TJCE - 3052743-17.2025.8.06.0001
1ª instância - 1ª Vara Civel da Comarca de Fortaleza
Polo Ativo
Polo Passivo
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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21/08/2025 00:00
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 21/08/2025 Documento: 169751615
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21/08/2025 00:00
Intimação
PROCESSO: 3052743-17.2025.8.06.0001 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) ASSUNTO: [Contratos Bancários, Revisão de Juros Remuneratórios, Capitalização/Anatocismo] AUTOR: LEONARDO BRUNO PINHEIRO DE MORAES REU: BANCO BRADESCO S.A.
SENTENÇA 1.
RELATÓRIO Cuida-se de ação revisional ajuizada por LEONARDO BRUNO PINHEIRO DE MORAES em face de BANCO BRADESCO S.A, em que a parte autora alegou, em síntese, que celebrou sete contratos de empréstimo pessoal consignado para trabalhadores do setor público.
Sustentou a abusividade das taxas de juros remuneratórios no período de normalidade do contrato, uma vez que se mostraram acima da taxa média divulgada pelo Bacen, para o período das contratações.
Pontuou a aplicação das normas insculpidas no CDC (Lei n.º 8078/90).
Postulou a adequação da taxa de juros do contrato à taxa média de juros divulgada pelo Banco Central.
Requereu a repetição em dobro dos valores pagos a maior e a concessão dos benefícios da justiça gratuita.
Juntou procuração e documentos.
Foi determinada a emenda à inicial, a fim de que o Autor juntasse aos autos a cópia dos contratos que pretendia revisar.
Manifestação do Promovente sob ID.167058230 com a juntada dos contratos contestados.
Os autos vieram conclusos. É o relatório.
Decido. 2.
FUNDAMENTAÇÃO Inicialmente, defiro ao Autor os benefícios da Justiça Gratuita, nos termos do art. 98 e seguintes do CPC. DO JULGAMENTO DE IMPROCEDÊNCIA LIMINAR DO PEDIDO: Tendo em consideração que todas as matérias versadas nestes autos dispensam a fase instrutória e que já tenho entendimento firmado de que o pleito autoral não merece prosperar, passo a sentenciar a demanda com arrimo no art. 332 do CPC.
Com efeito, tratando os autos do exame de cláusulas contratuais envolvendo contrato de empréstimo consignado, e estando as teses do autor em confronto direto com a jurisprudência sumulada e em julgamento de recurso repetitivo do Superior Tribunal de Justiça - consoante fundamentação a seguir -, deve o pedido ser liminarmente rejeitado com fundamento nos incisos I e II do art. 332 do CPC. DA DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA E DO PEDIDO: Limito-me a apreciar as questões suscitadas na peça inicial, eis que é vedado o conhecimento de ofício de matérias não arguidas pelas partes.
Com efeito, a incidência do Código de Defesa do Consumidor sobre os contratos bancários não autoriza a revisão ex officio de cláusulas contratuais pelo julgador (Súmula 381/STJ), razão pela qual o juiz acha-se adstrito ao conhecimento da matéria efetivamente impugnada.
Passo, então, ao exame dos temas. TEMA 1 - DA NÃO CONFIGURAÇÃO DA ABUSIVIDADE DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS E DOS JUROS PRATICADOS: Quanto ao tema atinente à abusividade das taxas de juros, a SEGUNDA SEÇÃO do STJ, em julgamento submetido ao rito dos recursos repetitivos, apreciando os RESP 1.112879/PR, e RESP 1.112880/PR, julgados em 12/05/2010, (DJe 19/05/2010), relatado pelo Ministra Nancy Andrighi, firmou e consolidou entendimento a respeito das questões processuais e de mérito em debate nas ações revisionais de contratos bancários em que se discutiu os temas acima mencionados.
Na oportunidade, foram fixadas as seguintes teses: 1) Nos contratos de mútuo em que a disponibilização do capital é imediata, deve ser consignado no respectivo instrumento o montante dos juros remuneratórios praticados.
