TRF1 - 1065649-06.2023.4.01.3400
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gab. 28 - Des. Fed. Euler de Almeida
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Polo Passivo
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19/05/2025 00:00
Intimação
JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1065649-06.2023.4.01.3400 PROCESSO REFERÊNCIA: 1065649-06.2023.4.01.3400 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: JULIA DE ALENCAR ARCANJO REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: JANAINA MACEDO NEVES - DF37006-S e ULISSES BORGES DE RESENDE - DF4595-A POLO PASSIVO:FUNDACAO NACIONAL DOS POVOS INDIGENAS - FUNAI RELATOR(A):EULER DE ALMEIDA SILVA JUNIOR PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198): 1065649-06.2023.4.01.3400 RELATÓRIO O EXMO.
SR.
DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR): Apelação interposta pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas – FUNAI contra sentença (ID 425055765) que julgou procedente o pedido de Julia de Alencar Arcanjo, declarando a nulidade do ato administrativo que determinou a reposição ao erário da quantia de R$ 5.545,48, a título de auxílio-alimentação e auxílio-transporte, e condenando a ré a restituir os valores já descontados, corrigidos monetariamente.
Foi deferido o benefício da assistência judiciária gratuita e concedida a tutela de urgência (ID 425055751).
Sem recurso.
Nas razões de seu recurso (ID 425055768), a FUNAI alegou, em síntese: 1) a Justiça Federal comum seria incompetente para o julgamento do feito, devendo a demanda ser processada no Juizado Especial Federal, dado o valor da causa; 2) a parte autora não faria jus à gratuidade de justiça, pois seus rendimentos seriam incompatíveis com a hipossuficiência econômica; 3) os valores foram pagos indevidamente por erro operacional da Administração, configurando hipótese de devolução ao erário conforme o Tema 1009 do STJ; 4) inexistência de comprovação da boa-fé objetiva da servidora, ressaltando que a reposição ao erário decorre do princípio da autotutela administrativa e da vedação ao enriquecimento ilícito.
A parte recorrente pediu o provimento do recurso de apelação.
A parte recorrida apresentou contrarrazões (ID 425055771), por meio das quais sustentou, em síntese: 1) a matéria envolve a anulação de ato administrativo, afastando a competência dos Juizados Especiais Federais; 2) pela manutenção da assistência judiciária gratuita; 3) recebeu os valores de boa-fé, pois sempre os percebeu nos afastamentos anteriores sem qualquer questionamento da Administração.
A parte recorrida pediu a manutenção da sentença recorrida. É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198): 1065649-06.2023.4.01.3400 VOTO O EXMO.
SR.
DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR): O recurso pode ser conhecido, porque presentes os pressupostos recursais (competência do relator e da turma julgadora, tempestividade, adequação e observância das normas pertinentes a eventual preparo recursal).
A sentença não merece ser reformada.
Cinge-se a controvérsia em deliberar a respeito da suspensão (anulação de ato administrativo que determinou o ressarcimento ao cofres públicos) da obrigatoriedade de reposição ao Erário no valor de R$ 5.545,48, determinada no Processo Administrativo n° 08620.003155/2021-45.
A parte autora sustentou que este valor se referiria ao suposto pagamento indevido de auxílio alimentação e auxílio transporte, já que a Administração entendeu que, após o acúmulo de 960 dias de licença para tratamento de saúde, a autora não teria mais direito ao pagamento dessas verbas, pois os dias não seriam mais de efetivo exercício.
Alegou a existência de boa-fé, já que o pagamento dessas verbas durante os primeiros 24 meses de licença saúde geraram a expectativa de que o pagamento fosse devido; a existência de ato administrativo consolidado; a inexistência de motivação; a impossibilidade de se determinar reposição ao erário e a violação ao devido processo legal.
Assistência judiciária gratuita A legislação de regência dispõe que a parte se beneficiará da gratuidade da justiça mediante simples alegação de insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios (art. 98, caput, e art. 99, § 3º, do CPC/2015).
A declaração da falta de condições para pagar as despesas processuais e os honorários advocatícios implica presunção apenas relativa de veracidade (juris tantum) para a pessoa natural (art. 99, § 3º, do CPC/2015).
