizavam traslados de entorpecentes que rompiam os limites territoriais de diversos países, além do fato de que a atividade criminosa desempenhada pelo grupo envolvia diferentes estados desta federação, com fundamento na previsão do artigo 40, incisos I e V, da Lei de Drogas, aumento as reprimendas em 1/2 (metade), passando a dosá-las em 09 anos e 09 meses de reclusão e 1.425 dias-multa, as quais torno definitivas.
Não há informações acerca da renda mensal do condenado, mas conforme sua oitiva e juízo sabe-se que é corretor e comercializa peças de avião, razão pela qual fixo o valor do dia-multa no patamar mínimo de 1/10 (um décimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, incidindo a devida correção monetária.
Observa-se que há pena a ser detraída, uma vez que o sentenciado foi preso preventivamente em 21.02.2019, conforme determinação deste juízo nos autos n. 0000038-81.2019.4.01.4300) e foi solto em 01.08.2019 (autos n. 0000038-81.2019.4.01.4300, ID 162032374 – pág. 56).
Portanto, na forma do art. 10 do Estatuto Repressivo, remanescem as penas privativas de liberdade de 09 anos, 03 meses e 16 dias de reclusão.A pena privativa de liberdade será cumprida, inicialmente, em regime fechado para (art. 33, § 2º, “a”, do CP).
O condenado não preenche os requisitos para a substituição de sua pena privativa de liberdade, em razão da quantidade da pena efetivamente dosada (artigo 44, inciso I, CP).
Fixo como valor mínimo para a reparação dos danos causados pela atividade criminosa objeto da “OPERAÇÃO FLAK” o valor de R$ 13.430.000,00 reais conforme indicado na denúncia, montante este que deverá ser oportunamente atualizado com juros de mora e correção monetária.
Deve-se ressaltar que a responsabilidade pela reparação do dano é solidária entre todos os agentes envolvidos na prática delitiva atinente à “OPERAÇÃO FLAK”, pois decorre do nexo de causalidade existente entre a conduta criminosa e a ocorrência objetiva da ofensa, sendo certo que a delimitação da responsabilidade ocorrerá por ocasião da execução das verbas.
O condenado poderá recorrer em liberdade, tendo em vista que não há qualquer fundamento que autorize sua segregação cautelar.
Nos termos do artigo 15, inciso III, da Constituição Federal, suspendo os direitos políticos do condenado enquanto durarem os efeitos da condenação.
Observo que constam dos autos da medida cautelar patrimonial n. 0000042-21.2019.4.01.4300 bens constritos pertencentes ao sentenciado AMAURI MOURA SILVEIRA cuja perda em favor da União deve ser declarada.
Neste contexto, DECLARO a perda em favor da União de todos os bens móveis, bens imóveis, inclusive aeronaves, cotas sociais e valores pertencentes ao condenado que tenham sido sequestrados ou apreendidos no âmbito da “OPERAÇÃO FLAK” (medida cautelar patrimonial n. 0000042-21.2019.4.01.4300), ressalvados somente aqueles que já tenham sido restituídos aos legítimos proprietários ou que tenham tido a sua ordem de sequestro levantada no bojo de feitos incidentais, o que faço com fundamento nos artigos 63, inciso I, e 63-B, caput in fine, da Lei n. 11.343/06 c/c artigo 91, inciso II, do Código Penal, sendo que os bens e numerários perdidos cujos valores excedam o necessário à reparação do dano deverão ser revertidos diretamente ao Fundo Nacional Antidrogas (FUNAD), na forma do artigo 63, §1º, da Lei n. 11.343/06.
Oportunamente, com o trânsito em julgado, deverá ser elaborada e remetida ao órgão gestor do FUNAD a relação dos bens e valores pertencentes ao sentenciado que tenham sido declarados perdidos nesta sentença, indicando o local em que se encontram e a entidade ou o órgão em cujo poder estejam, para os fins de sua destinação, nos termos da legislação vigente (artigo 63, §2º, da Lei n. 11.343/06).
Condeno ainda o sentenciado ao pagamento das custas e demais despesas processuais (artigo 804 do Código de Processo Penal).
PROVIDÊNCIAS DE IMPULSO PROCESSUAL A veiculação deste ato no Diário da Justiça é apenas para fim de publicidade.