Ausente a fixação da taxa no contrato, deve o juiz limitar os juros à média de mercado nas operações da espécie, divulgada pelo BACEN, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o cliente; 2) Em qualquer hipótese, é possível a correção para a taxa média se verificada abusividade nos juros remuneratórios praticados. Na espécie, pelos dados fornecidos na petição inicial e pelas cláusulas e índices constantes na Cédula de Crédito Bancária contida nos autos, extraio que a taxa anual de juros remuneratórios operada no período de normalidade foi expressamente pactuada, afastando o entendimento jurisprudencial da aplicação da taxa média.
E mesmo que se assim não fosse, a taxa anual acordada [(28,826%); (21,126%); (21,366%); (21,349%); (25,784%); (27,123%); (26,229%)] está dentro da curva média praticada pelo mercado para a operação de crédito de contratação de empréstimo consignado para trabalhadores do setor público no período contratado (abril/2024; fevereiro/2024 e outubro/2024), segundo os índices divulgados pelo Banco Central do Brasil (SÉRIE 20745: Taxa média de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito pessoal consignado para trabalhadores do setor público), não se me afigurando como abusiva. [As taxas médias divulgadas pelo BCB podem ser consultadas na página com a inserção do código 20745].
Vale frisar, dentro dessa perspectiva, que "a circunstância de a taxa de juros remuneratórios praticada pela instituição financeira exceder a taxa média do mercado não induz, por si só, à conclusão de cobrança abusiva, consistindo a referida taxa em um referencial a ser considerado, e não em um limite que deva ser necessariamente observado pelas instituições financeiras" (AgInt no AREsp 1223409/SP, Rel.
Ministro LÁZARO GUIMARÃES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 5ª REGIÃO), QUARTA TURMA, DJe 25/05/2018).
Como média, não se pode exigir que todos os financiamentos/empréstimos sejam feitos segundo essa taxa.
Se isto ocorresse, a taxa média deixaria de ser o que é, para ser um valor fixo.
Há, portanto, que se admitir uma faixa razoável para a variação dos juros.
De toda sorte, a compreensão do STJ é a de considerar dentro da curva média a taxa contratual duas vezes maior que a média do mercado: (AREsp 1332223/RS, MARIA ISABEL GALLOTTI, 06/09/2018) e (AgInt no AREsp 657.807/RS, Rel.
Ministro LÁZARO GUIMARÃES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 5ª REGIÃO), QUARTA TURMA, DJe 29/06/2018).
Concluo, portanto, que no caso concreto não há abusividade na taxa de juros remuneratórios, uma vez que o índice do produto adquirido se encontra dentro da curva média do mercado no período da contratação, segundo a série temporal apresentada pelo BCB e o entendimento consolidado pelo STJ. TEMA 2 - DOS JUROS REMUNERATÓRIOS E MORATÓRIOS: Quanto ao tema da limitação dos juros remuneratórios e moratórios, inscrição e manutenção no cadastro de inadimplentes e da configuração da mora, a SEGUNDA SEÇÃO do STJ, em julgamento submetido ao rito dos recursos repetitivos, apreciando o RESP 1.061.530/RS, julgado em 22/10/2008, (DJe 10/03/2009), relatado pela Ministra Nancy Andrighi, firmou e consolidou entendimento a respeito das questões processuais e de mérito em debate nas ações revisionais de contratos bancários em que se discutiu os temas acima mencionados.
Foram fixadas as seguintes teses: ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, § 1.º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto. Digo eu.
A redução dos juros depende da comprovação efetiva, no caso concreto, da onerosidade excessiva - capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - e cuja aplicação reclama, como parâmetro, o exame da taxa média de mercado para as operações equivalentes.
Desse modo, a simples estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% (doze por cento) ao ano, por si só, não indica abusividade, nos termos da Súmula n.º 382/STJ.