A presunção de miserabilidade milita em favor daqueles que possuem rendimentos mensais líquidos até o valor correspondente a 10 (dez) salários mínimos, conforme entendimento consolidado pela Primeira Seção do eg.
TRF-1ª Região (Nesse sentido: EDAC 0002413-48.2015.4.01.3313, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO NEVES DA CUNHA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, e-DJF1 DATA:09/08/2018; AC 0023609-70.2016.4.01.3400, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO NEVES DA CUNHA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, e-DJF1 DATA:29/09/2017).
No caso, os elementos contidos nos autos são suficientes para caracterizar a hipossuficiência da parte autora-recorrente para fins de manutenção da gratuidade da justiça, considerado a comprovação da percepção de renda mensal inferior a 10 (dez) salários-mínimos (IDs 425055733; 425055734; 425055735 e 425055736).
Desse modo, deve ser indeferido o requerimento formulado pela parte recorrente, a fim de que seja revogado o benefício da assistência judiciária concedida à parte autora.
Incompetência da justiça Federal A presente ação objetivou a anulação de ato administrativo (declaração de nulidade do ato administrativo que determinou a reposição ao Erário da quantia de R$ 5.545,48), matéria que não se insere na competência dos Juizados Federais Especiais Federais, conforme expressa previsão no art. 3°, § 1°, inciso III, da Lei n° 10.259/2001.
Nesse sentido, confira-se: DIREITO ADMINISTRATIVO.
SERVIDOR PÚBLICO.
ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE.
EXIGÊNCIA DE RESTITUIÇÃO AO ERÁRIO DE VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE.
DECADÊNCIA.
REVISÃO DE ATO ADMINISTRATIVO.
IMPOSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO APÓS TRANSCURSO DO PRAZO QUINQUENAL.
MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.
APELAÇÃO DESPROVIDA. 1.
Trata-se de apelação interposta pela União contra sentença que julgou procedente o pedido da parte autora para declarar a ilegalidade da exigência de restituição de valores recebidos a maior a título de adicionais de insalubridade e periculosidade.
A sentença anulou o ato administrativo que determinava a devolução dos valores e reconheceu a prescrição quinquenal da pretensão de ressarcimento por parte da Administração. 2.
No caso concreto, o pagamento dos adicionais ocorreu entre 1998 e 2001.
A determinação do Tribunal de Contas da União (TCU), por meio do processo TC 034.959/2011-4, para que o Departamento da Polícia Rodoviária Federal promovesse a devolução dos valores indevidamente pagos foi proferida apenas em 2015.
A União, no entanto, notificou os servidores sobre a cobrança somente em novembro de 2021, ultrapassando o prazo de cinco anos estabelecido para a revisão dos atos administrativos e para a exigência de restituição de valores ao erário. 3.
A questão central consiste em definir se é legítima a exigência de restituição ao erário de valores pagos a maior aos servidores, a título de adicionais de insalubridade e periculosidade, após o transcurso do prazo de cinco anos.
Discutem-se, ainda, a competência da Justiça Federal comum para o julgamento do caso e a aplicabilidade do prazo decadencial para a Administração rever atos administrativos. 4.
Preliminarmente, a União alegou a incompetência da Justiça Federal comum, sustentando que a causa deveria ser processada no Juizado Especial Federal (JEF), em razão do valor da demanda ser inferior a 60 salários mínimos.
A preliminar foi afastada, considerando-se que a ação envolve a anulação de ato administrativo de cobrança, situação excluída da competência do JEF, conforme art. 3º, §1º, III, da Lei nº 10.259/2001. 5.
Quanto ao mérito, é consolidado o entendimento de que o direito da Administração Pública de rever seus próprios atos está sujeito ao prazo decadencial de cinco anos, nos termos do art. 54 da Lei nº 9.784/1999, o que se aplica também às medidas destinadas à restituição de pagamentos indevidos efetivados a servidores públicos. 6.
No caso em análise, o pagamento dos adicionais de insalubridade e periculosidade ocorreu entre 1998 e 2001, e a determinação para a devolução dos valores foi proferida pelo TCU apenas em 2015, sem que a Administração tenha promovido, tempestivamente, as medidas necessárias para efetivar a cobrança.
