TRF1 - 1001038-47.2018.4.01.3100
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gab. 30 - Desembargadora Federal Daniele Maranhao Costa
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Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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15/03/2024 00:00
Intimação
JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1001038-47.2018.4.01.3100 PROCESSO REFERÊNCIA: 1001038-47.2018.4.01.3100 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria) e outros POLO PASSIVO:RAYCLEZIAN DA COSTA COSTA REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: EIDE JOSE MACHADO DE OLIVEIRA FIGUEIRA - AP1162-A RELATOR(A):DANIELE MARANHAO COSTA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 30 - DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO Processo Judicial Eletrônico R E L A T Ó R I O A EXMA.
SRA.
DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO (RELATORA): Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal e pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE contra sentença proferida pelo juízo da 2ª Vara Federal da Seção Judiciária do Amapá que, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada contra a parte requerida em razão da ausência de prestação de contas de recursos repassados por meio do Programa Nacional de Alimentação – PNAE, nos exercícios 2012, 2013 e 2014, na condição de gestor do Caixa Escolar José de Anchieta (Macapá/AP), julgou improcedentes os pedidos ante o entendimento de que a responsabilidade pela prestação de contas junto ao FNDE é da Entidade Executora (Secretarias de educação dos entes políticos), e não das Unidades Executoras (Caixa Escolar), consoante prescrição do art. art. 6º, I e II, da Resolução CD/FNDE nº 38/ 2009.
O juízo de 1º grau empreendeu essa resolução ao fundamento de que os recursos do PNAE são repassados à Secretaria de Estado da Educação do Amapá (SEED) e não diretamente ao caixa escolar, de maneira que "a suposta negligência da requerida ocorreu no âmbito de competência estadual".
Nas razões da apelação, a parte apelante alega, em síntese, em síntese, (i) não há se falar em "competência estadual", pois o descumprimento do dever legal e constitucional de prestar contas dos recursos oriundos do PNAE inviabilizou ao FNDE se debruçar sobre a prestação de contas e aferir a regularidade dos gastos e atingimento ou não das finalidades públicas buscadas com a verba federal, já que a SEED não recebeu a prestação de contas do caixa escolar no prazo legal, individualmente, acarretando consequências extremamente negativas à unidade escolar, com riscos de suspensão dos repasses de verbas a prejudicar o oferecimento do serviço público de educação; (ii) er sido comprovada a prática de ato de improbidade pelo réu, que não apresentou à Secretaria de Educação do Estado do Amapá - SEED/AP a documentação necessária para comprovar a regular execução dos recursos recebidos pela entidade executora (SEED); (iii) que, quando um gestor de um caixa escolar não encaminha ao Núcleo de Prestação de Contas e Convênios (NUGEP) da SEED as informações e documentos referentes à execução dos recursos do PNAE, a prestação de contas é encaminhada pela SEED ao FNDE, embora incompleta; (iv) consta dos autos documentos/informações acerca de prestação de contas com atraso pelo réu, referente aos anos de 2012 e 2013.
Contudo não há documentação que aponte a prestação de contas dos recursos repassados no exercício de 2014; (v) que o atraso/omissão na prestação de contas acarretou prejuízo ao Erário; e (vi) ter sido demonstrado o elemento subjetivo da conduta do réu; Não foram apresentadas contrarrazões.
O MPF nesta instância opinou pelo parcial provimento da apelação para absolver o requerido da prática da conduta descritas no art. 10, caput, da Lei 8.429/92, ante a ausência de demonstração de dolo específico de causar prejuízo ao erário. É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 30 - DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO Processo Judicial Eletrônico V O T O A EXMA.
SRA.
DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO (RELATORA): Conforme relatado, insurgem-se o MPF e o FNDE contra sentença que, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada contra a parte requerida em razão da ausência de prestação de contas de recursos repassados por meio do Programa Nacional de Alimentação – PNAE, nos exercícios 2012, 2013 e 2014, na condição de gestor do Caixa Escolar, julgou improcedentes os pedidos ante o entendimento de que os recursos do PNAE são repassados à Secretaria de Estado da Educação do Amapá (SEED) e não diretamente ao caixa escolar, de maneira que "a suposta negligência da requerida ocorreu no âmbito de competência estadual".
E que, nesse sentido, a responsabilidade pela prestação de contas junto ao FNDE é da Entidade Executora (Secretarias de educação dos entes políticos), e não das Unidades Executoras (Caixa Escolar), consoante prescrição do art. art. 6º, I e II, da Resolução CD/FNDE nº 38/ 2009.
