TRF1 - 1049767-29.2022.4.01.3500
1ª instância - 6ª Goi Nia
Polo Ativo
Polo Passivo
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Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Partes
Advogados
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Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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30/05/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA FEDERAL 6ª Vara da SJGO PROCESSO: 1049767-29.2022.4.01.3500 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) AUTOR: RONAN BORGES MENDES ASSISTENTE: TALITA MENDES GOMES REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS SENTENÇA I - Relatório Cuida-se de ação ordinária proposta pelo menor RONAN BORGES MENDES, neste ato representado por sua genitora (Sra.
Talita Mendes Gomes), visando, em sede de liminar a ser proferida em sentença, a reativação imediata do amparo assistencial NB 701.469.570-4, que lhe foi concedido em razão da sua condição de portador de deficiência, a partir do dia seguinte à sua suspensão, ocorrida em 1º.05.2021, bem como que o INSS se abstenha de efetuar a cobrança de valores recebidos sob tal título, declarando-se a inexistência de débitos advindos da cessação do benefício [de 1º/11/2015 a 31/03/2021 (R$ 70.698,33).
Despacho ID 1411562774 determina a emenda da inicial, que restou atendida no ID 1412878254.
Contestação do INSS (ID 1488572359), pugnando pela improcedência dos pedidos.
Junta cópia do processo administrativo referente à “Apuração da Irregularidade – MOB Digital” (ID 1488585855).
Réplica do autor (ID 1515886376).
Em sede de provas, as partes nada requereram.
Parecer do MPF opinando pela realização de perícia social (ID 1588014867).
No saneamento, determinou-se a realização de perícia social (ID 1592588940), cujo laudo foi anexado no ID 2124607975, com manifestação do autor (ID 2128096127) que, em seguida, apresentou memoriais (ID 2150108404). É o relatório.
Decido.
II - Fundamentação O processo comporta julgamento no estado em que se encontra (CPC, art. 355, I).
Sem questões preliminares a enfrentar, passo ao exame do mérito.
O benefício assistencial, consagrado no art. 203, V, da Constituição Federal, assegura mensalmente um salário mínimo a idosos com 65 anos ou mais e a pessoas com deficiência impossibilitadas de prover seu sustento ou de tê-lo provido por sua família.
A concessão deste amparo social pressupõe a demonstração cumulativa de dois requisitos essenciais: um de natureza subjetiva (a condição de deficiência ou idade avançada) e outro de caráter econômico (a situação de miserabilidade).
No caso específico de crianças com deficiência, a avaliação deve considerar o impacto da condição nas atividades próprias da idade.
A definição legal de deficiência, estabelecida no art. 20, §§ 2º e 3º da Lei nº 8.742/93, compreende impedimentos de natureza física, mental, intelectual ou sensorial com duração prolongada que, em interação com diversas barreiras, possam obstruir a participação plena e efetiva na sociedade.
A TNU, ao julgar o Tema 173 (PEDILEF n. 0073261-97.2014.4.03.6301/SP), consolidou o entendimento de que tal impedimento não se confunde necessariamente com incapacidade laborativa, mas deve persistir por período não inferior a dois anos, a ser verificado no caso concreto.
No aspecto econômico, o STF, ao julgar os REs 567.985 e 580.963, declarou a inconstitucionalidade parcial do § 3º do art. 20 da LOAS, que estabelecia como critério único a renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo, reconhecendo a necessidade de análise mais abrangente da condição socioeconômica.
Nesse contexto, o TRF da 1ª Região firmou entendimento no sentido de que a miserabilidade deve ser aferida mediante exame concreto de todos os elementos probatórios, não se limitando à mera declaração de renda.
A vulnerabilidade social, que configura situação extrema incompatível com a dignidade humana, não se confunde com mera insuficiência de recursos, pois o benefício não se destina à complementação de renda familiar (TRF-1 - AC: 00203661620184019199, Rel.
Olívia Merlin Silva, julgado em 22/11/2019).
Ademais, aplica-se, por analogia, o disposto no parágrafo único do Estatuto do Idoso para excluir da renda per capita benefícios assistenciais ou previdenciários de valor mínimo recebidos por idosos ou pessoas com deficiência, quando da concessão do amparo assistencial (TRF-5 - Ap: 00033608420148060041, Rel.
Fernando Braga Damasceno, julgado em 07/05/2020).
As recentes inovações legislativas introduzidas pelas Leis nºs 13.146/2015, 13.846/2019, 13.982/2020 e 15.077/2024 trouxeram significativos aprimoramentos ao regime do benefício assistencial.