E assim, revisitando o tema, reitero que no caso concreto não há abusividade na taxa de juros remuneratórios, uma vez que o índice do produto adquirido se encontra dentro da curva média praticada e em sintonia com o mercado financeiro, segundo a série temporal apresentada pelo BCB e o entendimento consolidado pelo STJ. ORIENTAÇÃO 2 - CONFIGURAÇÃO DA MORA a) O reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descarateriza a mora; b) Não descaracteriza a mora o ajuizamento isolado de ação revisional, nem mesmo quando o reconhecimento de abusividade incidir sobre os encargos inerentes ao período de inadimplência contratual. ORIENTAÇÃO 3 - JUROS MORATÓRIOS Nos contratos bancários, não-regidos por legislação específica, os juros moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1% ao mês.
Portanto, sendo a hipótese de contrato regido por lei específica (Dec.-lei n.º 911/69), não há de falar em convenção dos juros moratórios (no período da anormalidade contratual) até o limite de 1% ao mês. ORIENTAÇÃO 4 - INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES a) A abstenção da inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes, requerida em antecipação de tutela e/ou medida cautelar, somente será deferida se, cumulativamente: i) a ação for fundada em questionamento integral ou parcial do débito; ii) houver demonstração de que a cobrança indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; iii) houver depósito da parcela incontroversa ou for prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz; b) A inscrição/manutenção do nome do devedor em cadastro de inadimplentes decidida na sentença ou no acórdão observará o que for decidido no mérito do processo.
Caracterizada a mora, correta a inscrição/manutenção. ORIENTAÇÃO 5 - DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO É vedado aos juízes de primeiro e segundo graus de jurisdição julgar, com fundamento no art. 51 do CDC, sem pedido expresso, a abusividade de cláusulas nos contratos bancários.
Enfim, consoante essas orientações acerca do tema atinente aos juros remuneratórios e moratórios, fica rejeitada a redução (ou a limitação) dos juros operados.
Registro, a propósito, que a Taxa Selic não representa a taxa média praticada pelo mercado, sendo, portanto, inviável sua utilização como parâmetro de limitação de juros remuneratórios.
Nesse sentido: AgRg no REsp 958.662/RS, relatora Ministra Nancy Andrighi, DJ de 8.10.2007. TEMA 3 - DA REPETIÇÃO DO INDÉBITO Pela fundamentação já esposada, verifica-se que não há abusividade nem nulidade no contrato que leve à devolução de valores pagos ou cobrados.
Para que isto ocorresse, seria necessário haver conduta ilícita e dano, no entanto, constata-se apenas a celebração de contrato em termos claros e o desdobramento decorrente do uso do crédito do consumidor.
Improcedente, portanto, o pleito em questão.
Por derradeiro, e demais disso, o consumidor que contrata o serviço bancário, bem ciente da cobrança das cláusulas contratuais, do juro expressamente praticado e das tarifas impostas e, depois, ingressa em juízo requerendo revisão e devolução, como se surpreso estivesse, evidentemente não respeita a indispensável boa-fé objetiva que deve permear toda contratação.
Trata-se de violação aos deveres anexos de boa-fé objetiva, também chamadas figuras parcelares ou reativas, em evidente venire contra factum proprium, sob a modalidade tu quoque, não sendo dado ao consumidor, ou a quem quer que seja, agir de maneira desleal e de inopino, surpreendendo a outra parte com seu comportamento contraditório.
Ressalto que há a necessidade de se interpretar a situação existente, privilegiando os princípios da função social e da boa-fé objetiva, da qual se extraem os chamados deveres anexos ou laterais de conduta, tais como os deveres de colaboração, fidúcia, respeito, honestidade e transparência, que devem estar presentes nas relações contratuais como a que ora se examina.
Isso porque o princípio da boa-fé objetiva, quando relacionado à interpretação dos contratos e enquanto parâmetro de estabelecimento de padrão ético aos contraentes nas relações obrigacionais, ensina que o juiz deve analisar o negócio jurídico de forma global para verificar se, de alguma forma, deliberada ou não, uma das partes teve sua expectativa frustrada, pelo abuso da confiança por ela depositada.
A boa-fé objetiva constitui um modelo de conduta social ou um padrão ético de comportamento que impõe, concretamente, a todo o cidadão que, na sua vida de relação, atue com honestidade, lealdade e probidade.