Eis o trecho da sentença quanto ao ponto (Id. 252619080): A controvérsia reside em saber se ocorreu, ou não, atos de improbidade administrativa, caracterizados pela não prestação de contas do Caixa Escolar Provedor II, cuja conduta omissa foi atribuída à ré.
Entretanto, antes de se aferir essa questão, é preciso que se atente aos esclarecimentos prestados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE (Id. 15800960), no sentido de que, em relação ao PNAE, não há repasse direito ao citado caixa escolar.
Assim, destacou-se na referida documentação: (...) 3.
Salienta-se que, quanto ao Programa PNAE, o repasse de recursos é realizado diretamente à Secretaria de educação do Estado do Amapá (AP).
Não há repasse de recursos direto à conta de Caixas Escolares. (...) 5.
Frisa-se que, mediante consulta ao Sistema de Gestão de Prestação de Contas-SIGPC, não localizou-se descentralização de recursos para a caixa escolar em apreço, quanto a transferência em tela, no exercício citado.
Desse modo, resta prejudicado os subsídios acerca do PNAE/2012 e 2014.
Portanto, esclareço que os recursos repassados aos caixas escolares pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, relativamente ao Programa Nacional de Alimentação – PNAE são encaminhados diretamente à Secretaria de Educação do Estado-membro do Amapá ou à Secretaria Municipal de Educação dos municípios, que são as Entidades Executoras – EEx, estas, então, repassam os recursos aos caixas escolares, que são as Unidades Executoras – UEx.
Por sua vez, a Entidade Executora presta contas diretamente ao FNDE, nos termos do art. 6º, I e II, da Resolução CD/FNDE nº 38, de 16 de julho de 2009.
Por outro lado, excepcionando a regra acima exposta, conforme disposição do art. 9º do mencionado diploma infralegal, é facultado aos entes federativos (Estados, Distrito Federal e aos Municípios) repassar os recursos financeiros recebidos à conta do PNAE, diretamente às escolas de educação básica pertencentes à sua rede de ensino ou às Unidades Executoras – UEx, desde que comuniquem ao FNDE a adoção do mencionado procedimento.
Nesse contexto, cabe a Unidade Executora – UEx o ônus administrativo de prestar contas dos recursos recebidos do PNAE a Entidade Executora – EEx, e, esta, por sua vez, ao FNDE, consoante o art. 6º, II, c/c o parágrafo 3º, inciso IV, do art. 9º da Resolução CD/FNDE nº 38, de 16 de julho de 2009.
De fato, confira-se que no caso do PNAE a responsabilidade pela prestação de contas junto ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação é da Entidade Executora – EEx, na condição de executora do programa, conforme dispõe o art. 6º, inciso II, da resolução acima mencionada.
Art. 6º Participam do PNAE: I – (...) II – a Entidade Executora – EE, por meio de suas Secretarias de Educação, como responsável pela execução do PNAE, inclusive a utilização e complementação dos recursos financeiros transferidos pelo FNDE e a prestação de contas do Programa, bem como pela oferta de alimentação escolar por, no mínimo, 200 (duzentos) dias letivos, e pelas ações de educação alimentar e nutricional, a todos os alunos matriculados, representada pelos Estados, Municípios e Distrito Federal e as redes federais de educação básica ou suas mantenedoras, quando receberem os recursos diretamente do FNDE; Assim, no caso do PNAE, não havendo repasse de recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação ao Caixa Escolar, como se verifica na espécie, a relação existente entre o requerido, na condição de gestora do Caixa Escolar (Unidade Executora), é com a Entidade Executora, pois cabe a esta a prestação de contas junto ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE.
Desse modo, não se discute, no ponto específico, a ausência de prestação de contas no âmbito federal, cuja responsabilidade é da Entidade Executora, pois a suposta negligência da requerida ocorreu no âmbito de competência estadual, cuja relação é feita entre a Unidade Executora e a Entidade Executora.
Tanto é assim que a Secretária Adjunta de Apoio a Gestão informou, em 14/06/2019, que o requerido prestou contas junto à SEED dos recursos recebidos pelo Caixa Escolar José de Anchieta referente ao Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE/AP, referente aos anos de 2012 e 2013, cujas prestações de contas estão em análises.
Vale dizer, a prestação de contas deve ser feita perante a Secretaria de Estado da Educação do Estado-membro do Amapá e esta, por sua vez, apresenta a prestação de contas perante o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, não havendo relação direta, na espécie, entre o Caixa Escolar José de Anchieta, do qual o réu era gestor, e o FNDE.
