TJES - 5008665-81.2024.8.08.0000
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gab. Desemb. Dair Jose Bregunce de Oliveira - Vitoria
Polo Passivo
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Partes
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
-
22/07/2025 00:00
Intimação
ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO PROCESSO Nº 5008665-81.2024.8.08.0000 AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) AGRAVANTE: SAMARCO MINERACAO S.A.
AGRAVADO: ANTONIO PAULO SANTOS DA SILVA RELATOR(A):DAIR JOSE BREGUNCE DE OLIVEIRA ______________________________________________________________________________________________________________________________________________ EMENTA DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR.
AGRAVO DE INSTRUMENTO.
DANO AMBIENTAL DECORRENTE DE ROMPIMENTO DE BARRAGEM.
INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA.
APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR POR EQUIPARAÇÃO.
HIPOSSUFICIÊNCIA TÉCNICA DO AUTOR.
POSSIBILIDADE DE REDISTRIBUIÇÃO DINÂMICA DO ÔNUS PROBATÓRIO.
RECURSO DESPROVIDO.
I.
CASO EM EXAME Agravo de instrumento interposto por Samarco Mineração S.
A. contra decisão proferida nos autos da ação de indenização ajuizada por Antonio Paulo Santos da Silva, pescador profissional, que determinou a inversão do ônus da prova em desfavor das rés, com fundamento no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor c/c art. 373, §1º, do CPC.
A agravante sustentou a inaplicabilidade do CDC, a inexistência de relação de consumo, e a impossibilidade de imposição de prova diabólica, pleiteando a revogação da inversão probatória.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (I) definir se é juridicamente cabível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao caso, por equiparação da vítima de desastre ambiental a consumidor; (II) estabelecer se é válida, nos termos do CPC, a inversão do ônus da prova em desfavor da empresa de mineração demandada.
III.
RAZÕES DE DECIDIR Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor às vítimas de desastres ambientais, mesmo que não figurem diretamente na cadeia de consumo, nos termos do art. 17 do CDC, art. 21 da Lei nº 7.347/1985 e conforme jurisprudência do STJ, que reconhece a figura do consumidor bystander.
A jurisprudência do STJ e deste Tribunal estadual admite a inversão do ônus da prova nas ações indenizatórias por danos ambientais, em razão da hipossuficiência técnica e econômica da vítima frente ao empreendedor da atividade potencialmente perigosa, alinhando-se ao princípio da precaução e ao in dubio pro natura.
A inversão do ônus da prova não exime a parte autora de apresentar elementos indiciários mínimos sobre sua condição de pescador e os danos alegados, sob pena de imposição de prova diabólica à parte ré, vedada pelo art. 373, §2º, do CPC.
A decisão agravada observou corretamente os critérios legais e jurisprudenciais para redistribuição dinâmica do ônus da prova, limitando-a àqueles fatos cujo acesso e domínio probatório são notoriamente mais fáceis à parte ré, como dados técnicos e impactos ambientais do rompimento da barragem.
A verossimilhança das alegações do autor decorre do contexto notório do desastre ambiental e de documentos apresentados (RGP e CNIS), que demonstram, ainda que indiciariamente, sua vinculação à atividade pesqueira à época dos fatos.
IV.
DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido.
Tese de julgamento: Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, por equiparação, às vítimas de desastre ambiental, nos termos do art. 17 do CDC e art. 21 da Lei nº 7.347/1985.
A inversão do ônus da prova nas ações por dano ambiental é admissível diante da hipossuficiência técnica e econômica do autor, da aplicação dos princípios da precaução e do in dubio pro natura, e da jurisprudência consolidada do STJ.
A redistribuição do ônus da prova deve respeitar os limites do art. 373, §2º, do CPC, não podendo impor à ré prova de fato negativo, permanecendo com o autor o encargo de demonstrar os danos concretos e o nexo causal com o evento danoso.
Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 6º, VIII e 17; CPC, arts. 373, §§1º e 2º; Lei nº 7.347/1985, art. 21.
Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 2.411.734/MG, Rel.
