TRF1 - 1080152-05.2023.4.01.3700
1ª instância - 8ª Sao Luis
Polo Ativo
Polo Passivo
Partes
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
-
25/06/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Maranhão 8ª Vara Federal Ambiental e Agrária da SJMA PROCESSO: 1080152-05.2023.4.01.3700 CLASSE: AÇÃO CIVIL PÚBLICA (65) POLO ATIVO: MINISTERIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) FISCAL DA LEI e outros POLO PASSIVO:EMPRESARIAL CHAMPS MALL LTDA e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: AGENOR XAVIER VALADARES - BA5275 e MARIA DE JESUS PEREIRA VALADARES - MA12604 DECISÃO INTERLOCUTÓRIA Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal, com a posterior adesão da União Federal como assistente litisconsorcial ativa, em face de diversos estabelecimentos comerciais instalados na faixa de areia da Praia da Ponta D’Areia, em São Luís/MA, cuja ocupação seria indevida, por recair sobre área de uso comum do povo e de preservação permanente (APP).
O MPF sustenta que os réus mantêm estruturas fixas na área mesmo após o fim da autorização temporária expedida pela SPU/MA, o que violaria o regime jurídico dos bens públicos e a legislação ambiental.
A União aderiu aos pedidos e, com base em ofício da SPU/MA, afirmou que a área é inviável para regularização, em razão de tratar-se de bem de uso comum, excluído da hipótese do art. 16 da Lei nº 13.240/2015.
As rés, em contestação, sustentam que a ocupação da área ocorreu com base em autorização da União (SPU/MA), formalizada por meio de permissão de uso, posteriormente prorrogada, e que o indeferimento de novo pedido de prorrogação foi indevidamente fundamentado, padecendo de ilegalidade.
Afirmam que a ocupação sempre se deu de forma ordenada e compatível com o uso comum da área, com estruturas removíveis e sem implantação de equipamentos fixos ou qualquer impedimento ao uso coletivo.
Rejeitam a alegação de dano ambiental e defendem que não houve desvio de finalidade no uso autorizado.
Alegam, ainda, violação ao princípio da isonomia e proporcionalidade, destacando o tratamento diferenciado conferido a ocupações similares ao longo da Avenida Litorânea, cuja regularização foi promovida por meio de Termo de Ajustamento de Conduta - TAC (id 2091290152).
Em decisão id. 2148052786, o juízo determinou cautelarmente a vedação de novas intervenções na área sem autorização da SPU, e convocou as partes para se manifestarem sobre possibilidade de acordo.
A mesma decisão rejeitou a preliminar de ilegitimidade passiva formulada por Vitória Carolina Buzar Facundo e admitiu o ingresso de assistentes litisconsorciais nos polos ativo e passivo.
O MPF e a União se manifestaram veementemente contra a solução consensual, reafirmando que a ocupação é juridicamente irregular e incompatível com o regime protetivo da área.
Deferido o pedido de tutela de urgência para determinar a) a retirada integral das estruturas físicas, equipamentos e quaisquer objetos instalados na área pública descrita nos autos; (b) a abstenção do exercício de qualquer forma de uso privativo ou exploração econômica da referida área, até ulterior deliberação judicial; (c) a revogação tutela de urgência deferida na ação de conhecimento conexa (Processo nº 1049544-24.2023.4.01.3700) (id 2187493892).
Juntada de decisão monocrática proferida no âmbito do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que deferiu o pedido de antecipação da tutela recursal para suspender, imediatamente, os efeitos da decisão agravada, até ulterior deliberação. É o relatório.
Não há questões processuais pendentes de apreciação, razão por que examino a necessidade de produção de provas.
No caso em exame, a natureza jurídica da área como bem de uso comum do povo e de domínio da União não foi controvertida na contestação (id 2091290152) - o que atrai a preclusão consumativa sobre esse ponto, nos termos dos arts. 336 e 341 do CPC.
A própria defesa admite expressamente que a ocupação se deu por meio de autorização da SPU - o que pressupõe o reconhecimento da dominialidade federal -, além de sustentar que não há qualquer impedimento de uso da área como bem de uso comum do povo.