Não se confunde com a boa-fé subjetiva (guten Glauben), que é o estado de consciência ou a crença do sujeito de estar agindo em conformidade com as normas do ordenamento jurídico (v.g. posse de boa-fé, adquirente de boa-fé, cônjuge de boa-fé no casamento nulo).
O princípio da boa-fé objetiva (Treu und Glauben) foi consagrado pelo § 242 do BGB, estabelecendo simplesmente o seguinte: "§ 242 - O devedor deve cumprir a prestação tal como exige a boa-fé e os costumes do tráfego social".
A partir, especialmente, dessa cláusula geral de boa-fé, a doutrina alemã desenvolveu o princípio no âmbito do sistema de direito privado.
No plano do Direito das Obrigações, a boa-fé objetiva (Treu und Glauben) apresenta-se, especialmente, como um modelo ideal de conduta, que se exige de todos os integrantes da relação obrigacional (devedor e credor) na busca do correto adimplemento da obrigação, que é a sua finalidade última.
Almeida Costa, após afirmar que a boa-fé objetiva constitui um standard de conduta ou um padrão ético-jurídico, esclarece que ela estabelece que "os membros de uma comunidade jurídica devem agir de acordo com a boa-fé, consubstanciando uma exigência de adotarem uma linha de correção e probidade, tanto na constituição das relações entre eles como no desempenho das relações constituídas.
E com o duplo sentido dos direitos e dos deveres em que as relações jurídicas se analisam: importa que sejam aqueles exercidos e estes cumpridos de boa-fé.
Mais ainda: tanto sob o ângulo positivo de se agir com lealdade, como sob o ângulo negativo de não se agir com deslealdade" (COSTA, Mário Júlio Brito de Almeida.
Direito das Obrigações, 1991. p. 93-94). Com efeito, a autonomia privada representa um dos componentes primordiais da liberdade.
Nas palavras de Daniel Sarmento, essa autonomia significa: "(…) o poder do sujeito de auto-regulamentar seus próprios interesses, de autogoverno de sua esfera jurídica, e tem como matriz a concepção de ser humano como agente moral, dotado de razão, capaz de decidir o que é bom ou ruim para si, e que deve ter liberdade para guiar-se de acordo com estas escolhas, desde que elas não perturbem os direitos de terceiros nem violem outros valores relevantes da comunidade (…)" (SARMENTO, Daniel.
Direitos Fundamentais e Relações Privadas, p. 154) Os limites à liberdade contratual são traçados por princípios constitucionais e tem por objetivo assegurar interesses sociais (interesses de terceiros) no vínculo contratual.
Assim, a autonomia privada deverá estar alinhada com os padrões definidos por preceitos de ordem e autonomia pública, como é o caso da lealdade contratual e da boa-fé objetiva.
Com igual acerto, disserta Clóvis Veríssimo do Couto e Silva: "Os deveres resultantes do princípio da boa fé são denominados deveres secundários, anexos ou instrumentais.
Impõe-se, entretanto, cautela na aplicação do princípio da boa-fé, pois, do contrário, poderia resultar verdadeira subversão da dogmática, aluindo os conceitos fundamentais da relação jurídica, dos direitos e dos deveres. (…) deveres secundários comportam tratamento que abranja toda a relação jurídica.
Assim, podem ser examinados durante o curso ou o desenvolvimento da relação jurídica, e, em certos casos, posteriormente ao adimplemento da obrigação principal.
Consistem em indicações, atos de proteção, como o dever da afastar danos, atos de vigilância, da guarda, de cooperação, de assistência" (A obrigação como processo - reimpressão - Rio de Janeiro: Editora FGV. 2007, p. 37). 3.
DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO LIMINARMENTE IMPROCEDENTE o pedido, ficando mantidas inalteradas as cláusulas contratuais celebradas.
Condeno a parte Autora nas custas processuais, cuja cobrança e exigibilidade ficam suspensas, ante a gratuidade deferida.
Sem honorários, uma vez que não houve formação do contraditório.
