TRF1 - 1048536-12.2023.4.01.3700
1ª instância - 12ª Vara Federal - Sao Luis
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24/09/2024 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE 1ª INSTÂNCIA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DO MARANHÃO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL - 12ª VARA Processo nº: 1048536-12.2023.4.01.3700 Assunto: [Pessoa com Deficiência] AUTOR: GIOVANI GOMES RODRIGUES REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS SENTENÇA - TIPO A O autor pleiteia benefício assistencial no valor de um salário mínimo previsto no art. 203, V, da Constituição Federal “à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família”.
A Lei Orgânica da Assistência Social (Lei n° 8.742/93), suprindo a exigência constitucional de regulamentação dos requisitos para gozo do benefício, estatuiu: Art. 20.
O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família. §1º Para os efeitos do disposto no caput, entende-se como família o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo teto. §2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho. §3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
Anos depois, o Estatuto do Idoso (Lei n° 10741/03) reduziu a idade para o benefício em cinco anos (art. 34).
Como se vê, há necessidade de satisfação concomitante dos seguintes requisitos: (a) a deficiência que incapacita para uma vida independente e para o trabalho ou idade mínima de 65 anos, de acordo com o Estatuto do Idoso, que é norma mais recente; e (b) impossibilidade de prover sua manutenção ou tê-la provida por sua família.
No caso dos autos, o autor alega que está incapaz para a vida independente e para o trabalho.
O laudo pericial atesta que "o periciando é portador de deficiência ou enfermidade que limite o desempenho de atividades compatíveis com sua idade e restrinja sua participação social por período igual ou superior a dois anos", apresentando ileostomia CID10 – Z93.2.
Ultrapassada esta questão, passo ao exame da impossibilidade de sustento próprio ou mediante apoio da família.
O critério consagrado para caracterizar a hipossuficiência econômica na Lei n° 8.742/93 é de natureza objetiva.
A renda mensal per capita da família deve ser inferior a ¼ (um quarto) do salário-mínimo.
Contudo, a estreiteza do requisito legal foi rechaçada pelo STF.
Inicialmente, a exigência de renda per capita de no máximo ¼ do salário-mínimo foi desafiada pela ADI 1.232, que acabou sendo julgada improcedente, entendendo o Plenário, naquela ocasião, que, embora fosse evidente que o critério legal não abrangia diversas situações igualmente merecedoras de proteção estatal, havia uma insuficiência legislativa que somente poderia ser suprida pelo próprio Legislador, adicionando hipóteses de incidência para a deflagração da proteção assistencial. (STF, ADI 1.232, j. 27/08/1998).
O entendimento firmado nesta ADI prevaleceu por muitos anos, mas a inicial deferência natural das instâncias inferiores do Judiciário a este precedente começou a dar lugar a decisões contrárias à conclusão da ADI, apesar do efeito vinculante desta.
Aliás, precisamente pelo efeito vinculante é que o Judiciário passou a adotar diversos “expedientes argumentativos” para “escapar” das amarras da decisão do STF.
No caso em houve a ruptura com o entendimento que prevaleceu na ADI, relatado adiante, a Suprema Corte catalogou os lugares-comuns das decisões que, especialmente na primeira instância — onde os juízes tinham contato direto com os postulantes —, invocavam maior amplitude para que o julgador pudesse analisar, caso a caso, diante das peculiaridades do cenário concretamente examinado, a real necessidade de intervenção do Estado em favor de pessoas vulneráveis apesar do restritivo critério legal. (...) as reiteradas decisões do STF não foram suficientes para coibir as decisões das instâncias inferiores na solução dos casos concretos.
A inventividade hermenêutica passou a ficar cada vez mais apurada, tendo em vista a necessidade de se escapar dos comandos impostos pela jurisprudência do STF.