Em razão disso, tenho que não deve ser acolhida a pretensão formulada na petição inicial.
As apelações devem ser desprovidas, porquanto ausente a demonstração de dolo específico da parte requerida nas condutas que lhes são imputadas. 1.
Elementares dos tipos de improbidade e legislação superveniente.
Para a configuração de quaisquer das condutas ímprobas de enriquecimento ilícito, dano ao erário e violação de princípios da administração pública, previstas na Lei n. 8.429/92, sempre deve estar presente o dolo específico, sendo insuficiente a culpa grave e até mesmo o dolo genérico, consoante inteligência dos §§ 2º e 3º do art. 1º do referido diploma, alterado pela Lei 14.230/2021, tendo o STF, inclusive, fixado a seguinte tese: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo – DOLO” (Tema 1199, RE nº 843989/PR).
Igualmente, é necessária a comprovação de que o agente público visava “obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade” (art. 11, § 2º). 2.
Dano ao Erário.
Dispõe o art. 10 da Lei n. 8.429/92, com a redação da Lei n 14.230/2021, que “constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (...)”.
A novel legislação, ao alterar o caput do referido dispositivo, excluiu do tipo as condutas culposas, passando a exigir elemento subjetivo específico (dolo) para a caracterização dos atos ímprobos, além de estabelecer que a ação ou omissão dolosa deve “efetiva e comprovadamente” causar prejuízo.
Exige-se, portanto: a) ação ou omissão ilícita; b) dolo específico; e c) prejuízo ao erário, que deve causar i) perda patrimonial aos haveres do Poder Público; ii) desvio, onde determinado bem público é extraviado para outra destinação que não seja a para qual este devia ser empregado efetivamente; iii) apropriação, onde o agente ímprobo toma posse indevida de bem público para si; iv) malbaratamento, que é a alienação de determinado bem público por valor abaixo do que lhe cabe ou; v) dilapidação, onde há destruição total ou parcial de certo bem da Administração. 3.
Violação de Princípios da Administração.
O art. 11, caput, da Lei n. 8.429/92, com a redação conferida pela Lei n. 14.230/2021, passou a dispor que “constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade” e que esteja caracterizada por uma das condutas descritas em um de seus incisos (I a XII).
Especificamente quanto à conduta de deixar de prestar contas, a Lei n. 14.230/21 modificou o art. 11, VI, da Lei n. 8.429/92 para acrescentar a necessidade de haver prova da conduta do agente público relativa à ocultação de irregularidades.
Antes da alteração, a descrição típica era esta: Art. 11.
Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: [...] VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo; Após, a alteração da redação ficou desta forma: Art. 11.
Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo, desde que disponha das condições para isso, com vistas a ocultar irregularidades; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) - grifos acrescentados Nesse sentido, não basta o mero omitir-se no dever prestar contas.
O não fazer, sob a égide da Lei n. 14.230/2021, deve estar lastreado com má-fé e com desonestidade para acobertar irregularidades, porque, caso as contas fossem apresentadas pelo gestor, poderiam vir à tona práticas desconformes com a lei e dolosas.
A inação, nessa senda, seria um subterfúgio ao autobenefício ou ao benefício de terceiro em decorrência da verba federal recebida e gerida, mas sem o gerenciamento (delimitação dos débitos e dos créditos) mostrado à entidade ou ao órgão federal que repassou o numerário.
Considerando a natureza sancionatória da Lei n. 8.429/92, e firme no entendimento de que o princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica alcança as leis que disciplinam o direito administrativo sancionador, há que ser aplicada retroativamente a Lei n. 14.230/2021, no que diz com as condutas tidas por ímprobas e em relação às sanções a elas impostas, conforme já decidido pelo STF no Tema 1199. (ARE 843989, Relator(a): Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, julgado em 18/08/2022, Processo Eletrônico, Repercussão Geral - Mérito DJe-251 Divulg 09-12-2022 Public 12-12-2022).
A propósito: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO SEGUNDO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESPONSABILIDADE POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
ADVENTO DA LEI 14.231/2021.
INTELIGÊNCIA DO ARE 843989 (TEMA 1.199).
INCIDÊNCIA IMEDIATA DA NOVA REDAÇÃO DO ART. 11 DA LEI 8.429/1992 AOS PROCESSOS EM CURSO.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PROVIDOS PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. 1.
