TRF1 - 0001871-37.2014.4.01.3904
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gab. 31 - Desembargadora Federal Solange Salgado da Silva
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Polo Ativo
Polo Passivo
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Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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30/08/2023 00:00
Intimação
JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0001871-37.2014.4.01.3904 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001871-37.2014.4.01.3904 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: JOSUE FRANCISCO DA SILVA REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: JOSE AUGUSTO DIAS DA SILVA - PA8570-A POLO PASSIVO:Ministério Público Federal (Procuradoria) RELATOR(A):MARLLON SOUSA PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gabinete 31 Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 0001871-37.2014.4.01.3904 R E L A T Ó R I O O EXMO.
SR.
JUIZ FEDERAL MARLLON SOUSA (RELATOR CONVOCADO): Trata-se de recurso de apelação interposto por Josué Francisco da Silva contra sentença proferida pelo Juízo Federal da Vara Única de Subseção Judiciária de Pará, que nos autos da ação civil pública por ato de improbidade administrativa, proposta pelo Ministério Público Federal, julgou procedente o pedido para condenar o apelante nas sanções do art. 12, incisos II e III, da Lei 8.429/92, por ter incorrido em atos de improbidade previstos no arts. 10, caput, e 11, caput e inciso II, do mesmo diploma legal.
Consta da petição inicial que a Auditoria n° 13080, efetuada pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS – DENASUS, realizada no período de 26 a 29 de novembro de 2013, constatou a prática de atos ímprobos, dada a aplicação irregular dos recursos federais recebidos do Governo Federal destinados à saúde, no exercício de 2012, o que teria gerado um prejuízo ao erário na ordem de R$ 118.833,30 (cento e dezoito mil, oitocentos e trinta e três reais e trinta centavos) (ID 20995452 – págs. 3/14).
Aduz, ainda, que o apelante, Secretário Municipal de Saúde, à época dos fatos, praticou diversas falhas administrativas, afirmando que houve verdadeiro abandono na gestão municipal de saúde.
As falhas apontadas consistem na ausência de planejamento dos instrumentos de gestão e falta de controle social, de atenção básica, de estratégia de saúde da família e de vigilância sanitária e farmacêutica.
Após regular instrução processual, sobreveio sentença condenando o apelante a: i) ressarcimento integral do dano no valor de R$ 118.833,30 (cento e dezoito mil, oitocentos e trinta e três reais e trinta centavos); ii) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 8 (oito) anos; iii) pagamento de multa civil no valor do dano; iv) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos (ID 20995454 – págs. 170/205).
Em razões recursais, o apelante Josué Francisco da Silva sustenta, em síntese: i) ausência de análise dos documentos juntados pelo Juízo a quo, os quais foram anexados à manifestação preliminar; ii) inexistência de atos de improbidade; iii) ausência de proporcionalidade e razoabilidade na aplicação das sanções; iv) inexistência de dolo; v) possibilidade de juntada de novos documentos em sede recursal (ID 20995454 – págs. 209/234).
Contrarrazões do MPF (ID 20995453 – págs. 13/27).
Em parecer, a Procuradoria Regional da República da 1ª Regional manifesta-se pelo não provimento do recurso de apelação (ID 20995453 – págs. 31/49). É o relatório.
Juiz Federal MARLLON SOUSA Relator Convocado PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gabinete 31 Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 0001871-37.2014.4.01.3904 VOTO O EXMO.
SR.
JUIZ FEDERAL MARLLON SOUSA (RELATOR CONVOCADO): Satisfeitos os requisitos de admissibilidade, conheço do presente recurso.
Como relatado, o apelante foi condenado por supostamente atuar de forma deliberadamente omissa quanto à gestão municipal de saúde e por ter deixado de comprovar a destinação de gastos relativos a combustíveis, o que teria gerado prejuízo ao erário.
Durante a tramitação do processo foi publicada a Lei n. 14.230/2021, que introduziu consideráveis alterações na Lei n° 8.429/92, havendo decisão do STF (Tema 1.199) dirimindo conflitos relacionados à aplicabilidade dessas modificações aos processos em curso, cuja tese fixada transcrevo abaixo: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.” Grifos.
As mudanças na Lei nº 8.429/92, promovidas pela Lei nº 14.230/2021, aplicam-se ao caso concreto, eis que atingem as ações em curso, considerando que o artigo 1º, §4º, determina a aplicação imediata de seus dispositivos em razão dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, que comporta aplicação retroativa por beneficiar o réu.
