TRF2 - 5000770-39.2024.4.02.5119
1ª instância - 4ª Turma Recursal - Juiz Relator 1 - Rj
Polo Ativo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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06/09/2025 23:59
Confirmada a intimação eletrônica - Refer. ao Evento: 29
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29/08/2025 02:14
Publicado no DJEN - no dia 29/08/2025 - Refer. ao Evento: 28
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28/08/2025 02:09
Disponibilizado no DJEN - no dia 28/08/2025 - Refer. ao Evento: 28
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28/08/2025 00:00
Intimação
RECURSO CÍVEL Nº 5000770-39.2024.4.02.5119/RJ RECORRENTE: EDIL DA COSTA (AUTOR)ADVOGADO(A): VICTOR DOS SANTOS ASSIS (OAB RJ216882) DESPACHO/DECISÃO 1.
Recurso inominado interposto pelo autor contra sentença que julgou improcedente o pedido de concessão de benefício por incapacidade permantente a partir de 05/2020. 2.
Alega a parte recorrente que a sentença merece reforma no que tange ao cálculo do benefício, para que seja feito de acordo com as regras da EC 103/19. É o relatório.
Passo a decidir. 3.
Quanto à questão trazida em sede recursal, passo a expor minha reflexão sobre o assunto. DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA JURÍDICA 4.
O Regime Geral de Previdência Social prevê dois benefícios para tutelar seus segurados em caso de incapacidade, de acordo com a gravidade do risco social. 5.
Nas situações menos graves, em que a incapacidade é parcial ou temporária, será devido o auxílio por incapacidade temporária, anteriormente denominado auxílio-doença.
Já para os casos mais severos, associados a uma incapacidade total e permanente, está prevista a aposentadoria por incapacidade permanente. 6.
Até a EC 103/19, era identificado na legislação um grau de proteção proporcional à gravidade do risco social.
Desse modo, a incapacidade parcial ou temporária dava origem a um benefício com valor 91% da média das remunerações do segurado, enquanto a invalidez total e permanente gerava um benefício de 100% dessa média. 7.
As alterações dos critérios de cálculo na Reforma da Previdência de 2019, todavia, conduzem a uma desproporcionalidade, pois provocam uma proteção menor para o risco mais grave, gerando situações como a dos autos. 8.
Para melhor compreensão da questão, passa-se a explicar os novos critérios de cálculo. CÁLCULO DOS BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE 9.
O cálculo de um benefício previdenciário ocorre, em regra, pela apuração de uma base de cálculo – chamada de salário de benefício – correspondente à média das remunerações do segurado sobre as quais incidiu contribuição – chamadas de salários de contribuição. 10.
Sobre essa base de cálculo (salário de benefício), incide um coeficiente a fim de calcular a renda mensal inicial da prestação previdenciária. [salário de benefício] x [coeficiente de cálculo] = [renda mensal inicial] 11.
A EC 103/19 promoveu alterações tanto no cálculo do salário de benefício dos benefícios em geral, quanto no coeficiente de cálculo das aposentadorias.
Mas a questão em análise refere-se especificamente ao último aspecto. 12.
O texto constitucional deixou para o legislador ordinário a disciplina do cálculo dos benefícios previdenciários.
Entretanto, como regra transitória, válida até que lei discipline o assunto, estabeleceu os critérios previstos no art. 26 da EC 103/19.
Essa não é uma observação sem importância, pois não se está diante de uma norma materialmente constitucional, mas de assunto de competência do legislador ordinário, apenas transitoriamente disciplinado por Emenda Constitucional. 13.
No caput do referido dispositivo, consta a fórmula do salário de benefício para as prestações do Regime Geral de Previdência Social, o que inclui tanto a aposentadoria por incapacidade permanente, quanto o auxílio por incapacidade temporária.
Desse modo, a base de cálculo de ambos os benefícios, é a mesma: a média aritmética simples dos salários de contribuição e das remunerações adotados como base para contribuições a regime próprio de previdência social e ao Regime Geral ... de Previdência Social, ou como base para contribuições decorrentes das atividades militares de que tratam os arts. 42 e 142 da Constituição Federal, atualizados monetariamente, correspondentes a 100% (cem por cento) do período contributivo desde a competência julho de 1994 ou desde o início da contribuição, se posterior àquela competência. 14.