Decorrido o prazo legal sem que tenha sido interposto eventual recurso voluntário, certifiquem o trânsito em julgado e arquivem estes autos com baixa. -
20/08/2025 10:17
Expedida/certificada a comunicação eletrônica Documento: 169751615
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20/08/2025 10:17
Julgado improcedente o pedido
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30/07/2025 16:54
Conclusos para despacho
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30/07/2025 15:28
Juntada de Petição de Petição (outras)
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09/07/2025 14:11
Confirmada a comunicação eletrônica
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09/07/2025 00:00
Intimação
PROCESSO: 3052743-17.2025.8.06.0001 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) ASSUNTO: [Contratos Bancários, Revisão de Juros Remuneratórios, Capitalização/Anatocismo] AUTOR: LEONARDO BRUNO PINHEIRO DE MORAES REU: BANCO BRADESCO S.A.
DECISÃO Vistos etc.
O direito do consumidor à facilitação da prova das suas alegações em juízo, operada através da inversão do ônus probante, com amparo no art. 6.º, VIII da Lei 8.078/90, é regra de instrução, nas hipóteses em que seja necessário fazê-la, para a solução da lide.
E essa necessidade se apura mediante um critério de verossimilhança ou de hipossuficiência das partes envolvidas no processo.
De efeito, tal inversão não é op legis, cabendo ao magistrado avaliar acerca da presença de seus pressupostos. No sentido do texto, vale ressaltar o entendimento de Nelson Rosenvald e Cristiano de Farias: "Somente quando o juiz se mostrar perplexo, sem o convencimento firmado a partir da prova produzida, é que deverá lançar mão da inversão do ônus da prova com o propósito de julgar a causa.
Assim, é que, mesmo em relação de consumo, o momento de inverter o ônus da prova é o de julgamento da causa, em face de seu caráter eminentemente técnico, na medida em que o consumidor, como parte reconhecidamente mais fraca e vulnerável na relação de consumo, tem de ser tratado de forma diferente, a fim de que se alcance a igualdade real entre os participes da relação" (Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald, Direito Civil - Teoria Geral, 4.ª edição, pg. 559, Ed.
Lúmen Júris). Esse é também o magistério da jurisprudência do STJ que consagra o entendimento no sentido de que "a inversão do ônus da prova fica a critério do juiz, conforme apreciação dos aspectos de verossimilhança da alegação do consumidor e de sua hipossuficiência, conceitos intrinsecamente ligados ao conjunto fático-probatório dos autos delineado nas instâncias ordinárias, cujo reexame é vedado em sede especial, ut súmula nº 07/STJ" (AgRg no REsp 662.891/PR, 4ª Turma, Relator Ministro FERNANDO GONÇALVES, DJ de 16.5.2005). No mesmo sentido: "PROCESSUAL CIVIL.
ADMINISTRATIVO.
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
MAJORAÇÃO DE TARIFAS TELEFÔNICAS.
ALEGADA ABUSIVIDADE.
PEDIDO DE INVERSÃO DO ÔNUS PROBATÓRIO.
NECESSIDADE DO REEXAME DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS.
IMPOSSIBILIDADE NA VIA RECURSAL ELEITA.
SÚMULA 7/STJ. 1. "A inversão do ônus da prova fica a critério do juiz, conforme apreciação dos aspectos de verossimilhança da alegação do consumidor e de sua hipossuficiência, conceitos intrinsecamente ligados ao conjunto fático-probatório dos autos delineado nas instâncias ordinárias, cujo reexame é vedado em sede especial" (AgRg no REsp 662.891/PR, 4ª Turma, Rel.
Min.
Fernando Gonçalves, DJ de 16.5.2005). (...) 3.
Agravo regimental desprovido." (AgRg no REsp 851.592/SC, Rel.
Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03/02/2009, DJe 26/02/2009) RECURSO ESPECIAL.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL.
AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. ÔNUS DA PROVA.
TEORIA DA VEROSSIMILHANÇA PREPONDERANTE.
COMPATIBILIDADE, NA HIPÓTESE ESPECÍFICA DOS AUTOS, COM O ORDENAMENTO PROCESSUAL VIGENTE.
CONVICÇÃO DO JULGADOR.
LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA.