A notificação para pagamento ocorreu somente em 2021, mais de cinco anos após a determinação do TCU e após o pagamento dos valores.
Decadência consumada. 7. "Por decorrência lógica do acolhimento do pedido de afastamento da exigibilidade de reposição ao erário, é devida a devolução de valores porventura descontados da remuneração/proventos do servidor (AgInt no REsp 1780439/AP, Rel.
Min.
Gurgel de Faria, DJe 12/12/2019)" (AC 1063636-68.2022.4.01.3400, JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 11/09/2024). 8.
Apelação da União desprovida.
Tese de julgamento: 1.
A Administração Pública tem o direito de rever seus próprios atos para cobrar valores pagos indevidamente a servidores, mas tal direito está sujeito ao prazo decadencial de cinco anos, nos termos do art. 54 da Lei nº 9.784/1999. 2.
Transcorrido o prazo de cinco anos sem que a Administração efetive a cobrança dos valores, consolida-se a situação jurídica em favor do servidor, impedindo a exigência de devolução de valores pagos indevidamente, salvo comprovação de má-fé, em conformidade com os princípios da segurança jurídica e da boa-fé.
Legislação relevante citada: Lei nº 8.112/1990, art. 114; Lei nº 9.784/1999, arts. 53 e 54; Decreto nº 20.910/1932, art. 1º; Lei nº 10.259/2001, art. 3º, §1º, III.
Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.799.343/SC, Rel.
Min.
Gurgel de Faria, DJe 27/05/2021 (Tema 1069); STF, RE 636.553, Rel.
Min.
Roberto Barroso, DJe 19/12/2019 (Tema 445). (AC 1006499-31.2022.4.01.3400, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 10/12/2024 PAG.) PROCESSUAL CIVIL.
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA.
VARA FEDERAL E JUIZADO ESPECIAL FEDERAL.
LEI 10.259/2001.
PARECER NORMATIVO DA SECRETARIA DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR.
SUPERINTENDÊNCIA NACIONAL DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR.
ANULAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO.
VEDAÇÃO EXPRESSA DO ART. 3º, § 1º, INCISO III, DA LEI 10.259/2001.
COMPETÊNCIA DO JUÍZO FEDERAL COMUM. 1.
O presente conflito negativo de competência foi suscitado pelo juízo da 5ª Vara Federal de Juizado Especial Cível da Seção Judiciária da Bahia (SJBA), em virtude de decisão proferida pelo juízo da 10ª Vara Federal da mesma Seção, nos autos da ação declaratória c/c obrigação de restituição de valores, autuado sob o nº 1016590-97.2019.4.01.3300, proposta por MARIA DO CARMO SANTANA SILVA DOS ANJOS em face da SUPERINTENDÊNCIA NACIONAL DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR, objetivando "seja declarada a invalidade ex tunc do ato de aprovação normativa do Parecer 01/2005-DAJUR/SPC", bem como "seja declarada a extinção da relação jurídica contratual da reserva de poupança do pecúlio que, sem a adesão dos peculistas (nesse contingente incluída os requerentes)". 2.
Consoante o artigo 3º da Lei n.º 10.259/2001, a competência dos Juizados Especiais Federais Cíveis é absoluta para processar, conciliar e julgar causas de competência da Justiça Federal que não excedam o valor de sessenta salários mínimos.
Todavia, o seu § 1º elenca um rol das ações que, ainda que tenham valor até sessenta salários mínimos, não se incluem na competência dos Juizados Especiais da Justiça Federal. 3.
O art. 3º, § 1º, III, da Lei nº 10.259/2001, quando estabeleceu fugir da competência do Juizado Especial as causas "para a anulação ou cancelamento de ato administrativo federal, salvo o de natureza previdenciária e o de lançamento fiscal", pretendeu, a uma, garantir que as causas visando à desconstituição dos atos administrativos do Poder Público Federal tramitassem no juízo comum, por incompatibilidade do tema com o rito célere do juizado, e, a duas, permitir que as causas previdenciárias leia-se, as demandas individuais, em geral, marcadas pela hipossuficiência da parte, que discutem benefícios previdenciários continuassem com trâmite no Juizado Especial. 4.