Caracteriza improbidade administrativa toda ação ou omissão dolosa praticada por agente público ou por quem concorra para tal prática, ou ainda dela se beneficie, qualificada pela deslealdade, desonestidade ou má-fé, que acarrete enriquecimento ilícito (art. 9º), lesão ao erário (art. 10) ou afronte os princípios da Administração Pública (art. 11).
Transcrevo as diversas condutas imputadas na petição inicial (ID 20995452 – págs. 4/6): “Quanto ao Controle Social verifica-se: 1) a lei municipal n° 019/98, instituiu o Conselho Municipal de Saúde e determina que o Secretário Municipal de Saúde seja sempre seu presidente, em desacordo com as normativas do SUS; 2) falta de comprovação da indicação formal pelas entidade, de seus representantes no Conselho Municipal de Saúde -CMS, para o período de 2012 a 2014; 3) o Conselho Municipal de Saúde iião possui estrutura para o seu - funcionamento, nem espaço próprio; 4) o relatório detalhado contendo dados sobre o montante e a fonte de recursos aplicados em ações e serviços de saúde não é - encaminhado quadrimestralmente ao CMS.
Quanto a atenção básica: 1) inexistência de equipamentos essenciais no serviço de urgência e emergência na unidade Básica de Saúde; 2) inexistência do profissional médico em horário integral no serviço de urgência e emergência; 3) deficiência de planejamento e gerenciamento das atividades organizativas dos processos de trabalho desempenhadas pelas equipes da Estratégia Saúde da Família; 4) coleta de material para o exame preventivo do câncer do colo do útero não está sendo realizado nas unidades de saúde da família e unidade básica de saúde; 5) atendimento ao portador de transtorno mental não realizado - de forma contínua, programada e com acompanhamento adequado.
Quanto a estratégia saúde da família, verifica-se: 1) falta de 1 equipamentos necessários ao desenvolvimento das atividades desempenhadas pelas equipes; 2) descumprimento de carga horária pelos profissionais das equipes; 3) dados do Sistema Nacional dos Estabelecimentos de Saúde desatualizados no .que se refere aos profissionais; 4) falta de acompanhamento das atividades - pelos enfermeiros responsáveis; 5) gestantes sem o acompanhamento necessário 6) as unidades de saúde da família. não possuem de recursos para atendimentos de urgência em baixa complexidade.
Quanto à vigilância à saúde constata-se: 1) indisponibilidade de documento que comprove análise química da água para consumo; 2) resíduos de serviços de saúde não sofrem processo de manejo adequado; 3) baixa cobertura de exames preventivos do Câncer do Colo do Útero; 4) descumprimento de carga horária pelos agentes de controle de endemias; 5) indisponibilidade dos indicadores epidemiológicos; 6) deficiências na estrutura física.
Quanto a assistência farmacêutica básica verifica-se: 1) medicamentos guardados de maneira inadequada; 2) inexistência de mecanismos de controle que, possibilitem identificar os registros de entrada, saída e dispensarão dos medicamentos especiais 3) ausência de medicamentos; 4) falta de planejamento para aquisição de medicamentos; 5) ausência de profissional farmacêutico.
Quanto ao Controle interno, constata-se: 1) veículos sem controle de tráfico, quilometragem e combustível; 2) central de abastecimento farmacêutico sem estrutura física adequada e sem desenvolver atividades satisfatórias; 3) não foram celebrados contratos pela Secretaria Municipal de Saúde no exercício de 2012, com os profissionais de saúde que atuam no município e nem com as empresas prestadoras de serviços; 4) pagamento de exames de ultrassonografia sem relação de pacientes beneficiados; 5) extrato bancário não disponibilizado; 6) processos licitatórios não apresentados; 7) ausência de repasses de recursos para aquisição de insumos para diabéticos; 8) não aplicação, de contrapartida. 3.
Despesas não comprovadas: foi constatada ainda a ausência de documentos comprobatórios de urna série de despesas realizadas para aquisição de combustível, pagas sem a comprovação das quantidades fornecidas, das guias de autorização ou requisição para abastecimento e identificação dos respectivos veículos abastecidos, no valor de R$ 118.833,30 (cento e dezoito mil oitocentos e trinta e três mil e trinta centavos).” Considerando todas as imputações, constato que apenas a ausência de comprovação de despesas se enquadrou no art. 10, caput, da Lei 8.429/92.
