TRF1 - 1000501-55.2017.4.01.3304
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gab. 30 - Des. Fed. Daniele Maranhao Costa
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Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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10/06/2025 00:00
Intimação
JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1000501-55.2017.4.01.3304 PROCESSO REFERÊNCIA: 1000501-55.2017.4.01.3304 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria) e outros POLO PASSIVO:SILVIO JOSE SANTANA SANTOS REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: REBECA ALMEIDA BORGES - BA23849-A RELATOR(A):DANIELE MARANHAO COSTA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 30 - DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO Processo Judicial Eletrônico R E L A T Ó R I O A EXMA.
SRA.
DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO (RELATORA): Trata-se de apelações interpostas pelos autores da ação da sentença que em ação de improbidade administrativa ajuizada em desfavor de ex-prefeito julgou improcedente o pedido que objetiva a condenação do requerido na prática das condutas descritas nos artigos 10, VI, IX, XI, e 11, I, da Lei n. 8.429/92, consubstanciadas em irregularidades na prestação de contas quanto à execução de verbas públicas federais advindas de convenio firmado com o FNDE/PEJA.
Em suas razões recursais, o MPF sustenta, em síntese que: i) as provas acostadas aos autos são suficientes para demonstrar a prática do ato de improbidade administrativa; ii) ficou provada a irregularidade quanto à ausência de documentos comprobatórios das despesas; iii) houve desvio de finalidade, pois “toda omissão contempla o desvio de recursos (na execução ou na finalidade), já que a correta aplicação das verbas não foi comprovada pelo gestor”, comprovando-se, assim, o prejuízo ao erário. (id. 216663564).
Por sua vez, o FNDE em suas razões de recurso de apelação defende que: i) ficou demonstrada a prática do ato de improbidade administrativa; ii) os recursos que foram repassados em virtude do PEJA devem ser justificados nesse sentido, cabendo, assim, ao réu a demonstração de que os recursos foram aplicados no referido programa. (id. 216663563).
Contrarrazões não apresentadas.
A Procuradoria-Regional da República apresentou parecer, manifestando-se pelo provimento das apelações. (id. 225391534). É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 30 - DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO Processo Judicial Eletrônico V O T O A EXMA.
SRA.
DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO (RELATORA): Conforme relatado, trata-se de apelações interpostas pelos autores da ação da sentença que em ação de improbidade administrativa ajuizada em desfavor de ex-prefeito julgou improcedente o pedido que objetiva a condenação do requerido na prática das condutas descritas nos artigos 10, VI, IX, XI, e 11, I, da Lei n. 8.429/92, consubstanciadas em irregularidades na prestação de contas quanto à execução de verbas públicas federais advindas de convenio firmado com o FNDE/PEJA.
A sentença deve ser mantida, porquanto em consonância com as novas disposições legais e com a jurisprudência firmada sobre a matéria.
Elementares dos tipos de improbidade e legislação superveniente.
Para a configuração de quaisquer das condutas ímprobas de enriquecimento ilícito, dano ao erário e violação de princípios da administração pública, previstas na Lei n. 8.429/92, sempre deve estar presente o dolo específico, sendo insuficiente a culpa grave e até mesmo o dolo genérico, consoante inteligência dos §§ 2º e 3º do art. 1º do referido diploma, alterado pela Lei 14.230/2021, tendo o STF, inclusive, fixado a seguinte tese: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo – DOLO” (Tema 1199, RE nº 843989/PR).
Igualmente, é necessária a comprovação de que o agente público visava “obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade” (art. 11, § 2º).
Dano ao Erário.
Dispõe o art. 10 da Lei n. 8.429/92, com a redação da Lei 14.230/2021, que “constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (...)”.
A novel legislação, ao alterar o caput do referido dispositivo, excluiu do tipo as condutas culposas, passando a exigir elemento subjetivo específico (dolo) para a caracterização dos atos ímprobos, além de estabelecer que a ação ou omissão dolosa deve “efetiva e comprovadamente” causar prejuízo.