Dentre as principais alterações, destacam-se: (i) a exigência de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas e no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (art. 20, §12º da LOAS); (ii) a ampliação do limite de renda familiar per capita para até 1/2 salário mínimo (art. 20-A da LOAS), estabelecendo-se critérios progressivos que consideram fatores como: a gravidade da deficiência, o grau de dependência, as condições socioambientais e os gastos extraordinários com saúde; (iii) a avaliação obrigatória da deficiência com registro do CID para solicitantes com menos de 65 anos; (iv) a exigência de cadastro biométrico para concessão e manutenção do benefício; e (v) o prazo máximo de 24 meses para atualização cadastral no CadÚnico.
No que concerne ao conceito de família para fins de cálculo da renda per capita, a legislação (Lei nº 12.435/2011) compreende o requerente, seu cônjuge ou companheiro, os pais (ou, na ausência, o padrasto ou madrasta), os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores sob tutela que compartilhem o mesmo domicílio.
O TRF da 4ª Região, em decisão paradigmática (Processo nº 5022602-23.2020.4.04.9999/RS)[1], assentou o entendimento de que apenas os filhos maiores e economicamente ativos devem ser incluídos no cálculo, por deterem o dever legal de amparo aos seus ascendentes idosos, evitando assim distorções ao propósito essencial do benefício.
Caso concreto Não há controvérsia acerca da condição de deficiente do autor, portador de surdez profunda bilateral, congênita e irreversível, conforme atestado em relatório médico (ID 1398110769) e confirmado pela perícia administrativa realizada durante a análise do novo requerimento, formulado em 10/08/2022.
O laudo pericial enquadrou o impedimento nos termos do art. 20, §§ 2º e 10, da Lei nº 8.742/93, conforme registrado no ID 1398110764, pág. 64.
A dúvida recai sobre o requisito econômico para fins de restabelecimento do benefício assistencial NB 701.469.570-4 e de declaração de inexistência de débitos referentes as parcelas recebidas entre novembro/2015 e março/2021.
Conforme consta no processo administrativo que apurou a irregularidade no amparo assistencial (NB 701.469.570-4), do qual era titular desde 09/03/2015, o órgão previdenciário verificou a superação da renda permitida devido a vínculos empregatícios mantidos por sua genitora entre 2015 e 2020.
Tais rendimentos não foram declarados na atualização do CadÚnico em 13/01/2020, o que resultou na cessação do benefício em 01/05/2021 (ID 1488585855, fls. 56/58).
A análise conjunta dos elementos probatórios demonstra de forma inequívoca a ausência dos requisitos legais para manutenção do benefício assistencial, tanto no momento da cessação em 2021 quanto no requerimento formulado em 2022.
O laudo social (ID 2124607975) e os registros administrativos atestam que a genitora do autor aufere renda mensal de R$ 1.700,00 por meio de atividade autônoma regular, valor que - considerando o núcleo familiar comprovado de três pessoas (mãe, autor e irmão) - resulta em renda per capita de R$ 566,00.
Este patamar não apenas supera o limite original de 1/4 do salário mínimo, como também não se qualifica para a flexibilização do art. 20-A da LOAS (1/2 SM), visto que a situação concreta não apresenta os elementos agravantes exigidos pela norma: gravidade da deficiência incapacitante, dependência permanente ou condições socioambientais críticas.
As inconsistências cadastrais reforçam essa conclusão.
A tentativa de incluir Isabela da Rosa Borges no cálculo da renda em 2022 revela-se insustentável, pois: (i) não há comprovação de vínculo familiar no CadÚnico ou na inicial; (ii) o laudo social atestou expressamente a composição familiar tríplice (fls. 4); e (iii) a renda declarada (R$ 800,00 para 4 pessoas) divergiu radicalmente da realidade econômica apurada.
Tais contradições associam-se a indícios materiais de subdeclaração, como a atividade paralela de aluguel de chácara e serviços para festas, conforme registrado no laudo social a partir da análise de suas redes sociais e pela presença de equipamentos industriais na residência.
No aspecto subjetivo, a condição de surdez profunda bilateral do autor - embora incontroversa - não gera as limitações qualificadoras exigidas pela legislação.
Conforme registrado no laudo (fls. 3-4), o autor frequenta escola regular com acompanhamento de professor de libras, mantém interações sociais adequadas e não requer cuidados especiais além daqueles já providos pelo implante coclear (custeados pelo SUS/plano de saúde).
A ausência de gastos extraordinários com tratamentos ou medicamentos, somada à capacidade de desenvolvimento nas atividades próprias da idade, afasta o enquadramento nos critérios excepcionais do art. 20-A da LOAS.
Ademais, as condições materiais da família corroboram esse entendimento.
A residência em bairro nobre de Goiânia, mobiliada com eletrodomésticos novos (incluindo fogão industrial e máquina de lavar) e complementada por auxílio paterno (plano de saúde e vestimentas), configura realidade incompatível com o estado de miserabilidade previsto no art. 203, V da CF/88.