A posterior alegação de que a área não se qualificaria como bem de uso comum do povo configura inovação indevida da tese defensiva (petição - id 2160371428) e mesmo dos limites da causa de pedir da ação de conhecimento conexa (processo n. 1049544-24.2023.4.01.3700), em que as oras rés pretendem a permanência dos mesmos equipamentos existentes na área objeto da permissão de uso.
Com efeito, a tentativa posterior de enquadramento da área como categoria diversa das praias, com a finalidade de afastar sua categorização como bem de uso comum do povo, tem por base manifestação doutrinária sem repercussão jurídica válida no processo, pois a Lei nº 7.661/1988, em seu art. 10, p. 3º, define como "praia" “a área coberta e descoberta periodicamente pelas águas, acrescida da faixa subseqüente de material detrítico, tal como areias, cascalhos, seixos e pedregulhos, até o limite onde se inicie a vegetação natural, ou, em sua ausência, onde comece um outro ecossistema”, o que abrange justamente o espaço denominado pelas rés como “pós-praia”, que inequivocamente, no caso concreto, constitui a faixa de areia subsequente ao mar, caracterizada por substrato arenoso contínuo, utilizada livremente por banhistas, inclusive como área de circulação e permanência com os pés na areia, integrando, de forma funcional e paisagística, o mesmo ambiente praial, bem de uso comum do povo, conforme se infere de fotografias e vídeos que instruem a petição inicial e a contestação (v.g. ids 1910199238 e 2091449657).
Releva notar que a preclusão quanto à natureza da área como bem de uso comum do povo e de domínio da União não obsta a apuração, no âmbito da presente ação civil pública, de eventual qualificação da área como de preservação permanente (APP).
Trata-se de questão fática e técnica autônoma, compatível com os limites objetivos da causa de pedir ambiental, voltada à verificação da existência de vegetação fixadora de duna e à avaliação de possíveis impactos decorrentes da ocupação sobre a funcionalidade ecológica do ecossistema costeiro.
Dito isso, as questões de fato controvertidas ou que demandam a produção de provas se relacionam ao seguinte: (a) A verificação da existência, na área ocupada ou em suas imediações, de vegetação de restinga com função fixadora de duna, para fins de apuração de eventual caracterização da área como Área de Preservação Permanente (APP); (b) A existência de danos ambientais efetivamente constatáveis, decorrentes da instalação de estruturas ou da supressão ou impedimento de regeneração da vegetação nativa; (c) A definição de eventuais medidas técnicas necessárias à recomposição ambiental da área, caso verificado dano, inclusive com indicação de parâmetros para elaboração de Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD).
Ressalto que a controvérsia relativa à legalidade dos atos administrativos expedidos pela SPU, que resultaram no indeferimento da prorrogação da permissão de uso da área, constitui matéria de direito.
Sua apreciação prescinde da produção de prova pericial ou de outras provas, e será examinada no momento processual oportuno (julgamento definitivo).
O exame de questões fáticas acima indicadas,
por outro lado, imprescinde da realização de perícia técnica conduzida por profissional equidistante das partes.
Para fins de contextualização técnica e avaliação da dinâmica ambiental local, a perícia deverá incluir a análise da evolução da linha de costa e da faixa de areia ao longo do tempo, especialmente considerando a construção do espigão costeiro existente no local, mediante o uso de imagens de satélite e registros multitemporais de bases públicas disponíveis, a fim de subsidiar tecnicamente o exame das condições ambientais da ocupação e dos possíveis impactos ecológicos decorrentes.
Dessa forma, DEFIRO o pedido de produção de prova pericial, DETERMINO a realização de perícia judicial e, em decorrência, nomeio como perita EDILÉA DUTRA PEREIRA (Geóloga, inscrita no CREA/PA sob o n. 9930/D, doutora em Geociência e Meio Ambiente e Professora do Departamento de Geociência da Universidade Federal do Maranhão), que deverá apresentar proposta fundamentada de honorários.
