TRF1 - 1000855-57.2021.4.01.4301
1ª instância - 2ª Araguaina
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
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Polo Passivo
Partes
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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17/02/2023 02:08
Publicado Intimação em 17/02/2023.
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17/02/2023 02:08
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 17/02/2023
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16/02/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO TOCANTINS SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE ARAGUAÍNA SEGUNDA VARA FEDERAL AUTOS Nº: 1000855-57.2021.4.01.4301 DECISÃO INTERLOCUTÓRIA I.
RELATÓRIO Trata-se de ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público Estadual, na Justiça Comum em 08/09/2019, em face de 3 (três) investigados: ANTONIO PEREIRA DA SILVA, JOSE SANTANA NETO e LEANDRO COUTINHO NOLETO, suscitando, em síntese, que: (a) diante do surgimento de diversas denúncias apontando burla da lista de pessoas efetivamente inscritas no Programa Minha Casa Minha Vida, privilegiando pessoas que não cumpriam requisitos de necessidade ou previstos em lei, instaurou-se o Inquérito Civil Público nº 001/2016, constando-se favorecimentos a pessoas que não cumpriam os requisitos para integrar os programas destinados a moradia popular; (b) as fraudes cometidas não se deram no âmbito da Caixa Econômica Federal ou exclusivamente por alguns dos interessados; (c) os réus, nas funções respectivamente de, Prefeito, Secretário Municipal de Habitação e Diretor Executivo de Cadastro e Mobilização na Secretaria de Habitação foram os mentores e executores dos atos de improbidade administrativa ora imputados, observando-se que as famílias contempladas com moradia eram, na maioria dos casos, escolhidas, e não passavam por sorteio.
Ao final, requereu a condenação dos indiciados nas penas do art. 11 da Lei 8.492/92 e ao pagamento do ônus de sucumbência.
Com a inicial juntou documentos, incluindo o Inquérito Civil Publico nº 001/2016 (ID. 459503885, págs. 33 a ID. 459245948, pág. 7).
Petição do MPF no ID. 459245948, pág. 13, requerendo e a busca e apreensão de documentos que reputa imprescindíveis como prova.
Nova petição do MPF (ID. 459245948, pág. 17) informando que foi procurado por MARCOS ANTÔNIO LOPES LIMA, testemunha ouvida em sede do ICP nº 001/2016 que tramitou na Promotoria de Justiça e que culminou no ajuizamento da presente ação, momento no qual declarou que “os documentos, objetos da medida de busca e apreensão, estão sendo alterados e que foi procurado por um dos réus desta ação, candidato a vereador para mudar seu depoimento quando chamado em juízo”.
Na mesma petição, ainda, o MPF comunicou que tomou conhecimento do ajuizamento, em 17/09/2016, de Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) de nº 290-85.2016.6.27.004, com matéria similar (distribuição de casas populares através do PMCMV), ajuizada pela Coligação "É tempo de Mudar para Melhorar", na Justiça Eleitoral da 4ª Zona Eleitoral do Tocantins (inicial no ID. 459245948, págs. 20/26), com a presença de um dos réus da presente ação, já notificado para apresentar defesa.
Nova manifestação do Parquet (ID. 459245948, pág. 35) comunicando que obteve informações no sentido de que as “beneficiadas nos programas habitacionais estão sendo visitadas para elaboração de parecer social com data retroativa, visando justificar o fato de terem sido contempladas e contradizer a afirmação de que a maioria das famílias sequer tinham sido visitadas para avaliação de sua condição socioeconômica”.
Decisão liminar proferida no ID. 459245948, págs. 37/49, descrevendo as condutas imputadas a JOSÉ SANTANA NETO (Prefeito), LEANDRO COUTINHO NOLETO (candidato a Vereador) e ANTÔNIO PEREIRA e deferindo a medida de busca e apreensão, sob o fundamento de que: (a) há indícios de responsabilidade dos réus pela prática dos atos de improbidade tipificados pelo art. 11, caput, da Lei 8.429/92, quais sejam, violação dos princípios da administração pública, mediante prática de atos de corrupção na distribuição de casas populares neste município; (b) os depoimentos de várias pessoas perante o Ministério Público local demonstrou a verossimilhança das alegações, vislumbrando-se que os réus eram os responsáveis diretos pela execução dos projetos de habitação popular em Colinas, com poderes de mando e controle sobre os programas habitacionais; (c) O direcionamento da distribuição de casas populares, mediante fraude nos sorteios, visando à obtenção de favorecimentos de ordem política e pessoal, fere a isonomia que deve nortear a contemplação dos inscritos nos programas habitacionais para pessoas de baixa renda e é conduta vedada Lei 8.429/90, tipificada pelo art. 11; (d) as pessoas interessadas tinham que levar por diversas vezes os documentos, sem qualquer comprovante de entrega.