Já em seu § 2º c/c § 5º, o art. 26 define o coeficiente de cálculo para as aposentadorias, inclusive aquelas decorrentes de incapacidade permanente não relacionada a acidente de trabalho.
Pelo critério definido transitoriamente, o valor da aposentadoria corresponderá a 60% (sessenta por cento) do salário de benefício, com acréscimo de 2 (dois) pontos percentuais para cada ano de contribuição que exceder o tempo de 15 (quinze) anos, se mulher, ou 20 (vinte) anos de contribuição, se homem. 15.
Uma mulher com até 15 anos de contribuição, terá aposentadoria correspondente a 60% do salário de benefício.
A partir desse limite, a cada ano de contribuição adicional, soma-se 2%.
Desse modo, por exemplo, como demonstrado na tabela abaixo, aos 30 anos de contribuição, o coeficiente de cálculo da mulher será de 90% e aos 35 anos, 100%.
Coeficiente de Cálculo – Aposentadoria da Mulher15 anos – 60%23 anos – 76%31 anos – 92%16 anos – 62%24 anos – 78%32 anos – 94%17 anos – 64%25 anos – 80%33 anos – 96%18 anos – 66%26 anos – 82%34 anos – 98%19 anos – 68%27 anos – 84%35 anos – 100%20 anos – 70%28 anos – 86%36 anos – 102%21 anos – 72%29 anos – 88%37 anos – 104%22 anos – 74%30 anos – 90%38 anos – 106% 16.
O cálculo dos benefícios dos homens segue a mesma lógica, porém o acréscimo dos 2 pontos percentuais apenas se inicia aos 20 anos de contribuição.
Assim, aos 35 anos de contribuição o coeficiente será de 90% e apenas alcançará a alíquota de 100% aos 40 anos de contribuição.
Coeficiente de Cálculo – Aposentadoria do Homem20 anos – 60%28 anos – 76%36 anos – 92%21 anos – 62%29 anos – 78%37 anos – 94%22 anos – 64%30 anos – 80%38 anos – 96%23 anos – 66%31 anos – 82%39 anos – 98%24 anos – 68%32 anos – 84%40 anos – 100%25 anos – 70%33 anos – 86%41 anos – 102%26 anos – 72%34 anos – 88%42 anos – 104%27 anos – 74%35 anos – 90%43 anos – 106% 17.
As regras transitórias da EC 103/19, todavia, não trataram do valor do auxílio por incapacidade temporária, deixando a matéria sob a disciplina da Lei 8.213/91, que em seu art. 61 fixa o coeficiente de cálculo em 91% do salário de benefício, independentemente do tempo de contribuição do segurado. 18.
A alteração das regras de cálculo da aposentadoria gera uma situação contraditória.
Afinal, no caso das mulheres, o valor da aposentadoria por incapacidade permanente apenas supera o auxílio por incapacidade temporária quando a segurada possuir, ao menos, 31 anos de contribuição.
Já para os homens, a aposentadoria apenas supera o auxílio quando o segurado contar com, no mínimo, 36 anos de contribuição. 19.
A conclusão é que, em regra, o benefício destinado a proteger os segurados contra o risco mais grave (incapacidade total e permanente) terá valor inferior ao benefício cujo objetivo é proteger o segurado nos casos de risco menos grave (incapacidade parcial ou temporária). 20.
O que se passa a analisar é se essa desproporcionalidade exige algum esforço interpretativo para garantir a constitucionalidade da norma.
Para tanto, inicialmente discorre-se sobre o princípio da proporcionalidade, em sua vertente mais conhecida: a vedação do excesso.
Desse modo, será construída a base teórica para se identificar uma segunda vertente da proporcionalidade: a vedação à proibição deficiente. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E A VEDAÇÃO DO EXCESSO 21.
O princípio da proporcionalidade é integrado por três máximas parciais: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito1.
Para uma medida ultrapassar o crivo da proporcionalidade, deve ser idônea a produzir o resultado a que se propõe (adequação), necessária, em razão da inexistência de medida menos gravosa para alcançar o resultado (necessidade), bem como priorizar adequadamente o bem jurídico a ser protegido, em comparação ao bem jurídico sacrificado.2 22.
Não é proporcional, por falta de adequação, uma política pública que busque combater determinada doença por meio de medicamentos sem eficácia.
Da mesma forma, seria inadequado e, portanto, desproporcional, exigir perícia médica para a concessão de aposentadoria programada.