Todas as demais se subsumiram aos atos de improbidade, previstos no art. 11, caput e inciso II, os quais passo a analisar.
O texto do art. 11, caput e inciso II, da Lei 8.429/92, antes das alterações promovidas pela Lei 14.230/21, assim previa: “Art. 11.
Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente; II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;” Após as alterações promovidas pela Lei 14.230/21, o mencionado inciso II foi revogado e a redação do art. 11, caput, da LIA passou a dispor: “Art. 11.
Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)” A Lei nº 14.230/2021 deu nova redação ao caput do art. 11 da Lei nº 8.429/1992, de forma que os atos de improbidade administrativa, que atentam contra os princípios da Administração Pública deixaram de ter caráter exemplificativo e passaram a ostentar caráter taxativo, razão pela qual somente se caracterizará tais atos se expressamente indicadas nos incisos do referido dispositivo legal.
As condutas que ensejaram a condenação do apelante não mais encontram previsão no art. 11, caput e inciso II, da Lei de Improbidade Administrativa e, na esteira da tese fixada pelo STF, através da análise do Tema 1199, em se tratando de direito administrativo sancionador, a norma benéfica deve retroagir para beneficiar o réu.
Dessa forma, não há falar, portanto, em configuração de ato de improbidade por conduta prevista no art. 11, caput e inciso II, da Lei 8.429/92, tendo em vista a mencionada alteração prevista pela Lei 14.230/21 que tornou o fato atípico.
Nesse sentido, é a jurisprudência desta Corte Regional: "PROCESSUAL.
ADMINISTRATIVO.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
LEI 8.429/1992.
ALTERAÇÃO PELA LEI 14.230/2021.
NORMA PROCESSUAL.
APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO TEMPUS REGIT ACTUM.
NORMA MATERIAL.
SUPERVENIÊNCIA DE LEI NOVA.
DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR.
AFASTAMENTO DAS CONDUTAS CULPOSAS.
ART. 11, CAPUT, INCISO I.
REVOGAÇÃO.
CONDUTA INEXISTENTE.
ABSOLVIÇÃO.
SENTENÇA MANTIDA.
RECURSO NÃO PROVIDO. 1.
A Lei 8.429/1992, alterada pela Lei 14.230/2021, passou a vigorar na data da sua publicação, em 26/10/2021.
As controvérsias em torno da aplicação imediata das novas disposições legais devem ser analisadas em relação às questões de natureza processual e material. 2. Às questões de ordem processual são aplicáveis as leis em vigor no momento em que prolatado o decisum na instância a quo, em obediência ao princípio tempus regit actum (art. 14 do CPC e, por analogia, art. 2º do CPP).
Já às questões de natureza material, a nova lei tem aplicação imediata aos feitos em andamento, nos termos do art. 1º, § 4º, que dispõe: aplicam-se ao sistema da improbidade disciplinado nesta Lei os princípios constitucionais do direito administrativo sancionador. 3.
A novel legislação passa a exigir o dolo para caracterização do ato ímprobo no tocante às condutas previstas no arts. 9º, 10 e 11 da Lei 8.429/1992.
A mesma estrutura se vê da leitura do teor do caput dos três referidos dispositivos, nos quais expressamente foi excluída a culpa como modalidade de ato de improbidade administrativa. 4.
O direito administrativo sancionador, como sub-ramo do Direito Administrativo, expressa o poder punitivo do Estado ante o administrado, seja ele o próprio servidor público ou o particular.
Daí decorre sua aplicação aos atos de improbidade administrativa — notadamente para reconhecer a aplicação imediata de seus preceitos a condutas antes tidas como suficientes para caracterizar o ato de improbidade, e agora tidas como irrelevantes, ou atípicas. 5.
A opção legislativa de revogar alguns preceitos da lei de improbidade administrativa é válida, pois decorre de previsão constitucional contida no art. 37, § 4º, o qual preceitua que os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. 6.
A partir da alteração promovida pela Lei 14.230/2021, os incisos do art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa deixaram de lado o caráter exemplificativo e passaram a ostentar caráter taxativo, motivo pelo qual somente será configurada a improbidade por violação aos princípios, a prática das condutas expressamente indicadas no rol do referido dispositivo legal.
O caput e os incisos I e II do art. 11 da Lei 8.429/92 foram revogados. 7.