No caso em tela a parte pretende desconstituir ato normativo, de caráter geral, que regula Plano de Pecúlio Facultativo, antes normatizado por decreto federal, de sorte que, dada a natureza do normativo impugnado, deve ser reconhecida certa complexidade à causa, sendo de se aplicar, à hipótese, a exceção prevista no art. 3º, § 1º, III, da Lei nº 10.259/2001, visando a preservar competência do juízo comum para apreciação do feito. 5. "Não se incluem na competência dos Juizados Especiais Federais, nos termos da redação contida no art. 3º, § 1º, inciso IV, da Lei nº 10.259, de 2001, as causas em que se questionam os pressupostos ou requisitos do ato administrativo, visando sua anulação ou cancelamento, veiculando pretensão desconstitutiva, ainda que cumulada com pretensão condenatória" (CC 1003112-28.2019.4.01.0000, Des.
Federal JOÃO LUIZ DE SOUSA, Primeira Seção, PJe 03/02/2020). 6.
Conflito conhecido, declarando-se a competência do juízo da 10ª Vara Federal da SJBA, ora suscitado. (CC 1005111-45.2021.4.01.0000, DESEMBARGADORA FEDERAL ANA CAROLINA ALVES ARAUJO ROMAN, TRF1 - TERCEIRA SEÇÃO, PJe 12/09/2024 PAG.) Mérito A parte recorrente esclareceu que a situação do caso concreto é de erro administrativo (operacional ou de cálculo), conforme apelação (ID 425055768).
O Superior Tribunal de Justiça firmou a compreensão, em sede de recurso repetitivo no julgamento do REsp 1.244.182/PB (Tema 531), de que não é possível a devolução ao Erário Público de valores recebidos de boa-fé pelo servidor público quando eles são pagos em decorrência de interpretação equivocada de lei pela Administração Pública.
A boa-fé do servidor nesses casos é presumida.
Confira-se o julgado em referência (original sem destaque): ADMINISTRATIVO.
RECURSO ESPECIAL.
SERVIDOR PÚBLICO.
ART. 46, CAPUT, DA LEI N. 8.112/90 VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE POR INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA DE LEI.
IMPOSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO.
BOA-FÉ DO ADMINISTRADO.
RECURSO SUBMETIDO AO REGIME PREVISTO NO ARTIGO 543-C DO CPC. 1.
A discussão dos autos visa definir a possibilidade de devolução ao erário dos valores recebidos de boa-fé pelo servidor público, quando pagos indevidamente pela Administração Pública, em função de interpretação equivocada de lei. 2.
O art. 46, caput, da Lei n. 8.112/90 deve ser interpretado com alguns temperamentos, mormente em decorrência de princípios gerais do direito, como a boa-fé. 3.
Com base nisso, quando a Administração Pública interpreta erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido ao servidor, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos, ante a boa-fé do servidor público. 4.
Recurso afetado à Seção, por ser representativo de controvérsia, submetido a regime do artigo 543-C do CPC e da Resolução 8/STJ. 5.
Recurso especial não provido. (STJ, Primeira Seção, REsp n. 1.244.182/PB, relator Ministro Benedito Gonçalves, julgado em 10/10/2012, DJe de 19/10/2012).
Posteriormente, por ocasião do julgamento do REsp 1.769.209/AL, também submetido ao rito dos recursos repetitivos (Tema 1.009), o Superior Tribunal de Justiça, alterou em parte o seu entendimento firmado anteriormente (Tema 531), e diferenciou as situações em que a boa-fé do servidor é presumida, tendo em consideração o erro de direito (interpretação errônea ou equivocada da lei) ou o erro administrativo (operacional ou de cálculo) como se apresenta no caso concreto, conforme julgado a seguir transcrito (original em destaque): ADMINISTRATIVO.
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO.
SERVIDOR PÚBLICO.
ARTIGO 46, CAPUT, DA LEI N. 8.112/1990.
TESE DEFINIDA NO TEMA 531-STJ.