A diversidade e a complexidade dos casos levaram a uma variedade de critérios para concessão do benefício assistencial, tais como os descritos a seguir: a) O benefício previdenciário de valor mínimo, ou outro benefício assistencial percebido por idoso, é excluído da composição da renda familiar (Súmula 20 das Turmas Recursais de Santa Catarina e Precedentes da Turma Regional de Uniformização); b) Indivíduos maiores de 21 (vinte e um) anos são excluídos do grupo familiar para o cálculo da renda per capita; c) O benefício assistencial percebido por qualquer outro membro da família não é considerado para fins da apuração da renda familiar; d) Consideram-se componentes do grupo familiar, para fins de cálculo da renda per capita, apenas os que estão arrolados expressamente no art. 16 da Lei 8.213/91; e) Os gastos inerentes à condição do beneficiário (remédios etc.) são excluídos do cálculo da renda familiar. (STF, Rcl 4.374, j. 18/04/2013, trecho do voto do Relator) A Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais já tinha posicionamento firmado nesse sentido, que chegou a ser sumulado: Súmula 11 – A renda mensal, per capita, familiar, superior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo não impede a concessão do benefício assistencial previsto no art. 20, § 3º da Lei 8.742 de 1993, desde que comprovada, por outros meios, a miserabilidade do postulante.
A súmula foi cancelada em 23/04/2006, diante de reiteradas decisões do STF reafirmando a autoridade da decisão da ADI, mas nos juizados se continuou a julgar contrariamente à regra e à decisão do STF: A questão atinente à comprovação da miserabilidade vem sofrendo modificações jurisprudenciais, para considerar que o preceito contido no art. 20, § 3º da Lei no 8.742/93 não é o único critério válido para comprovar a condição de miserabilidade preceituada no artigo 203, V, da Constituição Federal. (grifei) (TNU, PU 2005.43.00.903968-3, j. 13/08/2007).
Em algum momento entre 2005 e 2006 houve uma mudança de entendimento dos Ministros da Corte, e o STF já dava sinais de que modificaria a orientação da ADI 1.232, julgando monocraticamente as muitas Reclamações levadas à Corte pela Procuradoria Federal já em desfavor do INSS.
Exemplificativamente, trecho de decisão que assim justificou a manutenção de decisão de base que violava os parâmetros da ADI: De se concluir, portanto, que o Supremo Tribunal teve por constitucional, em tese (cuidava-se de controle abstrato), a norma do art. 20 da Lei n. 8.742/93, mas não afirmou inexistirem outras situações concretas que impusessem atendimento constitucional e não subsunção àquela norma.
Taxativa, nesse sentido, é a inteligência do acórdão nos termos clareados no voto do Ministro Sepúlveda Pertence, transcrito parcialmente acima.
A constitucionalidade da norma legal, assim, não significa a inconstitucionalidade dos comportamentos judiciais que, para atender, nos casos concretos, à Constituição, garantidora do princípio da dignidade humana e do direito à saúde, e à obrigação estatal de prestar a assistência social “a quem dela necessitar, independentemente da contribuição à seguridade social”, tenham de definir aquele pagamento diante da constatação da necessidade da pessoa portadora de deficiência ou do idoso que não possa prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. (STF, Rcl 3.805, decisão monocrática de 09/10/2006).
Na mesma decisão ficou claro que a Ministra considerou que a regra deveria “ceder à realidade” fática verificada no processo: Afirmo: e a miséria constatada pelo juiz é incompatível com a dignidade da pessoa humana, princípio garantido no art. 1º, inc.
III, da Constituição da República; e a política definida a ignorar a miserabilidade de brasileiros é incompatível com os princípios postos no art. 3º e seus incisos da Constituição; e a negativa do Poder Judiciário em reconhecer, no caso concreto, a situação comprovada e as alternativas que a Constituição oferece para não deixar morrer à mingua algum brasileiro é incompatível com a garantia da jurisdição, a todos assegurada como direito fundamental (art. 5º, inc.
XXXV, da Constituição da República).
Muitas decisões proferidas monocraticamente pelos Ministros da Corte entre 2006 e 2013 tiveram fundamentação semelhante.
Os argumentos, embora redigidos de forma a permitir uma compatibilização com a conclusão da Corte na ADI, estão bastante distantes do que foi decidido em 1998.
O que houve foi efetivamente uma mudança de orientação no STF, onde se passou a entender que a insuficiência da lei permitia que o juiz, diante do caso concreto, avaliasse diretamente a situação de vulnerabilidade social alegada pelo postulante.
No julgamento da Reclamação 4.374, em 2013, prevaleceu o entendimento de que a lei não poderia restringir demasiadamente, como fez, o alcance de um direito de estatura constitucional. (STF, Rcl 4.374, j. 18/04/2013).