Nesse ponto, não está em discussão uma escolha entre alternativas possíveis, mas a ineficácia da medida eleita para alcançar o fim desejado. 23.
Em um segundo nível de análise, proporcionalidade exige que a medida adotada seja a menos gravosa entre aquelas possíveis para o atingimento da finalidade perseguida.
Por exemplo, é de proporcionalidade duvidosa a extinção de um benefício previdenciário com o objetivo de combater fraudes em sua concessão, considerando a viabilidade de outras medidas que tornariam desnecessária a total extinção da prestação. 24.
O terceiro nível de análise da proporcionalidade requer uma avaliação mais delicada e criteriosa, pois, ultrapassadas as etapas da adequação e da necessidade, passa-se a avaliar se a restrição a um determinado bem jurídico é justificada para se garantir a conservação de um segundo bem jurídico.
Sobre a proporcionalidade em sentido estrito, são elucidativas as objetivas palavras de Barroso: 3 ...proporcionalidade em sentido estrito, que é a ponderação entre o ônus imposto e o benefício trazido, para constatar se a medida é legítima.
Se o Poder Púbico, por exemplo, eletrificar um monumento de modo a que um adolescente sofra uma descarga elétrica que o incapacite ou mate quando for pichá-lo, a absoluta falta de proporcionalidade entre o bem jurídico protegido o patrimônio público e o bem jurídico sacrificado a vida (no caso, de um adolescente) torna inválida a providência. 25. Não é capaz de vencer a proporcionalidade em sentido estrito, por exemplo, norma que limite o valor do salário-maternidade ao teto do Regime Geral de Previdência Social, pois, com o objetivo de limitar os gastos públicos e equilibrar as contas previdenciárias, provocaria violento impacto no direito de as mulheres concorrerem em situação de igualdade com os homens no mercado de trabalho.
No histórico e emblemático julgamento da ADI 1946, que buscava excluir o salário-maternidade da abrangência do teto previsto no art. 14 da Emenda Constitucional nº 20/1998, o STF, sob a relatoria do Min.
Sydney Sanches, apesar de não mencionar expressamente a proporcionalidade, ponderou os bens jurídicos em jogo e concluiu que a proteção do cofre previdenciário não pode justificar a violação da cláusula constitucional de igualdade entre os gêneros. 26.
Infere-se, portanto, uma clara utilidade do princípio da proporcionalidade para conter a atuação estatal, evitando exageros que interfiram, sem razoabilidade, em outros valores constitucionalmente tutelados, como os direitos fundamentais. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E A VEDAÇÃO À PROTEÇÃO DEFICIENTE 27.
O que se busca analisar a partir deste ponto é se a atuação do Estado na proteção a um direito social pode ser considerada desproporcional por ser insuficiente à proteção do bem jurídico e, nesse caso, se haveria possibilidade de correção judicial dessa desproporcionalidade. 28.
A proporcionalidade exige um equilíbrio entre a atuação do Estado e o interesse jurídico tutelado.
A busca desse equilíbrio impede, como já verificado acima, comportamentos excessivos, dando origem à consolidada ideia da proibição do excesso.
Entretanto, importa reconhecer que uma atuação estatal insuficiente à proteção do direito também é desproporcional, pois desequilibra a relação entre os interesses jurídicos tutelados e o comportamento do Poder Público.
Em outras palavras, do princípio da proporcionalidade pode ser extraído, tanto uma proibição do excesso, quanto uma proibição de uma proteção insuficiente na implementação dos deveres de proteção do Estado. 29.
Nesse sentido leciona Ingo Sarlet: 4 Para a efetivação de seus deveres de proteção, o Estado – por meio da atuação de seus órgãos ou agentes – corre o risco de afetar de modo desproporcional outro(s) direito(s) fundamental(is), inclusive o(s) direito(s) de quem esteja sendo acusado de violar direitos fundamentais de terceiros.
Esta hipótese corresponde às aplicações correntes do princípio da proporcionalidade como critério de controle de constitucionalidade das medidas restritivas de direitos fundamentais – atuantes, nesta perspectiva, como direitos de defesa.
O princípio da proporcionalidade atua aqui, no plano da proibição de excesso, como um dos principais limites às limitações dos direitos fundamentais.
