TRF1 - 1007269-55.2025.4.01.3000
1ª instância - 1ª Rio Branco
Polo Ativo
Polo Passivo
Partes
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Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
-
10/06/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE 1ª INSTÂNCIA 1ª VARA FEDERAL CÍVEL E CRIMINAL DA SJAC FONE: (68) 3214-2071 | 3214-2059 | 3214-2074 www.jfac.jus.br - e-mail – [email protected] PROCESSO: 1007269-55.2025.4.01.3000 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: MARCOS JHONES MOREIRA DE ALMEIDA POLO PASSIVO: ESTADO DO ACRE E OUTROS DECISÃO Trata-se de ação ajuizada por MARCOS JHONES MOREIRA DE ALMEIDA em desfavor do ESTADO DO ACRE e da UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS, pretendendo em sede de tutela de urgência a validação de sua autodeclaração étnico/racial com a ratificação de sua inscrição em vaga destinada a negros/pardos no concurso promovido para o cargo de Analista do Ministério Público do Estado do Acre, e respectiva reclassificação.
Narrou que sua inscrição no referido concurso como pessoa negra (parda) foi indeferida pela Comissão de Heteroidentificacão, que não validou a autodeclaração, sendo também julgado improcedente o recurso intentado contra a decisão sob a fundamentação de que o candidato não possui traços fenotípicos inerentes ao negro, pois apresentaria tom de pele claro, nariz não negroide e lábios rosados e finos, não se enquadrando na população beneficiária da política de cotas raciais.
Ressalta que labora atualmente na Universidade Federal do Acre no cargo de Assistente em Administração, tendo sido nomeado através de uma das vagas reservadas aos candidatos pretos e pardos, em consequência de sua aprovação na etapa de heteroidentificação, após regular entrevista, cuja banca foi o Instituto Verbena, ora Ré nos presentes autos, que agora acabou por contraindicar o Autor às vagas reservadas.
Decido.
Nos termos do art. 300 do CPC, para a obtenção da tutela de urgência, a parte demandante precisa demonstrar a plausibilidade de suas alegações, bem como o perigo de dano caso a efetivação da tutela só ocorra ao final da lide.
Consoante jurisprudência firmada pelo STF na ADC 41, que trata de ações afirmativas voltadas à reserva de vagas para negros em concursos públicos com base na Lei 12.990/2014, prevalece que "[...] a fim de garantir a efetividade da política em questão, também é constitucional a instituição de mecanismos para evitar fraudes pelos candidatos. É legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação (e.g., a exigência de autodeclaração presencial perante a comissão do concurso), desde que respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa" (STF, Tribunal Pleno, ADC 41, Relator Ministro Roberto Barroso, 17/08/2017).
Nesse contexto, "a autodeclaração não é critério absoluto, sob pena de se subverterem os objetivos da lei de privilegiar a inclusão das pessoas menos favorecidas sejam por questões sociais ou econômicas ou por outro fator de discriminação.
Para se valer do benefício legal, não basta ser afrodescendente: tem que parecer ser afrodescendente, aos olhos do homem médio.
Tal verificação deve-se dar no âmbito administrativo, através de comissão universitária criada para tal função, devendo seu parecer ser fundamentado.” (TRF4, AG 5053549-50.2021.4.04.0000, QUARTA TURMA, Relatora MARIA ISABEL PEZZI KLEIN, juntado aos autos em 20/04/2022).
De outro lado, não obstante a legitimidade da adoção da heteroidentificação como critério supletivo à autodeclaração racial do candidato, a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 1ª Região vem admitindo a possibilidade de afastamento das conclusões das comissões de heteroidentificação de processos seletivos públicos em casos excepcionais, tal como diante de motivação genérica do ato de indeferimento (TRF1, 6ª Turma, AC 1010647-67.2022.4.01.3600, Relator Desembargador Federal João Carlos Mayer Soares, PJe 18/09/2024) ou quando dos documentos juntados aos autos for possível verificar que as características e aspectos fenotípicos do candidato são evidentes, de acordo com o conceito de negro - pretos e pardos - utilizado pelo legislador, baseado nas definições do IBGE (TRF1, 1ª Turma, AC 1061963-06.2023.4.01.3400, Relator Desembargador Federal Newton Pereira Ramos Neto, PJe 03/12/2024).
Em síntese: sendo válida a aplicação do critério da heteroidentificação para fins da manutenção ou não da autodeclaração relacionada à cota de ingresso em concursos públicos, a conclusão da Comissão de heteroidentificação criada para tal atribuição só pode ser afastada se sobrevier prova evidente da falha do órgão, seja por violação ao devido processo legal, seja por manifesta divergência com as provas produzidas quanto às características e aos aspectos fenotípicos do candidato.