Exige-se, portanto: a) ação ou omissão ilícita; b) dolo específico; e c) prejuízo ao erário, que deve causar i) perda patrimonial aos haveres do Poder Público; ii) desvio, onde determinado bem público é extraviado para outra destinação que não seja a para qual este devia ser empregado efetivamente; iii) apropriação, onde o agente ímprobo toma posse indevida de bem público para si; iv) malbaratamento, que é a alienação de determinado bem público por valor abaixo do que lhe cabe ou; v) dilapidação, em que há destruição total ou parcial de certo bem da Administração.
Violação de Princípios da Administração O art. 11, caput, da Lei n. 8.429/92, com a redação conferida pela Lei n. 14.230/2021, passou a dispor que “constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade”, desde esteja caracterizada por uma das condutas descritas em um de seus incisos (I a XII).
Esse novo sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa, introduzido no ordenamento jurídico brasileiro por meio da Lei n. 14.230/2021, alterou elementares de vários tipos infracionais e até mesmo os revogou, como as condutas previstas no art. 11, incisos I (“praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamente ou diverso daquele previsto, na regra de competência”), II (“retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício”), IX (“deixar de cumprir a exigência de requisitos de acessibilidade previstos na legislação”), e X (“transferir recurso a entidade privada, em razão da prestação de serviços na área de saúde sem a prévia celebração de contrato, convênio ou instrumento congênere, nos termos do parágrafo único do art. 24 da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990.”).
A ausência de imputação a um dos tipos descritos nos incisos do art. 11 da Lei n. 8.429/92, sejam aqueles da redação original, sejam os da redação atual, com as modificações promovidas pela Lei n. 14.230/2021, leva ao reconhecimento de imputação genérica, sem vinculação a um tipo específico, tornando inviável o acolhimento da pretensão do autor, por obediência à tipicidade fechada relativa aos atos ímprobos que atentam contra os princípios da administração pública.
Assim, sob a vigência da Lei n. 14.230/2021, no que diz respeito aos atos que atentam contra os princípios da administração pública, a imputabilidade deve se embasar em algum dos tipos descritos no inciso do art. 11 da Lei 8.429/1992, e, ainda, haver a comprovação do elemento subjetivo do tipo, o dolo, conforme expressa previsão legal, art. 17, § 6º, do mesmo diploma legal.
Superveniência de lei mais benéfica.
Considerando a natureza sancionatória da Lei n. 8.429/92, e firme no entendimento de que o princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica alcança as leis que disciplinam o direito administrativo sancionador, há que ser aplicada retroativamente a Lei n. 14.230/2021, no que diz com as condutas tidas por ímprobas e em relação às sanções a elas impostas, conforme já decidido pelo STF no Tema 1199. (ARE 843989, Relator (a): Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, julgado em 18/08/2022, Processo Eletrônico, Repercussão Geral - Mérito DJe-251 Divulg 09-12-2022 Public 12-12-2022).
Dessa forma, deve ser aplicada retroativamente a lei sancionadora mais benéfica.
Caso concreto A imputação está lastreada em inquérito civil, visando provar a suposta atuação irregular do ex-prefeito na condução de verbas públicas advindas do FNDE para a execução do Programa de Apoio aos Sistemas de Ensino para Atendimento à Educação de Jovens e Adultos – PEJA, caracterizada pela ausência de documentos comprobatórios de parte das despesas direcionadas ao referido programa.
Narra a inicial da ação que: O Inquérito Civil que ensejou a propositura da presente ação civil pública foi instaurado a partir de representação formulada pelo município de Maragogipe/BA (fls. 08-13), noticiando possíveis irregularidades praticadas pelo exgestor daquela comuna, no que tange à aplicação de recursos repassados pelo FNDE, por meio do PEJA, no exercício de 2005.