Diante de tal análise, foi deferido o pedido liminar determinando a imediata BUSCA E APREENSÃO CAUTELAR de computadores e anotações manuscritas ou impressas visando à produção de provas documentais, tendo o MINISTÉRIO PÚBLICO autor como DEPOSITÁRIO.
Em manifestação (ID. 459245948, pág. 55), o MPF informa que a liminar foi cumprida e que “consta na documentação apreendida relativa aos programas habitacionais ‘manuscritos de indicações’, em sua maioria, de vereadores, candidatos a reeleição, inclusive de candidato a prefeito, bem como a menção da necessidade do beneficiário do programa ser eleitor neste município e possível fraude e falsificação de documentos para enquadramento nos requisitos exigidos”.
Diante de tais fatos, requereu fosse espedida comunicação ao Juíz Eleitoral, para utilização da prova emprestada.
Ao final, requereu a realização de exame grafotécnico nos manuscritos mencionados e demais perícias pertinentes nos documentos e computadores apreendidos.
Manifestação preliminar dos indiciados (ID. 459245968, págs. 61/69), em conjunto, alegando, em síntese, que: (a) preliminarmente, pelo cerceamento de defesa, vez que “não foram juntados aos autos a totalidade dos documentos apreendidos quando do cumprimento da liminar deferida, vez que foram encartados aos autos apenas parte dos mesmos, conforme se observa da Certidão do Sr.
Meirinho constante do evento 15 dos autos; (b) todos os contemplados do Programa Minha Casa Minha Vida no município de Colinas do Tocantins foram selecionados seguindo os rígidos critérios constantes da Lei nº 11.977/2009, sendo as alegações da inicial genéricas, vez que não citaram os nomes dos contemplados.
Com a peça, juntaram documentação (ID. 459245968, pág. 70 a ID. 459245982, pág. 291).
Manifestação do Ministério Público Estadual (ID. 459245982, pág. 293/295).
Decisão (ID. 459245982, pág. 298/300) rejeitando a manifestação prévia da parte ré (art. 17, §8º, Lei 8.429/92), haja vista que existem suficientes indícios de que praticaram ato de improbidade e, de consequência, recebendo a ação para devido processamento.
Solicitou-se, ainda, apoio da Polícia Federal para realização da perícia.
Manifestação da Polícia Federal (ID. 459245982, pág. 330/331) comunicando a impossibilidade de realização da perícia nos computadores apreendidos e requisitando que o SECRETÁRIO DE ESTADO DA SEGURANÇA PÚBLICA, Dr.
CÉSAR SIMONI, disponibilize um PERITO do DEPARTAMENTO DE PERÍCIA TÉCNICA DA POLÍCIA CIVIL para realizar a PERÍCIA.
Município do Tocantins foi citado no ID. 459245982, pág. 353, tendo requerido sua inclusão no polo ativo da demanda no ID. 459245984, pág. 15.
Quesitos para a perícia técnica grafotécnica apresentados no ID. 459245984, pág. 49.
Manifestação dos requeridos (ID. 459245984, pág. 94/97) com apresentação de quesitos.
O Laudo pericial com análise da documentação apreendida apresentado no ID. 459482412, pág. 19/28, concluindo, dentre outros tópicos, que existem arquivos que mencionam famílias ou pessoas aptas aos programas habitacionais do Município de Colinas/TO e que existem arquivos relacionam os réus com a política habitacional.
Decisão (ID. 459482412, pág. 139) devolvendo o computador analisado na perícia para o proprietário.
Decisão (ID. 459482412, pág. 218/220) afirmando que “do cotejo dos autos verifico que existem indícios suficientes de ato de improbidade e de responsabilidade dos réus”, rejeitando a manifestação prévia da parte ré e, consequentemente, recebendo a ação.
Os réus foram posteriormente citados.