Deverá a Secretaria sucessivamente INTIMAR: a. as partes para, no prazo de 15 (quinze) dias, indicar assistente(s) técnico(s) e apresentar quesitos, (CPC, art. 465), cientificando-as de que, na hipótese de indicação de assistente(s) técnico(s), deverão informar seus contatos profissionais, inclusive endereço(s) eletrônico(s), para que seja viabilizada e assegurada a prévia comunicação, pelo(s) perito(s), a respeito das diligências e dos exames que realizar (CPC, arts. 466, p. 2º; e 475); b. a perita a respeito de sua nomeação para, no prazo de 5 (cinco) dias, apresentar proposta fundamentada de honorários (na qual deverá especificar as atividades a serem realizadas - justificação do valor proposto - e indicar seus contatos profissionais, em especial endereço eletrônico, para onde serão dirigidas as intimações pessoais) e currículo, que deverá ser arquivado em Secretaria para consulta das partes e de terceiros (CPC, art. 465, p. 2º); c. as partes, da proposta de honorários, para manifestar-se no prazo de 5 (cinco) dias (CPC, art. 465, p. 3º).
Na hipótese de concordância com o valor dos honorários periciais, o autor (1) Ministério Público Federal, os réus (2) Empresarial Champs Mall Ltda. (Empresarial MK Ltda.), (3) Lago Ltda., (4) Azu Japoneses e Contemporâneo Ltda., (5) Ponto Italiano Alimentos Ltda., (6) Ativa Empreendimentos Ltda., (7) Qu4ttro Bar Ltda., (8) V C B Facundo (empresário individual - pessoa física Vitória Carolina Buzar Facundo), bem como os assistentes litisconsorciais passivos (9) A. de Jesus Ltda. e (10) Bar e Restaurante Avenida Paulista Ltda., deverão comprovar, no prazo de 5 (cinco) dias, o depósito da pro-rata dos honorários periciais, proporcionalmente à razão de 1/10 para cada um, nos termos do art. 95 do CPC.
Faculto aos réus e aos assistentes litisconsorciais passivos – representados pela mesma banca de advogados – a abertura de conta única de depósito judicial, para fins de adimplemento conjunto dos honorários periciais que lhes competem.
Efetuado o depósito relativo aos honorários periciais, fica autorizado o levantamento de 50% de seu valor pela perita; a Secretaria deverá fixar, em conjunto com a profissional nomeada, a data de início dos trabalhos, da qual as partes serão intimadas com antecedência; o laudo pericial será apresentado no prazo máximo de 2 (dois) meses, observando-se os quesitos apresentados (CPC, arts. 465, caput e p. 4º) e os requisitos legalmente exigidos (CPC, art. 473).
Ressalto que os valores depositados em conta vinculada ao juízo (honorários periciais) deverão ser transferidos eletronicamente para a conta bancária previamente indicada pelo(a) credor(a) (perita), com observância da Orientação Normativa COGER 10134629, que dispõe sobre a transferência e o levantamento de depósitos judiciais no âmbito da Justiça Federal da 1ª Região.
Apresentado o laudo pericial, as partes serão intimadas para, querendo, manifestar-se no prazo de 15 (quinze) dias, podendo o assistente técnico de cada uma das partes, em igual prazo, apresentar seu respectivo parecer; poderão as partes, nesse mesmo prazo, requerer esclarecimentos a respeito de ponto sobre o qual exista divergência ou dúvida (CPC, art. 477, p. 1º e 2º).
Prestados os esclarecimentos necessários ou caso não sejam solicitados, deverá ser disponibilizada à perita a parcela final (remanescente) dos honorários periciais, mediante transferência eletrônica.