O FNDE informou, às fls. 30-36 e 77-80, que detectou irregularidades na prestação de contas do município de Maragogipe/BA.
Foram verificadas irregularidades no PEJA, envolvendo ausência de documentos comprobatórios de despesas.
Salienta-se que o PEJA (Programa de Apoio aos Sistemas de Ensino para Atendimento à Educação de Jovens e Adultos) consiste na transferência, em caráter suplementar, de recursos financeiros em favor dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, destinados a ampliar a oferta de vagas no ensino fundamental público de jovens e adultos e propiciar o atendimento educacional, com qualidade e aproveitamento, aos alunos matriculados nessa modalidade.
O FNDE, em seu parecer de fls. 78-80, informou, que, no exercício de 2005, a receita total do PEJA foi R$ 54.454,31 (cinquenta e quatro mil quatrocentos e cinquenta e quatro reais e trinta e um centavos), contudo, desse montante, o valor de R$ 18.702,05 (dezoito mil setecentos e dois reais e cinco centavos) não foi restituído pela Prefeitura Municipal de Maragogipe/BA, tampouco restou comprovada a sua execução.
Com a finalidade de sanar essas ocorrências constatadas, o FNDE notificou (Ofício nº 002/2015-DIAFI/COPRA/CGCAP/DIFIN/FNDE/MEC) o exprefeito Sr.
Silvio José Santana e notificou ainda (Ofício nº 003/2015 - DIAFI/COPRA/ CGCAP/DIFIN/FNDE/MEC) a atual prefeita, Sra.
Vera Lúcia Maria dos Santos, conforme às fls. 33 - 36.
Porém não houve resposta às notificações encaminhadas.
O FNDE informou que, ante a ausência de saneamento das irregularidades constatadas na execução dos recursos do PEJA/2005, a prestação de contas foi aprovada parcialmente, tendo sido adotadas as medidas para instauração de tomada de conta especial. (fls. 78-80 do inquérito civil público). (id. 216660256).
Por isso, o MPF pleiteou a condenação do requerido pela prática prevista nos artigos 10, VI, IX, XI, e 11, I, da Lei n. 8.429/92.
A sentença julgou improcedentes os pedidos pelo seguinte fundamento: Além disso, na prestação de contas, verificou-se que os valores utilizados foram aplicados integralmente na compra de materiais didáticos (Id. 2064967 - Pág. 9, tendo como favorecidos J.C.
SANTOS BARBOSA & CIA LTDA. no valor de R$ 6.509,55 (Id. 2064967 - Pág. 31 e 2064967 - Pág. 33); JM FALCAO & CIA LTDAREAL PAPELARIA no valor de R$ 4.876,00 (Id. 2064967 - Pág. 37 e 2064967 - Pág. 39) e GRACINDO MEDEIROS & CIA LTDA. na quantia de R$ 6.609,40 (Id. 2064967 - Pág. 42).
A análise dos extratos bancários revela, ainda, que referidos pagamentos se deram nos dias 16/03/2006 por meio do cheque 850003 (Id. 2064967 - Pág. 15), 20/01/2006 por meio do cheque 850001 (Id. 2064967 - Pág. 13) e 22/03/2006 por meio do documento 850002 (Id. 2064967 - Pág. 15), respectivamente.
Nada obstante, não ficou demonstrada por meio da prestação de contas a aplicação do saldo remanescente do programa, tendo havido apenas a devolução parcial do débito, conforme reconhecido pelo FNDE.
Todavia, verifico que, no dia 14/06/2006, havia o saldo de R$ 36.867,27 na conta bancária Agência 2271-3, conta 15062-2 e sem que o autor civil público demonstrasse, após essa data, para onde foram destinados os recursos, prova essencial à configuração do tipo previsto no art. 10, incisos VI, IX e XI da Lei de Improbidade Administrativa.
Friso que é do autor o ônus de provar os fatos constitutivos do seu direito, nos termos do art. 373, inciso I do CPC.