Min.
Maria Isabel Gallotti, DJE 13/05/2024; STJ, REsp 972.902/RS, Rel.
Min.
Eliana Calmon, DJe 14/09/2009; STJ, REsp 1.818.008/RO, Rel.
Min.
Herman Benjamin, DJe 22/10/2020; TJES, AI 5014842-61.2024.8.08.0000, Rel.
Des.
Jorge Henrique Valle dos Santos, Publ. 09/05/2025; TJES, AI 5003361-09.2021.8.08.0000, Rel.
Des.
Júlio Cesar Costa de Oliveira, julgado em 13/01/2022. ______________________________________________________________________________________________________________________________________________ ACÓRDÃO Decisão: À unanimidade, conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Órgão julgador vencedor: Gabinete Des.
DAIR JOSÉ BREGUNCE DE OLIVEIRA Composição de julgamento: Gabinete Des.
DAIR JOSÉ BREGUNCE DE OLIVEIRA - CARLOS MAGNO MOULIN LIMA - Relator / Gabinete Desª.
ELIANA JUNQUEIRA MUNHOS FERREIRA - ELIANA JUNQUEIRA MUNHOS FERREIRA - Vogal / Gabinete Des.
ROBSON LUIZ ALBANEZ - ROBSON LUIZ ALBANEZ - Vogal VOTOS VOGAIS Gabinete Desª.
ELIANA JUNQUEIRA MUNHOS FERREIRA - ELIANA JUNQUEIRA MUNHOS FERREIRA (Vogal) Acompanhar Gabinete Des.
ROBSON LUIZ ALBANEZ - ROBSON LUIZ ALBANEZ (Vogal) Acompanhar ______________________________________________________________________________________________________________________________________________ RELATÓRIO _______________________________________________________________________________________________________________________________________________ NOTAS TAQUIGRÁFICAS ________________________________________________________________________________________________________________________________________________ VOTO VENCEDOR AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 5008665-81.2024.8.08.0000.
AGRAVANTE: SAMARCO MINERAÇÃO S.
A.
AGRAVADO: ANTONIO PAULO SANTOS DA SILVA.
RELATOR: DES.
SUBSTITUTO CARLOS MAGNO MOULIN LIMA.
VOTO Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por Samarco Mineração S.
A. em face da respeitável decisão (id 8890746 – p. 1-7) proferida pelo meritíssimo Juiz de Direito da Segunda Vara Cível de Serra, Comarca da Capital, nos autos da ação indenizatória nº 5010132-82.2023.8.08.0048, ajuizada por Antonio Paulo Santos da Silva também em face de Fundação Renova, Vale S.
A. e BHP Billiton Brasil Ltda.
A referida decisão interlocutória inverteu o ônus da prova em desfavor das rés, ora agravante, com fulcro no artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, cumulado com o artigo 373, §1º, do Código de Processo Civil.
Em suas razões recursais (id 8890746 – p. 1-22), a agravante sustenta, em suma, a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor à espécie, por inexistir relação de consumo, mesmo por equiparação, entre os atingidos pelo rompimento da barragem de Fundão e a Samarco Mineração S.
A..
Defende que a inversão do ônus da prova não poderia ter sido decretada com base na legislação consumerista, devendo a matéria ser regida pelo Código Civil, recaindo sobre o autor, ora agravado, o ônus de comprovar os fatos constitutivos de seu direito.
Subsidiariamente, alega a impossibilidade da inversão do ônus da prova mesmo sob a ótica do Código de Processo Civil, pois o §2º do artigo 373 do referido diploma veda a distribuição diversa do ônus probatório caso a desincumbência do encargo se revele impossível ou excessivamente difícil, caracterizando “prova diabólica”.
Aduz, ainda, a inexistência de verossimilhança nas alegações do agravado, que não teria comprovado o exercício da atividade pesqueira com constância e regularidade à época do rompimento da barragem, nem as licenças necessárias ou a efetiva redução de renda.
Pugnou pela atribuição de efeito suspensivo e, ao final, pelo provimento do recurso para reformar a decisão e revogar a inversão do ônus da prova.