Manifestação do Ministério Público (ID. 459482412, pág. 273) com a juntada de Relatório de Análise Técnica referente a contraprova da perícia realizada, nas páginas seguintes.
Contestação dos requeridos juntada no (ID. 459482412, págs. 299/314) pugnando, em síntese: (a) preliminar de nulidade da Busca e Apreensão com base na teoria dos frutos da árvore envenenada (fruits of the poisonous tree), vez que o Ministério Público Estadual anexou vários documentos eivados de nulidades, pois foram obtidos em clara ofensa aos princípios constitucionais do devido processo legal; (b) no mérito, que as alegações não merecem prosperar, pois “nenhum dos supostos “INDICADOS” ao final restaram contemplados” com as casas do PMCMV; (c) todos os beneficiados pelos empreendimentos habitacionais foram selecionados por sorteios públicos, que por sua vez foram realizados em conformidade com a Portaria n° 595 de 18 de Novembro de 2013; (d) depoimento do Sr.
Marcos Antônio Lopes Lima não deve ser aceito, vez que o depoente “hoje figura como ocupante de cargo comissionado no município, o que reforça a tese de que tudo não passou de armação dos adversários políticos dos requeridos” e, ainda, não teve o contraditório; (e) quanto ao depoimento dos beneficiados que não foram contemplados, também não devem ser aceitos em prejuízo aos réus, vez que trata-se de reação natural à expectativa frustrada de recebimento do benefício; (f) não há indicação com provas concretas de quais beneficiários especificamente não possuíam perfil ou foram “indicados” pelos requeridos, ficando tudo no campo da suposição.
Foram impugnados todos os documentos juntados aos autos, por terem sido produzidos unilateralmente pelo MP sem crivo do contraditório, bem como os documentos oriundos da busca e apreensão depositados em poder do Ministério Público, que foram seletivamente anexados.
Manifestando-se sobre a prova pericial, os requeridos afirmaram que “o resultado da perícia em nada muda a situação dos autos, haja vista que as acusações infundadas continuam apenas nas ilações do autor”, asseverando que “inexiste laudo formalizado com respostas aos quesitos apresentados pelas partes”.
Com a defesa, apresentaram documentos (ID. 459482412, pags. 315/383).
Impugnação à contestação (ID. 459482412, pags. 387/391) afirmando que: (a) em face da preliminar suscitada, afirma que, foram apreendidas a quantidade de 215,5 kg de documentos, entre anotações manuscritas e impressas, além de caixas e pastas de arquivo, ou seja, diante do volume apreendido , certificaram os meirinhos que foi juntado por amostragem alguns desses conteúdos apreendidos, fato que não gera o prejuízo alegado.
Ademais, a referida alegação de nulidade já foi trazida aos autos através do Agravo de Instrumento protocolado sob o n.º 0004285-19.2017.827.0000, oportunidade em que foi rechaçada em grau recursal; (b) no mérito, diz que toda a ação tem lastro probatório produzido nos autos do Inquérito Civil Público n.º 001/2016, além das demais provas obtidas através da busca e apreensão; (c) a busca por interesses pessoais, aliada a uma política de "troca de favores", sonegou o sonho de diversas famílias que acreditavam num programa pautado pela isonomia, sendo que o acervo provatório trazido aos autos não possui o condão de somente identificar aquelas pessoas indicadas como beneficiárias e verificar se receberam ou não moradia, mas também de demonstrar como todo o processo habitacional era gerido naquilo que competia aos agentes políticos da época.
Após notificação, a CEF juntou aos autos (ID. 459482412, pág. 416/425 a ID. 459482421, págs. 1/10) lista de beneficiários contendo os nomes e as quantidades dos contemplados no Programa PMCMV.
Manifestação dos requeridos acerca da documentação acima (ID. 459482421, pág. 34/35) asseverando que os documentos reforçam os argumentos da defesa, tendo todos os beneficiados pelos empreendimentos habitacionais sido selecionados por sorteios públicos.
Nova manifestação dos requeridos (ID. 459482421, pág. 37/38) impugnando a documentação juntada nos autos, nos termos da contestação.
Laudo GRAFODOCUMENTOSCÓPICO juntado no ID. 459482421, págs. 80/81, ID. 459482443, ID. 459545358, ID. 459545367, ID. 459545384, ID. 459550856, ID. 459550866, ID. 459550891, págs. 1/ 50.