A Lei 14.231/2021 alterou profundamente o regime jurídico dos atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípio da administração pública (Lei 8.249/1992, art. 11), promovendo, dentre outros, a abolição da hipótese de responsabilização por violação genérica aos princípios discriminados no caput do art. 11 da Lei 8.249/1992 e passando a prever a tipificação taxativa dos atos de improbidade administrativa por ofensa aos princípios da administração pública, discriminada exaustivamente nos incisos do referido dispositivo legal. 2.
No julgamento do ARE 843989 (Tema 1.199), o Supremo Tribunal Federal assentou a irretroatividade das alterações da introduzidas pela Lei 14.231/2021 para fins de incidência em face da coisa julgada ou durante o processo de execução das penas e seus incidentes, mas ressalvou exceção de retroatividade para casos como o presente, em que ainda não houve o trânsito em julgado da condenação por ato de improbidade. 3.
As alterações promovidas pela Lei 14.231/2021 ao art. 11 da Lei 8.249/1992 aplicam-se aos atos de improbidade administrativa praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado. 4.
Tendo em vista que (i) o Tribunal de origem condenou o recorrente por conduta subsumida exclusivamente ao disposto no inciso I do do art. 11 da Lei 8.429/1992 e que (ii) a Lei 14.231/2021 revogou o referido dispositivo e a hipótese típica até então nele prevista ao mesmo tempo em que (iii) passou a prever a tipificação taxativa dos atos de improbidade administrativa por ofensa aos princípios da administração pública, imperiosa a reforma do acórdão recorrido para considerar improcedente a pretensão autoral no tocante ao recorrente. 5.
Impossível, no caso concreto, eventual reenquadramento do ato apontado como ilícito nas previsões contidas no art. 9º ou 10º da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.249/1992), pois o autor da demanda, na peça inicial, não requereu a condenação do recorrente como incurso no art. 9º da Lei de Improbidade Administrativa e o próprio acórdão recorrido, mantido pelo Superior Tribunal de Justiça, afastou a possibilidade de condenação do recorrente pelo art. 10, sem que houvesse qualquer impugnação do titular da ação civil pública quanto ao ponto. 6.
Embargos de declaração conhecidos e acolhidos para, reformando o acórdão embargado, dar provimento aos embargos de divergência, ao agravo regimental e ao recurso extraordinário com agravo, a fim de extinguir a presente ação civil pública por improbidade administrativa no tocante ao recorrente.(ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 22/08/2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 05-09-2023 PUBLIC 06-09-2023) Depreende-se, portanto, que o elemento condicionante da conduta tipificada pela norma do inciso VI do art. 11 da Lei n. 8.429/92 (alterado pela Lei n. 14.230/2021) – consistente em deixar de prestar contas, é o dolo específico de ocultar irregularidades.
Assim, deve ser aplicada retroativamente a lei sancionadora mais benéfica, devendo ser identificado na conduta imputada ao agente a existência da vontade livre e consciente de ocultar irregularidades por meio da não prestação de contas. 4.
Caso concreto Na espécie dos autos, como consignado na sentença, a parte requerida prestou contas à entidade executora dos recursos do PNAE/2012 e do PNAE/2013, mesmo que intempestivamente.
Já em relação à prestação de contas do PNAE/2014, embora ausente o cumprimento da obrigação, não houve a demonstração do dolo de ocultar irregularidades ou a comprovação de efetiva perda patrimonial ou desvio doloso de recursos públicos (art. 10, caput), sendo certo que não se admite a condenação com base apenas no dano presumido.
Destaque-se, quanto à questão, o parecer ofertado nesta instância pela Procuradoria-Regional da República (Id. 255110027): “Nesse ponto, segundo esclareceu o órgão ministerial em razões de apelação, a prestação de contas dos recursos do PNAE referente aos anos de 2012 e 2013 foi apresentada, de forma intempestiva, aguardando-se a análise dos documentos e informações encaminhados ao FNDE.
Já com relação ao ano de 2014, identificou-se situação de inadimplência, após a aprovação parcial da prestação de contas, com ressalvas.
Quanto aos exercícios de 2012 e 2013, não logra êxito a imputação de ofensa ao inciso VI do art.11 da Lei n. 8.429/92, consistente na “omissão do dever de prestar contas”, considerando que as contas foram prestadas, embora intempestivamente.
Ainda que assim não fosse, o que se aplica ao exercício ao PNAE 2014, não bastaria o mero omitir-se no dever prestar contas, conforme sustentam os apelantes.