AUSÊNCIA DE ALCANCE NOS CASOS DE PAGAMENTO INDEVIDO DECORRENTE DE ERRO DE CÁLCULO OU OPERACIONAL DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.
POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO.
SALVO INEQUÍVOCA PRESENÇA DA BOA-FÉ OBJETIVA. 1.
Delimitação do Tema: A afetação como representativo de controvérsia e agora trazido ao colegiado consiste em definir se a tese firmada no Tema 531/STJ seria igualmente aplicável aos casos de erro operacional ou de cálculo, para igualmente desobrigar o servidor público, de boa-fé, a restituir ao Erário a quantia recebida a maior. 2.
No julgamento do Recurso Especial Repetitivo n. 1.244.182/PB (Tema 531/STJ), definiu-se que quando a Administração Pública interpreta erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido ao servidor, de boa-fé, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos, o que está em conformidade com a Súmula 34 da Advocacia Geral da União - AGU. 3.
O artigo 46, caput, da Lei n. 8.112/1990 estabelece a possibilidade de reposições e indenizações ao erário.
Trata-se de disposição legal expressa, plenamente válida, embora com interpretação dada pela jurisprudência com alguns temperamentos, especialmente em observância aos princípios gerais do direito, como boa-fé, a fim de impedir que valores pagos indevidamente sejam devolvidos ao Erário. 4.
Diferentemente dos casos de errônea ou má aplicação de lei, onde o elemento objetivo é, por si, suficiente para levar à conclusão de que o servidor recebeu o valor de boa-fé, assegurando-lhe o direito da não devolução do valor recebido indevidamente, na hipótese de erro operacional ou de cálculo, deve-se analisar caso a caso, de modo a averiguar se o servidor tinha condições de compreender a ilicitude no recebimento dos valores, de modo a se lhe exigir comportamento diverso perante a Administração Pública. 5.
Ou seja, na hipótese de erro operacional ou de cálculo não se estende o entendimento firmado no Recurso Especial Repetitivo n. 1.244.182/PB, sem a observância da boa-fé objetiva do servidor, o que possibilita a restituição ao Erário dos valores pagos indevidamente decorrente de erro de cálculo ou operacional da Administração Pública. 6.
Tese representativa da controvérsia fixada nos seguintes termos: Os pagamentos indevidos aos servidores públicos decorrentes de erro administrativo (operacional ou de cálculo), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, estão sujeitos à devolução, ressalvadas as hipóteses em que o servidor, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido. 7.
Modulação dos efeitos: Os efeitos definidos neste representativo da controvérsia, somente devem atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão. 8.
Solução ao caso concreto (inciso IV do art. 104-A do RISTJ): Cinge-se a controvérsia na origem acerca da legalidade de ato administrativo do Diretor Geral do Departamento de Administração de Pessoal da Universidade Federal de Alagoas - UFAL, onde se impôs ao impetrante, servidor público do Magistério Superior, o desconto em folha de pagamento de valores recebidos a maior no cálculo de parcela de anuênio no período de 22/2/2020 a 31/3/2015, na ordem de 2%.Como bem decidido pelo acórdão recorrido, de fato, era difícil a identificação do pagamento a maior por parte do servidor, haja vista que nos contracheques não constam o percentual nem a base de cálculo de anuênio.
Assim, recebida de boa-fé, afasta-se a reposição da quantia paga indevidamente. 9.
Recurso especial conhecido e improvido.
Julgamento submetido ao rito dos recursos especiais repetitivos. (STJ, Primeira Seção, REsp n. 1.769.209/AL, relator Ministro Benedito Gonçalves, julgado em 10/3/2021, DJe de 19/5/2021).
Como visto, o STJ definiu que os efeitos do julgado proferido no REsp 1.769.209/AL (Tema 1.009) só alcançarão os processos que iniciaram com a sua tramitação no dia 19/05/2021, inclusive, data da publicação do recurso especial em comento.