Manifestação dos requeridos acerca do laudo GRAFODOCUMENTOSCÓPICO (ID. 459550891, págs. 73/75) afirmando que os documentos apreendidos não constam como lacrados, sendo certo que o Ministério Público, detentor dos documentos, não detinha ISENÇÃO DE ÂNIMO necessária para lhe ser conferido o depósito da prova judicial colhida, não tendo trazido aos autos qualquer elemento de prova que interesse à defesa, em total afronta à ISONOMIA.
Asseveram que a perícia não poderia ter concluído que os manuscritos foram dos punhos dos Requeridos, se no processo não houve a oportunizarão para que os Requeridos pudesse fazer as grafias e compará-las.
Em petição (ID. 459550891, pág. 81/83) o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL argumentou que os autos envolvem interesse da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, órgão que ostenta qualidade de empresa pública federal, e, por conseguinte interesse da UNIÃO, o que determina a modificação da competência para a JUSTIÇA FEDERAL, pleiteando a remessa para a Justiça Federal.
Decisão de ID. 459550891, pág. 87/90, declarou a incompetência e determinou a remessa dos autos à Justiça Federal.
A decisão ID. 502080870 ratificou os atos decisórios realizados pelo Juízo Estadual, não havendo se falar em ilicitude de provas autorizadas e produzidas por Juiz incompetente e, ainda, definiu a competência da Justiça Federal para solução da lide.
Ainda, determinou a intimação do MPF para se manifestar sobre o Laudo juntado nos autos.
Parecer do MPF no ID. 586706368 manifestando-se acerca dos laudos.
Nova manifestação dos requeridos no ID. 613002861, com a juntada da certidão de óbito de ANTONIO PEREIRA DA SILVA.
Despacho de ID. 814179586 chamou o feito à ordem, determinando a intimação das partes para manifestação acerca dos efeitos retroativos da Lei nº 14.230/21 sobre o caso, inclusive no que concerne à aplicação da prescrição e da possibilidade de acordo de não persecução cível.
Nesse seguimento, o MPF peticionou no ID. 821090559, aduzindo que não há que se falar, na situação dos autos, de aplicação retroativa da lei multicitada ou mesmo de incidência de prescrição intercorrente.
Demais disso, o Parquet afirmou ser possível a celebração de acordo de não persecução civil.
Por sua vez, os requeridos peticionaram no ID. 841793076, requerendo – à luz das alterações promovidas pela Lei nº 14.230/21, o reconhecimento da prescrição intercorrente em seu favor e, que não há espaço para um Acordo de Não Persecução Civil por entender que não estão presentes atos de improbidade administrativa, tampouco dolo na conduta.
Certidão de óbito de ANTONIO PEREIRA DA SILVA juntada no ID. 1236228831 É o que importa relatar.
Decido.
II.
FUNDAMENTAÇÃO II.1 DA APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI 14.230/2021 A Lei de Improbidade Administrativa – LIA (Lei nº 9.429/92) foi substancialmente alterada pela Lei nº 14.230, de 25/10/2021.
As alterações promovidas, na sua imensa maioria, são benéficas aos acusados de prática de atos ímprobos.
O artigo 5º, XL, da Constituição Federal, estabelece o princípio da retroatividade da lei penal benéfica ao réu.
O referido princípio veicula Direito Fundamental de concreção da dignidade da pessoa humana e, por essa razão, tem aplicação ampla, alcançando a seara do Direito Sancionatório.
Sobre a aplicação retroativa da lei benéfica no campo do Direito Sancionatório, transcrevo a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça - STJ: ADMINISTRATIVO.
RECURSO ESPECIAL.
PODER DE POLÍCIA.
SUNAB.
MULTA ADMINISTRATIVA.
RETROATIVIDADE DA LEI MAIS BENÉFICA.
POSSIBILIDADE.
ART. 5º, XL, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA.
PRINCÍPIO DO DIREITO SANCIONATÓRIO.
AFASTADA A APLICAÇÃO DA MULTA DO ART. 538, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC.
I.
O art. 5º, XL, da Constituição da República prevê a possibilidade de retroatividade da lei penal, sendo cabível extrair-se do dispositivo constitucional princípio implícito do Direito Sancionatório, segundo o qual a lei mais benéfica retroage.