Ficou superada a tese da “intransponibilidade do critério objetivo” consagrada na ADI, e o STF derrotou a restrição legal.
Embora não se estivesse diante de ausência de norma, havia uma lacuna axiológica que perdurava desde 1992, ou, como o Min.
Marco Aurélio, denominou, uma “inconstitucionalidade na prática”: Mostra-se patente que o artigo 20, § 3º, da Lei no 8.742/93, embora não seja, só por si, inconstitucional, gerou situação concreta de inconstitucionalidade.
A incidência da regra traduz falha no dever, criado pela Carta, de plena e efetiva proteção dos direitos fundamentais, resultante da eficácia positiva de tais direitos, cuja concretização é condição essencial à construção de uma sociedade mais justa e, portanto, civilizada. (…) Surge claro que os enunciados normativos, previstos em abstrato, podem resultar em incidências concretas que desatendam aos comandos constitucionais. (STF, Rcl 4.374, j. 18/04/2013).
A questão é posta pelo Ministro em termos de “constitucionalidade”, doutrina mais familiar à Corte.
Todavia, fica induvidoso pela admissão do Min.
Marco Aurélio que o critério legal era constitucional e aplicável tranquilamente aos casos ordinários, mas havia situações em que ele geraria uma “injustiça” e, por isso, a regra deveria ser pontualmente derrotada, permitindo ao juiz a avaliação ampla da situação diante de si. “Em tais casos, pode o juízo superar a norma legal sem declará-la inconstitucional, tornando prevalecentes os ditames constitucionais”. É caso típico de derrotabilidade normativa, referendada pela Suprema Corte, ao reconhecimento de que a norma constitucional que prevê o benefício não pode ter sua eficácia restringida de modo significativo pelo legislador ordinário.
Toda esta saga jurisprudencial evidencia que houve o reconhecimento de que o critério legal era demasiadamente estreito, incapaz de acomodar a multiplicidade de situações que a vida apresenta diariamente aos juízes de primeira instância.
No confronto entre a regra e a necessidade de fazer justiça no caso concreto, o Judiciário brasileiro, no que se refere ao benefício assistencial da Lei 8.742, optou pela segunda.
Assim, embora aquele julgamento tenha conclusão confusa, já que houve declaração de inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade e sem fixação de prazo para atuação do legislador ou qualquer tipo de modulação, é certo que o STF legitimou o que os juízes de primeira instância já vinham fazendo desde o advento da Lei 8.742.
Destarte, analisando o caso concreto, conforme a prova dos autos, cabe destacar que: (a) o grupo familiar é composto pelo autor; (b) a renda da família é de R$1300,00 que o autor recebe o BPC idoso; (c) o autor não necessita da presença constante de outra pessoa para realização das suas atividades cotidianas; (d) o grupo familiar gasta mensalmente R$ 400,00 com aluguel, R$500,00 com despesa de alimentação, R$50,00 com transporte, R$115,oo com gás de cozinha; (e) o grau de escolaridade do núcleo familiar é baixo, o autor possui apenas fundamental completo ; (f) a casa é alugada, conta com três compartimentos, acesso à rede elétrica, água encanada e rua asfaltada; (g) o autor não faz uso de medicamentos contínuos não fornecidos pelo SUS.
Em análise ao sistema de pesquisa eletrônica INFOSEG verificou-se que consta registro de propriedade das motos de placas NNA3854 (HONDA/NXR150 BROS ES - restrição de roubo/furto) e NHC4210 (HONDA/NXR150 BROS ESD) no CPF do autor.
Ressalta-se que a propriedade/posse, ou, enfim, a manutenção de um carro é manifestamente incompatível com a vulnerabilidade social exigida pela lei para o benefício assistencial.
Por fim, as fotos obtidas pela assistente social demonstram que a residência do grupo familiar possui estrutura razoável, permitindo uma vida digna.
Tudo somado, está claro que o autor não se encontra em situação de efetiva vulnerabilidade social.
Ante o exposto, julgo improcedente o pedido formulado pelo autor e resolvo o mérito. -
27/06/2023 13:32
Recebido pelo Distribuidor
-
27/06/2023 13:32
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
27/06/2023
Ultima Atualização
24/09/2024
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Sentença Tipo A • Arquivo
Sentença Tipo A • Arquivo
Sentença Tipo A • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
Despacho • Arquivo
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