PERSUAÇÃO RACIONAL.
ARTIGOS ANALISADOS: 212, IV, DO CC; 126, 131, 273, 333, 436 E 461 DO CPC. 1.
Ação de reparação por danos materiais e compensação por danos morais ajuizada em 22/7/1999.
Recurso especial concluso ao Gabinete em 7/10/2011. 2.
Controvérsia que se cinge a definir se o julgamento do mérito da presente demanda, mediante aplicação da teoria da verossimilhança preponderante, violou a regra de distribuição do ônus da prova. 3.
De acordo com o disposto no art. 333 do CPC, ao autor incumbe provar os fatos constitutivos de seu direito; ao réu, os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor. 4.
O ônus da prova, enquanto regra de julgamento - segundo a qual a decisão deve ser contrária à pretensão da parte que detinha o encargo de provar determinado fato e não o fez -, é norma de aplicação subsidiária que deve ser invocada somente na hipótese de o julgador constatar a impossibilidade de formação de seu convencimento a partir dos elementos constante dos autos. 5.
Em situações excepcionais, em que o julgador, atento às peculiaridades da hipótese, necessita reduzir as exigências probatórias comumente reclamadas para formação de sua convicção em virtude de impossibilidades fáticas associadas à produção da prova, é viável o julgamento do mérito da ação mediante convicção de verossimilhança. 6.
A teoria da verossimilhança preponderante, desenvolvida pelo direito comparado e que propaga a ideia de que a parte que ostentar posição mais verossímil em relação à outra deve ser beneficiada pelo resultado do julgamento, é compatível com o ordenamento jurídico-processual brasileiro, desde que invocada para servir de lastro à superação do estado de dúvida do julgador. É imprescindível, todavia, que a decisão esteja amparada em elementos de prova constantes dos autos (ainda que indiciários).
Em contrapartida, permanecendo a incerteza do juiz, deve-se decidir com base na regra do ônus da prova. 7.
O juiz deve formar seu convencimento a partir dos elementos trazidos a juízo, mas constitui prerrogativa sua apreciar livremente a prova produzida. 8.
No particular, infere-se da leitura do acórdão recorrido que os fatos alegados no curso da fase de instrução foram examinados pelo Tribunal de origem e que a prova produzida foi devidamente valorada, de modo que a formação da convicção dos julgadores fundou-se nas circunstâncias fáticas reveladas pelo substrato probatório que integra os autos. 9.
Negado provimento ao recurso especial. (RESP 1320295/RS, Rel.
Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/10/2013, DJe 29/11/2013) Em conclusão: a inversão do ônus da prova, que fica à critério do juiz, segundo critérios de (a) hipossuficiência do autor e de (b) verossimilhanças de suas alegações, é regra de instrução, devendo a decisão judicial que a determinar ser proferida "preferencialmente na fase de saneamento do processo ou, pelo menos, assegurando-se à parte a quem não incumbia inicialmente o encargo, a reabertura de oportunidade (RESP 802.832/MG, 2ª Seção, DJ 21.9.2011)" (ERESP 422.778/SP, Rel.
Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Rel. p/ Acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 29/02/2012, DJe 21/06/2012). No caso dos autos, não há, nem uma coisa, nem outra. No que diz respeito à verossimilhança, não é razoável [verossímil] conceber que a autora, ao adquirir produto bancário de financiamento em casa especializada, seja através de agente financeiro, seja pela própria instituição financeira, não indagasse acerca das taxas de juros do financiamento do mercado financeiro para saber qual a mais vantajosa e também o valor da parcela mensal.
A inversão do ônus da prova não pode se prestar a transmitir ao fornecedor de produtos ou serviços a incumbência de produzir a contraprova de fato que a experiência comum mostra desarrazoado. As regras e práticas comerciais arraigadas na sociedade afirmam que as empresas que trabalham com empréstimo consignado/financiamento sempre divulgam e orientem aos que se mostram interessados na aquisição de seus produtos, os índices de maior e menor valor, dentre as praticadas pelo mercado financeiro, além do que a conduta daquele que pretenda tomar empréstimo reclama por uma análise detalhada sobre o produto e, principalmente, da forma de pagamento, para que só então se conclua pela aquisição.