Precedente.
II.
Afastado o fundamento da aplicação analógica do art. 106 do Código Tributário Nacional, bem como a multa aplicada com base no art. 538, parágrafo único, do Código de Processo Civil.
III.
Recurso especial parcialmente provido. (REsp 1153083/MT, Rel.
Ministro SÉRGIO KUKINA, Rel. p/ Acórdão Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 06/11/2014, DJe 19/11/2014) A Lei nº 14.230/2021 previu expressamente que “aplicam-se ao sistema da improbidade disciplinado nesta Lei os princípios constitucionais do direito administrativo sancionador” (Art. 1º, § 4º).
Ressalto, o entendimento acima no tocante ao prazo prescricional.
Com efeito, a retroatividade das normas que tratam da prescrição da pretensão sancionatória (prescrição geral ou intercorrente), previstas no art. 23, da Lei n.º 8.429/1992, entra em flagrante colisão com a efetividade da proteção à probidade administrativa, tendo em vista a impossibilidade de o titular da ação, mandatário da sociedade na defesa do direito à probidade administrativa, ter se adequado, à época, a parâmetros que sequer eram previstos pela legislação em vigor, em prejuízo manifesto à segurança jurídica, e que, na maioria dos casos, as normas sobre prescrição incluídas pela Lei n.º 14.230/2021 preveem prazos muito reduzidos com relação ao texto original, bem como parâmetros de interrupção dos prazos bastante específicos (em muito incompatíveis com o procedimento adotado antes da reforma).
O art. 23, da LIA, em sua redação original, estabelecia prazos de prescrição da pretensão condenatória por ato de improbidade administrativa, de acordo com a posição funcional do agente perante a administração pública, sendo de 5 cinco anos, contados do término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de confiança, ou de acordo com o prazo prescricional previsto em lei específica, para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ou emprego.
Os prazos diferenciados, de acordo com a posição funcional do agente, tinham como escopo a inviabilidade prática na apuração das condutas, enquanto os agentes políticos ou aqueles investidos em funções de chefia detinham o controle sobre os meios de prova, em especial a documentação que envolvesse aquele fato sob suspeita, inviabilizando ou dificultando, enquanto perdurasse esse quadro, o conhecimento de eventual ilicitude pelos órgãos de controle, e, portanto, a adoção da medida judicial ou extrajudicial cabível.
Com relação aos servidores efetivos ou empregados públicos, a lei buscou unificar os prazos nas esferas administrativa e judicial, a fim de otimizar a instrução e a apuração dos fatos.
Com o advento da nova Lei n.º 14.230/2021, o prazo prescricional, qualquer que seja o vínculo do agente, passou a ser de 8 (oito) anos, contados “a partir da ocorrência do fato, ou, no caso de infrações permanentes, do dia em que cessou a permanência”.
Além disso, a lei estabeleceu uma série de causas de interrupção, com o reinício da contagem do prazo prescricional pela metade, ou seja, 4 anos.
Assim, interrompido o prazo de 8 anos com o ajuizamento da ação, reinicia-se a contagem do prazo pela metade (4 anos), que só se interromperá novamente, em primeiro grau de jurisdição, com a publicação de sentença condenatória (art. 23, § 4.º, inc.
II).
Observa-se que houve uma drástica mudança no regime de prescrição da Lei n.º 8.429/1992, após a reforma pela Lei n.º 14.230/2021, que era absolutamente imprevista pelos órgãos de controle (responsáveis pela apuração dos fatos) e pelos legitimados à propositura da ação por improbidade, que, conscientes dos prazos e parâmetros estabelecidos pela legislação então em vigor, conduziram as investigações e, posteriormente, o processo judicial de acordo com tais parâmetros.
A apuração da prática dos atos de improbidade administrativa, mormente ao se considerar as consequências que podem dela advir em desfavor do réu, em sua esfera política e patrimonial, é, via de regra, um trabalho complexo, que naturalmente demanda uma gestão de prazos, a fim de que possa desenvolvido com eficiência e respeito às garantias individuais do agente público e terceiros investigados.
Vale ressaltar que a prescrição é instituto jurídico que, além de garantir segurança jurídica ao réu, representa,
por outro lado, uma sanção direcionada ao titular da pretensão, em razão de sua inércia, desídia em agir para buscar a tutela do direito.