A lacuna probatória não permite, ainda, a condenação do réu nas sanções subsidiárias do art. 11 da LIA diante da narrativa contida na peça de ingressa que imputa ao requerido o desvio de finalidade na aplicação dos recursos do PEJA. (id. 216663562).
Fazendo a leitura da peça inicial e analisando as provas acostadas aos autos pelo autor, verifica-se que em 2005 houve o repasse ao Município de Maragogipe – BA pelo FNDE da quantia de R$ 51.788,95 para a concretização do Programa de Apoio aos Sistemas de Ensino para Atendimento à Educação de Jovens e Adultos – PEJA.
Da quantia acima especificada apurou-se o rendimento de aplicação de recursos no valor de R$ 2.665,26 (id. 216660260), e a aprovação de despesa no valor de R$ 17.757,31, a qual foi devidamente justificada e restituída ao FNDE. (id. 216663558).
No entanto, não houve a restituição do restante (R$ 18.702,05) nem a comprovação da despesa que teria sido realizada com o respectivo valor, o que gerou a presente ação de improbidade.
Assim, a discussão cinge-se ao valor de R$ 18.702,05 que não teria sido comprovado com quais despesas foi utilizado.
Compulsando os autos, constata-se que esse valor ora questionado foi destinado para a compra de materiais didáticos tendo como favorecidos J.C.
SANTOS BARBOSA & CIA LTDA, JM FALCAO & CIA LTDAREAL PAPELARIA, e GRACINDO MEDEIROS & CIA LTDA, mediante, inclusive, processo de licitação prévio como determina a legislação pátria. (id. 216660260).
Dessa forma, impõe destacar que o autor imputou ao prefeito desvio de finalidade, e não o desvio de recursos, o que cumulado de ausência de dolo específico impede qualquer condenação por ato de improbidade administrativa.
Veja-se que no caput do art. 10 estão elencadas condutas que causam dano ao patrimônio público ("perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres"), o que não é apontado pelo autor da ação.
Até mesmo porque as verbas foram, de uma forma ou de outra, destinadas às necessidades do Município de Maragogipe – BA.
Com efeito, os incisos do artigo 10 devem ser interpretados à luz caput, portanto, o desvio de finalidade desassociado do dano ao patrimônio não caracteriza improbidade.
Conforme se verifica, a verba pública foi aplicada em despesas do Município, e não desviadas para beneficio do próprio ex-prefeito ou de terceiros.
Isso não significa dizer,
por outro lado, que não houve ilícito administrativo, mas apenas que não houve prática de conduta prevista na Lei de Improbidade, sobretudo sob a sistemática criada pela nova Lei, que exige o dolo específico de causar dano ao erário.
O mero desvio de finalidade, embora constitua ilícito administrativo, não configura ato de improbidade, que reputo mais grave e merecedor, portanto, das sanções políticas prevista em lei.
Assim, o mero desvio de finalidade sem demonstração do dano ao erário e do dolo específico, não obedece à tipificação indicada pelo MPF na inicial.
Ademais, conforme já mencionado acima, parte das verbas federais foram aplicadas corretamente com a observação da destinação imposta pelo FNDE, porém, outra parte foi destinada às áreas não relacionadas com PEJA.
Todavia, repita-se, não houve prova nos autos no sentido de que foram desviadas para o patrimônio pessoal ou de terceiros as verbas em análise, situação que seria capaz de demonstrar um possível prejuízo.
Não há sequer indícios de benefício, direto ou indireto, o que afasta a possibilidade de reconhecimento de qualquer conduta dolosa, nem mesmo de dano ao erário.
Assim, o que pode ser extraído dos autos, é no máximo, desídia dos requeridos quanto às responsabilidades na execução das verbas públicas recebidas do FNDE, o que, por si só, não atrai condenação por ato ímprobo.
Assim, a ausência de prova quanto à autoria e quanto ao dolo específico dessa prática, afasta a possibilidade de condenação por ato ímprobo.