Por outro lado, poderá o Estado frustrar seus deveres de proteção atuando de modo insuficiente, isto é, ficando aquém dos níveis mínimos de proteção constitucionalmente exigidos ou mesmo deixando de atuar – hipótese, por sua vez, vinculada (ao menos em boa parte) à problemática das omissões inconstitucionais. É neste sentido que – como contraponto à assim designada proibição de excesso – expressiva doutrina e jurisprudência tem admitido a existência daquilo que se convencionou chamar de proibição de insuficiência (no sentido de insuficiente implementação dos deveres de proteção do Estado e como tradução livre do alemão Untermabverbot). 30.
Reconhece-se, desse modo, que o Estado pode agir desproporcionalmente ao efetivar o dever de proteção e afetar um direito fundamental, o que justificaria o controle de constitucionalidade das medidas restritivas com base no princípio da proporcionalidade, pela proibição de excesso.
Mas também poderá frustrar o dever de proteção agindo de forma insuficiente, aquém do mínimo exigido constitucionalmente, o que dará espaço ao controle da constitucionalidade do comportamento estatal com base no princípio da proporcionalidade, revelado como proibição da proteção deficiente. VEDAÇÃO À PROTEÇÃO DEFICIENTE E A EXTENSÃO DE DIREITO SOCIAL 31.
Infere-se, portanto, que “a proibição de proteção deficiente encerra, pois, verdadeira ferramenta de medição do dever de prestação legislativa e de identificação do mínimo exigível a título de imperativo de tutela”5.
A questão que se passa a investigar consiste em saber se, identificada uma atuação deficiente na tutela de um direito social fundamental, é possível a correção pela via judicial. 32.
Para se perquirir sobre a aplicação do princípio da vedação à proteção insuficiente na proteção de direitos sociais, propõe-se ao leitor um exercício teórico: imagine uma mulher que se dirige ao hospital para o parto de seu filho.
Empregada em uma indústria, optou por continuar trabalhando até o momento do parto, a fim de fruir o período de salário-maternidade integralmente ao lado do bebê.
A família depende de sua renda para o sustento, logo, deixar de trabalhar não é uma opção.
Mas, ainda que essa fosse uma alternativa, a futura mãe investiu muito em sua carreira e não pretende renunciar a sua vida profissional, tendo construído um projeto de vida que compatibiliza profissão e maternidade.
Reconhece, todavia, que nos primeiros meses de vida da criança deverá se afastar do trabalho, dedicando atenção integral ao filho.
Sente-se segura, todavia, pois sabe que, para esse período inicial de 120 dias, a lei prevê o pagamento de um benefício previdenciário substitutivo da renda decorrente do trabalho. 33.
Todavia, durante o parto ocorre uma complicação e a criança precisa ser internada na Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
O estado de saúde é crítico e inspira muito cuidado.
Apenas após 110 dias o bebê recebe alta e vai para casa.
Nesse ponto, restam apenas 10 dias para o convívio direto entre mãe e filho, antes do retorno à intensa rotina de trabalho da indústria. 34.
Inconformada com situação, a mãe avalia que a legislação estabelece que a contagem do prazo de 120 dias do salário-maternidade pode ser postergada apenas até o dia do parto6.
Não se conforma, pois sente que a regra não é suficiente para garantir o seu direito – assim como, de seu filho – de se dedicar exclusivamente aos cuidados da criança durante os primeiros meses de convivência familiar.
Uma licença limitada aos 10 dias restantes (120-110 dias) não é capaz de proteger eficientemente o interesse jurídico em jogo. 35.
Existe espaço para o reconhecimento judicial da deficiência protetiva das normas previdenciárias e trabalhistas da maternidade, no caso de necessidade de internação da mãe ou da criança? 36.
A resposta foi dada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento da ADI 6327-MC-Ref.
No voto do Relator, Ministro Fachin, a questão jurídica foi bem delimitada: 7 a probabilidade do direito reside na proteção deficiente das crianças prematuras (e de suas mães), que, embora demandem mais atenção mesmo ao terem alta, têm esse período encurtado, uma vez que o período em que remanescem no hospital é descontado do período de licença. 37. O STF considerou existir uma omissão da norma no tratamento dos casos em que a criança ou a mãe são impedido de conviver em razão de sua internação, gerando uma proteção insuficiente em relação ao interesse jurídico em jogo, motivo pelo qual conferiu interpretação constitucional aos dispositivos legais que tratam da licença8, para ampliar o período de proteção, fixando o termo inicial da contagem do prazo da salário e da licença-maternidade na data da alta hospitalar do recém-nascido ou de sua mãe, o que ocorrer por último. 38.