A referida norma se aplica ao caso concreto, eis que atinge as ações em curso, considerando que o artigo 1º, §4º determina expressamente a aplicação imediata de seus dispositivos em razão dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador que comporta aplicação retroativa. 8.
Considerando que a partir da vigência plena da Lei 14.230/2021, a conduta atribuída ao requerido deixou de ser típica (art. 11, caput, inciso I, da Lei 8.429/92), a manutenção da sentença que o absolveu é medida que se impõe, ainda que com fundamento diverso (ausência de dano ao erário, ausência de dolo, conduta de boa-fé). 9.
Apelação do MPF a que se nega provimento. (AC 1000406-21.2018.4.01.3100, DESEMBARGADOR FEDERAL MARIA DO CARMO CARDOSO, TRF1 - TERCEIRA TURMA, PJe 19/07/2023 PAG.)" Resta, portanto, pendente a análise acerca da prática dos atos ímprobos previstos no art. 10, caput, da LIA.
O art. 10, caput, da Lei 8.429/92, na redação anterior as alterações promovidas pela Lei 14.230/21 previa: “Art. 10.
Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: Após as alterações promovidas pela Lei 14.230/21, o art. 10, caput, da LIA passou a prever: “Art. 10.
Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)” O apelante sustenta que o Juízo a quo não considerou os documentos juntados em sua defesa preliminar.
Além disso, junta documento ao recurso de apelação ao argumento de tratar-se de documento novo.
Compulsando os autos, verifico que nos documentos de ID 20995454, págs. 77/103, constam registros de atestados de fornecimento de combustíveis, identificação dos veículos utilizados pela Secretaria Municipal de Saúde e notas fiscais datadas do exercício fiscal de 2012.
Tais elementos probatórios corroboram a destinação efetiva dos recursos para fins públicos.
As alterações promovidas pela Lei 14.230/21 impedem a condenação pelas condutas previstas no art. 10 da LIA se não houver cabal comprovação de danos efetivos ao erário.
Para caracterização dos atos ímprobos que causam prejuízo ao erário, torna-se imprescindível a comprovação do elemento material de lesão ao patrimônio público.
Nas palavras de Marçal Justen Filho: “Outra exigência contemplada formalmente pela Lei 14.230/21 é a comprovação de efetiva lesão ao erário.
A alteração da redação do caput do art. 10, que foi reiterada em diversos outros dispositivos, destina-se a eliminar a solução de sancionamento por improbidade, nas hipóteses referidas no art. 10, sem a ocorrência de dano efetivo e comprovado ao patrimônio público.” (Reforma da Lei de improbidade administrativa comentada e comparada: Lei 14.230, de 25 de outubro de 2012 / Marçal Justen Filho. – 1 Ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2022.
Pág. 92).
Embora tenham sido evidenciadas irregularidades na utilização das verbas originalmente destinadas a outras finalidades e no controle da frota de veículos, não se constata, a partir dos elementos presentes nos autos, a ocorrência de danos ao erário com relação ao abastecimento dos veículos oficiais.
Não há comprovação ou mesmo indício de que tais atos tenham acarretado prejuízo material, tampouco que os combustíveis tenham sido contratados por valores discrepantes dos praticados no mercado.
Não tendo o apelado se desincumbido do ônus de comprovar a efetiva perda patrimonial a absolvição é medida que se impõe.
Nesse sentido, é a jurisprudência desta Corte Regional: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO.
AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
LEI N. 8.429/92.
ALTERAÇÕES PROMOVIDAS PELA LEI N. 14.230/2021.
APLICAÇÃO AOS PROCESSOS EM CURSO.
AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE CONTAS.
ART. 10 DA LEI 8.429/92.
DOLO ESPECÍFICO E PREJUÍZO AO ERÁRIO NÃO DEMONSTRADOS.
ART. 11, VI, DA LEI 8.429/92.
DOLO E MÁ-FÉ NÃO CONFIGURADOS.
CONDUTA(S) ÍMPROBA(S) MANIFESTAMENTE INEXISTENTE(S).
ART. 17, §11, DA LEI 8.429/92.
DESPROVIMENTO DOS RECURSOS.
SENTENÇA MANTIDA. 1.
Trata-se recursos de apelação interpostos pelo MPF e pelo FNDE contra sentença que, em sede de ação civil de improbidade administrativa, julgou improcedentes os pedidos para condenação da ré como incursa nas condutas do art. 10, caput, e art. 11, VI, da Lei n° 8.429/92 (art. 487, I, do Código de Processo Civil).