No ponto, também merece destacar que “[a] partir das modificações introduzidas pela Lei n° 14.230/2021, a nova redação do caput art. 10 da Lei n° 8.429/92 passou a adotar a perda patrimonial efetiva como aspecto nuclear das condutas ímprobas que causam lesão ao erário, havendo óbice, por exemplo, à configuração do ato ímprobo com base na culpa grave e no dano presumido (dano in re ipsa cf. art. 21, I, da LIA)”( dano in re ipsa cf. art. 21, I, da LIA)”. (AC 1000137-35.2017.4.01.3902, Desembargador Federal Wilson Alves de Souza, TRF1 – Terceira Turma, PJe 21/03/2024).
De modo que não merece acolhida a tese de dano presumido sustentada pelo MPF, uma vez que deve haver a demonstração do efetivo dano ao erário mediante dolo específico, não se admitindo danos presumidos (in re ipsa).
Dessa forma, no caso em apreço não houve a demonstração do elemento condicionante da conduta tipificada pela norma dos incisos dos artigos 10, e 11, da Lei n. 8.429/92 consistente no dolo específico de causar lesão ao erário, com perda patrimonial efetiva, e de violar os princípios administrativos.
Ante o exposto, nego provimento às apelações do MPF e do FNDE.
Sem honorários advocatícios ou custas processuais (art. 23-B, §§ 1º e 2º, da Lei 8.429/92). É o voto.
Desembargadora Federal Daniele Maranhão Relatora PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 30 - DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 1000501-55.2017.4.01.3304 APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA), FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO APELADO: SILVIO JOSE SANTANA SANTOS Advogado do(a) APELADO: REBECA ALMEIDA BORGES - BA23849-A EMENTA PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
LEI 8.429/92.
DANO AO ERÁRIO.
ART. 10, VI, IX, XI.
VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS.
ART. 11, I, DA LEI 8.429/92.
IRREGULARIDADE NA EXECUÇÃO DAS VERBAS PÚBLICAS.
FNDE.
AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS COMPROBATÓRIOS DE DESPESAS.
DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR.
LEI 14.230/2021.
RETROATIVIDADE.
ENTENDIMENTO DO STF.
TEMA 1.199.
DOLO ESPECÍFICO NÃO COMPROVADO.
SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA.
APELAÇÕES DESPROVIDAS. 1.
Trata-se de apelações interpostas pelo FNDE e pelo MPF da sentença que em ação de improbidade administrativa ajuizada em desfavor do ex-prefeito de Maragogipe/BA julgou improcedente o pedido de a condenação do requerido pela prática das condutas descritas nos art. 10, VI, IX, XI, e 11, I, da Lei n. 8.429/92, consubstanciadas em irregularidades na prestação de contas quanto à execução de verbas públicas federais advindas de convenio firmado com o FNDE/PEJA. 2.
Para a configuração de quaisquer das condutas ímprobas de enriquecimento ilícito, dano ao erário e violação de princípios da administração pública, previstas nos art. 9º, 10 e 11 da Lei n. 8.429/92, sempre deve estar presente o dolo específico, sendo insuficiente a culpa grave e até mesmo o dolo genérico, consoante inteligência dos §§ 2º e 3º do art. 1º do referido diploma, alterado pela Lei 14.230/2021.
Igualmente é necessária a comprovação de que o agente público visava “obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade” (art. 11, § 2º). 3.
Considerando a natureza sancionatória da Lei n. 8.429/92, e ante o entendimento de que o princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica alcança as leis que disciplinam o direito administrativo sancionador, aplica-se retroativamente a Lei n. 14.230/2021, no que diz com as condutas tidas por ímprobas e em relação às sanções a elas impostas, conforme decidido pelo STF no Tema 1.199. (ARE 843989, Relator Ministro Alexandre de Morae, Tribunal Pleno, DJe-251 12-12-2022). 4.