Isso porque, mesmo que o fato seja comprovado (omissão no dever de prestar contas), é necessário perquirir acerca da existência do dolo na conduta do ex-gestor, consistente com a intenção de ocultar irregularidades (art. 11, VI, da Lei n. 8.429/92, alterado pela Lei n. 14.230/21).
O não fazer, sob a égide da Lei n. 14.230/2021, deve estar lastreado com má-fé e com desonestidade para acobertar irregularidades, porque, caso as contas fossem apresentadas pelo gestor, poderiam vir à tona práticas desconformes com a lei e dolosas.
A inação, nessa senda, seria um subterfúgio ao autobenefício ou ao benefício de terceiro em decorrência da verba federal recebida e gerida, mas sem o gerenciamento (delimitação dos débitos e dos créditos) mostrado à entidade ou ao órgão federal que repassou o numerário, situação esta não demonstrada nos autos.
Já quanto à imputação pela conduta descrita no art. 10, caput, da Lei 8.429/92, não houve demonstração de dolo específico, conforme bem se manifestou a PRR/1ª Região:
Por outro lado, com relação ao tipo previsto no art. 10, caput, da Lei n. 8.429/92, em atenção às alterações promovidas pela Lei n. 14.230/21 e ao julgamento do Tema 1.199-RG pelo STF, atualmente se exige a presença de uma intenção específica de causar prejuízo ao Erário para a caracterização do tipo normativo, o que não se verificou. – grifos acrescentados.
Portanto, ante o conjunto probatório constante nos autos, não houve demonstração do específico referido na conduta da parte apelada, bem assim das demais elementares dos tipos infracionais imputados, sendo certo que não se admite a condenação com base apenas no dano presumido.
Destarte, a conclusão, à luz das novas disposições inseridas na Lei 8.429/92, é pela improcedência in totum dos pedidos formulados na ação.
Ante o exposto, nego provimento à apelação.
Sem honorários ou custas (art. 23-B, §§ 1º e 2º, da Lei 8.429/92). É o voto.
Desembargadora Federal Daniele Maranhão Relatora PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 30 - DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198)1001038-47.2018.4.01.3100 APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA), FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO APELADO: RAYCLEZIAN DA COSTA COSTA Advogado do(a) APELADO: EIDE JOSE MACHADO DE OLIVEIRA FIGUEIRA - AP1162-A EMENTA PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
ART. 10, CAPUT, e ART. 11, VI, DA LEI 8.429/92.
DANO AO ERÁRIO E OMISSÃO NO DEVER DE PRESTAR CONTAS.
CONVÊNIO FIRMADO COM O FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO - FNDE.
DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR (ART. 1º, § 4º).
LEI MAIS BENÉFICA.
RETROATIVIDADE E APLICABILIDADE.
INADEQUAÇÃO TÍPICA.
ENTENDIMENTO DO STF.
TEMA 1.199.
DOLO ESPECÍFICO NÃO DEMONSTRADO.
DANO PRESUMIDO.
DESCABIMENTO.
SENTENÇA MANTIDA.
APELAÇÕES DESPROVIDAS. 1.
Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal e pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE contra sentença que, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada contra o requerido em razão da ausência de prestação de contas de recursos repassados por meio do Programa Nacional de Alimentação – PNAE, nos exercícios 2012, 2013 e 2014, na condição de gestor do Caixa Escolar, julgou improcedentes os pedidos ante o entendimento de que a responsabilidade pela prestação de contas junto ao FNDE é da Entidade Executora (Secretarias de educação dos entes políticos), e não das Unidades Executoras (Caixa Escolar), consoante prescrição do art. art. 6º, I e II, da Resolução CD/FNDE nº 38/ 2009. 2.
Elementares dos tipos de improbidade e legislação superveniente.
Para a configuração de quaisquer das condutas ímprobas de enriquecimento ilícito, dano ao erário e violação de princípios da administração pública, previstas na Lei n. 8.429/92, sempre deve estar presente o dolo específico, sendo insuficiente a culpa grave e até mesmo o dolo genérico, consoante inteligência dos §§ 2º e 3º do art. 1º do referido diploma, alterado pela Lei 14.230/2021, tendo o STF, inclusive, fixado a seguinte tese: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo – DOLO” (Tema 1199, RE nº 843989/PR).
Igualmente, é necessária a comprovação de que o agente público visava “obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade” (art. 1º, § 2º). 3.
Dano ao Erário.