O MPF defende a materialidade e autoria do(s) ato(s) ímprobo(s) imputado(s), bem como a irretroatividade da Lei n° 14.230/2021, requerendo o provimento do apelo a fim de que a sentença de primeiro grau seja reformada, com subsequente condenação da ré nas penas previstas nos incisos II e III do art. 12 do mesmo diploma legal.
O FNDE ratificou o Apelo do MPF. 2.
A Lei n° 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa - LIA) sofreu significativas modificações de natureza material e processual a partir das inovações introduzidas pela Lei n° 14.230/2021.
O referido diploma, que entrou em vigor a partir de 26/10/2021, ao passo em que estabeleceu novas diretrizes no campo da persecução dos atos de improbidade praticados contra a Administração Pública, fixou critérios mais rígidos em matéria probatória, ampliando as garantias asseguradas ao agente, e estabelecendo, de forma expressa, que ao sistema de responsabilização por atos ímprobos aplicam-se os princípios constitucionais do Direito Administrativo Sancionador (art. 1°, §4° da LIA). 3.
A nova legislação incide no caso concreto, seja em razão da índole processual de algumas de suas regras, seja por estabelecer um novo regime jurídico persecutório (norma de ordem pública), no qual é possível aplicar os princípios do direito administrativo sancionador (art. 1°, §4° da LIA), sub-ramo do Direito Administrativo, que expressa o poder punitivo do Estado perante o administrado. 4.
As questões de natureza material introduzidas na LIA pela Lei n° 14.230/2021, particularmente nas hipóteses benéficas ao réu, têm aplicação imediata aos processos em curso, em relação aos quais ainda não houve trânsito em julgado.
Na prática, o julgamento de uma ação de improbidade administrativa que esteja em trâmite, necessariamente, levará em conta a superveniência da Lei n° 14.230/2021, permitindo a retroatividade da norma material benigna em favor do agente.
Ou seja, se as inovações legais recaírem sobre elementos constitutivos do tipo, seja para excluir a ilicitude de certas condutas, seja para abrandar a punição ou, ainda, para recrudescer as condições para o juízo condenatório, a partir de exigências adicionais para a configuração do ato ímprobo, todas essas nuances deverão ser consideradas para o escorreito julgamento da causa. 5.
A responsabilização por ato de improbidade administrativa, em quaisquer das suas modalidades/categorias, não prescinde da comprovação do elemento subjetivo doloso (art. 1°, §§ 1° e 2°, art. 9°, 10 e 11 da LIA, com nova redação). 6.
A partir das modificações introduzidas pela Lei n° 14.230/2021, a nova redação do caput art. 10 da Lei n° 8.429/92 passou a adotar a perda patrimonial efetiva como aspecto nuclear das condutas ímprobas que causam lesão ao erário, havendo óbice, por exemplo, à configuração do ato ímprobo com base na culpa grave e no dano presumido (dano in reipsa cf. art. 21, I, da LIA).
Para além de não ter sido comprovado o agir doloso, não houve comprovação de efetivo prejuízo ao erário. 7.
Também os incisos do art. 11 da LIA deixaram de lado o caráter exemplificativo e passaram a ostentar caráter taxativo (numerusclausus).
Desse modo, apenas a prática das condutas expressamente tipificadas no rol do mencionado dispositivo será configurada como ato ímprobo por violação aos princípios da administração pública, sendo certo, ademais, que os incisos I, II, IX e X do art.11 da LIA foram expressamente revogados.
Já o enquadramento da conduta relativa a não prestação de contas (inciso VI - imputação dirigida à Apelada) impõe: (i) a demonstração de que o agente dispunha de condições para realizar o procedimento; bem como (ii) a comprovação de que ele (o agente) tinha por escopo ocultar irregularidades e obter proveito ou benefício indevido para si ou para terceiros (inciso VI e §1 do art. 11 da LIA), circunstâncias não verificadas no caso dos autos. 8.
O legislador ordinário, validamente (cf. permissivo do art. 37, §4° da CF/88), passou a exigir o animus doloso e o efetivo prejuízo ao erário para tipificação da(s) conduta(s) prevista(s) no art. 10 da LIA; aboliu alguns tipos sancionadores anteriormente previstos no art. 11 da LIA, bem como tornou mais rígido o tipo previsto no inciso VI do art. 11, exigindo efetiva demonstração do dolo específico. 9.