A controvérsia recursal reside na aferição da juridicidade da decisão de primeiro grau que inverteu o ônus da prova em desfavor da agravante, em ação indenizatória decorrente do rompimento da barragem de Fundão. 1. - Da aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor e da inversão do ônus probatório A decisão recorrida fundamentou a inversão do ônus probatório no artigo 6º, inciso VIII, do CDC, e no artigo 373, §1º, do CPC, reconhecendo a relação de consumo por equiparação e a hipossuficiência do autor, além da maior facilidade probatória das rés.
O agravado, na exordial da ação de origem, narra que o rompimento da barragem de Fundão, de responsabilidade da agravante, resultou na contaminação ambiental que obstou sua atividade pesqueira, fonte de seu sustento.
Conforme já delineado na decisão que indeferiu o pleito liminar (id 9104846 – p. 1-8), a relação jurídica em discussão, no que tange aos danos individuais homogêneos oriundos de desastre ambiental, atrai a incidência das normas protetivas do consumidor.
Tal entendimento decorre do disposto no artigo 21 da Lei nº 7.347/1985 (Lei da Ação Civil Pública), que estende a aplicação do Título III do CDC à defesa em juízo dos interesses e direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos.
O artigo 17 do CDC, por sua vez, equipara a consumidor todas as vítimas do evento danoso (bystander).
A jurisprudência do colendo Superior Tribunal de Justiça tem reiteradamente aplicado o CDC a casos de danos individuais reflexos de desastres ambientais, reconhecendo a vulnerabilidade do lesado frente ao agente poluidor.
Neste sentido “É possível a aplicação do CDC em se tratando de dano ambiental àqueles que não se insiram na cadeia de consumo, ante a previsão do art. 17 do CDC, que estabelece a aplicação do microssistema consumerista a todas as vítimas do evento danoso, considerados como bystanders.” (STJ; AgInt-AREsp 2.411.734; Proc. 2023/0254574-5; MG; Quarta Turma; Relª Min.
Maria Isabel Gallotti; DJE 13/05/2024) Ou seja, o colendo STJ, em casos envolvendo dano ambiental, tem se posicionado no sentido de que, como corolário do princípio in dubio pro natura, “justifica-se a inversão do ônus da prova, transferindo para o empreendedor da atividade potencialmente perigosa o ônus de demonstrar a segurança do empreendimento, a partir da interpretação do art. 6º, VIII, da Lei 8.078/1990 c/c o art. 21 da Lei 7.347/1985, conjugado ao Princípio Ambiental da Precaução” (REsp 972.902/RS, Rel.
Min.
Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 14.9.2009).
Veja-se também o REsp 1.818.008/RO, da relatoria do Ministro Herman Benjamin, tendo ainda assentado o colendo STJ que “a inversão do ônus da prova fica a critério do juiz, conforme apreciação dos aspectos de verossimilhança da alegação do consumidor e de sua hipossuficiência, conceitos intrinsecamente ligados ao conjunto fático-probatório dos autos delineado nas instâncias ordinárias, cujo reexame é vedado em sede especial” (AgInt no REsp 1652784/SP, Rel.
Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, data do julgamento: 24-08-2020, data da publicação/fonte: DJe 31-08-2020).
Ainda nessa ordem de ideias, o colendo STJ entende pela inversão do ônus da prova em desfavor do empreendedor da atividade potencialmente perigosa, a teor dos seguintes excertos de venerandos acórdãos: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL.
AGRAVO DE INSTRUMENTO.
AÇÃO INDENIZATÓRIA.
INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA.
POSSIBILIDADE.
SÚMULA Nº 83/STJ.
DANO AMBIENTAL. […] 1.
Com efeito, nos termos do entendimento jurisprudencial desta Corte Superior, “em se tratando de ação indenizatória por dano ambiental, a responsabilidade pelos danos causados é objetiva, pois fundada na teoria do risco integral, sendo possível a inversão do ônus da prova” (AgInt no AREsp n. 2.297.698/ES, relator o Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 4/12/2023, DJe de 7/12/2023).” […] (AgInt-REsp 2.119.784, Proc. 2024/0019880-7, MG, Terceira Turma, Rel.