Nesse caso, a vedação à proteção deficiente permitiu estender um direito a um grupo que, apesar de vivenciar um risco social credor de tutela jurídica, não tinha acesso à proteção.
No tópico seguinte, ficará claro que o princípio também justifica a ampliação da proteção garantida a um determinado grupo quando se mostrar inferior àquela que o ordenamento já confere a outro grupo em situação equivalente. VEDAÇÃO À PROTEÇÃO DEFICIENTE E A PROTEÇÃO DE SITUAÇÕES JURÍDICAS EQUIVALENTES 39.
Carla9, servidora pública federal, obteve guarda provisória, para fins de adoção, de uma criança com pouco mais de 1 ano de vida.
Para conseguir se dedicar à filha nos momentos de adaptação ao novo lar, requereu, à Administração Pública, licença maternidade, que lhe foi concedida pelo prazo de 30 dias, com base no art. 210 da Lei 8.112/1990.
Carla, contudo, procurou o Poder Judiciário, por considerar fazer jus a uma licença de 180 dias, idêntica àquela concedida nos casos de maternidade biológica. 40.
A questão chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF)10, onde foi debatido se a concessão da licença reduzida nos casos de adoção era suficiente à proteção das crianças adotadas – grupo vulnerável e fragilizado, que demanda cuidados para inserção na nova família – e das mães adotivas – que devem ter conservadas sua dignidade e autonomia para eleger projetos de vida, o que inclui a escolha pela adoção. 41.
Ao final, aquela Suprema Corte, sob a relatoria do Ministro Luís Roberto Barroso, reconheceu que a licença maternidade reduzida nos casos de adoção configura uma violação ao “princípio da vedação à proteção deficiente” e fixou a seguinte tese de repercussão geral, vinculada ao Tema 782: “os prazos da licença adotante não podem ser inferiores aos prazos da licença gestante, o mesmo valendo para as respectivas prorrogações.
Em relação à licença adotante, não é possível fixar prazos diversos em função da idade da criança adotada”. 42.
Esse foi apenas um dos diversos precedentes em que o Princípio da Vedação à Proteção Deficiente foi utilizado pelo Supremo Tribunal Federal como critério autorizador do controle judicial de políticas públicas no campo dos direitos sociais.
Como afirmou o STF, em acórdão relatado pelo Ministro Alexandre de Moraes, sobre a necessidade de reforma de centro de ensino de apoio à pessoa com surdez, a jurisprudência da Corte firmou-se no sentido de que “não viola o princípio da separação dos poderes a decisão do Poder Judiciário que, excepcionalmente, determina a implementação de políticas públicas quando evidenciada proteção deficiente a direitos fundamentais arrolados na Constituição Federal”. 11 VEDAÇÃO À PROTEÇÃO INSUFICIENTE E OS BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE 43.
Como exposto acima, os benefícios por incapacidade apresentam hoje uma desproporção entre a proteção estatal e o risco coberto.
Nos casos em que a incapacidade se resume a um caráter temporário ou parcial, o legislador reconhece que a proteção devida corresponde a uma renda de 91% do salário de benefício, independentemente do tempo de contribuição do segurado.
Mas quando o risco social possui caráter significativamente mais grave, por exigir uma invalidez total e permanente, a renda corresponderá a um valor que se inicia em 60% do salário de contribuição e apenas ultrapassa a renda do auxílio temporário se a mulher tiver, no mínimo, 31 anos de contribuição e o homem 36 anos de contribuição. 44.
A questão é grave, pois coloca em jogo a subsistência de pessoas em situação de grande vulnerabilidade, por estarem definitiva e absolutamente impossibilitadas de exercer uma atividade remunerada. 45.
Se o legislador reconhece há décadas que uma incapacidade parcial ou temporária justifica o pagamento de 91% do salário de benefício, parece evidentemente desproporcional uma aposentadoria por incapacidade permanente com valor inferior. É incoerente e revela uma proteção deficiente a norma que fixa o valor da aposentadoria por incapacidade permanente em patamar abaixo ao do auxílio por incapacidade temporária. 46.