Em resumo, devem ser observadas as seguintes regras a respeito do tema: 1) Na situação de pagamento devido pela administração, não é possível a condenação do servidor em obrigação de restituição de valores (estrito cumprimento de dever legal pela administração e exercício regular do Direito pelo servidor); 2) Na situação de pagamento indevido pela administração, em ação ajuizada antes de 19/05/2021, há presunção de boa-fé do servidor, tanto na situação de aplicação errônea do Direito pela administração quanto na hipótese de erro operacional ou de cálculos pela mesma (aplicação da modulação temporal constante da parte transitória da Tese 1.009 do STJ c/c aplicação ampla do Tese 531 do STJ para abranger as referidas situações de erro), o que atribui ônus probatório à administração para a desconstituição da referida presunção (inciso IV do art. 374 c/c inciso II do art. 373 do CPC/2015); 3) Na situação de pagamento indevido pela administração, em ação ajuizada posteriormente a 19/05/2021, inclusive, torna aplicável a parte permanente da Tese 1.009 do STJ c/c aplicação mais restrita do Tese 531 do STJ (para diferenciar as referidas situações de erro), nos seguintes termos: a) presunção de boa-fé do servidor, na situação de aplicação errônea do direito pela administração, o que atribui ônus probatório à administração para a desconstituição da referida presunção (inciso IV do art. 374 c/c inciso II do art. 373 do CPC/2015); b) presunção de culpa do servidor no cumprimento do seu dever de fiscalizar sua própria remuneração (ou afastamento jurisprudencial da presunção de boa-fé do servidor), na situação de erro operacional ou de cálculos, o que atribui ao servidor o dever de demonstrar sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido (inciso IV do art. 374 c/c inciso I do art. 373 do CPC/2015).
No presente caso concreto: 1) a situação é de erro operacional da Administração; 2) a ação foi distribuída após o dia 19/05/2021, razão pela qual não há presunção de boa-fé, cabendo à parte autora comprovar a boa-fé no recebimento das quantias pagas de forma irregular pela Administração; 3) a boa-fé está devidamente comprovada porque a parte autora sempre recebeu o auxílio alimentação e o auxílio transporte nos seus afastamentos e a Administração Pública poderia ter notificado a parte autora a respeito da retirada dos benefícios, o que não foi feito.
No que tange à devolução dos valores já descontados, a orientação pacífica do STJ é que, “nos casos em que descabe a reposição ao erário, a determinação de restituição dos valores porventura já descontado do servidor é decorrência lógica do reconhecimento de que o desconto é indevido”. (STJ, Segunda Turma, REsp 1.758.037/CE, Relator Ministro Francisco Falcão, DJe de 27.03.2019); (STJ, Primeira Turma, AgInt no REsp n. 1.948.323/AP, relatora Ministra Regina Helena Costa, julgado em 14/03/2022, DJe de 21/03/2022).
Ante o exposto, nego provimento à apelação.
Majoro os honorários advocatícios de sucumbência na fase recursal em R$ 200,00 reais, “levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal” (§11 do art. 85 do CPC).
Custas ex lege. É o voto.
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA Processo Judicial Eletrônico CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) PROCESSO: 1065649-06.2023.4.01.3400 PROCESSO DE REFERÊNCIA: 1065649-06.2023.4.01.3400 RECORRENTE: JULIA DE ALENCAR ARCANJO RECORRIDA: FUNDACAO NACIONAL DOS POVOS INDIGENAS - FUNAI EMENTA Ementa: ADMINISTRATIVO.
SERVIDOR PÚBLICO.
REPOSIÇÃO AO ERÁRIO.
AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO E AUXÍLIO-TRANSPORTE.
BOA-FÉ OBJETIVA.
IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO.
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL COMUM.
GRATUIDADE DE JUSTIÇA MANTIDA.
I - CASO EM EXAME 1.
Apelação interposta pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas – FUNAI contra sentença que julgou procedente o pedido de Julia de Alencar Arcanjo, declarando a nulidade do ato administrativo que determinou a reposição ao erário de R$ 5.545,48, referentes a auxílio-alimentação e auxílio-transporte, e condenando a ré à restituição dos valores já descontados, corrigidos monetariamente. 2.
A FUNAI alegou a incompetência da Justiça Federal comum, a incompatibilidade da parte autora com a gratuidade de justiça e a necessidade de devolução ao erário dos valores pagos indevidamente por erro administrativo.