Min.
Marco Aurélio Bellizze, data da publicação/fonte: DJe 15-05-2024) PROCESSUAL CIVIL.
AMBIENTAL.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
DANO AMBIENTAL.
BAÍA DE GUANABARA E ECOSSISTEMA RELACIONADO.
ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS ARTS. 489 E 1.022, AMBOS DO CPC/2015.
INEXISTÊNCIA. ÔNUS DA PROVA.
INVERSÃO.
IN DUBIO PRO NATURA.
ACÓRDÃO ALINHADO COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ.
I - Na origem, trata-se de agravo de instrumento interposto por Petróleo Brasileiro S/A - Petrobras contra a decisão que, nos autos da ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal contra a CEF, o Estado do Rio de Janeiro e Instituto Estadual do Ambiente - INEA, afastou a preliminar de incompetência da Justiça Federal, deferiu o pedido de inversão do ônus probatório formulado pelo autor e impôs aos réus a demonstração de que suas atividades não causam danos ao meio ambiente. […] VIII - O acórdão recorrido está em consonância ao entendimento jurisprudencial desta Corte Superior, o qual é firme no sentido de que, como corolário do princípio in dubio pro natura, “justifica-se a inversão do ônus da prova, transferindo para o empreendedor da atividade potencialmente perigosa o ônus de demonstrar a segurança do empreendimento, a partir da interpretação do art. 6º, VIII, da Lei 8.078/1990 c/c o art. 21 da Lei 7.347/1985, conjugado ao Princípio Ambiental da Precaução”".
Nesse sentido, por oportuno: (REsp n. 1.720.576/RO, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 5/6/2018, DJe de 16/9/2020, REsp n. 1.818.008/RO, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 13/10/2020, DJe de 22/10/2020 e AgInt no AREsp 1.311.669/SC, Rel.
Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, DJe 6/12/2018) IX - Agravo interno improvido. (AgInt no AREsp n. 2.055.990/RJ, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, data do julgamento: 17-4-2023, data da publicação/fonte: DJe de 20-4-2023.) AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
AGRAVO DE INSTRUMENTO.
DANO AMBIENTAL.
FALTA DE INTERESSE DE AGIR.
AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.
SÚMULAS 282 E 356/STF.
CAUSA DE PEDIR FUNDAMENTADA EM DANO AMBIENTAL.
PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO.
INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA.
POSSIBILIDADE.
SÚMULAS 7 E 83/STJ.
AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. […] 2.
Constata-se dos autos que a causa de pedir da ação inicial foi lastreada na reparação de danos materiais e morais decorrente de dano ambiental. 3.
A jurisprudência desta Corte é no sentido de admitir a inversão do ônus da prova em ação indenizatória decorrente de dano ambiental. […] (AgInt no AREsp n. 2.114.565/ES, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, data do julgamento: 6-3-2023, data da publicação/fonte: DJe de 13-3-2023.) A jurisprudência deste egrégio Tribunal de Justiça aponta para o mesmo sentido: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
AGRAVO DE INSTRUMENTO.
AÇÃO INDENIZATÓRIA.
DANO AMBIENTAL.
ROMPIMENTO DE BARRAGEM EM MARIANA/MG.
INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA.
RELAÇÃO DE CONSUMO POR EQUIPARAÇÃO.
CONSUMIDOR BYSTANDER.
POSSIBILIDADE.