Outrossim, formulo, desde logo, os seguintes quesitos do Juízo (CPC, art. 470, II): (1) Delimitar a área objeto da presente demanda, com identificação dos seus limites físicos, coordenadas geográficas e metragem, bem como a descrição do uso atual observado no local, inclusive com registro fotográfico. (2) Realizar a qualificação ambiental da área objeto da demanda, inclusive avaliando se está total ou parcialmente inserida em Área de Preservação Permanente (APP), com base na presença atual ou pretérita de vegetação de restinga com função fixadora de duna, mediante observação em campo e análise multitemporal de imagens de satélite e registros históricos disponíveis; (3) Descrever e avaliar os danos ambientais eventualmente constatados na área objeto da demanda, com especificação: (a) das intervenções realizadas no meio ambiente; (b) dos efeitos ecológicos decorrentes, inclusive com exame de eventual impacto à funcionalidade ecológica da área objeto da demanda; (4) Descrever as estruturas atualmente existentes na área, com especificação quanto à quantidade, tipo, extensão física, material empregado e forma de fixação ao solo, indicando se se tratam de estruturas removíveis ou fixas/permanentes, e avaliando o grau de impacto físico ou ecológico associado à sua presença no local; (5) Avaliar a viabilidade ambiental e técnica de recuperação da área eventualmente degradada, com indicação das medidas necessárias à recomposição do ecossistema afetado; (6) Para fins de contextualização da dinâmica ambiental local, a perita deverá realizar a análise da evolução da linha de costa e da faixa de areia ao longo do tempo, especialmente em razão da construção do espigão costeiro existente no local, com base em imagens de satélite e outras fontes técnicas disponíveis, visando a descrever os efeitos físicos e ecológicos dessa alteração sobre a faixa atualmente ocupada; (7) A perita deverá esclarecer todo e qualquer ponto que, sob o aspecto estritamente técnico, reputar indispensável à solução do conflito.
Intimem-se as partes: (a) para os fins do art. 357, § 1º, do Código de Processo Civil, a fim de que, no prazo de 5 (cinco) dias, possam requerer esclarecimentos ou solicitar ajustes à presente decisão de saneamento e organização do processo, mediante manifestação clara, objetiva e fundamentada; (b) para, no prazo de 15 (quinze) dias, indicarem seus respectivos quesitos e assistentes técnicos; (c) para ciência da decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (id 2187493892), que concedeu antecipação de tutela recursal para suspender os efeitos da tutela de urgência anteriormente concedida nesta Ação Civil Pública.
Com isso, fica restabelecida a eficácia da decisão proferida nos autos do processo nº 1049544-24.2023.4.01.3700, que deferiu tutela provisória de urgência, determinando à União que se abstenha de exigir a retirada das estruturas, com fundamento em alegações de razoabilidade administrativa, impacto econômico e regularidade formal da ocupação.
Os prazos ora fixados serão contados em dobro para o Ministério Público e a Advocacia Pública.
Traslade-se cópia da presente decisão, bem como da decisão monocrática proferida no âmbito do TRF1, para os autos da ação de conhecimento conexa (processo n. 1049544-24.2023.4.01.3700).
Cumpra-se.
São Luís (MA), data da assinatura eletrônica.
Maurício Rios Júnior Juiz Federal -
08/05/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Maranhão 8ª Vara Federal Ambiental e Agrária da SJMA PROCESSO: 1080152-05.2023.4.01.3700 CLASSE: AÇÃO CIVIL PÚBLICA (65) POLO ATIVO: MINISTERIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) FISCAL DA LEI e outros POLO PASSIVO:EMPRESARIAL CHAMPS MALL LTDA e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: AGENOR XAVIER VALADARES - BA5275 e MARIA DE JESUS PEREIRA VALADARES - MA12604 Justiça Verde – Projeto de Priorização da Jurisdição Ambiental DECISÃO Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal, com a posterior adesão da União Federal como assistente litisconsorcial ativo, em face de diversos estabelecimentos comerciais instalados na faixa de areia da Praia da Ponta D’Areia, em São Luís/MA, alegadamente ocupando indevidamente área de uso comum do povo e de preservação permanente (APP).
O MPF sustenta que os réus mantêm estruturas fixas na área mesmo após o fim da autorização temporária expedida pela SPU/MA, o que violaria a legislação ambiental e o regime jurídico dos bens públicos.
Requer, em sede de tutela de urgência, a imediata retirada das instalações e abstenção de exploração econômica do local.
A União aderiu aos pedidos e, com base em ofício da SPU/MA, afirmou que a área é inviável para regularização, em razão de tratar-se de bem de uso comum, excluído da hipótese do art. 16 da Lei nº 13.240/2015.