A Secretaria da Vara Federal deverá adotar as seguintes providências: (a) veicular esta sentença no Diário da Justiça; (b) arquivar cópia desta sentença em local apropriado; (c) intimar as partes e seus representantes legais; (d) aguardar o prazo para recurso.
PROVIDÊNCIAS FINAIS Após o trânsito em julgado, deverá a Secretaria da Vara: (a) lançar o nome do condenado no rol de culpados; (b) comunicar a condenação à Polícia Federal para fins cadastrais; (c) comunicar a condenação ao Tribunal Regional Eleitoral para fins de suspensão dos direitos políticos; (d) providenciar a execução das penas.
Palmas, 17 de julho de 2023.
Juiz Federal Adelmar Aires Pimenta da Silva TITULAR DA SEGUNDA VARA FEDERAL RESPONDENDO PELA QUARTA VARA FEDERAL (ATO PRESI 1009/2023) -
17/11/2022 11:32
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
17/11/2022 08:56
Processo devolvido à Secretaria
-
17/11/2022 08:56
Proferido despacho de mero expediente
-
04/11/2022 14:38
Conclusos para despacho
-
04/11/2022 04:53
Decorrido prazo de AMAURI MOURA SILVEIRA em 03/11/2022 23:59.
-
17/10/2022 12:42
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
12/10/2022 10:12
Juntada de alegações/razões finais
-
21/09/2022 02:02
Decorrido prazo de Ministério Público Federal (Procuradoria) em 20/09/2022 23:59.
-
05/09/2022 15:31
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
05/09/2022 15:30
Audiência de instrução e julgamento realizada, conduzida por Juiz(a) em/para 05/09/2022 13:30, 4ª Vara Federal Criminal da SJTO.
-
05/09/2022 15:30
Proferido despacho de mero expediente
-
05/09/2022 15:24
Juntada de Ata de audiência
-
05/09/2022 11:44
Desentranhado o documento
-
05/09/2022 11:44
Cancelada a movimentação processual
-
05/09/2022 11:44
Desentranhado o documento
-
05/09/2022 11:44
Cancelada a movimentação processual
-
30/08/2022 14:34
Audiência de instrução e julgamento designada, conduzida por #Não preenchido# em/para 05/09/2022 13:30, 4ª Vara Federal Criminal da SJTO.
-
30/08/2022 14:32
Juntada de Certidão
-
24/08/2022 01:38
Decorrido prazo de AMAURI MOURA SILVEIRA em 23/08/2022 23:59.
-
08/08/2022 19:52
Juntada de petição intercorrente
-
08/08/2022 10:03
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
07/08/2022 08:34
Processo devolvido à Secretaria
-
07/08/2022 08:34
Proferido despacho de mero expediente
-
02/08/2022 02:32
Decorrido prazo de AMAURI MOURA SILVEIRA em 01/08/2022 23:59.
-
29/07/2022 12:23
Conclusos para despacho
-
25/07/2022 14:08
Juntada de petição intercorrente
-
15/07/2022 16:38
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
15/07/2022 09:11
Processo devolvido à Secretaria
-
15/07/2022 09:11
Proferido despacho de mero expediente
-
07/07/2022 13:46
Conclusos para despacho
-
28/06/2022 20:33
Decorrido prazo de AMAURI MOURA SILVEIRA em 27/06/2022 23:59.
-
10/06/2022 11:42
Juntada de parecer
-
09/06/2022 18:27
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
09/06/2022 14:57
Processo devolvido à Secretaria
-
09/06/2022 14:57
Recebida a denúncia contra AMAURI MOURA SILVEIRA - CPF: *77.***.*10-20 (REU)
-
17/05/2022 16:46
Juntada de manifestação
-
12/05/2022 10:23
Conclusos para decisão
-
12/05/2022 02:33
Juntada de defesa prévia
-
06/05/2022 12:30
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
02/05/2022 12:53
Remetidos os Autos (em diligência) da Distribuição ao 4ª Vara Federal Criminal da SJTO
-
02/05/2022 12:53
Juntada de Informação de Prevenção
-
02/05/2022 12:50
Recebido pelo Distribuidor
-
02/05/2022 12:50
Distribuído por dependência
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
02/05/2022
Ultima Atualização
17/02/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
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Sentença Tipo D • Arquivo
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