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. - O artigo 17 do CDC equipara às vítimas de eventos danosos causados por produtos ou serviços todas as vítimas do evento (bystanders), permitindo-lhes o tratamento de consumidor por equiparação, o que inclui a facilitação de defesa de seus direitos. 2 - A responsabilidade civil por dano ambiental é objetiva, solidária e ilimitada, fundada nos princípios do poluidor-pagador e da precaução, sendo aplicável a inversão do ônus da prova em favor da vítima ambiental para assegurar a facilitação do acesso à justiça. 3 - A jurisprudência do STJ reconhece que, diante de danos ambientais, a inversão do ônus da prova visa à proteção das vítimas, cabendo ao poluidor comprovar que o empreendimento não causou ou não potencializou os danos alegados (STJ, RESP 1.454.281/MG; RESP 1.720.576/RO). 4 - A inversão do ônus da prova não exime a vítima de demonstrar elementos mínimos de sua pretensão indenizatória, especialmente em relação aos danos materiais e morais, sob pena de configurar prova diabólica contra a parte requerida. 5 - Em demandas ambientais, a distribuição dinâmica do ônus da prova é recomendada, atribuindo à parte com maior capacidade técnica e financeira o encargo de produzir provas complexas e custosas. 6 - A decisão recorrida, ao inverter o ônus da prova com base na hipossuficiência técnica e econômica dos autores e na teoria do consumidor bystander, encontra respaldo na legislação consumerista e na jurisprudência consolidada. 7 - Recurso conhecido e provido em parte. (TJES; AI 5014842-61.2024.8.08.0000; Segunda Câmara Cível; Rel.
Des.
Jorge Henrique Valle dos Santos; Publ. 09/05/2025) AGRAVO DE INSTRUMENTO.
AÇÃO INDENIZATÓRIA.
ROMPIMENTO DE BARRAGEM DE MINERAÇÃO.
DANO AMBIENTAL.
PREJUÍZOS MORAIS E MATERIAIS.
DESENVOLVIMENTO DE ATIVIDADE POTENCIALMENTE PERIGOSA PELA RÉ.
INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA.
APLICABILIDADE. 1. - A regência da relação jurídica estabelecida entre os autores da demanda originária e a ré no que tange aos direitos alegados pelos primeiros dá-se pelo Código de Defesa do Consumidor, por imposição do artigo 21 da Lei n. 7.347, de 24 de julho de 1985, tendo em vista que a ação tem como causa de pedir alegado evento danoso decorrente diretamente de dano ao meio ambiente ocasionado pelas atividades desenvolvidas pela agravante, qual seja, o apontado rompimento das barragens de mineração. 2. - O colendo Superior Tribunal de Justiça entende pela inversão do ônus da prova em desfavor do empreendedor da atividade potencialmente perigosa.
Precedente: REsp 1818008/RO. 3. - No caso, não se pode deixar de levar em consideração a vulnerabilidade dos agravados e, em especial, a hipossuficiência técnica deles diante da agravante, que, por óbvio, reúne melhores condições para demonstrar os fatos controvertidos, de modo que ainda que não se considerasse a aplicação da Lei n. 7.347/1985 à hipótese vertente, a inversão do ônus da prova seria medida impositiva nos termos do artigo 373, §1º, do Código de Processo Civil. 4. - “A inversão do ônus da prova nas ações de indenização decorrentes dos danos ambientais advindos do rompimento da barragem de resíduos minerários (…) deve se limitar à apuração da responsabilidade civil das empresas envolvidas e à respectiva extensão da degradação ambiental na área objeto do litígio, mantendo o ônus de comprovação da efetiva ocorrência dos danos materiais ao Autor da demanda, sob pena de se imputar à empresa de mineração a prova de fato negativo.
Art. 373 CPC/15.
Precedentes TJES.” (TJES, Embargos de Declaração Cível Ag AI, 030199001170, Relator Samuel Meira Brasil Junior, Terceira Câmara Cível, data de julgamento: 16-03-2021, data da publicação no Diário: 14-05-2021). 5. - Agravo de instrumento desprovido. (Agravo de instrumento n. 5003361-09.2021.8.08.0000, Relator Desembargador Substituto Júlio Cesar Costa de Oliveira, Terceira Câmara Cível, 13/01/2022) Ou seja, “Em demandas dessa natureza, como corolário do consagrado princípio in dubio pro natura, conjugado ao princípio ambiental da precaução, justifica-se a inversão do ônus da prova, transferindo para o empreendedor da atividade o ônus de demonstrar a segurança do empreendimento ou a impossibilidade de compensação dos danos na área atingida, o que deverá ser realizado em sede de cognição exauriente, inclusive com auxílio de prova técnica, como bem pontuado pela Procuradoria de Justiça”. (agravo de instrumento n. 5001528-82.2023.8.08.0000, órgão julgador: Quarta Câmara Cível, Rel.