Em manifestação id. 1995093649, os réus alegam que a ocupação foi realizada com autorização válida, de forma temporária e sob fiscalização da SPU.
Sustentam a boa-fé, ausência de dano ambiental comprovado e que a atividade comercial não impede o uso coletivo da área.
Requerem a improcedência dos pedidos ou, subsidiariamente, a modulação da tutela com prazo para retirada voluntária.
Propõem, ainda, a celebração de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC).
Em decisão id. 2148052786, o juízo determinou cautelarmente a vedação de novas intervenções na área sem autorização da SPU, e convocou as partes para se manifestarem sobre possibilidade de acordo.
Tanto o MPF quanto a União rejeitaram a proposta de solução consensual, reafirmando que a ocupação é juridicamente irregular e incompatível com o regime protetivo da APP.
Em nova manifestação de id. 2168193003 os réus insistiram na viabilidade de acordo, reiterando os impactos econômicos e sociais da retirada. É o relatório.
Decido A controvérsia tem por objeto a delimitação jurídica da área em questão, a sua natureza ambiental, a validade da ocupação realizada e a viabilidade jurídica e fática da concessão de medida liminar para determinar a sua desocupação imediata.
São requisitos que devem estar presentes para a concessão da tutela de urgência, nos termos do art. 300, do Código de Processo Civil: a) a probabilidade do direito pleiteado, ou seja, a plausibilidade lógica que surge da confrontação das alegações e das provas com os elementos disponíveis nos autos, do que decorre um provável reconhecimento do direito, obviamente baseado em cognição sumária; e b) o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo caso não seja concedida, isto é, quando houver situação de urgência em que não se justifique aguardar o desenvolvimento natural do processo.
A análise do caso exige o reconhecimento de que a área ocupada, segundo os elementos trazidos aos autos, corresponde a um bem público de uso comum do povo, situado em faixa costeira sob domínio da União, cuja gestão administrativa compete à SPU, a se enquadrar nos termos do art. 99, inciso I, do Código Civil: "Art. 99.
São bens públicos: I - os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças;" A gestão do imóvel em questão, por se tratar de bem da União, compete à SPU, a quem incumbe a autorização de uso precário e a fiscalização quanto à ocupação de tais áreas.
Além disso, sustentam os autores que se trata de Área de Preservação Permanente (APP), à luz da Resolução CONAMA nº 303/2002, que assim dispõe: "Art. 2º Constitui Área de Preservação Permanente, nos termos do inciso II, do § 2º, do art. 225 da Constituição Federal, dentre outras, a vegetação situada: (...) XV - nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues." O Código Florestal (Lei nº 12.651/2012), por sua vez, dispõe: "Art. 3º Para os efeitos desta Lei, entende-se por: II - Área de Preservação Permanente - APP: área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas;" Conforme ofício da própria SPU anexado aos autos, a autorização anteriormente concedida para uso da área expirou em junho de 2023, tendo sido indeferida sua prorrogação com base no art. 16, §2º, da Lei nº 13.240/2015, que dispõe: "Art. 16.
As áreas da União sob gestão do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão poderão ser cedidas, com ou sem encargos, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, nas condições estabelecidas em regulamento. § 2º Não poderão ser cedidas ou doadas as áreas que, por suas características, estejam: I - sujeitas a regime especial de uso; II - situadas em áreas de preservação permanente ou em áreas de risco; III - ocupadas de forma irregular com edificações não passíveis de regularização." A ausência de título jurídico atual e válido a autorizar a ocupação da área pelos réus configura, em juízo de cognição sumária, probabilidade relevante do direito invocado.
O fundamento legal é corroborado pela jurisprudência consolidada dos tribunais superiores no sentido da indisponibilidade de bens públicos de uso comum e da inaplicabilidade de prorrogação automática de autorizações precárias em áreas de preservação permanente.
Vejamos: “Construção ou atividade irregular em bem de uso comum do povo revela dano presumido à coletividade, dispensada prova de prejuízo em concreto.” REsp 1730402/RJ, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe 12/03/2019 – Jurisprudência em teses, ed. 124.