Dessa forma, “aplicar retroativamente o novo regime é penalizar o autor que não incorreu em omissão ou inércia” (LEONEL, R. de B.
Nova Lei de Improbidade: atipicidade, prescrição e direito superveniente, Conjur, nov. 2021.
Disponível em: https://www.conjur.com.br/2021-nov-29/leonel-lia-atipicidade-prescricao-direito-superveniente).
Em outros termos, a aplicação, de imediato, da prejudicial de mérito supramencionada importaria em supressão (surpresa) de legítima pretensão, formulada no tempo e de acordo com as formalidades exigidas em lei, em flagrante desrespeito à segurança jurídica, não apenas do legitimado extraordinário, mas também, e principalmente, do verdadeiro titular do interesse vindicado em juízo, qual seja: a sociedade como um todo. À vista desse quadro, não resta dúvida sobre a aplicação retroativa das alterações benéficas aos demandados promovidas pela Lei nº 14.230/2021 na LIA, ressalvando, contudo, a aplicabilidade imediata no que se refere ao instituto da prescrição.
II.2 NECESSIDADE DE EMENDA DA INICIAL A Lei nº 14.230/2021 criou requisitos para a petição inicial das ações de improbidade administrativa (pressupostos de validade e desenvolvimento regular do processo).
Art. 17 […] § 6º A petição inicial observará o seguinte: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) I - deverá individualizar a conduta do réu e apontar os elementos probatórios mínimos que demonstrem a ocorrência das hipóteses dos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei e de sua autoria, salvo impossibilidade devidamente fundamentada; (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) II - será instruída com documentos ou justificação que contenham indícios suficientes da veracidade dos fatos e do dolo imputado ou com razões fundamentadas da impossibilidade de apresentação de qualquer dessas provas, observada a legislação vigente, inclusive as disposições constantes dos arts. 77 e 80 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil). (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) [...] § 6º-B A petição inicial será rejeitada nos casos do art. 330 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), bem como quando não preenchidos os requisitos a que se referem os incisos I e II do § 6º deste artigo, ou ainda quando manifestamente inexistente o ato de improbidade imputado. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) Impende ressaltar que todas as condutas previstas nos arts. 09, 10 e 11 da LIA, com a nova redação legislativa, passaram a exigir dolo específico: Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) […] § 2º Considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) § 3º O mero exercício da função ou desempenho de competências públicas, sem comprovação de ato doloso com fim ilícito, afasta a responsabilidade por ato de improbidade administrativa. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) […] Art. 17-C […] § 1º A ilegalidade sem a presença de dolo que a qualifique não configura ato de improbidade. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) Igualmente, a LIA, com as alterações multicitadas, dispôs acerca do acordo de não persecução civil (art. 17-B); prescrição intercorrente, bem como necessidade de que para cada fato somente possa haver uma capitulação legal (art. 17, §10-D).
No caso dos autos, a petição inicial, ao que parece, atribui múltipla capitulação aos fatos, vez que apenas cita o caput do art. 11 como fundamento, sem explicitar em qual inciso as partes requeridas insurgiram, exigindo-se, assim, sua adequação ao novo cenário normativo, a fim de que seja prolatada sentença de mérito condizente com as restrições impostas pela Lei nº 14.230/2021.
Demais disso, a ausência de capitulação nos incisos do art. 11 acima citado, impossibilita a análise acerca da manutenção ou revogação o fato imputado, mediante a alteração legislativa em estudo.
Por oportuno, vale destacar ainda o art. 10, inciso VIII, da LIA - que com a nova redação dada pela Lei nº 14.230/21 passou a exigir expressamente a perda patrimonial efetiva para configuração do ato lesivo ao erário.
Logo, em que pese o estágio avançado da tramitação processual, conforme exposto no relatório alhures, considerando que a sentença será proferida na vigência da Lei nº 14.230/21 (e deve observar as disposições por ela fixadas), impõe-se a intimação da parte autora para adequar o feito às novas disposições da LIA.
III.
DISPOSITIVO Ante o exposto, decido: a) declarar a aplicação retroativa, ao presente processo, da Lei nº 14.230/21, no que for benéfico aos réus, ressalvando, contudo, a aplicabilidade imediata no que se refere ao instituto da prescrição; b) determinar a intimação do MPF para, em 15 (quinze) dias, adequar o feito às novas disposições da Lei de Improbidade Administrativa, momento em que terá de especificar eventuais provas que pretenda produzir à vista das novas disposições levadas a efeito em tal diploma legal; c) no mesmo prazo, deve o MPF manifestar-se sobre a certidão de óbito de ID. 1236228831 e requerer o que entender de direito em relação ao requerido falecido.