Des.
Carlos Magno Moulin Lima, data da publicação: 11-04-2024) Assim, “A possibilidade de inversão do ônus da prova, seja por força do reconhecimento de uma relação de consumo (consumidor por equiparação art. 17, CDC), seja em razão dos princípios que regem o trato da matéria em sede de Direito Ambiental (notadamente, a prevenção e a precaução) transfere para o fornecedor de serviços/produtos e causador do dano ambiental o encargo de provar que sua conduta não ensejou riscos para o meio ambiente e, por consequência, aos pescadores/moradores/exploradores da região e eventuais lesados.” (TJES, apelação cível n. 030160092547, Relator Carlos Simões Fonseca, órgão julgador: Segunda Câmara Cível, data do julgamento: 22-06-2021, data da publicação no Diário: 29-06-2021).
A verossimilhança das alegações do agravado, para o fim específico da inversão probatória, extrai-se do fato notório do desastre ambiental e de seus impactos na bacia do Rio Doce, afetando atividades pesqueiras.
O agravado apresentou Carteira de Pescador Profissional (RGP) com registro inicial em 13/12/2006 (id 8890773) e extrato do CNIS indicando sua condição de segurado especial pescador desde a mesma data (id 8890774 – p. 10).
Tais documentos, ainda que a expedição da carteira física do RGP seja de 2022, constituem indícios de sua vinculação à atividade pesqueira anteriormente ao evento danoso.
A hipossuficiência do agravado, pescador artesanal, frente à agravante, é manifesta, tanto técnica quanto economicamente, justificando a facilitação de sua defesa em juízo.
Ademais, a inversão probatória também encontra suporte no artigo 373, §1º, do CPC, que permite a redistribuição do ônus probatório diante da maior facilidade de uma das partes em produzir a prova. É razoável presumir que a agravante, como responsável pelo empreendimento causador do dano, possui melhores condições de acesso a informações e dados técnicos sobre a extensão dos impactos e as medidas de mitigação e reparação adotadas. 2. - Da alegação de imposição de prova diabólica e os limites da inversão A agravante sustenta que a inversão do ônus probatório lhe imporia a produção de prova de fato negativo, ou “prova diabólica”, especialmente quanto à demonstração de que o agravado não exercia a atividade pesqueira nos moldes alegados ou que não sofreu os danos pretendidos, invocando o artigo 373, §2º, do CPC.
De fato, a exigência de que a agravante produza prova negativa sobre fatos personalíssimos da vida pregressa do agravado, como sua rotina laboral específica em 2015 ou a exata composição de sua renda, poderia configurar encargo excessivamente oneroso ou de impossível execução.
Contudo, a inversão do ônus da prova não exime o autor de apresentar um substrato probatório mínimo acerca dos fatos constitutivos do seu direito, conforme dispõe o artigo 373, inciso I, do CPC.
A inversão, no contexto de danos ambientais e consumeristas, visa primordialmente reequilibrar a relação processual, sem, contudo, conduzir à automática procedência do pedido autoral desprovido de qualquer adminículo probatório.
Nesse sentido, a decisão monocrática que indeferiu o efeito suspensivo no presente feito (id 9104846), ressalva que a inversão do ônus da prova, em casos como o presente, deve se limitar à apuração da responsabilidade civil das empresas envolvidas e à respectiva extensão da degradação ambiental na área objeto do litígio, “mantendo o ônus de comprovação da efetiva ocorrência dos danos materiais ao Autor da demanda, sob pena de se imputar à empresa de mineração a prova de fato negativo”.
Esta é a orientação da jurisprudência deste egrégio Tribunal, vejamos: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO INDENIZATÓRIA.
ROMPIMENTO DA BARRAGEM DE MARIANA.