ADMINISTRATIVO.
RECURSO ESPECIAL.
PRAIA E ZONA COSTEIRA.
ARRAIAL DO CABO.
ART. 10 DA LEI 7.661/1988.
BEM DA UNIÃO.
AÇÃO REIVINDICATÓRIA E DEMOLITÓRIA.
ESBULHO.
QUIOSQUE.
ARTIGOS 64 E 71, PARÁGRAFO ÚNICO, DO DECRETO-LEI 9.760/1946.
USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA AMBIENTAL PELO MUNICÍPIO.
ART. 4° DA LEI 9.636/1998.
DANO AO MEIO AMBIENTE.
PAISAGEM.
INDENIZAÇÃO PELA OCUPAÇÃO PREVISTA NO ART. 10, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 9.636/1998.
CABIMENTO.
PRECEDENTES. (...)6.
Quem ocupa ou usa bem público sem a imprescindível aprovação expressa, inequívoca, atual e válida - ou além dos termos e condições nela previstos - da autoridade competente pratica esbulho, fazendo-o por sua conta e risco e, por isso, submetendo-se a sanções penais (p. ex., art. 20, caput, da Lei 4.947/1966 e art. 161, II, do Código Penal) e a remédios preventivos e reparatórios previstos na legislação, aí incluídas demolição às suas expensas e indenização pela apropriação vedada (= privatização contra legem) do patrimônio coletivo. É exatamente o que prevê o art. 10, parágrafo único, da Lei 9.636/1998: "Até a efetiva desocupação, será devida à União indenização pela posse ou ocupação ilícita, correspondente a 10% (dez por cento) do valor atualizado do domínio pleno do terreno, por ano ou fração de ano em que a União tenha ficado privada da posse ou ocupação do imóvel, sem prejuízo das demais sanções cabíveis".
REsp 1730402/RJ, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe 12/03/2019.
Cabe mencionar, que não há como alegar suposta ilegalidade da decisão da SPU, no que tange à ausência de renovação da licença temporária concedida, cabendo destacar a discricionariedade da Administração ao proferir tais decisões.
Para além disso, não é demasiado pontuar que à Secretaria do Patrimônio da União compete fiscalizar e zelar pela manutenção da destinação e do interesse público do patrimônio da União, podendo, para o alcance de tal finalidade, “embargar serviços e obras, aplicar multas e demais sanções previstas em lei e, ainda, requisitar força policial federal e solicitar o necessário auxílio de força pública estadual” (art. 11 da Lei n. 9.636/98).
Conforme o disposto no art. 225, §1º, inciso IV, da Constituição Federal, incumbe ao Poder Público exigir, na forma da lei, estudo prévio de impacto ambiental para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de degradação ambiental.
A não realização de tal estudo e a permanência de estruturas fixadas em área costeira de potencial sensibilidade ambiental revelam cenário de risco ao meio ambiente, cuja defesa constitui dever do Estado e direito de todos.
O fumus boni iuris está suficientemente evidenciado nos autos.
A SPU reconheceu expressamente que a autorização anteriormente concedida aos réus expirou em junho de 2023, tendo sido indeferida a sua prorrogação, com fundamento no §2º do art. 16 da Lei nº 13.240/2015, o qual estabelece que não é permitida a regularização de ocupações em áreas com características de preservação ambiental, ou que estejam sujeitas a restrição legal de uso.
A ausência de título jurídico válido que autorize a permanência dos particulares na área reforça a plausibilidade do direito invocado pelos autores.
No que tange ao periculum in mora, este decorre da permanência irregular de estruturas em área pública costeira, em desconformidade com os normativos ambientais e patrimoniais.
O prolongamento dessa ocupação indevida pode ensejar dano contínuo ao meio ambiente, além de consolidar situação de fato que se contrapõe ao interesse público primário.
Ressalte-se que o meio ambiente, por sua condição de bem jurídico de natureza transindividual, não comporta risco de lesão que possa ser plenamente reparado posteriormente.