Esta conclusão harmoniza-se com a jurisprudência do STF (REs 567.985/580.963), que exige análise concreta da capacidade econômica familiar, não se limitando a critérios meramente numéricos.
Diante deste quadro, conclui-se pela estrita adequação da decisão administrativa ao ordenamento jurídico, mantendo-se a legalidade tanto da cessação do benefício NB 701.469.570-4 quanto do indeferimento do novo pedido de 2022 (NB 711.921.732-2) – em consonância com a finalidade essencial da LOAS, que visa a proteção de situações de insustentabilidade comprovada, e não a complementação de renda familiar.
De modo diverso, quanto ao pedido de declaração de inexistência de débitos relativos às parcelas recebidas entre novembro/2015 e março/2021.
Embora a legislação previdenciária - em especial os artigos 115, II, da Lei 8.213/91 e 11, §3º da Lei 10.666/03 - autorize a revisão de benefícios e o ressarcimento de valores pagos indevidamente, tal medida pressupõe a demonstração de conduta dolosa ou fraudulenta por parte do beneficiário, requisito ausente no caso concreto.
Na espécie, os autos não evidenciam qualquer má-fé do autor na percepção das prestações.
A superação da renda familiar decorreu exclusivamente de vínculos empregatícios mantidos pela genitora entre 2015 e 2020, informações estas que, embora não declaradas nas atualizações cadastrais, não podem ser imputadas ao menor beneficiário. À época dos fatos, o autor encontrava-se sob representação legal, sem capacidade para controlar ou sequer ter ciência das atividades laborais maternas, circunstância que afasta qualquer responsabilidade subjetiva.
Além disso, a concessão administrativa original do benefício em março/2015 gerou legítima expectativa de direito.
O ato concessório, precedido de análise documental pelo órgão competente, criou situação jurídica plenamente justificadora da percepção mensal das prestações.
Nesse contexto, o beneficiário agiu com base na presunção de legitimidade do ato administrativo, caracterizando inequívoca boa-fé objetiva no recebimento dos valores - elemento que, por si só, obsta a repetição dos valores.
O princípio da segurança jurídica reforça essa conclusão.
Embora inquestionável o poder revisional da Administração Pública, tal prerrogativa deve compatibilizar-se com a proteção às relações jurídicas consolidadas de boa-fé.
A cessação do benefício, medida suficiente e proporcional para corrigir a irregularidade, dispensa a repetição de valores percebidos sem dolo, sob pena de violação ao equilíbrio das relações administrativas.
Não se pode olvidar que a natureza alimentar do benefício constitui fator decisivo nessa equação.
Voltado à subsistência de pessoas em situação de vulnerabilidade, os valores recebidos presumivelmente destinaram-se ao atendimento de necessidades básicas do autor.
Exigir sua devolução, além de desproporcional ante a ausência de má-fé, frustraria a própria finalidade social do instituto, convertendo medida protetiva em instrumento de opressão econômica.
Por tais fundamentos, inexistindo prova de conduta fraudulenta na percepção do benefício NB 701.469.570-4, mostra-se indevida a repetição dos valores recebidos, impondo-se o acolhimento parcial da pretensão autoral.
III - Dispositivo Do exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos, nos termos do art. 487, I do CPC, apenas para declarar a inexistência de débitos a título de repetição dos valores pagos ao requerente RONAN BORGES MENDES, em razão da concessão do benefício NB 701.469.570-4, no período compreendido entre 11/2015 e 03/2021 (ID 1488585855, págs. 41/43).
Pela parte autora, custas e verba honorária, que fixo em 10% (dez por cento) sobre a diferença atualizada entre o valor da causa e o montante do débito ora declarado inexistente - art. 85, §2º, CPC – porém suspensa, nos termos do art. 98, § 3º do CPC, mercê da gratuidade judiciária.
Pelo INSS, honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor do débito atualizado, ora declarado inexistente.
Registre-se.
Publique-se.
Intimem-se. (data e assinatura eletrônicas).
Paulo Ernane Moreira Barros Juiz Federal [1] (TRF-4 - AC: 50226022320204049999 5022602-23.2020.4.04.9999, Relator: GISELE LEMKE, Data de Julgamento: 09/03/2021, QUINTA TURMA). -
17/11/2022 17:56
Remetidos os Autos (em diligência) da Distribuição ao 6ª Vara Federal Cível da SJGO
-
17/11/2022 17:56
Juntada de Informação de Prevenção
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16/11/2022 19:29
Recebido pelo Distribuidor
-
16/11/2022 19:29
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
16/11/2022
Ultima Atualização
30/05/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
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