A novel legislação, ao alterar o caput do art. 10 da Lei n. 8.429/92, excluiu do tipo as condutas culposas, passando a exigir elemento subjetivo específico (dolo) para a caracterização dos atos ímprobos, além de estabelecer que a ação ou omissão dolosa deve “efetiva e comprovadamente” causar prejuízo.
Exige-se, portanto: a) ação ou omissão ilícita; b) dolo específico; e c) prejuízo ao erário, que deve causar i) perda patrimonial aos haveres do Poder Público; ii) desvio, em que determinado bem público é extraviado para outra destinação que não seja a para qual este devia ser empregado efetivamente; iii) apropriação, em que o agente toma posse indevida de bem público para si; iv) malbaratamento, que é a alienação de determinado bem público por valor abaixo do que lhe cabe ou; v) dilapidação, em que há destruição total ou parcial de certo bem da Administração. 4.
Violação de Princípios da Administração.
Preceitua o art. 11, caput, da Lei n. 8.429/92 (alterada pela Lei n. 14.230/2021), constituir ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, referindo-se, em particular, em seu inciso VI, à conduta de deixar de prestar contas quando o gestor estiver obrigado a fazê-lo, desde que disponha das condições para isso, com vistas a ocultar irregularidades. 5.
Considerando a natureza sancionatória da Lei n. 8.429/92, e firme no entendimento de que o princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica alcança as leis que disciplinam o direito administrativo sancionador, há que ser aplicada retroativamente a Lei n. 14.230/2021, no que diz com as condutas tidas por ímprobas e em relação às sanções a elas impostas, conforme já decidido pelo STF no Tema 1199. (ARE 843989, Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, julgado em 18/08/2022, Processo Eletrônico, Repercussão Geral - Mérito DJe-251 Divulg 09-12-2022 Public 12-12-2022). 6.
Caso concreto.
Na espécie dos autos, como consignado na sentença, a parte requerida prestou contas à entidade executora dos recursos do PNAE/2012 e do PNAE/2013, mesmo que intempestivamente.
Já em relação à prestação de contas do PNAE/2014, embora ausente o cumprimento da obrigação, não houve a demonstração do dolo de ocultar irregularidades ou a comprovação de efetiva perda patrimonial ou desvio doloso de recursos públicos (art. 10, caput), sendo certo que não se admite a condenação com base apenas no dano presumido. 7.
Nesse contexto, não demonstrado o dolo específico referido na conduta do apelado, bem assim das demais elementares dos tipos infracionais imputados, a conclusão, à luz das novas disposições inseridas na Lei 8.429/92, é pela improcedência in totum dos pedidos formulados na ação. 8.
Apelações a que se nega provimento.
ACÓRDÃO Decide a Décima Turma, por unanimidade, negar provimento às apelações, nos termos do voto da relatora.
Desembargadora Federal Daniele Maranhão Relatora -
19/02/2024 00:00
Intimação
Justiça Federal Tribunal Regional Federal da 1ª Região , 16 de fevereiro de 2024.
Intimação da Pauta de Julgamentos Destinatário: Ministério Público Federal (Procuradoria), FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO e Ministério Público Federal APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA), FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO APELADO: RAYCLEZIAN DA COSTA COSTA Advogado do(a) APELADO: EIDE JOSE MACHADO DE OLIVEIRA FIGUEIRA - AP1162-A O processo nº 1001038-47.2018.4.01.3100 (APELAÇÃO CÍVEL (198)) foi incluído na sessão de julgamento abaixo indicada, podendo, entretanto, nesta ou nas subsequentes, serem julgados os processos adiados ou remanescentes.
Sessão de Julgamento Data: 11-03-2024 Horário: 14:00 Local: Sala de sessões n. 1 - Observação: Os pedidos de participação e sustentação oral (arts. 44 e 45 do RITRF1) deverão ser formulados à coordenadoria processante até o dia anterior ao do início da sessão, através do e-mail [email protected], informando se a participação e/ou sustentação oral será presencial ou por videoconferência. -
23/08/2022 11:04
Juntada de parecer
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22/08/2022 10:11
Expedição de Outros documentos.
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22/08/2022 07:33
Proferido despacho de mero expediente
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18/08/2022 12:48
Conclusos para decisão
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17/08/2022 18:27
Remetidos os Autos da Distribuição a 4ª Turma
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17/08/2022 18:27
Juntada de Informação de Prevenção
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12/08/2022 19:37
Recebidos os autos
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12/08/2022 19:37
Recebido pelo Distribuidor
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12/08/2022 19:37
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
13/05/2023
Ultima Atualização
15/03/2024
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
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