A parte recorrida defendeu a competência da Justiça Federal comum, a manutenção da gratuidade de justiça e a boa-fé na percepção dos valores.
II - QUESTÃO EM DISCUSSÃO 3.
Há duas questões em discussão: (i) saber se a Justiça Federal comum é competente para julgar a demanda, à luz do art. 3º, § 1º, III, da Lei nº 10.259/2001; e (ii) saber se há a obrigatoriedade de reposição ao erário dos valores pagos indevidamente a título de auxílio-alimentação e auxílio-transporte, considerando o entendimento do STJ nos Temas 531 e 1009.
III - RAZÕES DE DECIDIR Preliminares 4.
A competência da Justiça Federal comum está configurada, pois a demanda envolve a anulação de ato administrativo, hipótese expressamente excluída da competência dos Juizados Especiais Federais, conforme o art. 3º, § 1º, III, da Lei nº 10.259/2001. 5.
A gratuidade de justiça foi corretamente concedida, pois a parte autora demonstrou rendimentos inferiores a dez salários mínimos, hipótese em que incide a presunção de hipossuficiência, nos termos do art. 99, § 3º, do CPC/2015.
Mérito 6.
A controvérsia central consiste em verificar a necessidade de reposição (anulação de ato administrativo que determinou o ressarcimento ao cofres públicos) ao erário de valores pagos indevidamente em razão de erro administrativo, com base nos precedentes do STJ. 7.
O STJ, no Tema 531 (REsp 1.244.182/PB), estabeleceu que não há devolução de valores recebidos de boa-fé quando decorrentes de interpretação errônea da lei pela Administração.
Posteriormente, no Tema 1009 (REsp 1.769.209/AL), diferenciou-se a hipótese de erro operacional ou de cálculo, exigindo comprovação da boa-fé objetiva do servidor para afastar a restituição. 8.
No caso concreto, os pagamentos indevidos decorreram de erro operacional da Administração, e a ação foi ajuizada após a modulação de efeitos do Tema 1009, sendo necessário que a parte autora demonstrasse sua boa-fé objetiva. 9 A boa-fé está devidamente comprovada porque a parte autora sempre recebeu o auxílio alimentação e o auxílio transporte nos seus afastamentos e a Administração Pública poderia ter notificado a parte autora a respeito da retirada dos benefícios, o que não foi feito. 10.
Quanto à devolução dos valores já descontados, o entendimento pacífico do STJ determina que, se a reposição ao erário é indevida, os valores já descontados devem ser restituídos ao servidor.
IV - DISPOSITIVO 11.
Recurso desprovido.
Honorários advocatícios majorados em R$ 200,00.
Legislação relevante citada: Lei nº 8.112/1990, art. 46, caput; Lei nº 9.784/1999, arts. 53 e 54; Decreto nº 20.910/1932, art. 1º; Lei nº 10.259/2001, art. 3º, § 1º, III; Código de Processo Civil de 2015, arts. 98 e 99, § 3º.
Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.244.182/PB, Rel.
Min.
Benedito Gonçalves, DJe 19/10/2012 (Tema 531); STJ, REsp 1.769.209/AL, Rel.
Min.
Benedito Gonçalves, DJe 19/05/2021 (Tema 1009); STJ, AgInt no REsp 1.758.037/CE, Rel.
Min.
Francisco Falcão, DJe 27/03/2019; STJ, AgInt no REsp 1.948.323/AP, Rel.
Min.
Regina Helena Costa, DJe 21/03/2022.
ACÓRDÃO Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, negar provimento à apelação cível, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data e assinatura eletrônicas.
Desembargador Federal EULER DE ALMEIDA Relator -
20/09/2024 16:21
Recebidos os autos
-
20/09/2024 16:21
Recebido pelo Distribuidor
-
20/09/2024 16:21
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
20/09/2024
Ultima Atualização
19/05/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
ACÓRDÃO • Arquivo
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ATO ORDINATÓRIO • Arquivo
SENTENÇA TIPO A • Arquivo
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DECISÃO • Arquivo
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DOCUMENTO COMPROBATÓRIO • Arquivo
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