Essa ausência de proporcionalidade geradora de proteção deficiente não conduz necessariamente à inconstitucionalidade da norma do art. 26, § 2º da EC 103/19, pois nas situações em que o segurado contar com mais de 30 (mulheres) ou 35 (homens) anos de contribuição, a aposentadoria superará o auxílio e a proporcionalidade entre risco e proteção estará recuperada. 47.
Entretanto, em todos os demais casos – que as regras de experiência demonstram ser a maioria – torna-se necessário um ajuste hermenêutico para a concessão de um tratamento proporcional à situação de invalidez total e permanente, a fim de se impedir a proteção deficiente desse risco social. 48.
Como a inconstitucionalidade apenas estaria presente no caso de aposentadoria com coeficiente inferior ao fixado pelo legislador para o auxílio, seria suficiente, para compatibilizar o art. 26, § 2º da EC 103/19 com o princípio da proporcionalidade, que a norma fosse interpretada de modo que o menor grau de proteção possível para os casos de incapacidade total e permanente fosse aquele garantido às situações de incapacidade parcial ou temporária. 49.
Desse modo, para a aposentadoria por incapacidade permanente, é inadmissível um coeficiente de cálculo inferior a 91% do salário de benefício.
Essa solução evita a quebra de proporcionalidade e respeitaria um patamar protetivo mínimo suficiente à tutela do interesse jurídico em jogo. 50.
Por outro lado, ao adotar parâmetro já consolidado na legislação ordinária, reconhece-se as limitações da capacidade institucional do Judiciário e evita-se efeitos sistêmicos não previstos, uma vez que a posição se ancora em opção política do formulador da política pública, se limitando a ajustes de proporcionalidade, o que indica a preservação da preocupação com o equilíbrio atuarial do sistema. CONCLUSÃO 51.
A atuação judicial no controle de políticas públicas sociais pode, inicialmente, causar alguma perplexidade e críticas relacionadas à legitimidade democrática.
Por esse motivo, o respeito às decisões majoritárias justifica o máximo de esforço em preservar as regras aprovadas no processo legislativo, especialmente, aquelas oriundas do Constituinte Derivado. 52.
São exigidas moderação e contenção no reconhecimento de inconstitucionalidade de normas que buscam estabelecer novos paradigmas para uma política pública, como ocorre no caso de uma Reforma de Previdência. 53.
Moderação e cautela, entretanto, não podem significar subserviência total.
Diante de uma situação de absoluta ausência de proporcionalidade, é necessário buscar a solução jurídica que conserve ao máximo da norma questionada, mas que seja adequada e suficiente para reparar o equilíbrio entre dever de proteção e risco tutelado. 54.
Em um país com índices de desigualdade sociais alarmantes, que revelam a ineficiência das políticas públicas redistributivas, a possibilidade de controlar a deficiência da materialização de direitos sociais pode significar um importante instrumento impulsionador do aprimoramento da atuação estatal na construção de uma sociedade mais igualitária.
Chancelar soluções desproporcionais ensejadoras de proteção deficiente, especialmente quando é possível uma solução hermenêutica ponderada, consiste em abandonar o projeto constitucional para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária. 55.
Na definição da renda mensal da aposentadoria por incapacidade permanente, a solução proporcional e suficiente é conferir ao art. 26, § 2º c/c § 5º da EC 103/19, interpretação conforme a Constituição, para se reconhecer que o coeficiente de cálculo mínimo da aposentadoria por incapacidade permanente não pode ser inferior àquele estabelecido pelo legislador para o auxílio por incapacidade temporária. 56. Dessa forma, a reforma da sentença é medida que se impõe.
Ante o exposto, CONHEÇO E DOU PROVIMENTO AO RECURSO para condenar o INSS a calcular a renda mensal inicial da aposentadoria por incapacidade permanente, com aplicação do coeficiente cálculo de 91% do salário de benefício, com todos os reflexos decorrentes, além de pagar a diferença das parcelas resultante da nova RMI.
Juros e correção na forma do Manual de Cálculos do CJF.
Sem honorários.
Após o trânsito em julgado, certifique-se e remetam-se os autos ao juizado de origem com a respectiva baixa na distribuição. 1.
ALEXY, Robert.
Teoria dos Direitos Fundamentais.
Tradução de Virgílio Afonso da Silva.
São Paulo: Malheiros Editores, 2008, 116-117. 2.
BARROSO, Luís Roberto.
Curso de Direito Constitucional Contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo.
São Paulo: Saraiva, 2019, p. 260. 3.
BARROSO, Luís Roberto.