Em recente apreciação do Tema 1199 (Recurso Extraordinário com Agravo nº 843989/PR), o Supremo Tribunal Federal fixou a seguinte tese: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei. 10. À luz dos balizamentos fixados pela Suprema Corte, afigura-se plenamente possível concluir que as novas disposições da LIA no que concerne à tipificação do ato de improbidade (normas de direito material mais benéficas) devem ser aplicadas às ações em curso, ou seja, nas quais ainda não se operou o trânsito em julgado.
Na hipótese dos autos, considerando as modificações introduzidas pela Lei n° 14.230/2021 e os princípios do direito administrativo sancionador, há manifesta inexistência do(s) ato(s) de improbidade descritos na petição inicial (cf.art.17, §11, da Lei n° 8.429/92 - atual redação), não merecendo reparos a sentença que julgou improcedentes os pedidos, extinguindo a ação com apoio no art. 487, I, do CPC. 11.
Descabimento do duplo grau obrigatório, uma vez que o legislador ordinário, nos termos do art. 17, § 19, inciso IV, c/c o art. 17-C, §3°, ambos da Lei nº. 8.429/1992, com redação conferida pela Lei n° 14.230/2021, fez clara opção pelo afastamento do instituto nas ações de improbidade administrativa. 12.
Desprovimento dos recursos de apelação. (AC 1001654-04.2019.4.01.4000, DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA, TRF1 - TERCEIRA TURMA, PJe 15/06/2023 PAG.) Ante o exposto, dou provimento ao recurso de apelação para reformar a sentença e absolver Josué Francisco da Silva das condutas previstas nos arts. 10, caput, e 11, caput e inciso II, ambos da Lei 8.429/92. É o voto.
Juiz Federal MARLLON SOUSA Relator Convocado PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gabinete 31 Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0001871-37.2014.4.01.3904 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001871-37.2014.4.01.3904 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: JOSUE FRANCISCO DA SILVA REPRESENTANTES POLO ATIVO: JOSE AUGUSTO DIAS DA SILVA - PA8570-A POLO PASSIVO:Ministério Público Federal (Procuradoria) E M E N T A ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL.
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
LEI 8.429/92.
Art. 11, CAPUT E INCISO II.
ABSOLVIÇÃO.
CONDUTA REGOVADA.
ART. 10, CAPUT.
ABSOLVIÇÃO.
PREJUÍZO NÃO COMPROVADO.
APELO PROVIDO. 1.
Durante a tramitação do processo foi publicada a Lei n. 14.230/2021, que introduziu consideráveis alterações na Lei n° 8.429/92, havendo decisão do STF (Tema 1.199) dirimindo conflitos relacionados à aplicabilidade dessas modificações aos processos em curso. 2.
As mudanças na Lei nº 8.429/92, promovidas pela Lei nº 14.230/2021, aplicam-se ao caso concreto, eis que atingem as ações em curso, considerando que o artigo 1º, §4º determina expressamente a aplicação imediata de seus dispositivos em razão dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, que comporta aplicação retroativa por beneficiar o réu, conforme determinado pelo Supremo Tribunal Federal na tese do Tema 1199, ao finalizar o julgamento do Recurso Extraordinário no Agravo nº 843989. 3.
No caso, o apelante foi condenado por supostamente atuar de forma deliberadamente omissa quanto à gestão municipal de saúde e por ter deixado de comprovar a destinação de gastos relativos a combustíveis, o que teria gerado prejuízo ao erário e violado os princípios da Administração Pública. 4.
A Lei nº 14.230/2021 deu nova redação ao caput do art. 11 da Lei nº 8.429/1992, de forma que os atos de improbidade administrativa, que atentem contra os princípios da administração pública, deixaram de ter caráter exemplificativo e passaram a ostentar caráter taxativo, razão pela qual somente se caracterizará tais atos se expressamente indicadas nos incisos do referido dispositivo legal. 5.
As condutas que ensejaram a condenação do apelante não mais encontram previsão no art. 11, caput e inciso II, da Lei de Improbidade Administrativa e, na esteira da tese fixada pelo STF, através da análise do Tema 1199, em se tratando de direito administrativo sancionador, a norma benéfica deve retroagir para beneficiar o réu. 6.
Constam, nos autos, registros de atestados de fornecimento de combustíveis, identificação dos veículos utilizados pela Secretaria Municipal de Saúde e notas fiscais datadas do exercício fiscal de 2012.