EXERCÍCIO DE ATIVIDADE PESQUEIRA.
FATO CONSTITUTIVO DO DIREITO DO AUTOR.
RECURSO DESPROVIDO. É ônus da parte autora, por força do que dispõe o inciso I, do art. 373, do Código de Processo Civil, comprovar que exercia atividade pesqueira à época do rompimento da barragem de Mariana/MG, vedada a inversão quanto a esta questão, pena de se impor aos réus a chamada prova diabólica. (AC 5005773-17.2021.8.08.0030; Primeira Câmara Cível; Rel.
Des.
Anselmo Lagui Laranja; Publ. 19/02/2024) […] “A inversão do ônus da prova nas ações de indenização decorrentes dos danos ambientais advindos do rompimento da barragem de resíduos minerários (…) deve se limitar à apuração da responsabilidade civil das empresas envolvidas e à respectiva extensão da degradação ambiental na área objeto do litígio, mantendo o ônus de comprovação da efetiva ocorrência dos danos materiais ao Autor da demanda, sob pena de se imputar à empresa de mineração a prova de fato negativo.
Art. 373 CPC/15.
Precedentes TJES.” (Embargos de Declaração Cível Ag AI, 030199001170, Relator Samuel Meira Brasil Junior, Terceira Câmara Cível, data de julgamento: 16-03-2021, data da publicação no Diário: 14-05-2021).
Esta delimitação é essencial.
A inversão deve incidir sobre os fatos que a agravante possui, efetivamente, melhores condições de provar, tais como as características técnicas do evento danoso, a composição dos rejeitos de minério, a extensão da pluma de contaminação, as áreas que foram oficialmente reconhecidas como impactadas e onde a pesca foi restringida por autoridades competentes em decorrência direta do evento, bem como as medidas de reparação e compensação que alega ter implementado.
Não se pode, todavia, transferir à agravante o encargo de provar, por exemplo, que o agravado não comercializava o pescado ou que sua renda não atingia o patamar por ele afirmado, pois são fatos que, em princípio, o próprio agravado possui melhores condições de demonstrar, ao menos indiciariamente. 3. - Da verossimilhança das alegações e da prova da atividade pesqueira A agravante contesta a verossimilhança das alegações do agravado, afirmando que este não comprovou o exercício da atividade pesqueira com a necessária constância e regularidade à época do rompimento da barragem, nem que foi diretamente impactado.
Aponta a data de expedição da Carteira de Pescador Profissional (RGP) em 2022 e a ausência de outros documentos, como licenças específicas e comprovantes de renda da época.
Conforme já exposto, o agravado apresentou RGP com registro inicial em 2006 e extrato do CNIS como segurado especial pescador desde a mesma data.
Tais documentos, embora a carteira física do RGP tenha sido expedida em 2022, indicam uma vinculação formal e pregressa à atividade pesqueira.
A jurisprudência, inclusive deste egrégio Tribunal, tem se mostrado sensível à informalidade que frequentemente caracteriza a atividade de pescadores artesanais, admitindo que a ausência de documentação formal e contemporânea ao evento danoso possa ser suprida por outros meios probatórios, a serem produzidos e valorados no curso da instrução (vide acórdão TJES nº 5003361-09.2021.8.08.0000, que cita precedente nesse sentido).
A avaliação definitiva da suficiência do acervo probatório para comprovar a condição de pescador do agravado no período relevante, a regularidade de sua atividade, os locais de pesca e a efetiva ocorrência e extensão dos danos materiais e morais é matéria afeta ao mérito da causa principal, a ser dirimida após a necessária instrução probatória, sob o crivo do contraditório.
Para fins da inversão do ônus da prova, o que se exige é a verossimilhança da alegação, um juízo de plausibilidade que, no presente caso, pode ser extraído dos indícios documentais apresentados, do contexto do desastre ambiental e da condição de hipossuficiência do demandante, conforme entendeu o juízo de origem.
Ante o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, conheço do presente agravo de instrumento para, no mérito, NEGAR PROVIMENTO a ele, mantendo a respeitável decisão recorrida que inverteu o ônus da prova em desfavor da agravante.