Razoabilidade e isonomia do direito brasileiro.
In Temas de Direito Constitucional.
Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 157. 4.
SARLET, Ingo Wolfgand.
A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p. 397. 5.
GAVIÃO, Juliana Venturella Nahas.
A proibição de proteção deficiente.
In: Revista do Ministério Público do RS.
Nº 61.
Porto Alegre: mai-out 2008, p. 93-111. 6.
Lei 8.213/91, art. 71: salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade. 7.
ADI 6327 MC-Ref, Relator: Edson Fachin, Tribunal Pleno, julgado em 03/04/2020, Processo Eletrônico DJe-154 DIVULG 18-06-2020 PUBLIC 19-06-2020). 8.
CLT, art. 392, § 1º; Lei 8.213/91, art. 71; Decreto 3.048/99, art. 93. 9.
A descrição é de um caso real, porém o nome foi alterado, para preservar a intimidade da servidora. 10.
RE 778889, Relator: Luís Roberto Barroso, Tribunal Pleno, julgado em 10/03/2016, Acórdão Eletrônica Repercussão Geral - Mérito DJe-159 Divulg 29-07-2016 Public 01-08-2016. 11.
ARE 1393768 AgR, Relator: Alexandre de Moraes, Primeira Turma, julgado em 18/10/2022, Processo Eletrônico DJe-213 Divulg 21-10-2022 Public 24-10-2022). -
27/08/2025 15:10
Expedida/certificada a intimação eletrônica
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27/08/2025 15:10
Expedida/certificada a intimação eletrônica
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27/08/2025 15:10
Conhecido o recurso e provido
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22/08/2025 15:59
Conclusos para decisão/despacho
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12/05/2025 12:54
Remetidos os Autos em grau de recurso para TR - Órgão Julgador: RJRIOTR04G03
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09/05/2025 01:08
Decorrido prazo - Refer. ao Evento: 20
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29/04/2025 18:57
Juntada de Certidão - suspensão do prazo - Motivo: FERIADO JUSTIÇA FEDERAL em 02/05/2025
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14/04/2025 23:27
Juntada de Certidão - suspensão do prazo - 22/04/2025 - Motivo: SUSPENSÃO DE PRAZOS - Portaria PRES/TRF2 nº 233, de 10 de abril de 2025
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12/04/2025 23:59
Confirmada a intimação eletrônica - Refer. ao Evento: 20
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02/04/2025 16:54
Expedida/certificada a intimação eletrônica - Contrarrazões
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20/03/2025 01:04
Decorrido prazo - Refer. ao Evento: 16
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19/03/2025 15:20
Juntada de Petição - Refer. ao Evento: 15
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27/02/2025 23:59
Confirmada a intimação eletrônica - Refer. aos Eventos: 15 e 16
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17/02/2025 12:45
Expedida/certificada a intimação eletrônica - Sentença
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17/02/2025 12:45
Expedida/certificada a intimação eletrônica - Sentença
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17/02/2025 12:45
Julgado improcedente o pedido
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08/08/2024 15:32
Conclusos para julgamento
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30/07/2024 10:38
Juntada de Petição - Refer. ao Evento: 5
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25/06/2024 01:11
Decorrido prazo - Refer. ao Evento: 4
-
15/06/2024 23:59
Confirmada a intimação eletrônica - Refer. aos Eventos: 4 e 5
-
12/06/2024 04:20
Juntada de Petição - Refer. ao Evento: 6
-
12/06/2024 04:20
Confirmada a intimação eletrônica - Refer. ao Evento: 6
-
10/06/2024 15:47
Juntada de Petição
-
05/06/2024 16:38
Expedida/certificada a intimação eletrônica - Requisição - Instrução - Fornecer processo admin. prev. PAP
-
05/06/2024 16:38
Expedida/certificada a citação eletrônica
-
05/06/2024 16:38
Expedida/certificada a intimação eletrônica
-
05/06/2024 16:38
Determinada a citação
-
04/06/2024 16:39
Conclusos para decisão/despacho
-
09/05/2024 12:17
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
12/05/2025
Ultima Atualização
06/09/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
DESPACHO/DECISÃO • Arquivo
SENTENÇA • Arquivo
EXECUÇÃO/CUMPRIMENTO DE SENTENÇA • Arquivo
DESPACHO/DECISÃO • Arquivo
OUTROS • Arquivo
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