Tais elementos probatórios corroboram a destinação efetiva dos recursos para fins públicos. 7.
Não há comprovação ou mesmo indício de que os atos imputados tenham acarretado prejuízo material, tampouco que os combustíveis tenham sido contratados por valores discrepantes dos praticados no mercado. 8.
Apelação defensiva provida para reformar a sentença e absolver o apelante.
A C Ó R D Ã O Decide a Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, à unanimidade, dar provimento ao apelo defensivo para absolver o acusado, nos termos do voto do relator.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juiz Federal MARLLON SOUSA Relator Convocado -
24/07/2023 00:00
Intimação
Justiça Federal Tribunal Regional Federal da 1ª Região , 21 de julho de 2023.
Intimação da Pauta de Julgamentos Destinatário: Ministério Público Federal (Procuradoria) e Ministério Público Federal APELANTE: JOSUE FRANCISCO DA SILVA Advogado do(a) APELANTE: JOSE AUGUSTO DIAS DA SILVA - PA8570-A APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) O processo nº 0001871-37.2014.4.01.3904 (APELAÇÃO CÍVEL (198)) foi incluído na sessão de julgamento abaixo indicada, podendo, entretanto, nesta ou nas subsequentes, serem julgados os processos adiados ou remanescentes.
Sessão de Julgamento Data: 14-08-2023 a 25-08-2023 Horário: 09:00 Local: Sessão Virtual da 10ª Turma - Resolução 10118537 - Observação: Informamos que a sessão virtual terá duração de 10 (dez) dias úteis, com início no dia 14/08/2023, às 09h, e encerramento no dia 25/08/2023, às 23h59.
A sessão virtual de julgamento no PJe, instituída pela Resolução Presi - 10118537, regulamenta a atuação dos advogados da seguinte forma: Art. 6º A sessão virtual terá o prazo de duração definido pelo presidente do órgão julgador, quando da publicação da pauta de julgamento, com duração mínima de 03 (três) dias úteis e máxima de 10 (dez) dias úteis. §1º A sustentação pelo advogado, na sessão virtual no PJe, quando solicitada e cabível, deverá ser apresentada via e-mail, à coordenadoria processante, em até 48 (quarenta e oito) horas da data de início da sessão virtual, por qualquer mídia suportada pelo PJe, cuja duração não poderá ultrapassar o prazo regimental.
Art. 7º Será excluído da sessão virtual, a qualquer tempo, enquanto não encerrada, o processo destacado a pedido de qualquer membro do colegiado, para julgamento em sessão presencial ou presencial com suporte de vídeo.
Parágrafo único - As solicitações formuladas por qualquer das partes ou pelo Ministério Público Federal - MPF de retirada de pauta da sessão virtual e inclusão em sessão presencial ou sessão presencial com suporte de vídeo, para fins de sustentação oral, deverão ser apresentadas, via e-mail, à coordenadoria processante, até 48 (quarenta e oito) horas (dois dias úteis) antes do dia do início da sessão virtual.
E-mail da Décima Turma: [email protected] -
19/09/2019 11:08
Conclusos para decisão
-
20/08/2019 19:11
Expedição de Outros documentos.
-
20/08/2019 19:11
Expedição de Outros documentos.
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10/07/2019 12:33
MIGRAÃÃO PARA O PJE ORDENADA
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06/09/2016 12:07
CONCLUSÃO PARA RELATÃRIO E VOTO
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06/09/2016 12:05
PROCESSO RECEBIDO - NO(A) GAB. DF CÃNDIDO RIBEIRO
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06/09/2016 09:12
PROCESSO REMETIDO - PARA GAB. DF CÃNDIDO RIBEIRO
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05/09/2016 14:22
PETIÃÃO JUNTADA - nr. 4011960 PARECER (DO MPF)
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02/09/2016 11:31
PROCESSO DEVOLVIDO PELA PROCURADORIA REGIONAL DA REPUBLICA - NO(A) QUARTA TURMA
-
23/08/2016 19:30
VISTA A PROCURADORIA REGIONAL DA REPUBLICA
-
23/08/2016 18:00
DISTRIBUIÃÃO AUTOMÃTICA - Ao DESEMBARGADOR FEDERAL CÃNDIDO RIBEIRO
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
13/05/2023
Ultima Atualização
29/08/2023
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
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