Seria, assim, pouco aceitável a tese de que a autora tomou empréstimo sem averiguar as taxas de juros empregadas.
Em segundo lugar, não me parece crível a afirmação da autora de que após o pagamento de algumas parcelas, não tivesse condições financeiras de continuar a adimplir as parcelar, em razão do seu elevado valor. É inaceitável a afirmação de surpresa com os encargos que lhe foram apresentados ou com a alegada falta de condições financeiras.
Não há, portanto, verossimilhança em suas alegações. A hipossuficiência, por sua vez, também não se verifica, seja do ponto de vista econômico, seja do ponto de vista técnico ou jurídico.
Inicialmente, imperioso divisar que o conceito do estado de hipossuficiente, de presunção relativa [iurus tantum], é entendida como característica particular de cada consumidor, no caso concreto, a partir dos parâmetros dispostos no art. 6.º, VIII do CDC, do conceito de vulnerabilidade, traço inerente a todo consumidor, com presunção absoluta [iuris et de iure], conforme disposto no art. 4.º, I. A matéria em discussão já afasta por si só qualquer discussão quanto à hipossuficiência econômica.
A hipossuficiência técnica, por sua vez, entendida como decorrente do fato de o consumidor não possuir conhecimentos específicos sobre os produtos e/ou serviços que está adquirindo, ficando sujeito aos imperativos do mercado, tendo como único aparato a confiança na boa-fé da outra parte, é afastada pelo argumento que utilizei quando falei da verossimilhança.
Não é razoável supor que alguém, ao tomar empréstimo, com destacado dispêndio financeiro, não se informe ao menos quanto aos encargos financeiros praticados.
Por fim, no que diz respeito à hipossuficiência jurídica, também não diviso presente, sobretudo, pelo esclarecimento que mostrou o autor, a partir da leitura da petição inicial. Não há, portanto, por qualquer ótica que se analise a questão, motivo algum para que seja operada a inversão do ônus da prova em favor do consumidor nos casos como o dos autos. Fixada, portanto, a premissa de que cabe ao autor a demonstração dos fatos constitutivos de seu direito (art. 373, I, CPC), com a apresentação do inteiro teor das cláusulas do contrato para exame das cláusulas e das teses afirmadas na petição inicial, indefiro a inversão do ônus, determinando que o promovente complete a petição inicial, fazendo a juntada aos autos de todas as cédulas de crédito bancárias que pretende revisar, no prazo de 15 (quinze) dias. Todavia, se já tenha tentado obter o contrato junto à instituição financeira, em respeito ao princípio da vedação às decisões-surpresa (art. 10, CPC), faculto à autora comprovar, em 15 (quinze) dias, a apresentação de requerimento administrativo válido e eficaz (com procuração com poderes especiais e pagamento dos encargos) dirigido à instituição financeira com o fim de obter a cédula de crédito que pretende a exibição (TEMA 648/STJ: "A propositura de ação cautelar de exibição de documentos bancários (cópias e segunda via de documentos) é cabível como medida preparatória a fim de instruir a ação principal, bastando a demonstração da existência de relação jurídica entre as partes, a comprovação de prévio pedido à instituição financeira não atendido em prazo razoável, e o pagamento do custo do serviço conforme previsão contratual e normatização da autoridade monetária") . Advirto que, decorrido o prazo assinalado sem que haja a comprovação, a petição inicial será indeferida e o processo extinto pela falta de interesse de agir com fundamento no art. 485, VI c/c o art. 330, III, do CPC.
Publiquem.
Fortaleza, data e hora registradas no sistema.
Juiz Cristiano Magalhães -
09/07/2025 00:00
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 09/07/2025 Documento: 164172372
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08/07/2025 16:17
Expedida/certificada a comunicação eletrônica Documento: 164172372
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08/07/2025 16:17
Determinada a emenda à inicial
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08/07/2025 11:23
Conclusos para decisão
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08/07/2025 11:23
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
08/07/2025
Ultima Atualização
21/08/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
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