No caso concreto, não vislumbro, em análise de cognição sumária, violação ao devido processo legal, pois o Edital do certame (Item 5.6, ID 2189397748, pg. 9) estabelece a checagem da autodeclaração, a ser realizada por comissão composta de 03 (três) membros, a qual delibera por maioria de votos.
Jáa análise do recurso, a composição da comissão também é feita com 3 (três) membros, que deliberam por maioria de votos, mas com seus integrantes sendo distintos da primeira comissão.
O autor informa ter apresentado recurso (o qual não juntou aos autos), que teria sido indeferido, conforme segue: "No entanto, o recurso foi indeferido sob a fundamentação de que em razão do candidato não possuir traços fenotípicos inerentes ao negro, visto que o mesmo supostamente apresenta tom de pele claro, nariz não negroide e lábios rosados e finos.
Desse modo, o candidato não se enquadra na população beneficiária da política de cotas raciais (DOC ANEXO)".
Conforme se observa da resposta que teria sido expedida pela Banca Examinadora, apresenta motivação específica, apontando as características que reputou estarem ausentes para qualificação do autor à ação afirmativa de cota racial, não havendo vício de motivação que determine sua anulação.
Quanto ao teor da decisão, não há como se afirmar, em sede de tutela de urgência, que há manifesto equívoco na conclusão da Comissão de Heteroidentificação.
O que há, na verdade, é uma divergência entre a conclusão adotada pela Comissão de Heteroidentificação e aquela defendida pelo autor e não há como saber, inequivocamente, quem está correto neste caso, nem tampouco firmar que há uma tese evidentemente errada.
Isto porque não há fórmula científica para a definição exata do que seja pessoa negra ou parda.
Os critérios para definir objetivamente qual é a cor de alguém variam bastante a depender da região e as "características fenotípicas" não elidem a dúvida, pois há inúmeras pessoas consideradas negras com lábios finos, nariz afilado ou cabelo não crespo, daí porque decidir se alguém é negro é questão deveras desafiadora, porque diz respeito a negar ou afirmar a alguém, mais do que um direito ou uma posição de vantagem, como um cargo público ou vaga na universidade, uma condição identitária.
E a negativa de uma condição identitária consiste, antes de tudo, em violência perpetrada contra quem, muitas vezes, é vítima contumaz de preconceitos e tratamentos discriminatórios.
A questão torna-se mais complexa em relação às pessoas pardas, sendo impreciso delimitar a linha divisória entre estas e as consideradas “brancas”.
Assim, reconhecendo que há certa e inafastável subjetividade na análise da matéria, sobretudo em uma população de significativa diversidade étnica, como a brasileira, não há como fugir das limitações para a atuação judicial quanto ao controle de mérito do ato administrativo, não cabendo ao magistrado desfazer a conclusão da Banca Examinadora, composta por vários profissionais, para impor a sua percepção subjetiva colhida a partir de fotografias juntadas aos autos.
Não desconsidero a informação trazida pelo autor de que de que teve inscrição de pardo deferida pela mesma Banca Examinadora em certame diverso.
Mas destaco que esse fato reforça ainda mais que a análise da matéria relacionada à heteroidentificação é muito subjetiva, especialmente quando envolve pessoas pardas.
Não há, entretanto, que se fazer vinculação entre os certames, já que os membros e suplentes que compõem as comissões, seja no procedimento de heteroidentificação, seja no recurso, são diversos, e decidem, por maioria de votos, se o candidato faz ou não jus à condição de cotista.
Nesse sentido, oportuno destacar que a Resolução n. 541/2023, do CNJ, determina que a autodeclaração terá validade somente para o concurso público aberto, não podendo ser estendida a outros certames (art. 5, § 1º).
Além disso, a mesma norma estabelece que não serão considerados, pela comissão de heteroidentificação, registros ou documentos pretéritos, inclusive imagem e certidões referentes à confirmação em procedimentos de heteroidentificação realizados em outros concursos federais, estaduais, distritais e municipais (art. 9º, § 2º).
Com essas razões, INDEFIRO o pedido de tutela de urgência (principal e alternativo) requerido por MARCOS JHONES MOREIRA DE ALMEIDA.
Defiro a gratuidade de justiça requerida pelo autor.
Dispensada a realização de audiência preliminar de conciliação, em face do disposto no art. 334, § 4º, II, do Código de Processo Civil.
Citem-se.
Intimem-se. -
28/05/2025 19:24
Recebido pelo Distribuidor
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28/05/2025 19:24
Autos incluídos no Juízo 100% Digital
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28/05/2025 19:24
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
28/05/2025
Ultima Atualização
10/06/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
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