A novel legislação, ao alterar o caput do art. 10 da Lei n. 8.429/92, excluiu do tipo as condutas culposas, passando a exigir elemento subjetivo específico (dolo) para a caracterização dos atos ímprobos, além de estabelecer que a ação ou omissão dolosa deve “efetiva e comprovadamente” causar prejuízo, havendo óbice, por exemplo, à configuração do ato ímprobo com base na culpa grave e no dano presumido (dano in re ipsa cf. art. 21, I, da LIA).
Exige-se, portanto: a) ação ou omissão ilícita; b) dolo específico; e c) prejuízo ao erário, que deve causar i) perda patrimonial aos haveres do Poder Público; ii) desvio, em que determinado bem público é extraviado para outra destinação que não seja a para qual este devia ser empregado efetivamente; iii) apropriação, em que o agente toma posse indevida de bem público para si; iv) malbaratamento, que é a alienação de determinado bem público por valor abaixo do que lhe cabe ou; v) dilapidação, em que há destruição total ou parcial de certo bem da Administração. 5.
O art. 11, caput, da Lei n. 8.429/92, com a redação conferida pela Lei n. 14.230/2021, passou a dispor que “constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade”, e desde que esteja caracterizada por uma das condutas descritas em um de seus incisos.
Não havendo essa adequação típica, não há que se falar em ato ímprobo.
Além de alterar elementares de vários tipos infracionais, a Lei 14.230/2021 também revogou, no que importa ao caso em apreço, o inciso I (“praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamente ou diverso daquele previsto, na regra de competência”) da Lei 8.429/92. 6.
Não obstante as irregularidades apontadas na execução das verbas públicas direcionadas ao Programa de Educação de Jovens e Adultos, não houve demonstração nos autos da prática das condutas apontadas na inicial, já que o MPF não demonstrou efetivamente qual seria a ação dolosa do requerido com fins de causar dano ao erário ou de violar princípios administrativos. 7.
Como bem consignado pelo juízo sentenciante, verificou-se na prestação de contas que os valores utilizados foram aplicados integralmente na compra de materiais didáticos e que, embora não tenha sido demonstrada na referida prestação a aplicação do saldo remanescente do programa, já que houve apenas a devolução parcial do débito, a acusação não demonstrou que teria havido sua utilização para fins diversos da finalidade do Programa, visando à configuração do tipo do art. 10, incisos VI, IX e XI da Lei de Improbidade Administrativa, ônus que lhe competia. 8.
Nesse contexto, não demonstrada o dolo específico, bem assim das demais elementares do tipo infracional dos artigos 10, VI, IX, XI, e 11, I, da Lei n. 8.429/92, a conclusão, à luz das novas disposições inseridas na Lei 8.429/92, é pela improcedência in totum dos pedidos formulados na ação. 9.
Apelações desprovidas.
ACÓRDÃO Decide a Décima Turma, por unanimidade, negar provimento às apelações, nos termos do voto da relatora.
Desembargadora Federal Daniele Maranhão Relatora -
10/06/2022 16:37
Conclusos para decisão
-
10/06/2022 15:29
Juntada de parecer
-
09/06/2022 17:06
Expedição de Outros documentos.
-
09/06/2022 13:36
Proferido despacho de mero expediente
-
31/05/2022 14:40
Conclusos para decisão
-
30/05/2022 18:26
Remetidos os Autos da Distribuição a 4ª Turma
-
30/05/2022 18:26
Juntada de Informação de Prevenção
-
26/05/2022 15:27
Recebidos os autos
-
26/05/2022 15:27
Recebido pelo Distribuidor
-
26/05/2022 15:27
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
13/05/2023
Ultima Atualização
10/06/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
ACÓRDÃO • Arquivo
ACÓRDÃO • Arquivo
ACÓRDÃO • Arquivo
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ATO ORDINATÓRIO • Arquivo
SENTENÇA TIPO A • Arquivo
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ATO ORDINATÓRIO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
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