Importa destacar que a função socioeconômica alegada pelos réus – consistente em atividades de recreação, turismo e gastronomia – não é suficiente para sobrepor-se ao interesse público maior de preservação ambiental e uso coletivo do bem público, ainda mais quando exercida sem respaldo jurídico atual.
A regularização de ocupações em faixa costeira sujeita à legislação ambiental depende de prévio licenciamento ambiental, autorização formal vigente e respeito aos princípios da legalidade, moralidade administrativa e supremacia do interesse público.
A medida ora requerida mostra-se, além de adequada e proporcional, plenamente reversível, tendo em vista que as estruturas existentes no local são removíveis, não havendo óbice técnico à recomposição da situação anterior.
A reversibilidade, nesse contexto, atende ao terceiro requisito previsto pela jurisprudência consolidada para concessão da tutela de urgência.
Outrossim, cabe enfrentar a decisão proferida nos autos do processo n. 1049544-24.2023.4.01.3700, que deferiu tutela provisória de urgência em favor da empresa ré, determinando à União que se abstivesse de exigir a retirada das estruturas, com base em alegações de razoabilidade administrativa, impacto econômico e regularidade formal da ocupação.
Ocorre que referida decisão foi proferida em juízo de cognição sumária, com base em elementos apresentados unilateralmente pela parte interessada, e em momento anterior à manifestação formal da SPU atestando a impossibilidade de renovação da permissão, bem como sem a oitiva do Ministério Público Federal ou avaliação do impacto ambiental do uso continuado da área, o que compromete a completude da cognição sobre os fatos.
Ademais, a permanência da decisão liminar anteriormente proferida compromete a efetividade da presente medida de urgência e cria evidente contradição jurisdicional, pois autoriza a continuidade de uma ocupação que, sob outro processo e outro juízo, se reconhece como incompatível com a legislação ambiental e patrimonial vigente. À luz do princípio da unicidade da jurisdição e da prevenção do juízo, verifico que a decisão proferida nestes autos reúne os interesses difusos tutelados pelo Ministério Público Federal e sob perspectiva ampla de proteção ao meio ambiente e ao patrimônio público.
Com fundamento, portanto, no art. 139, inciso IX, do Código de Processo Civil, revogo expressamente a tutela provisória anteriormente concedida nos autos do processo nº 1049544-24.2023.4.01.3700, por afronta aos princípios da precaução ambiental, da supremacia do interesse público, da legalidade administrativa e da preservação do meio ambiente como bem de uso comum do povo (CF, art. 225).
Por todo o exposto, defiro o pedido de tutela de urgência, com fundamento no art. 300 do Código de Processo Civil, nos seguintes termos: Determino que os réus promovam a retirada integral das estruturas físicas, equipamentos e quaisquer objetos instalados na área pública descrita nos autos, no prazo de 15 (quinze) dias, contados da intimação desta decisão; Determino, ainda, que os réus se abstenham de exercer qualquer forma de uso privativo ou exploração econômica da referida área, até ulterior deliberação judicial; Fixo multa diária no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), em caso de descumprimento das obrigações impostas, sem prejuízo da adoção de outras medidas coercitivas que se revelem necessárias.
Determinar a revogação da decisão proferida no processo nº 1049544-24.2023.4.01.3700, em razão da superveniência de elementos técnicos e jurídicos que demonstram a incompatibilidade da permanência das estruturas com a legislação vigente e com a tutela de interesse difuso sobre o meio ambiente.
Traslade-se cópia desta decisão aos autos conexos nº 1049544-24.2023.4.01.3700.
Cumpra-se com urgência, com prioridade no processamento e adoção das providências administrativas cabíveis ao cumprimento da ordem.
Comprovado nos autos o cumprimento das determinações impostas nesta decisão, vista às partes para a indicação das provas a produzir.
Intimem-se.
Brasília, data e assinatura no rodapé.
HIRAM ARMENIO XAVIER PEREIRA Juiz Federal -
04/10/2023 15:41
Recebido pelo Distribuidor
-
04/10/2023 15:41
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
04/10/2023
Ultima Atualização
25/06/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
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