Ressalva-se, todavia, que a inversão do ônus probatório deverá ser aplicada pelo juízo de primeiro grau em estrita observância aos limites e contornos estabelecidos na fundamentação deste voto, em especial no que concerne à não imposição de prova diabólica à agravante, remanescendo com o agravado o ônus de comprovar os danos materiais e morais individuais e específicos que alega ter sofrido, bem como o nexo de causalidade direto entre estes e o evento danoso. É como voto. _________________________________________________________________________________________________________________________________ VOTOS ESCRITOS (EXCETO VOTO VENCEDOR) Acompanho o judicioso voto de relatoria. -
21/07/2025 14:45
Expedição de Intimação - Diário.
-
21/07/2025 14:45
Expedição de Intimação - Diário.
-
18/07/2025 16:09
Conhecido o recurso de SAMARCO MINERACAO S.A. - CNPJ: 16.***.***/0001-61 (AGRAVANTE) e não-provido
-
17/07/2025 12:33
Juntada de Certidão - julgamento
-
16/07/2025 19:11
Deliberado em Sessão - Julgado - Mérito
-
04/07/2025 14:19
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 26/06/2025
-
25/06/2025 19:03
Inclusão em pauta para julgamento de mérito
-
05/06/2025 16:44
Processo devolvido à Secretaria
-
05/06/2025 16:44
Pedido de inclusão em pauta
-
16/10/2024 17:39
Conclusos para decisão a DAIR JOSE BREGUNCE DE OLIVEIRA
-
27/08/2024 01:10
Decorrido prazo de ANTONIO PAULO SANTOS DA SILVA em 26/08/2024 23:59.
-
17/08/2024 01:12
Decorrido prazo de SAMARCO MINERACAO S.A. em 16/08/2024 23:59.
-
25/07/2024 16:34
Expedida/certificada a intimação eletrônica
-
24/07/2024 09:00
Processo devolvido à Secretaria
-
24/07/2024 09:00
Recebido o recurso Sem efeito suspensivo
-
16/07/2024 14:27
Conclusos para despacho a DAIR JOSE BREGUNCE DE OLIVEIRA
-
16/07/2024 14:27
Recebidos os autos
-
16/07/2024 14:27
Remetidos os Autos (outros motivos) da Distribuição ao 4ª Câmara Cível
-
16/07/2024 14:27
Expedição de Certidão.
-
05/07/2024 14:42
Recebido pelo Distribuidor
-
05/07/2024 14:42
Remetidos os Autos (outros motivos) para Distribuição
-
05/07/2024 14:42
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
05/07/2024
Ultima Atualização
21/07/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Acórdão • Arquivo
Acórdão • Arquivo
Relatório • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
Documento de Identificação • Arquivo
Informações relacionadas
Processo nº 5000903-37.2024.8.08.0057
Paulo Cezar Peruggia
Franklin Fornazier Coitinho
Advogado: Isabelly Malacarne dos Passos
1ª instância - TJES
Ajuizamento: 12/11/2024 15:11
Processo nº 5017901-19.2023.8.08.0024
Lucas Prata Borges
Departamento Estadual de Transito do Esp...
Advogado: Eduardo Santos Sarlo
1ª instância - TJES
Ajuizamento: 12/06/2023 14:15
Processo nº 5010016-47.2024.8.08.0014
Associacao de Aposentados Mutualista Par...
Jorge dos Reis
Advogado: Layna Christina dos Santos
2ª instância - TJES
Ajuizamento: 21/07/2025 16:03
Processo nº 5030097-55.2022.8.08.0024
Manoel Carlos Mendes
Estado do Espirito Santo
Advogado: Victor Marques
1ª instância - TJES
Ajuizamento: 20/09/2022 13:39
Processo nº 5030097-55.2022.8.08.0024
Manoel Carlos Mendes
Estado do Espirito Santo
Advogado: Victor Marques
2ª instância - TJES
Ajuizamento: 21/05/2024 19:05