Na oportunidade, o Parquet deverá especificar os termos/condições necessários à celebração do acordo de não persecução civil possível na espécie (parecer de ID. 821090559).
Após, intime-se a parte ré para que, também em 15 (quinze) dias, manifeste-se acerca do peticionamento que venha a ser apresentado pelo MPF, inclusive sobre eventuais condicionantes que venham a ser impostas para fins da celebração do acordo supradito.
Na ocasião, os requeridos deverão especificar as provas que tenha interesse em razão da superveniência do novo cenário normativo acima tratado.
Ressalto que, após a manifestação das partes, será procedida a análise da certidão de óbito de ID. 1236228831 e suas consequências processuais e dos requerimentos formulados pelo MPF no ID. 586706368.
Intimem-se.
Após, imediatamente conclusos.
Araguaína/TO, data certificada no sistema.
Wilton Sobrinho da Silva Juiz Federal -
15/02/2023 09:16
Expedida/certificada a intimação eletrônica
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15/02/2023 09:16
Expedição de Outros documentos.
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15/02/2023 09:15
Expedição de Publicação ao Diário de Justiça Eletrônico Nacional.
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15/02/2023 09:15
Expedição de Publicação ao Diário de Justiça Eletrônico Nacional.
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14/02/2023 14:43
Processo devolvido à Secretaria
-
14/02/2023 14:43
Decisão Interlocutória de Mérito
-
15/08/2022 11:52
Conclusos para decisão
-
26/07/2022 16:06
Juntada de petição intercorrente
-
12/07/2022 11:33
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
12/07/2022 11:22
Juntada de Certidão
-
04/07/2022 08:06
Processo devolvido à Secretaria
-
04/07/2022 08:06
Outras Decisões
-
23/05/2022 14:29
Juntada de Vistos em inspeção - conclusão mantida
-
17/01/2022 09:33
Conclusos para decisão
-
01/12/2021 14:28
Juntada de manifestação
-
18/11/2021 14:07
Juntada de parecer
-
16/11/2021 08:37
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
16/11/2021 08:37
Expedição de Outros documentos.
-
12/11/2021 19:05
Processo devolvido à Secretaria
-
12/11/2021 19:05
Proferido despacho de mero expediente
-
05/11/2021 08:12
Decorrido prazo de JOSE SANTANA NETO em 04/11/2021 23:59.
-
05/11/2021 08:12
Decorrido prazo de FLAVIANA MAGNA DE SOUZA SILVA ROCHA em 04/11/2021 23:59.
-
05/11/2021 08:12
Decorrido prazo de ANTONIO PEREIRA DA SILVA em 04/11/2021 23:59.
-
28/10/2021 00:14
Decorrido prazo de PAULO ROBERTO RIBEIRO PONTES em 27/10/2021 23:59.
-
28/10/2021 00:14
Decorrido prazo de LEANDRO COUTINHO NOLETO em 27/10/2021 23:59.
-
28/09/2021 10:14
Conclusos para decisão
-
28/09/2021 10:13
Expedida/certificada a comunicação eletrônica
-
14/07/2021 23:48
Juntada de petição intercorrente
-
02/07/2021 09:13
Juntada de manifestação
-
18/06/2021 10:47
Juntada de parecer
-
25/05/2021 10:39
Expedição de Outros documentos.
-
25/05/2021 09:34
Processo devolvido à Secretaria
-
25/05/2021 09:34
Outras Decisões
-
03/03/2021 10:03
Juntada de substabelecimento
-
26/02/2021 20:55
Conclusos para decisão
-
26/02/2021 17:53
Remetidos os Autos da Distribuição a 2ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Araguaína-TO
-
26/02/2021 17:53
Juntada de Informação de Prevenção
-
26/02/2021 16:50
Recebido pelo Distribuidor
-
26/02/2021 16:50
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
26/02/2021
Ultima Atualização
26/02/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Acórdão • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
Sentença Tipo A • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
Despacho • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão (anexo) • Arquivo
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